A caverna do tempo perdido
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Sobre este e-book
Contra a vontade do pai, ele embarca em uma emocionante expedição ao Parque Nacional da Serra da Capivara, com seu professor Abreu, a filha deste, Maíra, e o misterioso Carlos. O grupo parte em busca de vestígios de civilizações perdidas.
Carlos é um homem rude, e constantemente ameaça o professor Abreu e até o próprio Donato. Por que o professor permitiu que Carlos participasse da expedição? E o que será que ele procura, uma vez que não se interessa por arqueologia?
Durante a expedição uma estranha caverna foi encontrada pelo professor. Qual será o segredo dessa caverna, onde o tempo "anda para trás" e pessoas são mumificadas vivas?
E será que antes mais alguém esteve ali?
Com essa eletrizante aventura, Elizabeth Loibl combina ficção e realidade, abordando fatos importantes relativos a descobrimentos e patrimônios históricos do Brasil.
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A caverna do tempo perdido - Elisabeth Loibl
autora
I
– Arqueologia?! – exclamou Emílio Silva, irritado. – Você poderia fazer o favor de explicar o que significa isso? – perguntou ao filho Donato, em tom irônico. A família estava reunida à mesa do jantar e, apesar da aparente harmonia, reinava um clima tenso.
– Mas eu já expliquei, pai – respondeu Donato com um suspiro.
Depois de alguns instantes de silêncio, Emílio Silva continuou o interrogatório:
– O que está acontecendo com você, filho?
– Nada, ora! – explodiu Donato.
Emílio levantou a voz:
– Isso não é resposta! Seu lugar na fábrica já está reservado.
– É que... – Donato respirou fundo. Sabia muito bem que a fábrica era o ponto fraco do pai, mesmo assim arriscou: – Eu não quero passar o resto da minha vida trancado na fábrica, pai. É isso.
A reação era a esperada: o pai empurrou o prato, o sangue lhe subiu à cabeça.
– O que deu em você?! Ficou louco? – gritou.
Donato tentou explicar:
– Pai, você sabe que eu me interesso por arqueologia. Um dos meus professores, o professor Abreu, é arqueólogo. Ele pretende fazer uma pesquisa no Piauí. Ele disse que...
Emílio Silva não deixou o filho terminar:
– Não acredito! Não vai me dizer que você quer ir ao Piauí?! – perguntou, alterado.
– É isso que eu ia dizer, mas eu também queria...
Emílio o interrompeu de novo:
– Nunca ouvi tamanha bobagem!
Donato esforçou-se para manter a calma. Com os olhos fixos no prato, murmurou:
– Eu quero ser arqueólogo, pai.
Emílio perdeu o controle e deu um murro na mesa.
– Você perdeu o juízo! – gritou.
– Emílio! Cuidado com a pressão – interveio dona Diva, a mãe de Donato, uma senhora à moda antiga, que acatava tudo o que o marido dizia.
– Pressão! Como posso cuidar da pressão se meu filho me vem com esse tipo de criancice?
– Você está fazendo tempestade em copo d’água, Emílio – disse dona Diva.
Donato resolveu enfrentar o pai:
– Eu vou com o professor para o Piauí, pai.
Emílio deu outro soco na mesa.
– Eu não permito que vocês resolvam as coisas sem meu consentimento, você sabe disso! Piauí! Imagine! Você não vai mesmo!
Mônica, a irmã mais nova, tentou intervir a favor do irmão:
– Deixa ele ir, pai!
– Não se intrometa, filha!
Emílio Silva fixou os olhos no filho.
– Piauí! – repetiu. – Fazer o que lá?
– O professor Abreu já foi ao Piauí pesquisar inscrições rupestres em Sete Cidades.
– Inscrições rupestres?! Sei lá o que é isso! Você não vai, está resolvido!
Com a teimosia que herdou do pai, Donato disse:
– Se você não deixar, eu saio de casa.
Pai e filho se encararam como inimigos. Emílio Silva, um homem de origem humilde, lutou muito para chegar aonde chegou. Seus pais trabalharam na roça em Minas Gerais e ele veio cedo para São Paulo para ganhar a vida.
Repetia mil vezes, para quem quisesse ouvir, mas principalmente para os filhos, que começou do zero e hoje era dono de uma metalúrgica de porte médio no ABC paulista.
Os tempos estavam difíceis para a indústria automobilística e, consequentemente, para as fábricas que dependiam dela. Justo agora, seu único filho lhe causava ainda mais problemas.
Emílio esforçou-se para recuperar o autocontrole. Mais calmo, perguntou:
– Afinal, o que é arqueologia? Eu gostaria de entender seu interesse por essa... hum, essa coisa.
Aliviado, Donato tentou explicar:
– É a ciência que estuda os testemunhos da cultura humana, de povos que viveram no passado. É...
O pai, um homem voltado para as conquistas da vida moderna, não deixou o filho continuar. Impaciente, interrompeu-o novamente:
– Bobagem! É o presente que interessa!
Donato não recuou.
– Eu quero fazer descobertas, não quero ficar o dia todo na fábrica – insistiu, decidido a lutar por aquilo que queria.
– Que desaforo! – gritou Emílio Silva. – Você fala como se fosse uma vergonha trabalhar na fábrica! De onde acha que vem o dinheiro para sustentar vocês?
Donato, até então calmo, não se conteve mais:
– Você nunca me perguntou se é isso que eu quero! Eu tenho vontade própria, sabia?
Emílio levantou-se sem ter tocado na comida e foi até um pequeno bar, onde encheu um copo de uísque puro.
– Emílio, por favor... – começou dona Diva, mas foi imediatamente interrompida pelo marido:
– Deixe-nos sozinhos, Diva.
– Mas...
– Por favor!
Havia muitos anos acostumada com o caráter autoritário do marido, dona Diva saiu da sala sem mais uma palavra. Mônica, a irmã de Donato, não se conformava com o jeito submisso da mãe e, apesar de bem mais nova que o irmão, não raras vezes a criticava com palavras duras.
Agora recusava-se a sair da sala, pois queria dar uma força ao irmão.
– Pai, deixa ele ir ao Piauí, não tem nada de mais!
– Não se meta nisso, Mônica! – respondeu Emílio, irritado.
Apesar de atrevida, o que era próprio de sua idade, Mônica também possuía inteligência fora do comum. Sabia quando era preciso recuar. Trocou um rápido olhar com o irmão e depois foi atrás da mãe.
Com o copo na mão, Emílio olhou para o filho como se o visse pela primeira vez. Donato tinha dezessete anos e estava na hora de se interessar pela fábrica. Tudo o que Emílio construíra foi pensando nos filhos.
Diante do silêncio do pai, Donato criou coragem.
– É que... você nunca me perguntou se eu queria trabalhar na fábrica.
Emílio encheu o copo novamente.
– Eu não entendo... a gente gasta uma fortuna pensando que vai dar uma educação melhor do que a gente teve... pra quê?
O pai não tinha muita instrução, mas não era bobo. Sabia que podia perder o filho se não mantivesse a cabeça fria.
– Você ainda é muito jovem, não sabe nada da vida, das dificuldades.
– Pai, eu...
– Espere! Você teima em ir com aquele... hum, professor, para o Piauí fazer não sei o quê. Vá para os Estados Unidos, filho. Ou para a Europa.
– Você não quer entender, pai! Eu já decidi: vou para o Piauí com o professor Abreu!
Por alguns instantes fez-se silêncio. Depois o pai, aparentemente calmo, perguntou:
– Por que o Piauí, filho? O que tem de tão interessante lá?
– É que o professor Abreu procura vestígios de civilizações perdidas. Ele acha, por exemplo, que no Piauí vai encontrar sinais do Peabiru, o lendário caminho pré-histórico. Segundo os relatos de alguns pesquisadores, existem em Sete Cidades e também na Serra da Capivara sinais que confirmam a presença dos fenícios e dos vikings. O professor...
Donato se empolgara, mas, de repente, notou que estava falando à toa.
– Pai! Você não está nem prestando atenção! Depois não vai dizer que não te conto nada!
Emílio Silva olhou, pensativo, para o copo vazio, como se ali estivesse a resposta para seus problemas. Finalmente, suspirou:
– O que você me contou, filho, pra mim é grego. Não entendi nada. Tudo isso me parece um tanto confuso, mas, se é isso que você quer...
– Escuta, pai...
Emílio levantou a mão, num gesto de resignação.
– Espere! Eu concordo com essa maluquice de ir ao Piauí, mas com uma condição.
– Condição?!
– Quero lhe propor um acordo, filho. Você vai para o Piauí e, quando voltar, trabalha um ano comigo na fábrica. Se depois você ainda quiser estudar arqueologia, não vou mais interferir; você terá meu apoio. Eu acho que é uma proposta justa!
Donato ficou mudo. Trabalhar um ano na fábrica! Por outro lado, o pai lhe prometera ajuda. Estudar e pesquisar sem problemas financeiros! Poucos tinham essa chance!
– Se você faz questão... – respondeu, sem muito entusiasmo.
– Claro que faço questão! Arqueologia não paga contas, filho!
Mais tarde, em seu confortável quarto, no décimo andar de um luxuoso prédio de apartamentos da zona sul, o rapaz foi até a janela. A seus pés se estendia São Paulo, a antiga Piratininga, a cidade dos bandeirantes, homens destemidos que conquistaram terras desconhecidas. Eu gostaria de ser como eles!
, pensou, respirando fundo. Por que enfrentara o pai com tanta teimosia? Nenhum de seus colegas e amigos compartilhava seus sonhos; ao contrário, todos zombavam dele! O divertimento e as aventuras dos colegas limitavam-se a jogos eletrônicos, filmes, televisão, internet... mas, para ele, Donato, a vida se passava lá fora. O que havia de errado nisso?
I I
– Oi – disse Carol.
– Oi – respondeu Donato, mal-humorado.
Por alguns minutos andaram em silêncio, até que Carol não aguentou mais:
– O que você tem? – E sem esperar resposta: – É verdade que você vai para o Piauí com o professor Abreu?
Donato deu de ombros.
– Então você já sabe?
– Todo mundo sabe.
– E daí?
– Nada... é que... por que o Piauí?
Donato chutou uma lata vazia.
– Pra