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    Monge budista entoa serm�es de �dio contra minoria isl�mica de Mianmar

    CAROLINA VILA-NOVA
    DE S�O PAULO

    22/10/2017 02h00

    O princ�pio da n�o viol�ncia � central no budismo. Mas quando Mianmar deixou para tr�s 50 anos de ditadura militar e iniciou uma transi��o pol�tica em 2011, ganhou for�a nesse pa�s do Sudeste Asi�tico uma vertente budista ultranacionalista que prega um �dio anti-isl�mico que � em parte respons�vel por uma das maiores crises humanit�rias da atualidade.

    A figura mais not�ria desse budismo � o Vener�vel (Ashin) Wirathu, 49, abade do mosteiro de Masoeyein, com cerca de 2.500 monges, em Mandalay, capital religiosa de Mianmar. Ele j� foi apelidado de "Bin Laden budista", e uma capa da revista americana "Time" o chamou de "a face do terror budista".

    Bay Ismoyo - 8.set.2017/AFP
    Retrato do monge ultranacionalista Wirathu, que entoa discursos de �dio contra a minoria rohingya
    Retrato do monge ultranacionalista Wirathu, que entoa discursos de �dio contra a minoria rohingya

    Wirathu foi al�ado a figura nacional, de sua natal Kyaukse, perto de Mandalay, h� menos de 15 anos. Em v�deo, prometia que mu�ulmanos n�o teriam o que comer nem onde morar e pedia: "ao meu sinal, sigam-me".

    Um m�s depois, gangues budistas mataram 11 mu�ulmanos, destru�ram duas mesquitas e incendiaram mais de 40 casas em Kyaukse. Wirathu foi preso e condenado a 25 anos de pris�o por incita��o ao �dio religioso.

    Ap�s cumprir nove anos da pena, Wirathu foi beneficiado em 2012 por uma anistia do governo de Thein Sein. Criou um canal no YouTube, uma p�gina no Facebook e um movimento, o 969 —alus�o �s virtudes de Buda— para disseminar suas ideias.

    Dist�rbios �tnico-religiosos logo irromperam no Estado de Rakhine (norte), onde grande parte da popula��o de etnia rohingya , mu�ulmana, vive. Wirathu liderava marchas ali, defendendo a proposta de Sein de mandar a minoria �tnica, que perfaz 4% da popula��o de Mianmar, para um terceiro pa�s.

    A onda de viol�ncia contra os rohingyas que entrou por 2013 fez com que o clero budista o bloqueasse nas m�dias sociais e banisse o 969. Mas as prega��es continuaram, e o 969 virou uma estrutura mais formal, a MaBaTha (Associa��o para a Prote��o da Religi�o e da Ra�a).

    Em janeiro �ltimo, quando o monge aplaudiu publicamente a morte de um advogado isl�mico de direitos humanos, o governo o proibiu de pregar. Mas ele continua fazendo discursos em locais p�blicos, como este narrado pelo "Wall Street Journal": "Que tipo de gente s�o os mu�ulmanos? Eles comem arroz pelo �nus e excretam pela boca? Eles s�o o contr�rio de tudo que h� na natureza", disse o vener�vel a cerca de mil pessoas perto de Yangon, a principal cidade do pa�s.

    ECO FASCISTA

    Os budistas s�o 88% dos 54 milh�es que vivem em Mianmar. Wirathu, por�m, tem uma ideia fixa: a de que os rohingyas s�o um c�ncer que vai carcomer o pa�s.

    "Se vamos viver em paz e harmonia, n�o cabe ao povo birman�s. Depende dos mu�ulmanos. Eles est�o devorando o povo birman�s, destruindo o budismo e a ordem budista, adotando a��es para tornar Mianmar um pa�s mu�ulmano", diz.

    Seu discurso gira em torno da ideia de que a aniquila��o mu�ulmana � condi��o necess�ria para a preserva��o da maioria budista no pa�s.

    "Toda nossa ra�a tem sofrido muito sob o jugo dessa minoria [rohingya]. A maioria dos birmaneses n�o se meteu com eles, n�o abusou deles, mas est� sofrendo sob seu jugo. Se houver tantos mu�ulmanos quanto h� budistas, nunca teremos paz", afirma.

    Por isso, outra obsess�o do abade � a proibi��o de casamentos interreligiosos. Em c�lebre serm�o a mulheres budistas, Wirathu perguntava, e elas respondiam:

    — "O que vai ocorrer com a nossa religi�o se voc�s se casarem com um mu�ulmano?

    — Ela vai desaparecer.

    — Ent�o � melhor se casar com um alco�latra ou com um mu�ulmano? (rindo)

    — Com um alco�latra.

    — Com um viciado ou um mu�ulmano?

    — Com um viciado.

    — Com um mendigo ou um mu�ulmano?

    — Com um mendigo.

    — Com um cachorro ou um mu�ulmano?

    — Com um cachorro."

    "A viol�ncia contra mu�ulmanos em Mianmar existe antes de Wirathu, mas seus discursos contribuem para o aumento do sentimento anti-isl�mico ao redor do pa�s", disse � "Vice" Bill Davis, da ONG M�dicos pelos Direitos Humanos em Mianmar.

    A mais recente onda de viol�ncia come�ou depois que um ataque do Arsa (Ex�rcito da Salva��o Rohingya Arakan) no Rakhine levou a uma campanha de repress�o pelo Ex�rcito que a ONU classificou de "limpeza �tnica".

    A campanha inclui a destrui��o das casas de mu�ulmanos, al�m de assassinatos, estupros e tortura, levando � fuga de 500 mil pessoas para a vizinha Bangladesh.

    Refugiados relataram �s ag�ncias humanit�rias terem visto monges budistas com uniformes militares ou cal�as jeans sob seus robes, perpetrando alguns dos atos.

    Sobre as acusa��es de estupro, Wirathu nega: "os corpos delas s�o nojentos".

    "A m�dia foca Wirathu e a MaBaTha, mas ambos foram estimulados pelo governo de turno entre 2001 e 2016, que usou o nacionalismo budista como arma pol�tica para tentar conter a popularidade de Aung San Suu Kyi [a hoje l�der de fato de Mianmar]", diz Mark Farmaner, diretor da Burma Campaign UK.

    "A atual onda de viol�ncia � mais �tnica do que religiosa, mas o Tatmadaw [Ex�rcito] usou o sentimento anti-isl�mico para angariar apoio de outras etnias na sua campanha de supress�o dos rohingyas", afirma o cientista pol�tico Thitinan Pongsudhirak, da Univerisdade Chulalongkorn, de Bangkok.

    Editoria de Arte/Folhapress
    Mianmar
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