Marcelo Barreto
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Marcelo Barreto
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Marcelo Barreto

Por — Rio de Janeiro

Onze horas antes de a seleção brasileira enfrentar o México no primeiro amistoso preparativo para a Copa América, a bola rolou em Campo Grande. Viegas e Los Angeles se enfrentavam pelo Campeonato Carioca amador sub-17. Numa manhã ensolarada, o Campo de Futebol São Basílio, apesar de bem cuidado e cercado por árvores, só tinha sombra sobre os bancos de reservas. A padaria onde tomei café com bolo de aipim já estava vazia. Os espectadores preferiam enfrentar o calor no bar da esquina, que servia cerveja na rua. Não houve venda de ingressos, até porque apenas um alambrado separa jogadores e torcedores. Nem publicidade, à exceção de uma faixa atrás de uma das bandeiras de escanteio em que um político ainda desejava feliz Dia das Mães.

Como nenhum dos times era do bairro, no entorno reinava um silêncio ora atento, ora curioso. Os sons vinham de dentro e da beira do campo, onde quase todo mundo mandava todo mundo — só não confirmando a justificativa de Fernando Diniz graças a uns poucos mais contidos. Um zagueiro do Los Angeles, especificamente, mandava o tempo todo. Mais do que um xingamento, a expressão para ele parecia ser apenas uma forma de chamar a atenção dos companheiros ou de aliviar a própria tensão. E, justiça seja feita, em nenhum momento os palavrões incentivaram a violência. A partida, que terminou empatada em 1 a 1, com o Los Angeles se classificando nos pênaltis, transcorreu com lealdade.

Enquanto assistia, eu fazia contas e pensava naquelas perguntas de entrevista de emprego: onde você se vê daqui a cinco anos? Literal e metaforicamente, são enormes as distâncias entre Campo Grande e College Station, entre o Campo de Futebol São Basílio e o Kyle Field, entre o Carioca amador sub-17 e a Copa América. Mas a diferença de idade entre os jogadores que vi ontem de manhã, sonhando com uma chance no futebol, e os que veria à noite, buscando um lugar na seleção, era inversamente proporcional. Tive de escrever a coluna antes de Dorival Júnior confirmar a escalação, mas o treinador anunciou de véspera a utilização de Gabriel Martinelli, que tem 22 anos — ou seja, os cinco da pergunta da entrevista a mais do que os meninos de Los Angeles e Viegas (time do projeto que hospeda uma biblioteca com meu nome e ainda busca para se manter, via lei de incentivo, uma verba anual menor do que o salário de um craque da elite).

Numa vida normal, muita coisa acontece em cinco anos. Para um estudante na faixa etária dos que estavam em campo ontem, dá tempo de terminar o Ensino Médio e cursar a faculdade. Mas o futebol acelera esse processo. Endrick, que acaba de estourar a idade para jogar campeonatos sub-17 como o Carioca amador, já jogou num grande clube brasileiro, foi transferido por uma fortuna para um grande clube europeu e está na seleção. Claro, essa é uma trajetória que só os fenômenos percorrem. Mesmo quem não explode tão cedo, porém, precisa lidar com desafios ao processo de amadurecimento: a pressão da competição, a pressão das críticas, a pressão de ser arrimo de família, a pressão.

A seleção de Dorival levantou, entre vocês da imprensa e da torcida, a preocupação de ter uma média de idade baixa. Mas ser jovem no futebol é bem diferente do que acontece em outras áreas. Significa apenas que a vida não espera amadurecer.

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