• Serafina

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    Brasil produz 25% das pedras preciosas usadas por grifes como 'Tiffany & Co.'

    PEDRO DINIZ
    DE TE�FILO-OTONI E CORINTO (MG)

    24/09/2017 02h00

    As gemas nacionais, respons�veis por cerca de 25% do mercado mundial de pedras, passam por um processo opaco entre serem lavradas em terras do Norte, Nordeste e Sudeste do pa�s e chegarem �s vitrines de joalherias exclusivas das maiores cidades do mundo.

    � imposs�vel dizer quanto h� de pedras preciosas sob o Brasil, porque apenas uma fina camada de solo foi explorada em mais de 500 anos de extra��o predat�ria, atualmente regulada pelo governo federal com leis complexas e, Serafina constatou, com alguns quilates de vista grossa.

    Um s�mbolo desse tesouro escondido fica em Te�filo Otoni, cidade a nove horas de Belo Horizonte, em Minas Gerais. Com uma das maiores jazidas do globo, leva o apelido de "capital mundial" das pedras preciosas.

    O lugar � frequentado por colecionadores, garimpeiros, revendedores e at� xeques. Um desses �rabes teria comprado um andar inteiro de um hotel na pracinha central para ver primeiro as �guas-marinhas, esmeraldas e turmalinas que, quando vendidas no exterior, viram decora��o de casas da elite ou mat�ria prima de lapidadores.

    Foram eles e um grupo de australianos em busca de opalas que engrossaram as reservas das pequenas pousadas da cidade nos tr�s dias de agosto passado, quando aconteceu a Feira Internacional de Pedras Preciosas de Te�filo-Otoni. Ao lado de munic�pios como Tucson (EUA) e Sharjah (Emirados �rabes), a cidade mineira integra a rota dos compradores.

    Caixas lotadas de milh�es de d�lares em pedras se empilham ao lado de marmitas. Nos quiosques de PVC est�o os top�zios imperiais, s� encontradas em Ouro Preto (MG), e esmeraldas –o Brasil � l�der mundial na extra��o delas, ao lado da Col�mbia.

    As imperiais s�o especialidades de Roberto Ferreira. Ele negocia as gemas lapidadas com empresas especializadas na venda para joalherias. Na sua lista de clientes h� nomes como a Tiffany &Co., Amsterdam Sauer e H.Stern.

    Ele explica que o pre�o da gema varia de acordo com a cor, raridade e limpeza. Um top�zio imperial avermelhado exposto em seu estande, de 26 quilates e do tamanho de um dedo m�dio, era avaliado em quase US$ 9 mil, cerca de R$ 27.000.

    "Fecho por trinta e cinco mil reais", disparou Felipe Mendes, 33, prontamente atendido pelo americano que desembolsou um farto chuma�o de notas verdes como a pedra que levou.

    Mendes compra as gemas diretamente dos mineiros, que contratam garimpeiros para a extra��o. Sabe, ao sair do pa�s, a pedras s�o revendidas por pelo menos tr�s vezes o valor da primeira venda. Segundo ele, turmalinas s�o as mais disputadas. "A piorzinha custa US$ 70 o grama."

    Ele guarda no smartphone a foto de uma �gua-marinha gigante, descoberta por um pai e seus dois filhos, que virou o assunto da feira. "Dizem que tem mais de 120kg." Os vendedores estimam que chegue a valer R$ 30 milh�es. A fofoca na cidade � que os donos est�o pedindo R$ 80 milh�es. O destino da pedra, como boa parte das gemas brasileiras de valores estratosf�ricos, � incerto.

    Todos os anos, a Pol�cia Federal desarticula quadrilhas de contrabando de gemas. Em 2012, ganhou o mundo a not�cia de uma esmeralda do sul da Bahia contrabandeada para os Estados Unidos. Avaliada em mais de R$ 300 milh�es, at� hoje a gema n�o foi repatriada.

    Estima-se que cerca de 25% da produ��o mundial de pedras saiam da regi�o, um dos poucos n�meros confi�veis de um neg�cio que recentemente voltou aos holofotes na Opera��o Calicute. No ano passado, descobriu-se o esquema de ocultamento de propina articulado pelo ex-governador do Rio, Sergio Cabral, e sua mulher, Adriana Ancelmo, com a compra de pe�as da grife H.Stern, ep�tome do luxo da hist�ria das pedras brasileiras.

    Fundador da marca, o alem�o Hans Stern (1922-2007), foi o primeiro joalheiro a levantar a bandeira das pedras do pa�s, cuja pecha de "semipreciosas" foi dada por empres�rios do hemisf�rio norte preocupados com as novas concorrentes das safiras e diamantes.

    HOMEM M�STICO

    Longe do espet�culo da nobreza e do glamour das joias acabadas, os garimpeiros resistem como base e ponta do iceberg dessa hist�ria. N�o t�o raro, o quartzo � uma das pouqu�ssimas pedras que o pa�s consegue aproveitar em larga escala e, por isso, se converteu em sustento de ex-sonhadores, muitos sa�dos dos contos da extra��o do ouro em Serra Pelada (PA), nos anos 1980.

    O quartzo caiu nas gra�as do mercado de bijuteria, que atribui � pedra poderes m�sticos, principalmente, e da ind�stria de tecnologia, que compra o sil�cio extra�do das pedras para fazer de controle remoto a pe�as de smartphone.

    Em Corinto, a 212 km de Belo Horizonte, centenas de garimpeiros sobrevivem da pedra. A Uniquartz, uma cooperativa de ex-garimpeiros que "sofriam na m�o de picaretas", segundo seu presidente, Enilson Souza, 46, extrai toneladas de quartzo que, em m�dia, valem R$ 0,10 o quilo. O cristal comp�e a renda das fam�lias que ganham em torno de R$ 2.000 por m�s.

    "O garimpeiro, antes de tudo, � um sonhador, um homem m�stico e ing�nuo. � o sonho de achar uma pedra que vai mudar a vida para sempre o que move esses homens", diz Robson de Andrade, 72, atual presidente do Sindicato Nacional dos Garimpeiros.

    Filho de pai garimpeiro, que teve a sorte de encontrar �guas-marinhas cuja venda foi revertida em terrenos, casas e uma vida confort�vel, Robson tem uma vis�o clara e rara sobre as gemas.

    "Vi muito homem enlouquecer, ficar rico e gastar tudo esperando encontrar mais. As pedras s�o presentes de Deus, mas tamb�m um v�cio."

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