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Psicologia, Saúde e Desenvolvimento Humano
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E-book434 páginas3 horas

Psicologia, Saúde e Desenvolvimento Humano

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Sobre este e-book

O livro "Psicologia, Saúde e Desenvolvimento Humano" aborda, sob diferentes perspectivas, o processo de ajustamento psicológico das pessoas ante as adversidades, especialmente no que tange às suas relações com o mundo e o processo saúde-doença. Variados autores, mesmo que a partir de escolhas específicas a sua formação, compartilham a visão da Psicologia como uma ciência que busca, por meio da coleção de robustas evidências, assentar-se, cada vez mais, como um campo de extrema valia para a compreensão das experiências do ser humano. A cada capítulo, é possível identificar aspectos fundamentais de alguns aportes básicos e contemporâneos das áreas da Saúde e do Desenvolvimento, propondo-se olhares singulares sobre contextos de vida. Com tais peculiaridades, possibilidades de estudo e pesquisa são desenvolvidas ao longo de suas páginas. Por fim, esta coletânea de textos visa colaborar com a formação, a reflexão e a ação de estudantes e profissionais das áreas da saúde, humanas e sociais, em mais uma produção de conhecimento necessário ao cenário da Psicologia brasileira.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento16 de nov. de 2022
ISBN9786525264042
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    Psicologia, Saúde e Desenvolvimento Humano - André Faro

    CAPÍTULO 1 - RELAÇÃO ENTRE AUTOEFICÁCIA E DEPRESSÃO EM ADOLESCENTES

    Daiane Nunes

    André Faro

    Estima-se que há 1,2 bilhões de adolescentes em todo mundo, isto é, uma a cada seis pessoas tem entre 10 e 19 anos (World Health Organization [WHO], 2014). Essa etapa do desenvolvimento descreve um momento único para o indivíduo, representando uma importante janela para determinação em saúde na vida adulta (Global Burden of Diseases [GBD], 2019). Embora a maioria dos adolescentes seja saudável, ainda existe morte prematura substancial, ocorrência de doenças e lesões que provocam incapacidade. Além disso, com o crescente envelhecimento da população, condições e comportamentos em saúde na adolescência, como inatividade física, obesidade, uso de substâncias, dentre outros, assumem maior importância. Portanto, podem comprometer não apenas a sua saúde atual, como também serem determinantes para sua qualidade de vida e bem-estar no futuro (Jamison et al., 2013).

    As condições de saúde mental dos adolescentes representam 16% da carga global de doenças e lesões. Metade dessas condições tem início aos 14 anos de idade e, na maioria dos casos, não são detectadas e tratadas de forma adequada, acarretando maior comprometimento. Estima-se que entre 10-20% dos adolescentes no mundo vivenciam alguma doença mental e a depressão é uma delas (GBD, 2019). A depressão também tem sido associada a inúmeros comportamentos de risco à saúde, como uso de substâncias psicoativas (Stoduto et al., 2008) e, de forma mais grave, a ideação suicida (Macias et al., 2016).

    A prevalência mundial de depressão nesse grupo é de 3% a 9%, com prevalência cumulativa de 20% até o final da adolescência e uma taxa de recorrência de 60-70% ao longo da vida (Callahan et al., 2012). O transtorno afeta múltiplas funções ao adolescente e os principais sintomas incluem perda de energia, desinteresse, retardo psicomotor, sentimentos de desesperança e culpa, perturbações do sono, alterações de apetite e peso, isolamento e dificuldade de concentração que podem levar prejuízo nas esferas acadêmica e social (Thapar et al., 2012).

    O modelo cognitivo da depressão propõe que este transtorno seja entendido como resultado de uma inibição global do indivíduo, que altera e distorce a forma como este vê o mundo, percebe e demonstra suas emoções. O cerne deste modelo está no entendimento de que há um viés cognitivo no processo de informações que moderam as experiências individuais numa perspectiva negativista (Beck, 2008). Nesse sentido, inúmeros construtos constituídos por fatores cognitivos e sociais, como a autoestima (Gao et al., 2015), lócus de controle (Moshki et al., 2012) e autoeficácia (Valois et al., 2015), apresentam-se como elementos que atuam de forma protetiva e auxiliam no processo de ajustamento psicológico dos indivíduos.

    Achados na literatura têm dado destaque à variável autoeficácia no entendimento da depressão (Clum et al., 2013; Soysa & Wilcomb, 2015; Tan-Kristanto & Kiropoulos, 2014). A autoeficácia diz respeito às crenças individuais acerca da capacidade do indivíduo de exercer controle sobre seu nível de funcionamento e sobre eventos que afetam suas vidas. Em outras palavras, refere-se às crenças de um indivíduo acerca de sua própria capacidade para organizar e executar os cursos de ação necessários para produzir determinados níveis de realizações e resultados (Bandura, 1993). As crenças de autoeficácia exercem influência significativa no humor depressivo estabelecendo uma relação de reciprocidade. Isto é, níveis de autoeficácia podem predizer estados emocionais, enquanto estes exercem influência na remodelação de crenças preexistentes e desenvolvimento de novas crenças de competência pessoal (Crapara et al., 2013).

    Na adolescência, há evidências que uma percepção adaptativa de autoeficácia está relacionada a comportamentos em saúde, incluindo a adoção de hábitos alimentares mais saudáveis (Fitzgerald et al., 2013), prática de exercícios (Luszczynska et al., 2010), consumo de álcool e outras drogas (Connor et al., 2011), entre outros. Evidências apontam, ainda, que níveis rebaixados de autoeficácia estão associados à ideação suicida e tentativa de suicídio (Valois et al., 2015), transtorno de ansiedade social (Iancu et al., 2015), transtorno de estresse pós-traumático (Guerra et al., 2014) e depressão (Ahmad et al., 2014).

    A relação entre níveis de autoeficácia como preditores de depressão em adolescentes trata-se de um campo de pesquisa recente, comparado ao estudo de outros fenômenos psicológicos nesse público. O estudo empírico mais antigo foi publicado na década de 1990 (Ehrenberg et al., 1991). Portanto, verifica-se a necessidade de mapeamentos sistemáticos dos achados, a fim de apresentar uma síntese do que se sabe acerca dessa relação. Não foi encontrado, a partir da literatura nacional e internacional, nenhum levantamento sistemático acerca da relação entre autoeficácia e depressão na adolescência. Estudos dessa natureza possibilitam melhor entendimento do fenômeno em questão, bem como verificam possíveis lacunas a serem respondidas, direcionando futuros estudos de forma mais eficiente.

    A revisão integrativa consiste na elaboração de uma análise da literatura que tem como objetivo a ampliação do entendimento acerca de um determinado fenômeno a partir dos achados de estudos anteriores. Essa técnica tem sido frequentemente utilizada no campo da saúde por possibilitar a análise de pesquisas que fornecem subsídios para tomadas de decisões e melhoria de práticas clínicas, bem como permite uma síntese do conhecimento acerca de determinada temática, direcionando a possíveis preenchimentos de lacunas encontradas na literatura (Souza et al., 2010).

    O presente capítulo teve como objetivo principal realizar uma revisão integrativa da literatura acerca da relação entre autoeficácia e depressão em adolescentes. Como objetivos específicos, investigou-se: a) as características bibliométricas e psicométricas dos trabalhos encontrados; e b) o conteúdo dos principais achados. Sendo este último categorizado pelos dados de depressão e autoeficácia, relação entre ambas as variáveis, diferenças por sexo, idade e dimensionalidade da autoeficácia.

    ASPECTOS METODOLÓGICOS

    Para tanto, utilizou-se o programaStArt (State of the Art by Systematic Review, v. 2.3.4.2), ferramenta gratuita, desenvolvido pelo Laboratório de Pesquisa em Engenharia de Software (LaPES), da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), como suporte à aplicação de técnicas de revisões sistemáticas. Empregou-se, ainda, a declaração PRISMA (Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses) como critério para identificação, seleção e avaliação, a fim de agrupar e analisar os dados da presente investigação, incluindo métodos estatísticos de sumarização dos resultados (Ribeiro, 2014).

    As bases de dados eletrônicas pesquisadas foram a Web of Science, Scopus, PsycINFO, SciELO e PePSIC, plataformas de ampla indexação online de revistas científicas de caráter interdisciplinar. Foram incluídos para análise os artigos indexados entre 2008 e fevereiro de 2020, disponibilizados na íntegra, de acesso livre ou a partir do acesso CAfe (Comunidade Acadêmica Federada) na plataforma periódicos CAPES/MEC.

    Incluíram-se artigos empíricos que reportassem evidências acerca da relação entre autoeficácia e depressão em adolescentes. Considerou-se como critério de inclusão artigos em que a variável depressão foi mensurada como variável dependente (VD) e a autoeficácia como variável independente (VI). Foram excluídos da amostra artigos teóricos, relatos de caso, outras revisões da literatura, artigos que tivessem como amostra crianças, adultos e idosos ou que apresentassem aspectos metodológicos dúbios (por exemplo, a não especificação da medida utilizada para avaliar os fenômenos).

    Utilizaram-se os descritores "depression, self-efficacy, adolescent" e sinônimos (teenager e adolescence), considerando que nenhum estudo foi encontrado utilizando os mesmos descritores em português. Para as bases de dados Web of Science, Scopus e SciELO foram utilizadas as seguintes palavras-chave: "self-efficacy" AND "depression" AND "adolescent OR teenager OR adolescence". Para a base PsycINFO foram utilizados apenas os termos "self-efficacy" AND "depression, aplicando-se o filtro de grupo etário adolescence, disponibilizado pela plataforma da base. Na base PePSIC, não foi encontrado nenhum artigo quando inserido o termo adolescent no campo de busca, portanto, optou-se por utilizar apenas os termos self-efficacy" AND "depression", sendo selecionado apenas os estudos que tivessem amostra de adolescentes.

    Foram levantados 907 artigos. As bases de dados que obtiveram maior número de estudos foram a Web of Science (58,4%; n = 530) seguido da PsycINFO (20,9%; n = 190), Scopus (20%; n = 181), SciELO (0,5%; n = 05) e PePSIC (0,1%; n = 01). Após o descarte dos artigos duplicados (24,6%; n = 224), procedeu-se a etapa de leitura dos títulos e resumos. Nessa etapa, 607 (67%) artigos foram rejeitados considerando os critérios de inclusão e exclusão, restando 76 (8,3%) para serem lidos na íntegra. Desses, 66 (86,8%) foram excluídos por não atenderem aos critérios de seleção, de modo que, 10 (13,2%) compuseram os estudos primários desta revisão. O processo de seleção e análise dos artigos selecionados pode ser visualizado na Figura 1.

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    Figura 1. Processo de seleção e análise dos estudos encontrados segundo a recomendação PRISMA.

    Os estudos primários foram analisados segundo duas categorias: Características bibliométricas e psicométricas, incluindo sexo e número de participantes, instrumentos para mensurar autoeficácia e depressão e suas propriedades psicométricas; e análise de conteúdo dos principais achados, a saber: Dados sobre ocorrência de depressão e níveis de autoeficácia em adolescentes; relação entre ambas as variáveis; diferenças quanto ao sexo e idade dos participantes; e dimensionalidade das medidas de autoeficácia.

    A Tabela 1 apresenta a sumarização dos principais achados dos estudos primários que compõem esta revisão integrativa.

    Tabela 1. Características bibliométricas e de conteúdo dos estudos primários da relação entre autoeficácia e depressão em adolescentes.

    Notas. 1. Os autores não apresentaram o número de participantes por sexo.

    CARACTERÍSTICAS BIBLIOMÉTRICAS E PSICOMÉTRICAS DOS ESTUDOS PRIMÁRIOS

    Este estudo revisou a relação entre autoeficácia e depressão no total de 13.737 adolescentes (Md = 172). A menor amostra foi constituída por 73 participantes e a maior por 9.666. A maioria dos estudos primários (80%) foi composta por participantes de ambos os sexos. Houve apenas dois estudos em que as amostras foram exclusivas, sendo um deles constituído apenas por meninos (E2) e o outro por meninas (E10).

    O Children’s Depression Inventory (CDI) (40%) foi o instrumento mais utilizado para mensurar depressão, seguido do Center for Epidemiologic Studies Depression (CES-D) (30%). O Inventory to Diagnose Depression (IDD), a Depression Self-Rating Scale (DSS) e a Subescala de Depressão Cognitiva do CES-D foram utilizados apenas uma vez. Com exceção do E9, que não apresentou as propriedades psicométricas do IDD em sua amostra, os demais instrumentos obtiveram alfa de Cronbach acima de 0,80. Dentre esses instrumentos, apenas o CDI (Gouveia et al., 1995) e o CES-D (Silveira & Jorge, 1998) foram traduzidos e adaptados para o contexto brasileiro.

    A Escala de Autoeficácia Geral Percebida (EAGP) (30%) e o Self-efficacy Questionnaire-Modified (SEQ-M) (30%) foram os instrumentos mais utilizados para medir autoeficácia. Também foram utilizados a Peer Aggression Coping Self-Efficacy Scale (10%), a AIDS-Prevention Self-efficacy Scale (10%), o Self-Efficacy Questionnaire for Children (SEQ-C) (10%) e a Perceived Self-Efficacy Scale for Children and Adolescents (10%). Os instrumentos apresentaram alfa de Cronbach acima de 0,70 em seus respectivos estudos. Apenas o E6 não apresentou as propriedades psicométricas da medida utilizada. Desses, apenas a EAGP foi adaptada para o contexto nacional (Souza & Souza, 2004).

    Em linhas gerais, os instrumentos para mensurar depressão e autoeficácia apresentaram boas propriedades psicométricas, com confiabilidade elevada. O CDI foi o mais utilizado para avaliar sintomas depressivos. Nesse sentido, revisões da literatura apontam suas qualidades psicométricas e destacam sua ampla utilização na investigação do fenômeno em adolescentes (Bernaras et al., 2019; Carnevale, 2011). A EAGP e o SEQ-M foram os mais empregados para investigar autoeficácia na relação com depressão nesse grupo. A primeira escala consiste em uma medida que avalia autoeficácia geral, que se refere à confiança global do indivíduo em suas capacidades de lidar com uma ampla variedade de demandas (Schwarzer & Jerusalem, 1995). A escala é uma das ferramentas mais utilizadas para avaliar o construto em todo o mundo, tendo sido traduzida para 28 idiomas (Scholz et al., 2002). Já o SEQ-M é um subconjunto de escalas de um questionário multidimensional de autoeficácia (Bandura et al., 1999). A medida foi adaptada para avaliar o construto em três dimensões (acadêmica, social e resistência à influência negativa dos pares) (Scott et al., 2008). Considerando a alta estabilidade e consistência da EAGP e do SEQ-M em diferentes contextos, os achados desta pesquisa recomendam a utilização dessas medidas em futuras pesquisas. Isso possibilitará estabelecer parâmetros confiáveis de comparação entre diferentes estudos, delineando mais consistentemente o conhecimento acerca dessa relação.

    ANÁLISE DE CONTEÚDO: PRINCIPAIS ACHADOS

    Depressão

    Dentre os principais achados acerca dos sintomas depressivos, observou-se que no CDI os adolescentes apresentaram escore médio de 8,6 (DP = 1,56; Mínimo [Min]= 0; Máximo [Max]= 54), indicando ausência de sintomatologia depressiva (ponto de corte ≥ 15). O menor valor de escore médio (M = 6,8; DP = 7,87) foi observado no E3, enquanto que o maior escore médio (M = 9,7; DP = 7,28) foi obtido no E4. Utilizando o CES-D, o E1 indicou que 57% (n = 5487) dos adolescentes apresentaram pontuação acima do ponto de corte (≥ 16 pontos); destes, 48,1% foram classificados como tendo depressão grave (≥ 25 pontos), seguidos por depressão leve (26,9%; 16 a 20 pontos) e depressão moderada (25%; 21 a 24 pontos). No E2, também com o CES-D, 38,1% dos participantes apresentaram sintomas depressivos (sintomas leves: 26,4%; sintomas graves: 11,7%).

    Em síntese, os dados sobre depressão nos estudos aqui avaliados indicaram de moderada a elevada ocorrência do transtorno em adolescentes, o que segue a tendência de outras pesquisas realizadas nesse público. A exemplo disso, uma revisão sistemática verificou a prevalência de 30% de depressão em jovens com idade entre 15 e 26 anos – que pode ser considerada moderada (Ibrahim et al., 2013). Globalmente, a importância da depressão na adolescência vem sendo pauta de destaque (Thapar et al., 2012). Estudos indicam diferentes mecanismos psicológicos de adaptação como fatores protetivos à ocorrência de depressão, como a autoestima, autocontrole e autoeficácia (Breton et al., 2015; Colman et al., 2014).

    Autoeficácia

    Nos estudos que utilizaram a EAGP, os adolescentes apresentaram níveis moderados de autoeficácia, a exemplo do E2, no qual o escore médio foi de 27,2 (DP = 5,11; Mín. = 10; Máx. = 40) e o E10, em que os participantes obtiveram escore médio de26,6 (DP = 5,74). No SEQ-M os adolescentes também apresentaram níveis moderados de autoeficácia. No E4, por exemplo, a autoeficácia acadêmica obteve escore médio de 98,9 (DP = 18,98; Mín. = 43; Máx. = 144); na autoeficácia social foi de 50,6 (DP = 18,98; Mín. = 13; Máx. = 70) e na autoeficácia de resistência à influência negativa dos pares foi de 33,2 (DP = 8,35; Mín. = 6; Máx. = 42).

    Assim, constata-se que os adolescentes apresentaram níveis moderados de autoeficácia nesta revisão. Embora não tenham sido encontradas na literatura revisões sobre esta variável em adolescentes, outros estudos também encontraram resultados semelhantes com esse público utilizando a EAGP (McGeown et al., 2014; Sagone & De Caroli, 2013). Na adolescência, crenças rebaixadas de autoeficácia potencializam a vulnerabilidade ao estresse e fragilidade diante de exigências ambientais que aumentam nessa fase da vida (Tsang et al., 2012). Os adolescentes que apresentam níveis elevados de autoeficácia tendem a estabelecer objetivos mais desafiadores, persistem na tarefa diante de obstáculos e lidam melhor com estados afetivos e emocionais negativos (Franco & Rodrigues, 2018). Portanto, destaca-se a sua importância na ocorrência de sintomas depressivos, seja na predição de estados emocionais ou na reformulação de crenças em adolescentes (Crapara et al., 2013).

    Relação entre depressão e autoeficácia

    Em 90% dos estudos foram constatadas relações estatisticamente significativas e negativas entre autoeficácia e depressão (de E2 a E10). Os estudos E2, E3, E5, E6, E7, E8 e E9 testaram essa relação através de correlação, sendo que a mais forte (r = -0,70; p < 0,001) foi verificada em E7, e a mais fraca (r = -0,17; p < 0,005) em E8. Os estudos E2, E3 e E8, além de analisarem essa relação através de correlação, também realizaram regressão linear, junto aos estudos E4 e E10. O menor valor de β foi visto em E2 (β = -0,14; p < 0,010) e o maior valor em E10 (β = -0,38; p < 0,010).

    Constatou-se, portanto, uma relação estatisticamente significativa e negativa entre autoeficácia e depressão em adolescentes. Essa associação também foi verificada em outros grupos etários (Greenfield et al., 2012; Tovar et al., 2015), indicando consistência dessa relação ao longo da vida. Na adolescência, as crenças mal adaptativas de autoeficácia desempenham um papel mediador na origem de problemas afetivos, incluindo sintomas depressivos (Ahmad et al., 2014). Isto é, quando adolescentes são confrontados com eventos de vida negativos à sua adaptação, uma autoeficácia positiva ajuda a gerenciar estressores, reduzindo a chance de desenvolvimento de sintomas depressivos. Em contrapartida, perceber-se incapaz tende a comprometer o enfrentamento da situação que produz estresse, potencializando a ocorrência de depressão (Caroli & Sagone, 2014). Assim, o resultado da presente revisão reforça indícios de que o fortalecimento de crenças adaptativas de autoeficácia deve ser considerado um importante alvo de intervenção e de ações psicoeducativas de como lidar com adversidades.

    Autoeficácia e depressão: Diferenças por sexo

    Diferenças por sexo nos níveis de depressão e autoeficácia foram avaliadas em 40% dos estudos primários (E1, E3, E7 e E8). Todos indicaram que as meninas tinham níveis mais elevados de sintomas depressivos e menores níveis de autoeficácia do que os meninos. No E3, por exemplo, utilizando o CDI, os meninos apresentaram menor escore médio de depressão (M = 4,8; DP = 7,58) e maior nível de autoeficácia no SEQ-C (M = 92,1; DP = 14,82), em comparação às meninas (M = 8,2 [DP = 7,82]; M = 83,2 [DP = 16,69], respectivamente). Essa diferença foi estatisticamente significativa tanto para a variável autoeficácia (t[130] = 3,14; p < 0,001), quanto para os sintomas depressivos (t[130] = 2,51; p < 0,050).

    No E8, com a escala Peer Aggression Coping Self-Efficacy, a relação entre depressão e os quatro domínios de autoeficácia de enfrentamento foram mais fortes para as meninas: autoeficácia para comportamento proativo (z = 3,68; p < 0,010); autoeficácia de evitação do comportamento agressivo (z = 3,75; p < 0,010); autoeficácia de evitação da autoculpa (z = 4,21; p < 0,010); e autoeficácia de desengajamento de papel de vítima (z = 5,21, p < 0,010).

    A maioria dos estudos revisados tinha amostras de ambos os sexos, sendo constatadas diferenças por sexo quanto aos níveis de autoeficácia e sintomas depressivos. Apenas dois tiveram amostras exclusivas de meninos e meninas. Os resultados reafirmam um achado recorrente na literatura, de que as meninas apresentam níveis mais elevados de depressão e níveis mais rebaixados de autoeficácia, comparativamente aos meninos (Bandura et al., 2003; Díaz-Santos et al., 2011; Tak et al., 2017). Uma explicação para isso é que as meninas apresentam crenças de autoeficácia elevadas para gerenciar as atividades acadêmicas, ter empatia pelos sentimentos e experiências alheios ou rejeitar a pressão dos pares para engajamento em comportamentos de risco. No entanto, em comparação aos meninos, elas apresentam níveis mais rebaixados para gerenciar emoções e estados afetivos negativos. Embora as crenças de autoeficácia difiram em função do sexo, as estruturas causais são essencialmente as mesmas para os dois grupos; ou seja, níveis rebaixados de autoeficácia tendem a predizer níveis elevados de sintomas depressivos em meninos e meninas (Bandura et al., 2003). Recomenda-se que futuras pesquisas investiguem as diferenças individuais em subgrupos de meninas ou meninos, a fim de entender quais, dentre os subgrupos, apresentam maior vulnerabilidade.

    Autoeficácia e depressão: Diferenças por idade

    Apenas 30% dos estudos (E3, E8, E9) investigaram diferenças nos níveis de autoeficácia e depressão quanto à variável idade dos adolescentes. Desses, apenas um (E9)evidenciou tais diferenças. No E9, em um modelo de mediação, não houve associação indireta entre autoeficácia acadêmica e sintomas depressivos através da orientação do objetivo (se este havia partido dele, intrinsecamente, ou se era algo oriundo do desejo de outras pessoas) para os adolescentes mais novos. Em contrapartida, entre os adolescentes mais velhos, a autoeficácia acadêmica predisse a depressão e isso foi mediado pela orientação do objetivo. Em outras palavras, os adolescentes mais velhos, mais confiantes em suas habilidades acadêmicas, tendiam a estabelecer metas mais intrinsecamente motivadas que resultavam em aumento dos sintomas depressivos.

    Cumpre ressaltar que poucos estudos se propuseram a investigar diferenças nos níveis de autoeficácia quanto à idade do adolescente, seja na relação com depressão ou em outros desfechos. Dentre eles, ainda não há um consenso, isto é, alguns indicam que adolescentes mais velhos apresentam níveis mais elevados de autoeficácia (Ndika et al., 2009) e outros sugerem que crenças de autoeficácia e de competência pessoal diminuem à medida que os alunos avançam pelas séries escolares (Jacobs et al., 2002). Contudo, há uma tendência em acreditar que os adolescentes mais velhos vivenciam mais demandas da vida adulta que requerem o desenvolvimento de habilidades ainda não apreendidas, o que põe em dúvida suas crenças de competência pessoal (Schunk & Meece, 2006). Frente a essa dúvida, futuras pesquisas podem ser direcionadas ao esclarecimento da ocorrência diferenciada do fenômeno segundo a idade do adolescente, bem como seu impacto preditivo na depressão.

    Depressão e dimensionalidade da autoeficácia

    Foram utilizadas medidas gerais de autoeficácia em 30% dos estudos primários. Destes, apenas um não constatou uma associação estatisticamente significativa entre autoeficácia e depressão (E1). Os demais (E2 e E10) indicaram que autoeficácia foi preditora significativa de sintomas depressivos. Quanto aos estudos que utilizaram medidas específicas de autoeficácia para avaliar sua relação com depressão (70%), todos constataram essa associação entre as variáveis. Por exemplo, o E8 evidenciou uma correlação estatisticamente significativa e negativa entre depressão e os fatores de autoeficácia: comportamento pró-ativo (r = -0,26), evitação de comportamento agressivo (r = -0,17), evitação de autoculpa (r = -0,29) e desengajamento do papel de vítima (r = -0,30) da Peer Aggression Coping Self-Efficacy.

    A autoeficácia acadêmica, mensurada pelas escalas SEQ-C (E3) e SEQ-M (E4, E5 e E9) foi o fator mais utilizado e a que se mostrou mais robusta na investigação da relação com os sintomas depressivos. No E5, por exemplo, o fator apresentou correlação mais forte (r = -0,37) com os sintomas depressivos, isso quando comparada à autoeficácia social (r = -0,24) e de resistência à influência negativa dos pares (r = -0,18). No E9, que foi realizado com uma amostra de jovens indígenas norte-americanos, a autoeficácia acadêmica foi o único fator que apresentou correlação estatisticamente significativa e negativa com depressão.

    A maior parte dos estudos que compuseram esta amostra utilizou medidas específicas para mensurar autoeficácia e sua relação com sintomas depressivos em adolescentes. Esse achado denota uma importante recomendação: a de que a autoeficácia é mais bem apreendida em termos de comportamentos específicos em contraposição às medidas gerais. Visto que, a crença de autoeficácia em uma determinada situação (p. ex., para engajamento em comportamentos de risco) não implica em uma crença geral ou uma crença em outro domínio (p. ex., para engajamento em atividade física) (Luszczynska et al., 2005).

    Nesta revisão, a autoeficácia acadêmica (crença na capacidade de gerenciar assuntos acadêmicos), emocional (crença na capacidade de lidar, satisfatoriamente, com emoções negativas), social (crença na capacidade de estabelecer e manejar, de maneira eficaz, relações interpessoais) e autorregulatória (crença na capacidade de ser efetivamente assertivo e resistir às influências de colegas por se envolver em comportamentos de risco), foram os domínios mais empregados do construto. Tais domínios são concernentes à investigação da autoeficácia em adolescentes, por mensurar aspectos da vivência desse grupo. Portanto, recomenda-se que futuras pesquisas utilizem medidas específicas de autoeficácia na investigação dos fenômenos psicológicos em adolescentes, a fim de mensurar mais adequadamente o construto e suas implicações.

    CONSIDERAÇÕES FINAIS

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