• Opini�o

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    Mariana de Mesquita: Das doulas como testemunhas

    05/02/2013 03h30

    Nos �ltimos dias, uma rede de maternidades de S�o Paulo proibiu a entrada de doulas, profissionais que prestam suporte emocional e f�sico � mulher antes, durante e depois do parto. Diante da repercuss�o negativa na imprensa e nas redes sociais, mudaram de estrat�gia: a gestante teria direito a um �nico acompanhante no parto, devendo escolher entre a doula e o marido. A justificativa era reduzir os �ndices de infec��o hospitalar.

    Se a preocupa��o � essa, por que n�o limitam tamb�m o acesso das equipes de fotografia e filmagem? Por que n�o se esfor�am para reduzir os altos �ndices de cesariana, em torno de 90%? A verdade � que o trabalho das doulas, embora respaldado pela Organiza��o Mundial da Sa�de, n�o se encaixa em nosso modelo de assist�ncia obst�trica, arbitr�rio e centrado na figura do m�dico.

    Nos pa�ses desenvolvidos, com as menores taxas de mortalidade materna e fetal, o pr�-natal, o parto e o p�s-parto s�o acompanhados por obstetrizes e enfermeiras obstetras (parteiras). O m�dico s� � chamado em casos considerados de risco.

    Por aqui, o inc�modo causado pela presen�a das doulas est� ligado ao poder que elas ajudam a mulher a conquistar, o de serem donas de seus pr�prios partos. Mulheres que tiveram o acompanhamento de uma doula na gravidez s�o questionadoras, pois sabem do seu direito de decidir sobre o parto. Um perfil bem diferente do desejado por hospitais, onde a boa paciente � aquela que se recolhe � posi��o de coadjuvante.

    A mulher informada, ao contr�rio, tem nome pr�prio: n�o aceita ser infantilizada, ser chamada de "m�ezinha". N�o aceita soro de rotina, corte desnecess�rio na vagina, ser separada do seu filho sem real motivo. A mulher informada sabe que pode escolher em que posi��o, como, onde e com quem prefere dar � luz. N�o est� acima nem abaixo da autoridade m�dica ou do protocolo hospitalar, pois n�o estabelece com eles uma rela��o de poder. Exige apenas que tudo esteja a favor desse importante trabalho, que somente ela pode e deve executar: trazer seu filho ao mundo.

    O casal bem informado "d� trabalho" ao hospital, pois tem consci�ncia da viol�ncia muitas vezes imposta pelos procedimentos de rotina ao corpo e � personalidade fr�geis do seu beb�. Eles pesquisaram, leram artigos cient�ficos, conhecem as leis e sentem al�vio por saber que o beb� n�o precisa passar por procedimentos dolorosos e solit�rios em seus primeiros momentos de vida, apenas porque fazem parte da rotina do hospital.

    Qual � mesmo o perigo oferecido pela doula? � que a doula � testemunha! Ela presencia e identifica a viol�ncia silenciosa e covarde contra dois seres (m�e e beb�), que, por conta da fragilidade do momento, n�o est�o em condi��es de questionar.

    Mulheres acompanhadas por doulas n�o se deixam convencer de que o choro desesperado do rec�m-nascido seja bom de ouvir, sinal de sa�de! De que a cl�ssica cena da m�e presa � cama, dopada e incapacitada, fa�a parte do processo de ter um filho. De que o pai ver seu filho atrav�s do vidro seja normal.

    O recuo estrat�gico dos hospitais quanto � restri��o �s doulas mostra a for�a da voz da sociedade. Estejamos atentos �s entrelinhas: agora, a doula pode entrar, desde que seja fisioterapeuta, psic�loga, enfermeira ou terapeuta. A dire��o cl�nica sabe quem � e quais s�o as atribui��es da doula ou essa exig�ncia � uma demostra��o clara da postura intransigente?

    Mas o recuo estrat�gico n�o impediu a manifesta��o, no domingo passado, na avenida Paulista. A marcha foi uma demonstra��o de que a sociedade n�o tolera mais esse abuso.

    MARIANA DE MESQUITA, 33, � doula e membro da Associa��o de Doulas de S�o Paulo (Adosp)

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