Um contemporaneo do Infante D. Henrique
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Um contemporaneo do Infante D. Henrique - Alberto Pimentel
The Project Gutenberg EBook of Um contemporaneo do Infante D. Henrique, by
Alberto Pimentel
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Title: Um contemporaneo do Infante D. Henrique
Author: Alberto Pimentel
Release Date: June 13, 2010 [EBook #32792]
Language: Portuguese
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UM CONTEMPORANEO
DO
INFANTE D. HENRIQUE
Carta a MR. MATHIEU LUGAN
POR
ALBERTO PIMENTEL
PORTO
Livraria Internacional de Ernesto Chardron
Casa editora
M. LUGAN, Successor
1894
Todos os direitos reservados
{1}
UM CONTEMPORANEO
DO
INFANTE D. HENRIQUE
{2}
PORTO—TYP. DE A. J. DA SILVA TEIXEIRA
Cancella Velha, 70
{3}
UM CONTEMPORANEO
DO
INFANTE D. HENRIQUE
Carta a MR. MATHIEU LUGAN
POR
ALBERTO PIMENTEL
PORTO
Livraria Internacional de Ernesto Chardron
Casa editora
M. LUGAN, Successor
1894
Todos os direitos reservados
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L'histoire d'Alvaro Vaz de Almada est généralement peu connue hors du Portugal; et en Portugal même la biographie de ce grand homme est environnée de details contradictoires.
FERDINAND DENIS—Portugal, pag. 85.
{6}
{7}
Meu prezado amigo:
Vivendo entre portuguezes ha muitos annos, quer v. corresponder á estima e consideração que d'elles tem justamente recebido, associando-se, como editor de obras litterarias, á commemoração solemne com que a cidade do Porto vai celebrar o quinto centenario do nascimento do infante D. Henrique, o Descobridor.
É nobre a acção, que v. se propõe praticar. E, procedendo assim, segue o exemplo de muitos estrangeiros, a quem Portugal{8} deve gratidão pelo interesse que tem tornado em evidenciar á luz da verdade e da gloria os feitos d'este pequeno povo, que tamanhos serviços prestou no seculo XV á sciencia e ao commercio, á humanidade e á civilisação, especialmente no momento historico em que o infante D. Henrique apparece em scena para emprehender e estimular os descobrimentos maritimos.
Entre esses estrangeiros a quem devemos ser gratos, avulta, certamente, um compatriota de v., o illustre Ferdinand Denis, que tanto amou, com especial dedicação, o passado de Portugal nas suas gloriosas tradições e nos seus triumphos por mar e por terra, na guerra ou na paz.
Estamos, pois, habituados á sympathia de estrangeiros, e não é, por isso, de estranhar a deliberação de v. Mas é para agradecer e louvar.
Acceitando a missão de auxiliar o nobre{9} alvitre de v., e achando-me collocado em frente do periodo mais brilhante da historia de Portugal, que o infante D. Henrique personifica, lembrei-me de que o assumpto, comquanto vasto, ha de ser amplamente tratado por muitos escriptores portuguezes, que mais ou menos se encontrarão n'um ponto de partida commum: a vida do infante, e a sua influencia na successão dos nossos descobrimentos maritimos.
Assim, pois, pensei que, sendo já conhecida, nas suas linhas geraes, a biographia do infante, eu poderia, sem atraiçoar a intenção de v., tomar outro rumo, estudando, dentro dos estreitos limites de uma carta, a feição proeminente de uma época, de que D. Henrique foi a culminação, mas que se assignalou pelo concurso de um grupo de homens colossalmente prestigiosos.
Como na vida de todos os heroes, ha{10} manchas, claro-escuro na vida do infante Descobridor. Encarado em si mesmo o homem, teve defeitos, commetteu erros, mas não é esta a hora propria para os relembrar. O principe exerceu, e este é o ponto essencial e capital, uma acção benefica na historia da humanidade, e marca o periodo que, elevando Portugal, aproveitou ao mundo todo.
Mas, quanto á época, é justo, sem nunca perder de vista o infante, procurar medir a estatura dos portuguezes do seculo XV, que com elle collaboraram, nas viagens ou nas campanhas, e que constituem os elementos de caracterisação do espirito arrojado, leal, cavalheiresco, épico, dos inexcediveis heroes d'esse tempo.
A alma portugueza era então um mixto de poesia e valor, sobretudo de poesia no valor. Feita de bronze, não conhecia perigos, difficuldades, resistencias. O infante, estimulando a coragem{11} para as emprezas maritimas, era a expressão do sentir de heroes, que avançavam sempre, contra o Mar Tenebroso, contra os moiros, os inimigos exteriores, ou contra as agitações da politica interna, sem medirem os percalços do commettimento.
A pureza dos costumes, nos homens e nas mulheres, dava um como perfume de santidade impeccavel ás ideas e aos sentimentos da época. A religião era mais alguma coisa do que o culto de Deus nos templos: era a lei por onde cada um regia as suas palavras e acções, os seus pensamentos e feitos, nas suas relações com Deus ou com os homens.
O fanatismo religioso levava a vêr inimigos n'aquelles que, não commungando na mesma religião, não poderiam attingir o gráo de perfeição moral em que todas as crenças se purificavam. Era um preconceito do tempo, eram as idéas da época. Mas ha n'esse sentir, que hoje se nos{12} afigura barbaro, uma noção mal comprehendida, posto que sincera, de que o catholicismo era a unica expressão possivel da civilisação dos costumes.
Alongados os descobrimentos maritimos pela costa occidental da Africa, iniciado, com chave de oiro, o periodo dos factos gloriosos, que nos deram farta participação nos progressos da civilisação universal, fechava-se, simultaneamente, a porta do espirito cavalheiresco que dominára o coração dos portuguezes da idade-média.
Depois d'isso fomos guerreiros, mas não eramos já cavalleiros. Fomos ainda conquistadores, mas não eramos já impulsionados por um mobil limpo de ambições mesquinhas.
O joven rei D. Sebastião, voltando da sua primeira jornada a Africa, quiz desembarcar no cabo de S. Vicente, por uma noite de lua, e alli se demorou nove ou{13} dez dias, como elle proprio contou, meditando ambiciosamente na grandeza de uma época, que dos rochedos do Algarve, como uma águia, havia no tempo de D. Henrique arrancado vôo para ir assombrar o mundo inteiro.
Tinha pena o joven e valoroso rei de não ser d'essa época. E com razão. Mas Portugal havia começado a descer: Alcacerquibir, o abysmo cavado pelas mãos do imprudente monarcha, breve se transformaria na sepultura de um seculo de gloria.
Não trarei, meu amigo, novos subsidios á biographia do infante Descobridor, de quem tantas pennas illustres se irão por certo occupar; mas procurarei desenhar, na vasta tela da sua época famosa, o vulto de um homem, que é um elemento importantissimo de caracterisação e de synthese, de um homem sem o qual essa enorme e brilhante conjugação de heroes,{14} apostados em glorificar o nome da patria, ficaria incompleta.
Refiro-me a Alvaro Vaz de Almada, que foi contemporaneo do infante D. Henrique, e que bem se póde chamar o ultimo cavalleiro portuguez.
Herculano escreveu d'elle no Panorama: «D. Alvaro, caindo morto, era o symbolo da cavallaria expirando».
O proprio infante D. Henrique dizia de Alvaro Vaz de Almada que não sómente Portugal, mas tambem toda a Hespanha, podiam ter grande gloria de crear tão famoso cavalleiro.
E o rei Affonso de Napoles e seu irmão o infante D. Henrique de Aragão diziam que tinham encontrado em Portugal bom pão e bom capitão. Bom capitão: Alvaro Vaz.
Tal era o homem.{15}
*
* *
Resumirei, quanto me fôr possivel, o quadro genealogico de Alvaro Vaz de Almada.
D. Sueiro Viegas Coelho, fidalgo de