"Tentam destruir a Klan desde seu nascimento, em 1865. Mas 150 anos depois continuamos aqui." Quem fala assim � James Moore, ou "Kludd Imperial", t�tulo equivalente ao de capel�o, dos Cavaleiros Brancos Leais da KKK, enquanto se dirige aos presentes a um encontro da Ku Klux Klan na zona rural do Alabama, nos EUA.
Pouco depois, Moore diz que a mais conhecida organiza��o supremacista branca do mundo conseguiu 20 novos membros durante aquele evento.
BBC | ||
Grupo de simpatizantes da KKK se re�ne no Alabama, no sul dos EUA |
A cena, registrada no document�rio da BBC "KKK: a luta pela supremacia branca", se deu quando ainda faltavam alguns meses para o 150� anivers�rio da organiza��o, fundada em 24 de dezembro de 1865.
Meio s�culo e meio depois de seu nascimento, a Ku Klux Klan parece estar recuperando certo protagonismo.
A organiza��o est� longe dos n�meros que alcan�ou na d�cada de 1920, mas diz estar recrutando cada vez mais integrantes para a "guerra de ra�as" que, 150 anos depois da Guerra de Secess�o, parece estar em curso nos EUA.
A "amea�a isl�mica", para a KKK exposta em ataques como o de San Bernardino, na Calif�rnia, no qual morreram 14 pessoas, e a chegada de imigrantes n�o brancos proporcionaram novos inimigos � organiza��o, e, com eles, cada vez mais simpatizantes.
E muitos integrantes se sentem legitimados pelo discurso de pol�ticos como o pr�-candidato republicano � Presid�ncia Donald Trump, que j� defendeu a expuls�o de todos os imigrantes latinos ilegais do pa�s e a proibi��o da entrada de qualquer mu�ulmano.
Mas o que � a KKK, e at� que ponto se deve levar a s�rio essa organiza��o e seus membros, que costumam queimar cruzes vestidos com capuzes brancos?
SUPREMACIA BRANCA
BBC | ||
Grupo de simpatizantes da KKK se re�ne no Alabama, no sul dos EUA |
Historiadores apontam que a Ku Klux Klan foi fundada no Tennessee pouco depois da guerra civil americana, ou Guerra de Secess�o (1861-1865), por um grupo de ex-soldados confederados (da regi�o sul do pa�s, derrotada no conflito). O nome foi inspirado na palavra grega para c�rculo: kuklos.
Originalmente concebida como um clube recreativo, a KKK rapidamente come�ou a atuar de forma violenta para intimidar popula��es negras do sul dos EUA e garantir a supremacia dos moradores de ra�a branca.
E, segundo a organiza��o de direitos civis SPLC (South Poverty Law Center), houve elementos que deram m�stica ao grupo e contribu�ram para sua popularidade: "t�tulos rid�culos" (a autoridade m�xima da KKK recebe, por exemplo, o nome de "mago imperial"), roupas com capuzes, a��es noturnas violentas e a ideia de que o grupo era parte de um "imp�rio invis�vel".
Depois de um curto e violento per�odo, a organiza��o considerada pela Liga Antidifama��o como "o primeiro grupo terrorista dos EUA" se desfez como resultado da press�o do governo federal, mas teve seus objetivos garantidos pela manuten��o de leis segregacionistas no sul do pa�s.
Na d�cada de 1920, contudo, a crescente imigra��o cat�lica e judia e a popularidade do filme "O Nascimento de uma Na��o", de 1915, em que a KKK aparece como "mocinho" da hist�ria, contribu�ram para o renascimento do grupo.
Ainda segundo a SPLC, quando a KKK organizou uma enorme marcha em Washington em 1925, o grupo tinha quatro milh�es de membros e forte influ�ncia na pol�tica de Estados do sul dos EUA.
"Uma s�rie de esc�ndalos sexuais, disputas internas por poder e investiga��es jornal�sticas rapidamente reduziram sua influ�ncia", afirma a SPLC, fundada em 1971 para combater de forma legal as organiza��es supremacistas.
DIREITOS CIVIS
A luta por direitos civis na d�cada de 1960 resultaria em um interesse renovado pela filosofia do grupo, como o nome da KKK, roupas, rituais e pr�ticas sendo adotados por diferentes grupos. Logo houve um novo recuo, resultado de mais disputas internas, julgamentos e infiltra��es por parte de ag�ncias de governo.
"Desde sua cria��o, a Ku Klux Klan passou por v�rios ciclos de crescimento e colapso, e em alguns desses ciclos a KKK foi mais radical que em outros", afirma a Liga Antidifama��o, conhecida pela sigla em ingl�s ADL.
"Mas em todas as suas incarna��es, ela manteve sua heran�a dupla de �dio e viol�ncia", diz a organiza��o, que estima haver hoje cerca de 40 filiais da KKK nos EUA, com 5.000 membros
A SPLC calcula esse n�mero entre 5.000 e 8.000, "divididos entre dezenas de organiza��es diferentes - e muitas vezes antag�nicas - que usam o nome da Klan."
Segundo a entidade de direitos civis, enquanto algumas dessas express�es da KKK s�o abertamente racistas, outras "procuram esconder seu racismo sob o manto de 'direitos civis para brancos'".
A lista de inimigos da KKK tamb�m se ampliou pouco a pouco, para incluir n�o apenas negros, judeus e cat�licos (ainda que estes �ltimos tenham sido reconsiderados na d�cada de 1970), mas tamb�m homossexuais e diferentes grupos de imigrantes, diz a ADL.
GUERRA RACIAL
"Os Estados Unidos nasceram como uma na��o crist� e nossos valores crist�os est�o sendo atacados", resume um membro da KKK, coberto pelo tradicional capuz branco, no document�rio "KKK: A luta pela supremacia branca".
"Somos pessoas normais, viemos de todos os setores: um � professor de escola, outro trabalha em um hospital, h� v�rios pol�ticos", afirma James Moore, o "Kludd Imperial" dos Cavaleiros Brancos Leais.
"N�s, brancos, estamos infelizmente perdendo esta guerra, mas os brancos ir�o acordar. Uma pequena unidade militar pode derrotar os negros em quest�o de semanas, e a maior parte de nossa gente vem das For�as Armadas. Vamos retomar os EUA", afirma no document�rio da BBC, transmitido pela primeira vez em outubro.
Em uma primeira an�lise, a amea�a pode parecer uma simples bravata amparada pela primeira emenda da Constitui��o americana, que garante a liberdade de express�o e acaba protegendo a KKK e seus membros - desde que n�o promovam viol�ncia.
Mas � fato que essa filosofia n�o deixa de ter consequ�ncias reais.
Para integrantes da KKK como Charles Murphy —"Grande Drag�o" da KKK para a Carolina do Sul—, provocar essa "guerra de ra�as" foi o objetivo declarado do jovem Dylann Roof, que em junho matou nove pessoas em uma igreja frequentada por negros em Charleston.
Roof n�o tinha rela��o com a KKK, mas, segundo Murphy, "foi isso [provocar guerra racial] que ele disse que queria".
"Se [os negros] querem uma guerra de ra�as, que demos uma a eles antes que eu morra. Quero poder ver isso", acrescenta o integrante da KKK no document�rio.
LEGITIMIDADE
Por esses e outros motivos, o presidente dos EUA, Barack Obama, afirmou ap�s o ataque em Charleston que o pa�s "ainda n�o se curou do racismo".
E mesmo que nenhum pol�tico americano endosse abertamente atos racistas ou a pr�pria KKK, h� quem veja com preocupa��o os rumos da atual pr�-campanha presidencial no pa�s.
O ex-l�der da KKK David Duke, por exemplo, celebrou publicamente as propostas de Trump, e o descreveu como o melhor entre todos os pr�-candidatos republicanos � Casa Branca.
Em entrevista publicada em 23 de dezembro em seu canal no YouTube, Duke - que se afastou da KKK em 1980, depois de uma tentativa frustrada de modernizar a organiza��o - disse que Trump � at� mais radical do que ele.
"Muitos grupos da KKK procuram se aproveitar do medo e da incerteza usando sentimentos xenof�bicos para fins de recrutamento e propaganda", alertou recentemente a Liga Antidifama��o.
Para o fundador o site supremacista branco Stormfront, Don Black, o discurso incendi�rio de Trump est� alcan�ando o mesmo objetivo.
Ele disse que seu site registra um aumento de audi�ncia de at� 40% toda vez que declara��es racistas de Trump s�o destaque na m�dia.
E esse fen�meno tamb�m se expressa entre membros da KKK e de outros grupos que promovem a supremacia branca.
"A desmoraliza��o � o pior inimigo (dessas organiza��es), e Trump est� mudando isso", disse Black, segundo o site Politico.
"Ele fez com que seja aceit�vel falar sobre as preocupa��es dos americanos de origem europeia", acrescentou.
"E certamente est� criando um movimento que continuar� independentemente de Trump, inclusive se ele recuar em algum momento", concluiu o supremacista, em declara��o que soa como uma advert�ncia.