O estudo “Juventudes Fora da Escola” é resultado de uma ampla pesquisa que busca aprofundar a compreensão sobre a realidade dos jovens brasileiros entre 15 e 29 anos que não estavam matriculados na escola e não concluíram a educação básica. Em 2022, estavam nessa condição 9,8 milhões de jovens.

 

Essa exclusão do sistema educacional confronta diretamente o direito à educação assegurado pela Constituição Federal, gerando graves consequências para os jovens e para o desenvolvimento social e econômico do país.

Para que nenhum jovem fique para trás, é crucial a implementação de iniciativas e políticas diversificadas e abrangentes. E o sucesso dessa empreitada depende da colaboração de diversos atores. Por isso, estabelecer metas claras, com prazos definidos, mobilizar diferentes setores e garantir que nenhum jovem chegue à vida adulta sem ter ao menos concluído o ensino médio são passos fundamentais nesse processo.

 


Diante disso, o levantamento se propõe a retratar as diversas realidades dessas juventudes, examinando os motivos que as afastaram da escola. Além disso, procuramos investigar o potencial de diferentes políticas públicas e outras iniciativas para reverter o cenário.

Etapas do projeto

O projeto foi realizado em quatro etapas, que envolveram levantamentos quantitativos e qualitativos com jovens fora da escola e especialistas em educação e mercado de trabalho:

1. Dados secundários e bibliografia

O projeto foi realizado em quatro etapas, que envolveram levantamentos quantitativos e qualitativos com jovens fora da escola e especialistas em educação e mercado de trabalho:

2. Entrevista com especialistas

Entrevistas individuais e em profundidade com especialistas, de diferentes campos do conhecimento.

3. Grupos de discussão

Grupos de discussão online com 23 jovens fora da escola sem ter concluído a educação básica, moradores de 12 estados, com diversidade de perfis e de condições de vida.

4. Pesquisa Quantitativa

Entrevistas com 1.643 jovens de 15 a 29 anos que não estavam estudando e não tinham terminado a educação básica no momento da abordagem; amostra representativa da população dessa faixa etária que não frequenta escola e não terminou a educação básica; abordagem presencial, em pontos de fluxo localizados em mais de 200 municípios nas 27 unidades da Federação e margem de erro máxima para o total da amostra de 3 pontos percentuais, para mais ou para menos, dentro do nível de confiança de 95%.

+ Jovens pesquisadores

Cinco jovens que não concluíram a educação básica foram cocriadores da pesquisa, contribuindo com suas vivências e seus pontos de vista desde o início do projeto.

Orientado pela metodologia PerguntAção, da Rede Conhecimento Social, esse processo colaborativo é um diferencial do estudo em relação a outros já realizados sobre o tema.

Em oficinas formativas, o grupo de jovens pesquisadores contribuiu na formulação das hipóteses a serem investigadas, na construção de questionários e roteiros de discussão usados nos levantamentos qualitativos e quantitativos e na análise dos dados obtidos.

Juventudes fora da escola

Entre as diferentes abordagens metodológicas que permitiram agrupar as evidências deste estudo, uma delas consistiu na reunião de um grupo de cinco jovens pesquisadores – eles próprios fora da escola, sem o ensino médio – que participou ativamente de todas as etapas do processo, desde a definição das perguntas das hipóteses a serem testadas, até a análise dos dados quantitativos e qualitativos, sempre sob a orientação de facilitadores.

Além disso, a contribuição dos especialistas também foi significativa, oferecendo reflexões consolidadas no campo, com base em diversas perspectivas, ressaltando a importância de combinar intervenções e fortalecer políticas intersetoriais. A análise da disposição desses jovens em retornar aos estudos demonstra que a maioria, correspondente a 73%, está disposta a fazê-lo.

Ainda, é importante reconhecer a diversidade de aspectos envolvidos, como questões regionais, econômicas, de gênero, cor e raça, faixa etária, trajetória escolar e tempo fora da escola. Considerar esses elementos é essencial para garantir que as iniciativas e políticas públicas sejam efetivas, especialmente buscando harmonizar o direito à educação com outros direitos essenciais das juventudes.

A existência de perfis distintos destaca a necessidade de intervenções variadas e combinadas para reintegrar os jovens ao sistema educacional, levando em conta suas particularidades e desafios específicos. A título de exemplo, destacamos dois perfis que ilustram a necessidade de distintas abordagens para facilitar a reintegração dos jovens ao sistema educacional:

Os jovens que estão ‘quase lá’

O grupo representa aqueles que interromperam seus estudos no ensino médio e estão muito próximos de concluir a educação básica. Eles somam 3,4 milhões, mais da metade (58%) pertence ao sexo masculino, 70% são negros e a grande maioria (84%) possui entre 20 e 29 anos. Estes não têm mais idade para frequentar o ensino regular. No entanto, uma parcela de 16% (540 mil) é de jovens na faixa etária de 15 a 19 anos, público-alvo do ensino regular.

Cerca de um terço (28%) dos jovens ‘quase lá’ encontra-se em ocupações formais, com condições econômicas ligeiramente mais favoráveis do que a média dos jovens fora da escola. Quanto à intenção de concluir a educação básica, 83% expressam esse interesse e 65% manifestam o desejo de cursar o ensino médio técnico — ambos os percentuais são maiores que as respectivas médias dos jovens fora da escola.

As motivações para retomar os estudos mostraram a diversidade de trajetórias e condições de vida, dentro do próprio grupo. Passam também por aqueles que querem obter melhorias das condições de trabalho e aqueles que querem ingressar em uma faculdade e prestar concursos públicos.

Para esse grupo, a articulação entre as políticas de educação e trabalho, junto com a cooperação entre o setor público e privado, é essencial para facilitar a conclusão da educação básica. E isso pode ser alcançado por meio da flexibilização dos horários de trabalho e de estudo. Além disso, o grupo demonstra um interesse um pouco maior na modalidade de ensino híbrido (presencial e remoto) e na participação em cursos online.
destaca-se para os ‘quase lá’ em proporção maior que a média dos jovens fora da escola.

Dentre as formas de apoio consideradas essenciais, a necessidade de suporte emocional destaca-se para os ‘quase lá’ em proporção maior que a média dos jovens fora da escola.

As jovens mulheres com filhos

Outro grupo fundamental para compreender a diversidade de realidades e contextos de vida são as jovens mulheres com filhos, que enfrentam múltiplas vulnerabilidades e querem retomar os estudos. Este grupo considerável de 2,4 milhões de jovens, sendo 72% negras, apresenta uma proporção de apenas 9% na faixa etária entre 15 e 19 anos. São jovens que desempenham o papel de cuidadoras e frequentemente assumem a responsabilidade pelo sustento de seus familiares.

É consideravelmente perceptível a maior presença dessas jovens fora da força de trabalho e desempregadas. Em comparação com o conjunto dos jovens fora da escola, elas possuem uma renda familiar média expressivamente inferior. Há também uma incidência mais alta de recebimento de algum auxílio governamental entre os membros da família.

Entre as motivações para retornar aos estudos, é possível destacar as aspirações de melhoria nas perspectivas de trabalho e, comparativamente aos jovens do sexo masculino, um interesse superior em cursar uma faculdade.

Mais especificamente sobre as motivações citadas para o retorno aos estudos, as jovens mães demonstram forte interesse em melhorar suas perspectivas educacionais, principalmente por meio do ensino médio técnico e da educação de jovens e adultos (EJA). Entretanto, o acesso a vagas em escolas próximas e em horários adequados à sua realidade se mostra um desafio significativo para muitas delas.

Cientes dos obstáculos, essas jovens consideram essencial a disponibilidade de creches para seus filhos enquanto elas estudam. Além disso, há uma valorização expressiva de auxílio financeiro regular para que possam voltar a estudar. O apoio familiar também é destacado por uma porção significativa como fator indispensável no processo de reinserção escolar.

Outra inquietação desse grupo é o medo de não conseguir acompanhar as aulas, enfatizando a necessidade de educadores que possam auxiliá-las na superação de dificuldades de aprendizagem. Elas valorizam um ambiente escolar que promova relacionamentos interpessoais saudáveis e conte com profissionais qualificados para lidar com questões emocionais e psicológicas. Vale destacar ainda que, em uma proporção acima da média, as jovens mães apontam possíveis desafios no acesso a cursos online.

Por que a inclusão educacional dos jovens é urgente?

A exclusão escolar desperta indignação quando ocorre na infância. Todavia, em geral, ela é tolerada quando o jovem ou o adulto não concluiu a etapa de ensino na idade esperada, especialmente no caso das juventudes vulnerabilizadas. Enquanto se formar no terceiro ano do ensino médio é considerado um caminho natural na trajetória de jovens de camadas privilegiadas, a escolarização incompleta é naturalizada no caso de jovens de baixa renda.

Quantos são?

No Brasil, em 2022, 9,8 milhões¹ de jovens de 15 a 29 anos não estudavam e não tinham concluído a educação básica. Isso equivale a 19,9% da população dessa faixa etária e impacta de forma desigual diferentes grupos:

Por afetar principalmente grupos historicamente não priorizados na sociedade brasileira, a exclusão de mais de 9 milhões de jovens do sistema educacional é, até certo ponto, naturalizada. Mas não deveria.

Primeiro, porque confronta diretamente o direito à educação básica obrigatória e gratuita dos 4 aos 17 anos de idade, previsto na Constituição Federal de 1988 — que também assegura educação gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria.

Além disso, diversos estudos comprovam os impactos negativos da baixa escolaridade para indivíduos e sociedades inteiras. Estatísticas nacionais e internacionais mostram que jovens que não concluem a educação básica têm mais chance de enfrentar desemprego, trabalhos precarizados e de baixa remuneração.

Por afetar principalmente grupos historicamente não priorizados na sociedade brasileira, a exclusão de mais de 9 milhões de jovens do sistema educacional é, até certo ponto, naturalizada. Mas não deveria.

Primeiro, porque confronta diretamente o direito à educação básica obrigatória e gratuita dos 4 aos 17 anos de idade, previsto na Constituição Federal de 1988 — que também assegura educação gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria.

A situação se agrava com o chamado “efeito cicatriz”, pelo qual, segundo evidências, a qualidade do primeiro emprego obtido pelos trabalhadores tende a impactar toda sua trajetória profissional. Ou seja, os prejuízos de não concluir a educação básica na juventude podem se estender ao longo da vida daquela pessoa, perpetuando um ciclo de desigualdade e pobreza que restringe o potencial produtivo e de crescimento de um país.

Quem são?

O universo dos jovens brasileiros que não estudam e não concluíram a educação básica é amplo e heterogêneo — por isso o termo “juventudes”, no plural, adotado aqui. A seguir, separamos alguns destaques encontrados na pesquisa quantitativa:

Mais de 70% querem voltar a estudar

O estudo identificou que três em cada quatro jovens fora da escola (73%) têm a intenção de concluir a educação básica. São cerca de 7 milhões de jovens que podem ser beneficiados por políticas que apoiem essa população na retomada dos estudos.

Quanto menor a faixa etária, maior é o interesse: 79% dos jovens de 15 a 19 anos manifestaram intenção de completar a educação básica, contra 75% no grupo de 20 a 24 e 68% no de 25 a 29.

À medida que os jovens estão mais distantes do término do ciclo básico, o interesse em terminar os estudos é menor: 36% dos que não completaram o ensino fundamental afirmam não ter a intenção de completar o ensino médio, contra 27% daqueles com fundamental completo e 17% do grupo com ensino médio incompleto. A intenção de voltar a estudar é mais comum entre as jovens do sexo feminino (78%) do que entre os do sexo masculino (69%).

Ao menos sete de cada dez jovens que pretendem concluir os estudos têm interesse em cursar o ensino médio técnico. O interesse pela educação profissional e tecnológica (EPT) é maior entre as jovens do sexo feminino, no grupo que tem ensino médio incompleto, na faixa etária mais jovem e nas áreas metropolitanas.

O que os motiva a completar os estudos?

Grande parte dos jovens que pretendem completar a educação básica cita como motivação a possibilidade de melhorar a condição profissional. Quando estimulados a pensar sobre as razões para voltar a estudar, 52% citaram aspectos relacionados à empregabilidade: um emprego melhor ou, simplesmente, conseguir um emprego. O desejo de fazer uma faculdade também é uma motivação significativa para concluir os estudos, manifestado por 28% dos entrevistados.

Eles associam a conclusão da educação básica a ser alguém na vida, ter dignidade e não sofrer discriminação ao buscar emprego.

Os jovens que participaram da pesquisa qualitativa mencionaram, ainda, a vontade de ser motivo de orgulho para familiares.

"É mais por minha esposa e pra minha mãe mesmo, que fica na agonia que eu termine pra arrumar emprego melhor.”

- Jovem em grupo de discussão

“E agora eu tô correndo atrás do tempo perdido pra terminar meus estudos, pra fazer minha faculdade, mostrar pros meus filhos que é dos estudos que eles vão tirar alguma coisa boa.”

- Jovem em grupo de discussão

Quais as barreiras que afastam estudantes da escola?

Os motivos para não voltar à escola fornecem informações importantes para sustentar as iniciativas e políticas de retorno. Considerando o grupo dos 27% de jovens que não pretendem concluir a educação básica, os principais motivos mencionados são:

A experiência anterior com a escola, marcada por dificuldades de aprendizagem e repetências — 68% dos entrevistados já foram reprovados —, ajuda a entender os motivos relacionados a não ter vontade e não ter paciência para estudar. Tanto que mais da metade (51%) dos jovens que não pretendem terminar a educação básica teriam medo de voltar a estudar e não conseguir acompanhar as aulas.

“Me senti muito envergonhado porque todo mundo passou e eu não (...). Eu nunca tinha repetido de ano, eu tinha só 11 anos, uma criança, perdi por conta de um ponto e isso me doeu. Desisti e fui trabalhar.”

- Jovem pesquisador

“Me senti muito envergonhado porque todo mundo passou e eu não (...). Eu nunca tinha repetido de ano, eu tinha só 11 anos, uma criança, perdi por conta de um ponto e isso me doeu. Desisti e fui trabalhar.”

- Jovem pesquisador

Quando estimulados a completar a frase “eu não teria saído da escola se...”, os jovens dos grupos de discussão revelaram que, quando mais novos, não tinham consciência do papel da educação na vida deles.

Eu não teria saído da escola se:

  • Soubesse que as oportunidades de trabalho para quem não concluiu o ensino médio são limitadas e precárias;
  • Tivesse ajuda para conciliar trabalho e estudo;
  • Tivesse apoio pedagógico para dificuldade de aprendizagem;
  • Tivesse apoio psicológico;
  • O ensino médio preparasse para o ensino superior e para o mercado de trabalho.

“Se eu soubesse que eu ia me lascar tanto na roça como eu me lasquei até hoje, eu não parava de estudar, não. Tinha ficado quieto. Tinha estudado, tinha conseguido um emprego melhor para mim, tava trabalhando bem melhor do que eu trabalho hoje.”

- Jovem em grupo de discussão

Para os especialistas consultados, essa dificuldade de focar no benefício da educação em longo prazo poderia ser suprida com o desenvolvimento, pela escola, de um projeto de vida junto aos alunos, que os ajudaria a compreender o benefício de permanecer. Entre as barreiras que dificultam o retorno do jovem à escola, dois eixos se destacam e serão analisados a seguir: o trabalho e o papel social da mulher.

O desafio de conciliar escola e trabalho

A maioria dos jovens (92%) concorda que terminar os estudos é importante para obter melhores oportunidades e que o diploma é relevante (85% de concordância). Por outro lado, grande parte deles (78%) também concorda com a frase de que, neste momento, o trabalho é prioritário em relação ao ensino escolar.

Na opinião de jovens e especialistas, a escola e o mundo do trabalho não estão preparados para acolher o estudante que trabalha e o trabalhador que estuda.

“Em vários países do mundo, o jovem trabalha. A questão é: como você compatibiliza ele trabalhar e estar na escola? Basicamente, depois dos 17 anos ele está trabalhando e estudando ao mesmo tempo. Então não adianta tentar contrapor o trabalho à educação. Você tem que fazer os dois conversarem, porque os dois são importantes. (...) Acho que o ponto fundamental é criar um ambiente de aprendizado que envolva escola e trabalho.”

- Especialista

“É bem cansativo. Aqui as aulas começam 6 e pouco, 7 e pouco, vai até 10h30, 11h. O que você vai fazer? Você acorda cedo, 4, 5 e pouco, para trabalhar. Você acorda 5h30, por exemplo, chega em casa 16h30, 17h, para você sair para a escola para chegar às 23h? Pensa.”

- Jovem em grupo de discussão

Outro ponto mencionado pelos jovens é que muitas empresas não contratam quem não terminou a educação básica, mas também não apoiam esse retorno:

“Muitas empresas preferem que você largue o estudo para continuar no trabalho.”

- Jovem pesquisador

Os participantes da pesquisa reivindicam, ainda, a ampliação de vagas de Jovem Aprendiz voltadas para aqueles que estão fora da escola e desejam retornar, pois atualmente elas possuem um limite de idade (até 24 anos) ou não estão disponíveis em todas as cidades.

Os papéis sociais da mulher

Entre as jovens do sexo feminino que participaram da pesquisa quantitativa, oito em cada dez têm filhos. Levando em conta que, em geral, a responsabilidade de cuidar da criança recai sobre a mãe — tanto que 34% das mulheres citam a necessidade de cuidar da família como razão para não completar os estudos, contra 8% dos homens —, ações de apoio às jovens mães são cruciais para viabilizar o retorno dessa população aos estudos.

“Se eu não tivesse parado, né, logo quando eu tive minha primeira filha... Mas quando ela inteirou um ano (...), o meu pensamento foi: não, eu preciso trabalhar, que eu preciso sustentar ela. O meu pensamento naquele tempo foi esse. Eu preciso, então não vou conseguir estudar. E eu não vou conseguir manter o meu estudo e o trabalho ao mesmo tempo.”

- Jovem em grupo de discussão

"É preciso ter uma rede de proteção estruturando essa menina que acabou de ser mãe. Se ela não tiver uma creche, ela não vai voltar, ela não tem com quem deixar esse menino. (...) O que acaba acontecendo é que a rede fica sendo muito mais familiar e informal do que a rede de proteção das políticas públicas mesmo.”

- Especialista

A rede de proteção deve incluir não apenas um espaço para a criança ficar, seja na própria escola, seja em creches com horários compatíveis com as aulas, mas também a inserção de mães e filhos em programas governamentais que os acolham de forma abrangente.

“Tem um aspecto que é da escola, que é de acolhimento, de compreensão do que ela está passando, de traçar uma proposta de aprendizagem pra ela. Mas tem uma outra perspectiva que vai além da educação, que é da rede de proteção. (...) Tem condição desse familiar que ela cuida ter outra estratégia dentro da própria política pública, da saúde ou do que for, para apoiar? Porque se a gente não vê isso numa perspectiva de políticas públicas e de redes de proteção (...), ela vai estar isolada numa situação que ela, sozinha, não dá conta.”

- Especialista

Um problema,
múltiplas soluções

O que precisa mudar para que as juventudes fora da escola consigam completar a educação básica? Tanto os especialistas quanto os jovens concordam que não há um modelo que funcione para todos e que a solução efetiva é ofertar diversas possibilidades. Não apenas para atender jovens de diferentes faixas etárias, condições socioeconômicas, territorialidades e perfis demográficos, mas também para suprir diferentes demandas que podem ter afastado da escola cada um desses jovens.

Algumas dessas possibilidades foram identificadas no levantamento bibliográfico da pesquisa, que categorizou ações implementadas no Brasil e no mundo para lidar com o desafio das juventudes fora da escola. São elas:

  • Bolsas de incentivo;
  • Fortalecimento da EJA;
  • Educação profissional e tecnológica;
  • Lei da aprendizagem;
  • Ensino médio noturno;
  • Busca ativa;
  • Matrícula facilitada;
  • Acolhimento e apoio a jovens mães;
  • Reforço, mentoria e motivação;
  • Alerta preventivo: identificar estudantes com mais risco de evasão e intervir a tempo;
  • Melhoria da saúde mental e do clima escolar.

Muitas iniciativas não contemplam a população de 20 a 29 anos, faixa etária de 86% dos jovens fora da escola sem concluir a educação básica. É necessária e urgente, portanto, a implementação de mais ações voltadas para incentivar esse público a retornar à sala de aula.

Outro ponto destacado por especialistas e jovens ouvidos pela pesquisa foi a necessidade de soluções não só para o retorno, mas para a permanência dos jovens na escola até a conclusão dos estudos. Esse movimento demanda intervenções de acolhimento intersetoriais e construídas localmente, considerando os diferentes contextos de vida. Mas afinal,

O que pode ser feito para viabilizar o retorno dos jovens aos estudos?

Na etapa quantitativa, os entrevistados foram apresentados a uma série de alternativas — relacionadas a políticas públicas, modalidades, horários e currículo dos cursos, entre outros fatores — e estimulados a escolher até três opções em cada uma dessas dimensões.

A preferência se distribui pelas seis opções sugeridas. A compatibilidade da jornada de escola e trabalho, a oferta de bolsa de estudos e a oferta de creche para quem tem filhos ganham destaque.

Sobre os programas de auxílio financeiro a estudantes, os especialistas consultados fizeram três recomendações, com base em pesquisas sobre o impacto de iniciativas já existentes: que o recurso seja destinado ao jovem, e não à família; que a frequência da bolsa seja mensal; e que o valor distribuído no ato da matrícula seja maior do que as demais parcelas.

Eles também ponderam que as bolsas podem incentivar a permanência, mas não resolvem os problemas relacionados à qualidade de ensino — o fator que mais impacta positivamente o aumento de renda ao longo dos anos.

“Eles estão recebendo uma bolsa para quê? Para promover o projeto de vida deles. (...) Se há um projeto de bolsa bem-sucedido é o projeto que está inserido num programa de melhoria da educação, num programa de atendimento individualizado aos alunos, com mentoria e acompanhamento individualizado.”

- Especialista

A preferência pelo ensino 100% presencial se destacou e foi escolhida por metade dos entrevistados (51%). As outras modalidades tiveram cerca de um quarto de menções cada uma, com 28% escolhendo a educação a distância (EaD) com professor online, 25%, o ensino híbrido e 23%, EaD com aulas gravadas.

Já os trabalhadores formais manifestaram preferência acima da média pela EaD com aulas síncronas (35% x 28%) e pelo ensino híbrido (28% x 25%), numa indicação de que consideram estes modelos uma possibilidade de conciliar estudo e trabalho.

A pesquisa aponta, ainda, para a falta de experiência de grande parte desses jovens com a EaD: 70% nunca fizeram um curso online e outros 7% não têm acesso à internet.

Apesar disso, mais da metade (58%) entende que conseguiria acessar esse tipo de curso sem problemas de conexão — mas também é expressiva a parcela dos que mencionam dificuldades para se conectar (25%) e dos que não conseguiriam acessar aulas online (14%).

Aqui, é possível observar uma clara preferência por estudar no período da noite: 62% consideram esta opção e 55% a colocam em 1º lugar. O turno da manhã é uma opção para 24% dos jovens e o da tarde, para 17% — proporção semelhante à opção pelo horário flexível (16%).

Independentemente do turno escolhido, mais da metade dos jovens (54%) disseram que há vagas compatíveis com sua rotina perto de onde moram. Por outro lado, é preocupante que cerca de um terço tenha respondido que não há oferta de vagas compatíveis com sua rotina em escolas próximas.

É possível perceber um interesse considerável em completar rapidamente a educação básica (43%) e em se preparar para entrar em uma universidade ou passar em concurso público (35%), assim como o desejo por uma formação profissional mais imediata (31%).

Esses jovens demonstram interesse na utilização de recursos tecnológicos e em oficinas e laboratórios. Nos grupos de discussão, os participantes citaram também algumas aulas práticas que gostariam de ter no retorno à escola: música e artes, laboratório de ciência, atividades ao ar livre e educação física.

O apoio de professores para superar dificuldades, apontada por 52% dos jovens como um fator de incentivo para voltar a estudar, vai de encontro com a opção de aulas presenciais e pode ser um sinal da expectativa de conseguir superar dificuldades de aprendizagem vividas no passado.

As demais opções apresentadas — bom relacionamento entre alunos e professores, apoio da família e apoio psicológico na escola — também atingem proporções expressivas, que revelam a importância do acolhimento e do suporte emocional para os jovens fora da escola.

Uma responsabilidade de todos

Voltar a estudar depois de um tempo longe da escola pode ser desafiador, especialmente para aqueles da faixa etária mais avançada. Uma grande parte desses jovens precisa conciliar os estudos com responsabilidades familiares e profissionais e, em muitos casos, superar sentimentos de fracasso e experiências negativas associadas à vivência escolar anterior.

 

Logo, é preciso que esses jovens recebam apoio para conseguir retornar e concluir a educação básica, em um esforço que deve envolver diversos setores da sociedade. É natural que o enfrentamento do problema seja liderado pelas políticas públicas de educação, mas elas devem ser complementadas por políticas relacionadas a trabalho, assistência social, gênero e saúde, entre outras.

 

Além disso, a tarefa de planejar, financiar, implementar e monitorar essas políticas deve envolver todas as esferas de governo (municipal, estadual e federal), assim como os membros do poder legislativo, mas não só. Setor privado, mídia, organizações não governamentais, igrejas, famílias, todos podem fazer sua parte para garantir que esses jovens acessem plenamente o direito constitucional à educação.

 

Uma evidência empírica do potencial motivador de discutir o tema e levar informações para essas juventudes é que, ao longo das oficinas de PerguntAção que rolaram durante a construção do estudo, três dos cinco jovens pesquisadores decidiram dar continuidade à sua escolarização, por se sentirem mais bem informados e estimulados após a participação no projeto.

Esse desfecho, ainda que não planejado, reforça um ponto central: o de que os jovens querem voltar a estudar, especialmente quando bem informados sobre os benefícios que podem obter com a conclusão da educação básica e sobre as possibilidades de viabilizar esse retorno.

 

Para que concretizem esse desejo, é preciso oferecer condições que lhes permitam conciliar o estudo com as demais dimensões da vida — algo que, como foi visto, só pode ser alcançado com uma combinação de estratégias que atendam às diferentes necessidades e realidades vividas pelas juventudes fora da escola.

 

O desafio está posto e deve ser visto como prioridade por toda a sociedade, uma vez que garantir aos jovens brasileiros a possibilidade de desenvolver plenamente seu potencial, por meio do acesso à educação, traz benefícios não só para os próprios jovens, mas para todo o país.

Para uma leitura mais aprofundada do cenário, clique aqui e acesse a pesquisa completa.

Realização: Fundação Roberto Marinho | Itaú Educação e Trabalho

Parceria Técnica: Instituto Datafolha | Conhecimento Social Estratégia e Gestão | Rede Conhecimento Social

Diagramação: Daniel Frias, Izabella Donafe e Lucas Gomes

Edição: Pamela Machado e Tiago Lontra

Vídeo de capa: Envato
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Imagem de capa: Freepik

Outras imagens: Freepik
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