No coração da Amazônia
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Sobre este e-book
Durante sua adaptação ao novo país, o garoto irá se deparar com uma cultura bastante diferente da sua e ficará encantado com a biodiversidade da vida na floresta. No entanto, chamará sua atenção o fato de que diversas espécies de animais estão correndo o risco de extinção.
Com a ajuda de seus novos amigos, Hans vai descobrir que há muito a ser feito para ajudar na preservação da fauna e da flora da Amazônia.
Manuel Filho
Quando eu tinha oito anos, meu nome e endereço foram publicados na seção ‘Amizade Selada’ da revista Cebolinha 54, da editora Abril, e, em razão disso, recebi cartinhas e postais de vários cantinhos do Brasil. Construí várias amizades e desejei conhecer lugares tão incríveis como os que eu descobria ainda na infância. E fiz mesmo diversas viagens: reais e imaginárias. Comecei a inventar as minhas histórias, publiquei mais de 60 livros, ganhei prêmios literários, como o Jabuti, e participo de encontros literários o ano inteiro.Também sou ator, cantor e adoro pisar nos palcos por aí.Quando o Mauricio me deixa brincar com a Turma da Mônica, eu volto a momentos inesquecíveis da minha infância. É mágico colocar palavras nas bocas destes personagens tão amados! Espero que tenha curtido esta aventura, com medinho, claro.
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No coração da Amazônia - Manuel Filho
Sumário
Ah, se eu soubesse!...
1. Um rio negro
2. Que peixe estranho
3. O silêncio dos inocentes
4. Todo mundo faz
5. Faz parte da família
6. Liberdade! Liberdade?
7. Os dois lados da moeda
8. Imitando a natureza
9. As pequenas grandes mudanças
10. Uma delicada surpresa
O autor
Hoje não teve jeito. Quando minha mãe entrou no meu quarto e viu que depois de sete meses no Brasil eu ainda não havia desarrumado as malas completamente, ela ordenou que eu colocasse tudo em ordem. Eu tinha largado um monte de coisas num canto porque eram roupas de frio e objetos que eu nem sabia se iria usar novamente. Só deixei no cabide as roupas do dia a dia. Não era uma bagunça. Da maneira que ela contou para o meu pai, parecia que tinha acontecido uma guerra no meu quarto.
Porém, no fim das contas, até que foi legal. Encontrei várias recordações dos meus amigos que ficaram na Alemanha. Só não sinto muita falta deles porque trocamos informações e fotos a todo momento. Alguns, inclusive, já me disseram que querem vir pra cá qualquer dia desses. O mais emocionante foi encontrar um pedacinho de papel que estava esquecido no bolso de uma mala, trancado por um zíper. Enfiei a mão lá dentro e, quando puxei, veio a passagem aérea que usei para vir pro Brasil toda amassada.
Era só um pedaço de papel, mas trazia tanta expectativa, tantos sonhos... Olhando para ela, começo a relembrar, como se fosse agora, tudo o que aconteceu desde que eu cheguei aqui... Ah, se eu soubesse!...
S enhores passageiros, em alguns instantes pousaremos no aeroporto da cidade de Manaus. Por favor...
Nossa! Quase dei um pulo do meu assento apertado. Eu já voava havia tanto tempo que, mais um pouquinho, iria virar passarinho. Primeiro fiz um voo de mais de dez horas de Frankfurt, na Alemanha, até o Rio de Janeiro, no Brasil. Então, tive que esperar outras três ou quatro horas para pegar o voo para Manaus, a capital do estado do Amazonas sobre a qual eu tanto tinha ouvido falar nos últimos anos.
Nem podia acreditar que, finalmente, fazia essa viagem. Tenho um belo desafio pela frente, mas estou muito empolgado com tudo o que me espera. Minha avó é brasileira; vivia no Rio Grande do Sul. Quando ela se casou com meu avô, que é alemão como eu, acabou tendo que se mudar para a Alemanha, porém, nunca esqueceu a sua terra natal. Cresci ouvindo as histórias que ela contava, as viagens que havia feito: as praias lindas, o povo caloroso, a Floresta Amazônica e a imensidão do país. Sempre tive vontade de vir para cá, mas não esperava que fosse me mudar tão cedo.
Meus pais são músicos e frequentemente tocavam em uma das orquestras mais famosas da Alemanha. Há cerca de uns dois anos, participaram de um concerto em Manaus e ficaram encantados com a história da região. Eles me contaram que tiveram dificuldade para se comunicar no princípio, entendiam melhor do que falavam, porém, aos poucos, foram se virando. A gente sempre falou um pouco de português em casa porque a minha avó ensinava para todos. Na verdade, ela jamais conseguiu falar alemão muito bem, o que nos forçou a aprender português. No fim, meus pais ficaram tão apaixonados pela Amazônia que tiveram uma ideia que, no início, parecia impossível: criar uma ong para ensinar música para os jovens e também fazer um intercâmbio do conhecimento dos sons e instrumentos dos povos locais.
Quando alguém comentava que meu pai tinha enlouquecido, ele falava:
– Se alguém conseguiu erguer um dos teatros mais lindos do mundo em plena Floresta Amazônica no século XIX, não é possível que eu não consiga construir uma ong nos dias de hoje, que será bem menor, afinal de contas.
O primeiro problema que ele teve que enfrentar foi a questão do dinheiro para iniciar o projeto. Meus pais eram profissionais respeitados e já tinham gravado várias peças musicais. Sempre que eu contava isso, a primeira pergunta que me faziam era se eles pertenciam a algum grupo de rock. Eu achava engraçado porque nem rock se ouvia em casa. O fato é que eles recebiam dinheiro pelos direitos autorais e estavam dispostos a investir na criação da ong que, para eles, seria a realização de um grande sonho: morar no Brasil e ainda ensinar música para jovens. Em seguida, foram atrás de amigos e de entidades na Alemanha que já haviam passado por experiências semelhantes para aprender sobre documentos, burocracia, um monte de procedimentos. Nesse período, eles ficavam muito cansados.
No momento em que eles me perguntaram se eu topava entrar nessa aventura, não tive nenhuma dúvida: disse SIM na hora. Fiquei empolgado para ver de perto tudo o que eu sempre tinha ouvido falar apenas pela minha avó. E depois, se eu não gostasse, poderia voltar para a Alemanha e viria visitá-los de vez em quando e vice-versa. Não seria o fim do mundo, afinal, eu já tinha alguns planos de sair de mochila por aí conhecendo lugares e a ideia de começar pela Floresta Amazônica me parecia fascinante.
Quando meus pais chegaram aqui para fundar definitivamente a música na floresta, foi esse o nome que eles deram para a ong, eu fiquei triste porque não pude vir junto. Precisava encerrar minhas aulas para recomeçá-las em seguida no Brasil. Pelo que meus pais me explicaram, eu entraria num período chamado de ensino médio.
Foram os três meses mais longos da minha vida. Acabei ficando muito tempo no computador ou celular: conversando e verificando o que se passava pelas redes sociais. Eu lia mais de dez vezes cada mensagem que chegava e não conseguia acreditar em tudo o que meus pais me contavam: árvores imensas, espaços impenetráveis, dias e dias navegando um único rio para chegar a outra cidade, rios tão largos que não dava para ver as margens, animais singulares, jacarés de seis metros, piranhas, árvores de borracha.
Era tanta novidade, todos os dias, que eu até duvidava de determinadas coisas. Como é que pode existir uma cobra de 12 metros de comprimento ou folhas de árvores do tamanho de uma pessoa? Tudo isso dentro de uma floresta só? Ficava difícil de acreditar, mas eles me diziam que aquilo era só o começo.
Finalmente havia chegado o dia em que eu iria embarcar. Minha avó chorou muito no aeroporto. Ela até pensou em vir comigo para matar as saudades, porém, meu avô estava doente e ela não podia deixá-lo sozinho. Na verdade, seria ótimo se os dois pudessem viajar para o Brasil.
Senhores passageiros, mantenham-se sentados, com o cinto de segurança...
O aviso que eu esperava! O pouso havia iniciado. Olhei pela janela e era realmente incrível. O verde da floresta se espalhava por todos os lados. Eu conseguia distinguir pouca coisa, mas dava pra ver que o verde não era um só: viam-se centenas de tonalidades diferentes. Acho que nem o maior artista do mundo poderia criar tantas variedades da mesma cor.
De repente, o avião fez uma curva e tudo ficou escuro. Achei estranho; todo o verde sumiu. Pensei que tivéssemos entrado em alguma nuvem, entretanto, foi algo ainda mais impressionante. Eu olhava pela janela e só conseguia perceber uma imagem meio turva, como se fosse uma nuvem embaçada. Então, o avião acertou o nível e, ao ficar estável novamente, eu compreendi o que havia acontecido. A coisa escura, turva, nada mais era do que o leito de um imenso rio. Lentamente surgiu uma paisagem marrom e depois o verde da floresta voltou. Eu entendi que era a floresta que terminava na margem do rio, deixando uma linha de areia que formava uma espécie de praia e, na sequência, o rio. Aquele deveria ser o rio Negro, imaginei. Dava para ver a água batendo na margem, tremendamente escura.
Lá do alto senti que as histórias dos meus pais deveriam mesmo ser verdadeiras. O rio impressionava; uma série de outros afluentes desaguavam nele. Alguns eram tão retos que pareciam estradas comuns, mas essa ideia era rapidamente desmentida porque eles eram navegados por barcos de diferentes tamanhos. Então, tudo foi sumindo, menos a floresta que ficava cada vez mais próxima. Algumas casas surgiram e logo estávamos em terra: o avião correndo na pista com a floresta ao lado, o tempo todo, como se fosse uma companheira inseparável.
Finalmente o avião parou. Estiquei as pernas e busquei minha mochila no bagageiro. Agora eu estava louco para ver os meus pais. A ansiedade só aumentava. Fui para a esteira de onde eu deveria retirar minha mala: parecia que ela não chegava nunca. Peguei-a, coloquei-a num carrinho e procurei a saída. Fiquei morrendo de vontade de começar a gastar o português que eu tinha aprendido, perguntando para alguém onde