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O Mandarim
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E-book85 páginas1 hora

O Mandarim

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Sobre este e-book

O Mandarim narra a história de Teodoro, um humilde funcionário público em Lisboa que, ao ler um misterioso livro, descobre uma forma mágica de adquirir uma vasta fortuna ao custo da vida de um mandarim chinês. Atraído pela promessa de riqueza fácil, Teodoro enfrenta um dilema moral profundo ao tocar uma campainha que sela o destino do mandarim. A obra explora as consequências deste ato e levanta questões sobre a ganância, a ética e as verdadeiras fontes da felicidade.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento5 de jul. de 2024
ISBN9788410227682
O Mandarim

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    O Mandarim - José Maria Eça de Queiroz

    O_Mandarim.jpg

    Esta colecção valoriza as obras mais importantes da literatura universal, cada uma em sua língua original.

    Na Série Letras Portuguesas destacam-se: Livro do desassossego, de Fernando Pessoa; O Ermitão do Muquém, de Bernardo Guimarães; O banqueiro anarquista, de Fernando Pessoa; O Guarani, de José de Alencar; O mandarim, de José Maria de Eça de Queiroz...

    JOSÉ MARIA de EÇA DE Queiroz

    © Ed. Perelló, SL, 2024

    Rua Miraculosa, Nº 26, Valência

    46009 - Espanha

    Tlf. (+34) 644 79 79 83

    [email protected]

    http://edperello.es

    I.S.B.N.: 978-84-10227-68-2

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    PROLOGO

    1.º Amigo (bebendo Conhaque e soda,

    debaixo de árvores, num terraço, à beira de água)

    Camarada, por estes calores do Estio que embotam a ponta da sagacidade, repousemos do áspero estudo da Realidade humana... Partamos para os campos do Sonho, vaguear por essas azuladas colinas românticas onde se ergue a torre abandonada do Sobrenatural, e musgos frescos recobrem as ruínas do Idealismo... Façamos fantasia!...

    2.º Amigo

    Mas sobriamente, camarada, parcamente!... E como nas sábias e amáveis Alegorias da Renascença, misturando-lhe sempre uma Moralidade discreta...

    (Comédia Inédita).

    I

    Eu chamo-me Theodoro — e fui amanuense do Ministério do Reino.

    Nesse tempo vivia eu à travessa da Conceição n.º 106, na casa de hóspedes da D. Augusta, a esplêndida D. Augusta, viúva do major Marques. Tinha dois companheiros: o Cabrita, empregado na Administração do bairro central, esguio e amarelo como uma tocha de enterro; e o possante, o exuberante tenente Couceiro, grande tocador de viola francesa.

    A minha existência era bem equilibrada e suave. Toda a semana, de mangas de lustrina à carteira da minha repartição, ia lançando, numa formosa letra cursiva, sobre o papel Tojal do Estado, estas frases fáceis: «Illmo e Excmo Sr. Tenho a honra de comunicar a V. Excª... Tenho a honra de passar às mãos de V. Excª, Illmo e Excmo Sr...»

    Aos domingos repousava: instalava-me então no canapé da sala de jantar, de cachimbo nos dentes, e admirava a D. Augusta, que, em dias de missa, costumava limpar com clara de ovo a caspa do tenente Couceiro. Esta hora, sobretudo no verão, era deliciosa: pelas janelas meio cerradas penetrava o bafo da soalheira, algum repique distante dos sinos da Conceição Nova, e o arrulhar das rolas na varanda; a monótona sussurração das moscas balançava-se sobre a velha cambraia, antigo véu nupcial da Madame Marques, que cobria agora no aparador os pratos de cerejas bicais; pouco a pouco o tenente, envolvido num lençol como um ídolo no seu manto, ia adormecendo, sob a fricção mole das carinhosas mãos da D. Augusta; e ela, arrebitando o dedo mínimo branquinho e papudo, sulcava-lhe as repas lustrosas com o pentezinho dos bichos... Eu então, enternecido, dizia à deleitosa senhora:

    —Ai D. Augusta, que anjo que é!

    Ela ria; chamava-me enguiço! Eu sorria, sem me escandalizar. Enguiço era com efeito o nome que me davam na casa — por eu ser magro, entrar sempre as portas com o pé direito, tremer de ratos, ter à cabeceira da cama uma litografia de Nossa Senhora das Dores que pertencera à mamã, e corcovar. Infelizmente corcovo — do muito que verguei o espinhaço, na Universidade, recuando como uma pega assustada diante dos senhores Lentes; na repartição, dobrando a fronte ao pó perante os meus Directores Gerais. Esta atitude de resto convém ao bacharel; ela mantém a disciplina num Estado bem organizado; e a mim garantia-me a tranquilidade dos domingos, o uso dalguma roupa branca, e vinte mil reis mensais.

    Não posso negar, porém, que nesse tempo eu era ambicioso — como o reconheciam sagazmente a Madame Marques e o lépido Couceiro. Não que me revolvesse o peito o apetite heróico de dirigir, do alto de um trono, vastos rebanhos humanos; não que a minha louca alma jamais aspirasse a rodar pela Baixa em trem da Companhia, seguida de um correio coitando; — mas pungia-me o desejo de poder jantar no Hotel Central com Champanhe, apertar a mão mimosa de viscondessas, e, pelo menos duas vezes por semana, adormecer, num êxtase mudo, sobre o seio fresco de Vénus. Oh! moços que vos dirigíeis vivamente a S. Carlos, atabafados em paletós caros onde alvejava a gravata de soirée! Oh! Tipoias, apinhadas de andaluzas, batendo galhardamente para os touros — quantas vezes me fizestes suspirar! Porque a certeza de que os meus vinte mil reis por mês e o meu jeito encolhido de enguiço me excluíam para sempre dessas alegrias sociais vinha-me então ferir o peito — como uma flecha que se crava num tronco, e fica muito tempo vibrando!

    Ainda assim, eu não me considerava sombriamente um «pária». A vida humilde tem doçuras: é grato, numa manhã de sol alegre, com o guardanapo ao pescoço, diante do bife de grelha, desdobrar o Diário de Noticias; pelas tardes de verão, nos bancos gratuitos do Passeio, gozam-se suavidades de idílio; é saboroso à noite no Martinho, sorvendo aos goles um café, ouvir os verbosos injuriar a pátria... Depois, nunca fui excessivamente infeliz — porque não tenho imaginação: não me consumia, rondando e almejando em torno de paraísos fictícios, nascidos da minha própria alma desejosa como nuvens da evaporação de um lago; não suspirava, olhando as lúcidas estrelas, por um amor à Romeu, ou por uma gloria social à Camors. Sou um positivo. Só aspirava ao racional, ao tangível, ao que já fora alcançado por outros no meu bairro, ao que é acessível ao bacharel. E ia-me resignando, como quem a uma table d’hôte mastiga a bucha de pão seco à espera que lhe chegue o prato rico da Charlotte russe. As felicidades haviam de vir: e para as apressar eu fazia tudo o que devia

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