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Por Arcílio Neto — Itu, SP


O torcedor do Ituano parece estar preso em um pesadelo sem fim. Após ficar na porta do acesso à Série A do Brasileiro, na Batalha de Itu de 2022 contra o Vasco, o Galo passou a enfileirar decepções e derrotas. Desde então, a rotina do time passou a ser lutar contra o rebaixamento.

Com pênalti perdido e duas expulsões, Ituano segue na lanterna da Série B

Com pênalti perdido e duas expulsões, Ituano segue na lanterna da Série B

Em 2023, escapou por um fio no Paulistão e na Série B. Neste ano, porém, o Rubro-negro caiu no estadual e vai jogar a Série A2 novamente após 24 anos. O calvário, entretanto, continua mais forte do que nunca e só piorou desde o descenso em março.

Mais de um mês se passou e a sensação da torcida é que a Série B nada mais é que uma continuação do Paulistão. A base do time rebaixado foi mantida e apenas cinco jogadores foram trazidos para o Brasileiro.

Somando a reta final do estadual, a Copa do Brasil e as primeiras três rodadas da Série B, o Ituano chegou a uma marca inédita em mais de 40 anos: a de sete derrotas seguidas.

O Galo nunca havia tido uma série tão ruim como esta desde a mudança de nome, em 1990. Os reveses foram para São Luiz, Bragantino, Inter de Limeira, São Paulo, Chapecoense, Operário-PR e Novorizontino.

O ge fez um levantamento inédito e constatou que essa é a primeira vez que o clube perde sete jogos em sequência, considerando o período após 1985. Antes disso, os dados sobre as competições disputadas são escassos e, por este motivo, a pesquisa teve que parar nesse ano.

Momento do gol do Novorizontino contra o Ituano — Foto: Ozzair Jr./Novorizontino

Após terminar o Paulistão na última posição, o Ituano é o vice-lanterna da Série B com três derrotas em três jogos e um saldo negativo de seis gols.

Em todo o ano de 2024, o Rubro-negro tem apenas uma vitória. O triunfo solitário foi há mais de 100 dias, em janeiro, contra o Corinthians, pela segunda rodada do estadual. Nesta temporada, o time acumula ainda outros três empates e 12 derrotas, um aproveitamento de 12,5%.

Até então, a pior série de derrotas do Ituano dos últimos 40 anos havia sido em 1994, ano que o clube foi rebaixado no Paulistão. A sequência da época envolveu os seis reveses para União São João, Corinthians, Ferroviária, Palmeiras e Ponte Preta no estadual, além do Juventus-SP na estreia da Série C.

Em alguns dos piores anos da história do clube, como 1999 e 2007, o Rubro-negro não ultrapassou a marca de cinco derrotas seguidas. Em 2006, perdeu seis em sequência na Copa FPF, mas não atuou com a equipe principal.

Com as sucessivas frustrações de 2024, o ge traz, a partir de agora, pontos-chave que ajudam a dar a dimensão da crise que toma conta do Galo de Itu.

Rota de colisão com a torcida

A derrota do Ituano para o Novorizontino escancarou a crise do time da casa com o próprio torcedor. Quando o Galo de Itu tomou 1 a 0, alguns torcedores elevaram o tom das cobranças.

No momento que Eduardo Person, que havia acabado de perder um pênalti, empatou no fim do primeiro tempo, o camisa 10 esbravejou contra os próprios torcedores. Um dos mais bem avaliados pela torcida, até então, fez gestos e protestou em um forte desabafo.

Person marca gol do Ituano e esbraveja contra próprio torcedor

Person marca gol do Ituano e esbraveja contra próprio torcedor

Ele deu entrevista no intervalo, pediu desculpas pela ação, mas a torcida aumentou o tom contra Person e o time. A torcida começou a gritar olé no toque de bola do Novorizontino e chegou até a comemorar uma entrada mais dura em cima do seu camisa 10. Quando Alberto Valentim resolveu tirar Person do jogo, a torcida vaiou e xingou bastante o jogador.

O Tigre do Vale fez 3 a 1 e diversos torcedores rubro-negros saudaram o gol em tom de ironia. Também houve momento para xingamentos aos gestores. Após o jogo, o gestor Paulo Silvestri criticou a torcida.

Eduardo Person comemora gol do Ituano contra o Novorizontino — Foto: Fernando Roberto/Ituano FC

Erros da gestão

Após a histórica Série B de 2022, que poderia marcar uma mudança de patamar do Ituano, a gestão do clube enfileirou más decisões. A começar pela reformulação do elenco, que perdeu 16 jogadores ao fim do ano.

A maioria das saídas foi uma decisão do clube, como os casos de Roberto, Jiménez, Aylon e outros. Entre os titulares frequentes, Lucas Dias, Caíque, Kaio e Aylon foram as ausências mais sentidas. Em 2023, o Galo teve três técnicos diferentes: Carlos Pimentel, Gilmar Dal Pozzo e Marcinho.

O último deles veio para implantar a nova identidade que era sonho dos gestores do Ituano. A ilusão do "DNA ofensivo" foi responsável por manter Marcinho no cargo, mesmo com resultados e atuações ruins. Em 40 jogos dele à frente do Rubro-negro, foram oito vitórias, 17 empates e 15 derrotas.

Juninho Paulista voltou a ser gestor do Ituano no fim de 2023, após passagem pela seleção brasileira — Foto: Marcos Ribolli

Juninho Paulista chamou a responsabilidade em momentos de dificuldade e chegou a falar em "dor no coração" na demissão de Marcinho.

Já o outro gestor, Paulo Silvestri, optou por não dar entrevista ao ge no momento mais crítico. No último sábado, abandonou a coletiva no meio da pergunta do ge que ainda estava sendo formulada.

Silvestri virou as costas para o questionamento, que seria sobre como o torcedor rubro-negro poderia confiar que a Série B não seria uma continuidade do Paulistão, e o que seria feito de diferente.

Paulo Silvestri, gestor do Ituano — Foto: Anderson Rodrigues/Ag. Paulistão

Falta de investimento

Juninho Paulista teve competência em tirar o clube do fundo do poço, quando assumiu a gestão em 2009. A austeridade sempre foi um remédio contra o endividamento e por mais responsabilidade financeira. Essa foi considerada uma virtude em muitos momentos, principalmente quando o Ituano não tinha divisão nacional ou atuava nas Séries C e D.

Porém, o Galo de Itu subiu degraus e ao chegar à Série B e Copa do Brasil, não houve salto de investimentos dos gestores. O clube continuou a estratégia de montar elencos pequenos e baratos.

Em todos os campeonatos, o time sempre se destaca como uma das menores folhas salariais existentes, mesmo em anos com aumento de receita como 2023, quando o clube faturou alto com Paulistão e Copa do Brasil, principalmente.

Água Santa x Ituano, Paulistão 2024 — Foto: Rebeca Reis/Ag. Paulistão

Apesar disso, há exemplos que já deram certo no passado, como no título do Paulistão 2014 e no quase acesso na Série B 2022. Porém, os exemplos de fracassos são mais frequentes que os de sucesso. Desde a Batalha de Itu, o Rubro-negro venceu 13 de 72 jogos disputados. No recorte das 29 últimas partidas, foram apenas dois triunfos.

Quase todas as contratações recentes do clube foram "apostas". Até houve acertos com jogadores renomados, mas esses estavam em baixa na carreira há muito tempo, como os casos de Jean Pyerre e Geuvânio. Em geral, são trazidos atletas de divisões inferiores e com estatísticas pouco animadoras.

Geuvânio treina com bola no Ituano, na última semana de 2022 — Foto: Flávio Torres/Ituano FC

A falta de ousadia em reforços pode ser apontada como um dos fatores que fizeram o Ituano ser ultrapassado por clubes como Novorizontino e Mirassol.

Até na contratação de técnicos, o Galo de Itu costuma ser econômico. Foi o caso de Marcinho, que nunca havia sido treinador profissional na carreira e foi mantido por quase um ano, mesmo com resultados ruins. Ele só foi demitido após a eliminação na Copa do Brasil deste ano para o São Luiz.

Marcinho foi demitido do Ituano em fevereiro de 2024 — Foto: Miguel Schincariol/Ituano FC

Alberto Valentim foi contratado para as duas rodadas finais do Paulistão, mas não evitou o rebaixamento. Ele foi o primeiro técnico "caro" contratado pela gestão atual e, até o momento, não conseguiu mudar o rumo do clube que está em marcha ré.

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