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Massada
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E-book235 páginas3 horas

Massada

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Sobre este e-book

"Resultado de vinte anos de pesquisa, Massada: amor e esperança no maior suicídio coletivo da história é um romance histórico que conta a jornada de Hadassa, uma mulher forte, à frente do seu tempo, que precisa fugir com sua família junto a outros 966 judeus para a fortaleza de Massada, localizada ao norte do Mar Morto. Quando Hadassa e seu grupo se dão conta de que estão cercados por mais de 15 mil soldados romanos, a humilhação, a desesperança, o medo e a morte iminente por mãos inimigas fazem com que os judeus tenham de tomar uma decisão que mudaria o destino deles para sempre.
Teria sido possível mudar o curso dos acontecimentos? E o que cada um de nós faria se estivesse em uma situação extrema como a de Hadassa?
Massada nos faz refl etir sobre nosso propósito e questionar a espiritualidade de nosso tempo, além de nos fazer rever as perspectivas que temos sobre as dores da existência humana em meio ao ruído e à fúria de um dos episódios mais fascinantes da história."
IdiomaPortuguês
Data de lançamento14 de mai. de 2021
ISBN9786586077872
Massada

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    Massada - Marcos Meier

    1

    A fortaleza de Massada

    Hadassa chorava silenciosamente. Benjamin, ao seu lado, não ousava interferir de forma alguma. Desejava abraçá-la e dizer irmã, nós não vamos morrer, não se preocupe, mas essa sempre fora a missão dela, e naquela noite ambos sabiam que a morte era bem real e estava próxima.

    De cima da torre leste os dois podiam observar alguns poucos legionários romanos guardando o muro que circundava o imponente platô de Massada. Estar na muralha daquela fortaleza natural trazia uma sensação de segurança, de que o inimigo jamais chegaria até eles, mas sabiam que não era verdade. Mais de quinze mil soldados sedentos pelo sangue daquele pequeno grupo de judeus não seriam mais impedidos de subir. Do lado oposto da montanha, a rampa estava pronta, as muralhas haviam sido destruídas e a torre de assalto fora posicionada. A manhã logo chegaria, e, com ela, o horror assassino da espada romana.

    Talvez fosse hora de ser humilde e pedir ao Criador que seu amado fosse salvo, libertado da prisão e que no futuro pudesse ter uma vida feliz. Que encontrasse uma mulher que o amasse tanto quanto ela o amava. Que tivesse muitos filhos. Sonhava com um último beijo, um abraço acolhedor e sua voz sussurrando em seu ouvido: Tenha calma, querida, vai dar tudo certo.

    Seus devaneios eram constantemente interrompidos por choros e gritos de crianças que, ao lado de seus pais, eram sacrificadas em nome do amor. O terror pairava no ar em meio à fumaça que destruía os últimos troncos de madeira da segunda muralha.

    Ela desejava que tudo aquilo fosse apenas um pesadelo, que a qualquer momento despertasse de seu sono e acordasse em um mundo mais justo. Mas não passava de um desejo.

    Olhou para as estrelas refletidas nas águas calmas do Mar Salgado¹ e tentou, pela última vez, orar ao Criador. Implorou por sua própria vida, a de Benjamin e a de seu amado. Em seguida, abaixou-se e tocou a face molhada de lágrimas de seu irmãozinho. Os dois trocaram um olhar profundo. Queriam mais oportunidades para correr e se divertir nas ruas de Jerusalém. Desejavam ardentemente que a vida não lhes fosse tirada. Então, com uma voz que saiu do fundo de sua alma, acalentou o coração daquele menino amedrontado:

    – Sempre há uma saída.

    Era primavera, 15 de abril do ano 74 da Era Comum.² Aquela data seria lembrada para sempre como o dia do maior suicídio coletivo da história. E a vida, mesmo com todas as suas incertezas, precisava encontrar outro caminho para aqueles frágeis e assustados irmãos. A mensagem que percorreria o mundo e encheria de esperança o coração de milhões de pessoas no futuro não podia morrer ali.

    2

    No templo

    Quatro anos antes

    Hadassa ria ao ver seu irmão correr pelo templo. Mesmo sabendo que não era permitido, o prazer de Benjamin naquela pequena transgressão era tão grande que ela não ousava interferir. As pessoas que presenciavam a cena, constrangidas ao perceber que o menino era filho do administrador do templo, também não o corrigiam.

    Mas os ouvidos do pai não aceitaram a correria do caçula.

    – Hadassa! Faça-o parar! Vão para casa. Se querem fazer barulho, perturbem os ouvidos de sua mãe, não os meus.

    Os dois se deram as mãos e vagarosamente saíram dali. Hadassa se virou e, com um sorriso, provocou:

    – Até depois, paizinho.

    O pai apenas os encarou, sem dizer mais nada.

    Naquela época, não havia construção mais imponente que o célebre Templo de Salomão. Sua grandiosidade fazia com que todos se sentissem como grãos de areia, seres humildes criados por aquele a quem todos os judeus clamavam como único. E, na opinião dos peregrinos, nem Roma possuía edificações comparáveis a esse lugar sagrado.³

    Descendo as extensas escadarias, Benjamin voltou a extravasar sua alegria pulando os degraus de dois em dois, às vezes até de três em três. Uma senhora que subia devagar parou e os observou. Seu tempo de força e rapidez tinha ficado para trás. Agora, cada degrau era um obstáculo, e a atenção tinha de ser total para que não tropeçasse.

    – Ben, dê seu ombro para a viúva Sarah segurar. Eu a pego desse lado. Senhora, apoie-se em nós.

    – Minhas crianças, aceito a oferta. Parece que a cada dia alguém coloca mais um degrau nesta escadaria. Como é longa!

    Sem entender a brincadeira, o menino disse ser impossível adicionar degraus. As duas riram da ingenuidade dele.

    – Está de folga hoje? Não vai ter aulas com seu mestre?

    – Já tive, senhora. Meu mestre não vai dar as aulas da tarde durante um mês. Ele mencionou algo sobre certas reuniões de que deve participar.

    – Hum, como é bom ter um mês de folga, não é? – a mulher disse, olhando carinhosamente para o menino.

    – Devíamos ter folga sempre – respondeu Benjamin com um ar indignado.

    Depois de deixarem a idosa no pátio do templo, os dois irmãos retomaram a diversão da descida.

    – Sabe, Ben, um dia sem uma boa ação é um dia perdido.

    – Eu sei. Meu mestre sempre diz isso nas aulas.

    – Conte-me o que mais ele diz.

    – Hoje ele falou que minha elevação me rebaixa e meu rebaixamento me elev…

    Sem que o menino tivesse terminado de falar, um homem parou em frente aos dois com uma expressão de pavor e gritou:

    – Morrer! Vocês vão morrer! Todos vão morrer! – urrou enquanto chacoalhava Hadassa pelos ombros, antes de sair correndo escadaria acima.

    Muito assustados, sem saber quem ele era ou por que falara aquilo, perderam a alegria e a descontração da descida. Ben agarrou a mão da irmã para que saíssem logo dali.

    Longe do templo, ainda com o coração acelerado, Hadassa percebeu que as pessoas caminhavam cabisbaixas, como se algo estivesse errado. O sorriso dos cambistas e dos comerciantes havia sido substituído por medo. E certamente não por efeito das palavras daquele louco.

    – Benjamin, vamos conversar com a vendedora de púrpura, ela sempre sabe tudo o que acontece na cidade. Estou desconfiada de que algo ruim vai acontecer.

    – O mercado é muito longe, e papai nos disse para ir para casa. Quer ir mesmo assim? Se ele me der bronca, vou dizer que foi você que me levou.

    – Não tenho dúvida, você sempre me entrega. Vamos por outro caminho, longe dessa gente lenta.

    – Tudo bem, mas papai…

    – Vamos rapidinho… Pare de ser chato.

    Os dois conheciam tão bem os atalhos em Jerusalém que ninguém poderia chegar antes deles a lugar nenhum, seja qual fosse o destino. Alguns minutos depois, sentados no chão em frente à vendedora, Hadassa perguntou com delicadeza sobre as dificuldades pelas quais a mulher vinha passando e como estavam as vendas. Depois, sem conseguir esconder sua curiosidade, indagou:

    – Senhora Areta, por acaso sabe por que as pessoas estão com medo? Ouviu alguma coisa?

    – Não sei muito. Ouvi dizer que o general Tito está organizando um grande exército. Várias legiões já estão sob seu comando, e parece que até a decima Fretensis foi convocada!⁴ Tudo indica que ele vem para prender e crucificar todos os sicários.⁵

    – Os sicários? Seria bom se matassem todos. São uns ignorantes.

    – Querida, não seja tão rude. Eles lutam para que nosso povo seja livre. Os romanos é que estão errados. Agora estão cobrando impostos redobrados em todos os portos, inclusive em Ascalom. Um absurdo. É por isso que a púrpura está mais cara. E pode ficar ainda mais, então é melhor aproveitar. Vai comprar um pouco?

    – Não, hoje não. Só estava curiosa.

    – Bem, então já sabe, mas não se preocupe, pois os romanos não atacariam Jerusalém. Nós não oferecemos perigo.

    Interrompendo a conversa, um jovem comerciante grego desceu de seu cavalo e se dirigiu à vendedora.

    – Perdão pelo incômodo. Preciso encontrar bons produtores de vinho, entre outras coisas. Como a senhora sempre me ajuda, vim saber de você.

    – Senhor Alexandre, meu caro, como está Ascalom? – perguntou Areta, animada com a presença do ilustre comprador. Depois, virando-se para Hadassa, explicou, sorrindo: – Querida, este é Alexandre, meu fornecedor de púrpura e outros pigmentos. Ele vem da ilha de Rodes, de uma cidade cujo nome sempre esqueço.

    – Lindos. O nome da cidade é Lindos – o homem impostou um pouco a voz para impressionar a jovem. No entanto, diante da beleza de Hadassa, emudeceu.

    Em todas as suas viagens, jamais vira uma mulher como ela. Era quase impossível descrever fielmente seu rosto, e talvez quem tenha chegado mais perto de fazê-lo foi Yohanna, a prima da menina, quando disse: Não é coincidência que seu nome seja Hadassa. Ele significa ‘flor da murta’, e você é tão bela quanto ela. Essa flor, pequena, branca e perfumada, tem uma beleza exótica, mas sua perfeição e delicadeza a tornam única.

    Essa aura de mistério deixou Alexandre encantado. Os olhares dos dois se cruzaram, e um silêncio mágico os isolou de toda a movimentação costumeira das ruas.

    Hadassa, constrangida por seus próprios pensamentos a respeito da beleza do rapaz, abaixou a cabeça. Ele era jovem, tinha mãos fortes e parecia ser muito trabalhador. Ao mesmo tempo, seus cabelos cacheados lhe davam graça e seus olhos eram do mesmo verde-claro do Grande Mar.⁶ Logo acima da sobrancelha direita havia uma pequena cicatriz inclinada que lhe conferia um ar sério, fazendo com que parecesse sarcástico mesmo quando sorria. Ela gostou do detalhe.

    Pela primeira vez na vida, Hadassa sentiu sua pele aquecer como nas vezes em que se secara ao sol logo após se banhar no rio. Aquilo era agradável e ao mesmo tempo assustador. Algo tão novo quanto a atração por um desconhecido deixou sua respiração totalmente alterada.

    – Ascalom está bem, os negócios é que não. Os romanos são muito gananciosos – disse o rapaz à vendedora. Depois, desejando causar uma boa primeira impressão em Hadassa, desculpou-se. – Moça, perdoe-me pela minha falta de delicadeza, a pressa prejudicou meus bons modos. Gostaria de saber seu nome, se não se incomodar em dizê-lo.

    – Hadassa – respondeu, ainda com a cabeça abaixada, tentando disfarçar um leve sorriso.

    Ela queria ter dito mais coisas naquele momento, mas uma voz no fundo de sua mente a reprimia: Hadassa, não aja como uma meretriz. Você é filha de um sacerdote, não pode ficar conversando com homens pela rua, sejam eles quem forem. O conflito entre as orientações maternas e as novas sensações que experimentava naquele momento era perturbador.

    – Você parece tímida. Não se acanhe, não vou importuná-la. Vi que seu irmão gosta de cavalos e já fez amizade com o meu. Impressionante como ele o acaricia sem medo. Parece ter um dom especial.

    – Benjamin, saia daí. Não mexa no cavalo – a voz de Hadassa não tinha um tom autoritário, como se não quisesse que seu irmão a obedecesse.

    – Deixe-o, Hadassa, deixe-o montar. Menino! – o rapaz ergueu a voz. – Quer montar meu cavalo?

    – Eu quero! Sim, é claro que quero! – Benjamin pulava e agitava as mãos descompassadamente.

    – Ben, você não sabe montar. É perigoso! – a irmã tentou impedir.

    Afastando-se de Hadassa, Alexandre levantou Benjamin até acomodá-lo na sela.

    – Pegue as rédeas, segurando com essa mão. Puxe para virar para a esquerda ou para a direita, e desse jeito você faz o animal parar. Nunca force demais para não machucar a boca do cavalo, porque em vez de parar ele pode empinar e derrubar você, entendeu? Quer ir até aquela casa no fim da rua e voltar? Mas não corra e não o faça galopar, é perigoso.

    Benjamin não respondeu, mas conduziu o cavalo com perfeição. Sua alegria contrastava com a fisionomia das pessoas por quem passava. Retornou a galope, assustando os transeuntes, mas ainda mais a irmã, que gritava, em pânico.

    – Meu Pai Criador, livre-o de qualquer mal! Senhor Alexandre, ajude-o!

    Ao se aproximar, Benjamin fez o cavalo parar perfeitamente, como se fosse um cavaleiro experiente.

    – Por Júpiter! Você nos assustou. Por que não disse que sabia montar? – perguntou Alexandre, surpreso.

    O menino desceu do cavalo com a agilidade de quem está habituado com a montaria.

    – Não sabia, aprendi agora. Mas já tinha visto como os romanos montam, só fiz igual. É incrível, muito gostoso! – respondeu, com alegria e agitação.

    – Você poderia ganhar muito dinheiro em corridas. É muito leve e corajoso.

    Hadassa, assustada com o que tinha acabado de acontecer e receosa de que o grego influenciasse seu irmão, despediu-se da vendedora. Pegando Benjamin pela mão, desobedeceu às regras de sua mãe e se dirigiu a Alexandre:

    – Obrigada pelo empréstimo do cavalo, mas precisamos ir. Amanhã estaremos aqui de novo, para buscar um pouco de púrpura.

    Ela não precisava comprar pigmentos, mas temia que não voltassem a se ver. Só tomou coragem para sair dali porque se lembrou de uma frase que ouvira de uma de suas tias maternas: Quando um homem deseja uma mulher, ele sempre dá um jeito de encontrá-la.

    – Que moça formosa, é como uma Afrodite entre os seres humanos! De onde ela é? – disse Alexandre para Areta, agitado.

    – É filha do administrador do templo, o sacerdote Abbar. Ele é irmão do sumo sacerdote Fanias Ben Samuel. Abbar é um dos líderes mais poderosos, muito respeitado pelo povo. Mas não se aproxime dela. Um gentio jamais poderia se casar com uma judia.

    – Casar? Apenas achei-a muito bonita. E, apesar de muito respeitosa, livrou-se de mim tão rápido que nem pude continuar a conversa.

    – Senhor, já o conheço há quantos anos? Cinco? Sua boca fala, mas seu coração a contradiz. Vamos voltar a falar de negócios. – Os dois trocaram olhares de cumplicidade.

    – Sim. Por favor, se conhecer produtores de vinho de excelente qualidade, diga a eles que tenho interesse em comprar toda a produção. Já tenho compradores em Roma aguardando. Nosso navio está em Ascalom.

    – Está bem, assim o farei. Conheço um dos grandes, vou verificar se ele tem estoque ou já vendeu tudo. Terei as informações quando o senhor voltar.

    3

    Fretensis

    No caminho de casa, Benjamin falava sem parar sobre o cavalo e sobre como tinha sido incrível montá-lo. Disse à irmã que, se não fosse se tornar um sacerdote, seria um campeão de corridas.

    – Eu venceria todos os romanos, os gregos e os sírios!

    – É verdade, meu irmão. Você seria um excelente cavaleiro, tanto quanto será um excelente sacerdote.

    Os dois entram correndo em casa.

    – Mãe, onde está a senhora? Preciso contar uma coisa! – chamou Hadassa.

    Moravam em um lugar bem grande, comum entre os sacerdotes abastados. Hadassa e Benjamin procuraram Navit pelos aposentos e a encontraram deitada em seu quarto.

    – Mamãe, o povo está com medo. Ouvi dizer que os romanos vão invadir Jerusalém e assassinar todos os sicários, mas acho que vão matar todo mundo.

    – Mamãe, mamãe, andei a cavalo! E até corri! Eu podia ser um campeão de corridas. É muito rápido, ele corre muito! Os cavalos…

    – Benjamin, deixe-me ouvir Hadassa, depois você me conta suas histórias.

    Sem interesse naquela conversa, o menino saiu correndo para contar as novidades aos seus amigos da vizinhança.

    – Filha, Jerusalém já está nas mãos dos romanos, por que nos invadiriam? Você está se preocupando à toa.

    – Não sei, mamãe, no templo tem muito mais gente do que o normal. Estão com medo, implorando proteção.

    Hadassa tentou convencer a mãe, mas nada a impressionou. Nem a história do louco nas escadarias.

    – Deixe os assuntos de homens para os homens. Seu pai saberá o que fazer. Ele sempre sabe, afinal, é o homem mais sábio que já existiu desde Salomão.

    A voz da mãe estava carregada de sarcasmo. Falava do marido sempre com desdém, jamais com carinho. O mesmo acontecia para com as tias de Hadassa, irmãs do marido. Apenas um dos tios, o sumo

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