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    Revolu��o russa, 100

    Opini�o

    Comemorar? O verbo est� errado; n�o h� nada para comemorar

    JO�O PEREIRA COUTINHO
    COLUNISTA DA FOLHA

    05/11/2017 02h00

    Alexis de Tocqueville, no cl�ssico "O Antigo Regime e a Revolu��o", deixou uma das observa��es mais luminosas sobre 1789: os revolucion�rios come�aram por destruir as iniquidades da monarquia absoluta, mas, em poucos anos, tornaram-se t�o ou mais absolutistas do que Lu�s 16.

    A observa��o de Tocqueville, com poucas altera��es, pode ser aplicada � Revolu��o de Outubro de 1917: destruindo a grande revolu��o patri�tica de fevereiro daquele ano, L�nin regressou � autocracia czarista –e levou-a a extremos de desumanidade que a R�ssia e o mundo nunca tinham conhecido.

    � importante come�ar com esta observa��o para desarmar a primeira mentira: a ideia generosa de que L�nin e seu bando corrigiram as injusti�as do Imp�rio Russo. � falso.

    O que n�o significa que as injusti�as n�o fossem verdadeiras.

    Nicolau 2�, que nunca se notabilizou particularmente pela intelig�ncia (ou pela prud�ncia), foi cavando a sua sepultura no primeiro quartel do s�culo 20.

    Duas guerras definem o seu talento suicid�rio: a primeira, ruinosa, contra o Jap�o (1904-05); a segunda, apocal�ptica, contra a Alemanha e a �ustria-Hungria (1914-17).

    N�o foram s� 2 milh�es de russos que tombaram em combate. Nicolau 2� interrompia o incipiente desenvolvimento industrial e agr�rio do imp�rio para condenar um povo � mis�ria extrema.

    � desses charcos infectos que nascem revolu��es. Mas, em fevereiro de 1917, era ainda poss�vel pensar uma transi��o de regime toler�vel: liberais, social-democratas e at� socialistas revolucion�rios uniam-se � soldadesca e ao povo para terminar com a secular dinastia dos Romanov.

    O governo provis�rio, apostado em trazer a R�ssia para "o grande concerto das na��es europeias", abolia a pena de morte, garantia direitos pol�ticos e civis b�sicos e preparava elei��es para uma Assembleia Constituinte.

    A Revolu��o de Outubro n�o se faz contra uma autocracia; faz-se contra a legalidade e o pluralismo de fevereiro, destro�ando qualquer vest�gio de "democracia".

    Dizer que as liberdades mais b�sicas –de express�o, consci�ncia, manifesta��o etc.– foram abolidas � um eufemismo.

    Com L�nin, a Assembleia Constituinte, que ele foi incapaz de conquistar democraticamente, era dissolvida (Adolf Hitler, nesse quesito, foi pouco original); os opositores pol�ticos eram presos ou fuzilados; o campesinato era pilhado e aterrorizado; os velhos campos de trabalho czaristas eram convertidos e alargados para receber os novos presos pol�ticos; e a pol�cia secreta –a Tcheka– intimidava, sequestrava e matava como a arcaica Okhrana (pol�cia secreta do regime czarista) nunca se atreveu.

    Revolu��o Russa, 100: mais

    E se a Primeira Guerra Mundial (1914-1918) provocara 2 milh�es de mortos, a guerra civil de 1918-1922 na R�ssia multiplicava esse n�mero por cinco.

    Quando morreu, em 1924, L�nin atingira o seu objetivo fundamental: uma ditadura de partido �nico com os recursos institucionais, policiais e militares que St�lin limitou-se a herdar e aprofundar durante seu governo, at� 1953.

    Eis a segunda mentira que importa tamb�m corrigir: Josef St�lin n�o atrai�oou a teoria e a pr�tica do mestre. Seguiu-a com redobrado esfor�o sanguin�rio.

    "Comemorar" a Revolu��o de Outubro de 1917? O verbo est� errado.

    N�o h� nada para comemorar. Exceto a evid�ncia –tempor�ria?– de que o comunismo, tal como o nazismo, � hoje uma aberra��o minorit�ria.

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