Do meme às marcas
Quando a piada se torna um negócio lucrativo
1 maio 2023 | Por Globo
Comportamentos Emergentes
Em meio ao turbilhão de emoções que é a vida adulta no século XXI, o humor acaba por funcionar como um suspiro para os problemas ou uma válvula de escape, trazendo a dose de leveza que precisamos para digerir a rotina.
E assim como a vida em sociedade, ele passou por transformações significativas ao longo do tempo, adquirindo novas variações, particularidades, formatos e atribuições que sempre o mantiveram na vanguarda da cultura, nacional e internacional.
Talvez o mais moderno e recente desses diferentes exercícios humorísticos seja o meme. Ele começou como uma brincadeira despretensiosa nas redes sociais, foi virando coisa séria, modificou a maneira como nos expressamos, se tornou a linguagem oficial da internet e hoje, é tido quase como uma instituição nacional.
Através de uma linguagem acessível, de rápida identificação com o conteúdo e vindo de uma “fábrica sem donos”, ou seja, de todo e qualquer lugar, seu consumo segue crescendo entre brasileiros de todas as idades, especialmente após o período de isolamento social.
Hoje estabelecido com as páginas de humor e seus milhões de seguidores, que ditam tendências no digital - inclusive, para além da comédia -, os memes têm atraído a atenção também de grandes marcas que querem se conectar com as novas gerações via internet.
Assim, a maneira criativa de se comunicar com bom humor que só o meme oferece revelou um potencial de conexão lucrativa com a publicidade, que rende grana para os criadores de conteúdo e engajamento para quem quer associar seus produtos e serviços a eles. É a chamada “win-win situation”. Mas afinal,
o que faz do meme um sucesso no Brasil?
o que faz do
meme um
sucesso no
Brasil?
O estudo In meme we trust, publicado na Plataforma Gente, traz um mergulho nesse universo que parecia indecifrável para tentar explicar o porquê dos memes fazerem tanto sucesso por aqui - impulsionados, principalmente, pelos jovens da Geração Z.
A pesquisa destaca que a habilidade de condensar pensamentos, emoções e discussões em um conteúdo facilmente compartilhável é o que faz dessa linguagem uma grande potência criativa na comunicação digital. Na prática, um meme vale mais que mil caracteres.
Ainda, seu alcance ultrapassou as barreiras da internet para se estabelecer na cultura popular e também no pensamento brasileiro, inspirando desde fantasias de carnaval até pesquisas acadêmicas dedicadas a compreender essa linguagem mutante e irrastreável. “O meme caiu como uma luva na lógica imediatista, fluida e volátil que passou a conduzir a nossa disputada atenção no mundo atual”, diz o estudo.
A maneira como eles capturam o sentimento de uma época ou lugar, para servirem quase como um documento histórico na internet, fazem dos memes uma expressão criativa e intuitiva ao mesmo tempo. Em outras palavras, eles são uma criação coletiva com vida própria e transmitida com o convívio.
No Brasil, maior mercado digital da América Latina (mais de 144 milhões de usuários) e segundo país com o maior tempo médio diário gasto nas redes sociais, segundo dados da eMarketer, os memes encontraram um terreno fértil para prosperar.
Com a habilidade de rir de si mesmo que só o brasileiro tem, a “criação memética" se tornou o veículo perfeito para representar o espírito do nosso tempo e espaço. Tomando como fonte de inspiração filmagens amadoras, o noticiário ou até mesmo personagens da TV, criamos uma verdadeira produção em cadeia, chegando a exportar nossos memes para o resto do mundo.
O sucesso da linguagem é tão grande que alcançou a publicidade, reavendo uma parceria lucrativa entre humor e propaganda que acontece há décadas. Todavia, agora com uma roupagem “memética”.
Uma parceria lucrativa
Um estudo da Ipsos que analisa o mood das campanhas publicitárias inscritas no Effie Awards Brasil, premiação que consagra ideias inovadoras relacionadas a estratégias de marketing e comunicação, aponta que 55% delas seguem uma linha bem-humorada. Entre os trabalhos premiados no festival, esse índice sobe para 65%.
No entanto, assim como outras diversas temáticas passaram por transformações quase estruturais nos últimos anos, as propagandas com viés humorístico também deixaram de ser o que eram antes. Agora, os memes - e seus criadores - ganharam protagonismo.
Páginas de humor como Saquinho de Lixo, Melted Videos, O Brasil Que Deu Certo, South America Memes e tantas outras, deixaram de ser “apenas” criadoras de conteúdo para se tornarem influencers, entrando de vez nesse mercado gigantesco e alcançando engajamento semelhante ao de figuras carimbadas da internet - que já atraiam atenção das marcas.
Para se ter uma ideia, o mercado de influencers movimentou cerca de US$ 16,4 bilhões em todo o mundo somente em 2022, segundo o site especializado Influencer Marketing Hub. E o Brasil é um dos principais celeiros de negócios desse setor.
A Statista, empresa alemã de dados de mercado, afirma que 45% dos brasileiros já compraram algum produto com base na recomendação de algum influenciador e/ou celebridade.
Fonte: Revista Você S/A
45%
dos brasileiros já compraram algum produto
Com seguidores fiéis e engajados, especialmente no Instagram, essas páginas conseguiram criar uma estética própria tão original e particular para suas publicações que as marcas desejam seus produtos inseridos e associados a ela, para que a absorção do conteúdo seja o mais natural possível.
Um exemplo recente é a parceria das páginas Saquinho de Lixo e Melted Videos com os patrocinadores do festival Lollapalooza, realizado entre os dias 24 e 26 de março e que contou com cobertura do Multishow.
Graças a publicações personalizadas, as marcas conseguiram gerar um engajamento orgânico e identificado, falando para milhões de pessoas que seguem as duas páginas, de um jeito que só a estética peculiar desses criadores de conteúdo é capaz de realizar.
Agora consolidadas na internet, essas páginas de humor, que já firmaram parcerias com grandes nomes do mercado brasileiro e marcas de alcance internacional, miram o próximo passo: transformar o meme em produtos próprios, a piada em artigos comerciáveis.
O meme também é produto
Um dos pioneiros nesse movimento de transformar a piada em negócio, vendendo produtos personalizados, é a página O Brasil Que Deu Certo (OBQDC). Em 2022, seu faturamento com peças originais como camisetas, meias, chinelos e acessórios, era quase o mesmo que o arrecadado com publicidade.
Com uma loja virtual estruturada e com a “cara” da OBQDC, as vendas ajudaram a equilibrar a entrada de receita da página e se tornaram uma maneira lucrativa de unir o humor característico dos memes com peças exclusivas e comercializáveis.
A Melted Videos é outra que já investiu em produtos próprios - em 2019, a página chegou a lançar peças em parceria com a marca de roupas Bolovo - e promete voltar a investir no mercado de artigos autorais em 2023, agora sem o intermédio de uma outra empresa.
Já o perfil de humor Saquinho de Lixo foi além e decidiu levar a expertise na produção de memes e conteúdos humorísticos para as marcas. Em março de 2023, o perfil lançou a operação Saquinho de Mídias Criativas, um hub de soluções de conteúdo voltado a empresas e influenciadores que queiram profissionalizar a comunicação por meio da linguagem e estética dos memes.
De acordo com seus criadores, o serviço será ofertado em três frentes:
Estratégias Criativas
que pretende ajudar as marcas a encontrar um tom adequado de comunicação e definição de editorias de conteúdo que possam ter engajamento;
Mentoria Digital
com orientação para melhor aproveitamento do público-alvo e engajamento de comunidades;
Consultoria
com acompanhamento pontual de campanhas e projetos.
Fonte: Saquinho de Lixo quer transformar memes em negócios - Meio e Mensagem
Mais que uma tendência, o humor é uma característica dos filmes e peças publicitárias brasileiras e sempre esteve associado às campanhas de grandes empresas - mesmo aquelas que não tinham como premissa um olhar mais jocoso para seus produtos e serviços.
Na dose certa, ele pode ajudar as marcas a alcançar um público cada vez mais carente de conteúdos leves, agradáveis e quase descompromissados, mas sem perder o tom crítico e o cuidado com temas sensíveis.
Logo, para as marcas, é hora de olhar para o meme e seus criadores, que conseguem gerar identificação quase imediata com o público, com a seriedade que os negócios exigem, mas é claro, sem perder o sorriso no rosto.
Redação e Edição: Tiago Lontra e Patrícia Gregorio
Diagramação: Izabella Donafe, Daniel Frias e Roger Arruda
Imagem de capa: Gety Images - Milorad Kravic
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