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Por Fernando Almeida* — Americana, SP


A expectativa por um bom desempenho do Brasil nas Paralimpíadas de Paris 2024 cresceu quando Alexandre Galgani garantiu um lugar nos Jogos. Ele é o primeiro atirador esportivo confirmado na competição, com direito a classificação com medalha de ouro e recorde no Parapan.

Em Santiago, Galgani fez história. Na segunda participação do tiro esportivo em um Parapan, conquistou duas medalhas: uma prata na categoria rifle 10m e o ouro na carabina 50m, batendo o recorde Parapan-Americano na final e garantindo a sonhada vaga para Paris.

Alexandre Galgani, ouro no tiro esportivo Parapan-Americano — Foto: Miriam Jeske/CPB

- Eu não podia deixar escapar essa chance. Me preparei ao máximo para garantir a vaga em Paris e consegui subir na pontuação.Quando vi que eu ganhei eu não sabia se chorava, se dava risada, se eu gesticulava. Eu ficava meio perdidão, mas a sensação é maravilhosa, não tem como descrever - conta Galgani.

Aos 40 anos, o paratleta de Americana (SP), se prepara para sua terceira Olimpíada e para realizar o sonho de seu maior incentivador. O pai de Galgani foi o responsável por ensinar o esporte que, mais tarde, seria a ferramenta que transformou a vida do filho após um acidente que tirou seus movimentos aos 18 anos.

O atirador perdeu o pai por um problema no coração durante uma competição em 2014, antes de sua primeira participação em Olimpíada, mas, antes, fez uma promessa:

- Prometi pro meu pai que eu ia ser campeão mundial e paralímpico.

- O foco é ir para o pódio em Paris. no tiro esportivo paralímpico a gente consegue manter um nível alto com uma idade mais avançada. Então eu espero ainda participar de mais umas três ou quatro Olimpíadas ainda. Se Deus quiser, eu vou lutar pelo pódio.

Alexandre Galgani na Copa Brasil de tiro esportivo — Foto: Graziella Batista/CPB/MPIX

Mesmo no mais alto nível, as condições de treinamento da modalidade não são as ideais, e Galgani precisa viajar em torno de 500km para usar uma estrutura de ponta.

- Infelizmente, a gente é carente de centro de treinamento no Brasil. Os dois melhores que a gente tem, ficam no Rio de Janeiro. Esses dois estantes, hoje, na minha visão, são os melhores do Brasil. E a gente tenta treinar lá o máximo possível. Então, o paralímpico faz treinamentos com a gente lá, quatro, cinco, seis vezes por ano. Fora as provas ainda que têm lá. Isso ajuda bastante. Mas, além disso, eu montei um estande na minha casa, de ar comprimido. Então, eu treino no quintal da minha casa.

Para se manter competindo, Galgani, além de montar um estante dentro da própria casa, conta com o apoio de amigos, familiares e patrocinadores pagar para viagens e equipamentos.

Paratleta de tiro esportivo que havia 'perdido' armas já participou do Mundial nesta sexta

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A trajetória de Alexandre Galgani mostra que ele se recusa a desistir. Tanto que, poucos dias depois de voltar de Santiago com duas medalhas no peito, ele participará de um campeonato mundial e precisou custear a viagem por um meio alternativo.

- Dia 5 eu estou indo aos Emirados Árabes participar da uma Copa do Mundo Estou indo por conta, porque não estava no cronograma do Comitê Paralímpico. Então, eu acabei fazendo uma rifa para custear custear essa viagem. Ainda tenho que acabar de vender essa rifa. Estou com o foco agora nos Emirados Árabes, mas é preparação já para Paris.

O acidente

As medalhas não foram as primeiras conquistas do atirador por meio do esporte. Em 2002, com 18 anos, Galgani mergulhou na piscina de sua casa, bateu a cabeça no fundo e teve uma lesão na coluna, ficando sem os movimentos do corpo. Foi então que o esporte assumiu um papel ainda mais importante.

- No começo foi bem difícil, porque eu só mexia os olhos, então, tinha um desânimo muito grande. Tinha uma incógnita que não sabia se eu ia poder sair da cama ou não.

Alexandre Galgani — Foto: Arquivo Pessoal

Por meio da fisioterapia e do apoio da família, Galgani conseguiu, aos poucos, retomar os movimentos dos membros superiores. Com a evolução na reabilitação, o primeiro pedido ao pai foi a ajuda para voltar a atirar. A partir disso, veio uma nova motivação.

- Hoje não tenho todos os movimentos superiores. Não mexo nenhum dedo da mão, mas consigo dirigir, consigo praticar o esporte. O esporte na minha vida foi pra voltar a sonhar, ver o meu olho brilhar, fazer alguma coisa que eu amo. Saber que eu posso brigar de igual pra igual com muitos aí ou até mais. Então, o esporte trouxe a minha vida de volta.

A mudança de vida não se limitou ao esporte. Ainda nos primeiros anos de tiro esportivo, Galgani iniciou a graduação e hoje é bacharel em direito. As conquistas fora do esporte são creditadas pelo paratleta à força mental adquirida no ambiente esportivo.

- No paralímpico, a gente depende muito mais do mental. Como a gente tem menos movimentos, ele fica mais difícil. Então, se você não se concentrar dez vezes mais do que as pessoas que têm todos os movimentos, você não consegue exercer com tanta eficiência o que você tem que fazer.

- Então, o benefício mental que todo paratleta tem com o esporte é imenso. Claro que o motor também, não tem dúvida, mas o mental é primordial. Você muda a vida da pessoa da água para o vinho do dia para a noite. É inacreditável, porque você muda a filosofia sua de vida, você muda a sua percepção, você volta a sonhar muito mais do que você já sonhou algum dia - completa.

* Fernando Almeida, estagiário, colaborou sob a supervisão de Júlio Nascimento

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