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Por Bruna Rodrigues e Rafael Bizarelo — Le Mans, França


São mais de 100 anos de muita velocidade, acidentes impressionantes e grandes disputas nas 24 Horas de Le Mans. Junto do GP de Mônaco e das 500 Milhas de Indianápolis, a corrida faz parte da Tríplice Coroa do Automobilismo. Neste sábado, os pilotos partem para a longa prova de endurance na França, que conta com a participação de seis brasileiros.

24 horas de Le Mans 2024 — Foto: James Moy Photography/Getty Images

O sábado é o ponto de partida da prova. Às 11h (de Brasília), os pilotos largam para a primeira de muitas voltas no Circuito de La Sarthe, palco da corrida desde 1923. São 24 horas, que se encerram às 11h do domingo, dia 16 de junho.

24 horas de Le Mans 2024 — Foto: James Moy Photography/Getty Images

Como funciona?

Cada equipe possui três pilotos que se revezam durante as 24 horas da prova, que faz parte do Campeonato Mundial de Endurance da FIA, o WEC. Disputada desde 1923, Le Mans é a corrida de resistência mais tradicional do mundo.

O circuito possui 13,626 km e 38 curvas. A volta da pole position de 2024, conquistada pela Porsche Penske foi de 3m24s634. Na última edição, a Ferrari, vencedora da prova, fez um total de 342 voltas com James Calado, Antonio Giovinazzi e Alessandro Pier Guidi. A premiação para a escuderia italiana foi de 250 mil euros (R$ 1,4 milhões na cotação atual).

Circuito de La Sarthe, palco das 24 horas de Le Mans — Foto: Ker Robertson/Getty Images

Muita resistência

Nos primórdios do automobilismo, nos primeiros anos do século XX, as provas eram apenas sobre velocidade. Le Mans não foi pioneiras nas provas de resistência, mas inovou com as 24 horas em um circuito que saia da pista de corrida para as ruas com asfalto, cascalho e pedras.

André Lagache e René Léonard, ambos franceses, foram os pilotos que percorreram a maior distância ao fim dos 1440 minutos na primeira edição da prova, em 1923. A bordo de um Chenard & Walcker azul, eles partiram uma largada nada convencional: por muitos anos, os pilotos saiam do lado esquerdo da pista e corriam até os carros para acelerar em Le Mans.

André Lagache e René Leonard venceram a primeira edição das 24 Horas de Le Mans, em 1923 — Foto: Klemantaski Collection/Getty Images

Le Mans foi um sucesso imediato no mundo do automobilismo. As provas seguintes tiveram participação das grandes fabricantes de carros no período entreguerras. A Bentley, com os 'Bentley Boys', dominou as primeiras edições, mas passou a enfrentar uma grande disputa com Alfa Romeu e Bugatti, que também levaram taças para as fábricas.

Quando Jean-Pierre Wimille e Pierre Veyron celebraram a vitória de 1939 pela Bugatti, a tensão na Europa entre as grandes potências da época já era muito grande. Apenas 75 dias após a corrida, começou a Segunda Guerra Mundial, que deixou mais de 70 milhões de mortos e quebrou o Velho Continente financeira e fisicamente com diversos bombardeios. Casa das 24 Horas de Le Mans, a França foi um dos países muito afetados pelos ataques do Eixo. A Alemanha nazista chegou a tomar conta do país.

Luigi Chinetti guiou a Ferrari nas 24 Horas de Le Mans de 1949 — Foto: Klemantaski Collection/Getty Images

A volta da disputa em Le Mans aconteceu dez anos depois da vitória de Wimille e Veyron. Em 1949, a França estava em êxtase para o retorno da prova de resistência. Era ano de estreia de ouro - ou melhor, vermelha. A Ferrari participou da corrida pela primeira vez, e levou a vitória logo de cara.

Prova marcada pelo perigo

O nome resistência não é à toa. Nem todos suportam os extremos das 24 Horas de Le Mans, que foi palco de grandes acidentes nos últimos 100 anos.

Uma das maiores tragédias da história do automobilismo acontece em Le Mans. Na prova de 1955, ainda no início, o piloto Mike Hawthorne, da Jaguar, liderava na disputa com Lance Macklin, piloto de um Austin-Healey, e Pierre Levegh, em uma Mercedes. A corrida tinha duas horas e meia de duração quando Hawthorne atravessou a pista para um pit-stop na volta 35.

Destroços do carro de Pierre Levegh após acidente em Le Mans, em 1955 — Foto: Getty Images

Macklin, para não colidir com Hawthorne, precisou desviar, mas Levegh não conseguiu fazer a manobra a tempo. O francês foi direto na Austin-Healey, que serviu como uma rampa para a Mercedes voar até os torcedores. Pierre Levegh foi catapultado para fora do carro, que explodiu nos fãs. Ao todo, 84 pessoas morreram, incluindo o piloto.

A corrida não parou, mas a Mercedes optou por abandonar. Essa saída da equipe alemã, porém, não seria apenas naquela edição de Le Mans, mas também do automobilismo. A volta ocorreu mais de 30 anos depois.

O desastre de 1955 não foi o primeiro nem o último acidente que tirou vidas nas 24 Horas de Le Mans. Desde 1923, um total de 23 pilotos já morreram por batidas no Circuito de La Sarthe. O último foi Allan Simonsen, em 2013.

Grandes rivalidades

Foi através de grandes disputas que a prova manteve o prestígio mesmo após o desastre catastrófico de 1955. Jaguar e Ferrari foram as equipes que se destacaram do início dos anos 50, mas a escuderia italiana dominou as 24 Horas de Le Mans até o meio da década de 60.

Jochen Rindt venceu as 24 Horas de Le Mans de 1965 pela Ferrari — Foto: Bernard Cahier/Getty Images

A sede de vingança de Henry Ford II foi o que mudou o cenário de Le Mans nos anos 60. Na década anterior, a Ford passou muito perto de comprar a Ferrari, mas 'il Commendatore' Enzo Ferrari desistiu da venda quando ia fechar o negócio. Com isso, a empresa estadunidense queria dar o troco na escuderia.

Carroll Shelby foi um dos principais responsáveis pela criação do Ford GT40. Na pista, o americano, junto de Roy Salvadori, furou o domínio da Ferrari com a conquista de Le Mans em 1959 pela Aston Martin. Sete anos depois, em 1966, ele esteve no time de desenvolvimento da grande máquina da Ford.

Ninguém teve chances naquele ano. A Ford dominou com três carros nas três primeiras colocações na chegada. Os australianos Chris Amon e Bruce McLaren, fundador da equipe que leva o seu sobrenome, ficaram com a vitória de 1966.

Bruce McLaren e Chris Amon venceram as 24 Horas de Le Mans de 1966 com a Ford — Foto: Bernard Cahier/Getty Images

A Ford somou quatro vitórias seguidas em Le Mans. Em 1970, a Porsche conquistou a prova pela primeira vez, e passou a dominar a corrida de resistência. Hoje, a equipe é a maior vencedora com a conquista do topo em 19 ocasiões.

F1 + Le Mans

Le Mans sempre recebeu pilotos da Fórmula 1, mas apenas alguns conseguiram vencer a prova de resistência. Nenhum brasileiro conquistou as 24 Horas até hoje. Felipe Drugovich e Pipo Derani estão juntos na Action Express Racing, enquanto Felipe Nasr disputa pela Porsche Penske.

Do atual grid da Fórmula 1, apenas Fernando Alonso, da Aston Martin, e Nico Hulkenberg, da Haas, venceram as 24 Horas de Le Mans. O espanhol, inclusive, já conquistou a prova em duas ocasiões, e precisa da vitória nas 500 Milhas de Indianápolis para ter a Tríplice Coroa do Automobilismo.

Fora da Fórmula 1, Alonso venceu as 24 Horas de Le Mans de 2019 e está em busca da Tríplice Coroa — Foto: James Moy Photography/Getty Images

O título extraoficial é buscado por muitos pilotos, mas apenas um conseguiu conquistá-lo até hoje. Graham Hill venceu o GP de Mônaco, as 500 Milhas de Indianápolis e partiu para Le Mans para levar a Tríplice Coroa. Em 1972, o britânico venceu a prova de resistência ao lado de Henri Pescarolo pela Matra.

Tazio Nuvolari, Maurice Trintignant, Bruce McLaren e Jochen Rindt foram outros pilotos que venceram o Grande Prêmio de Mônaco e as 24 Horas de Le Mans, mas que não conquistaram as 500 Milhas de Indianápolis. Jacky Ickx, com oito vezes vencedor na F1, é o segundo maior campeão da prova de resistência com seis vitórias.

Em 2024, um total de 14 pilotos que já correram na Fórmula 1 disputam Le Mans:

  • André Lotterer - Porsche Penske
  • Antonio Giovinazzi (vencedor em 2023) - Ferrari
  • Brendon Hartley (vencedor em 2017, 2020 e 2022) -Toyota
  • Daniil Kvyat - Lamborghini
  • Felipe Nasr - Porsche Penske
  • Jack Aitken - Cadillac
  • Jean-Eric Vergne - Peugeot
  • Jenson Button (campeão da F1 e vencedor do GP de Mônaco em 2009) - JOTA
  • Kamui Kobayashi (vencedor em 2021) - Toyota
  • Mick Schumacher - Alpine
  • Nyck de Vries - Toyota
  • Paul Di Resta - Peugeot
  • Robert Kubica - AF Corse
  • Romain Grosjean - Lamborghini
  • Sebastien Bourdais - Cadillac
  • Sébastien Buemi (vencedor em 2018, 2019, 2020 e 2022) - Toyota
  • Stoffel Vandoorne - Peugeot
  • Will Stevens - JOTA

Trio vencedor das 24h de Le Mans 2023 — Foto: Clive Rose/Getty Images

Recordes das 24 Horas de Le Mans

- Tom Kristensen é o recordista de vitórias com nove edições conquistadas (1997, 2000, 2001, 2002, 2003, 2004, 2005, 2008 e 2013);

- Anfitriã, a França é o segundo país com mais vitórias. 28 pilotos franceses venceram, enquanto 34 britânicos levaram Le Mans;

- A Porsche é a equipe que mais venceu: ao todo, são 19 edições (1970, 1971, 1976, 1977, 1979, 1981, 1982, 1983, 1984, 1985, 1986, 1987, 1994, 1996, 1997, 1998, 2015, 2016 e 2017);

- Em 2023, a Ferrari encerrou um jejum de 58 anos sem vitórias. O tabu existia desde 1965;

- José Carlos Pace (1974), Raul Boesel (1991), Lucas di Grassi (2014) e Bruno Senna (2020) foram os brasileiros que bateram na trave e ficaram com a segunda colocação na classificação geral;

- O Brasil possui oito vitórias em outras categorias das 24 Horas de Le Mans: Thomas Erdos (LMP2 em 2005 e 2006), Jaime Melo Jr. (GT2 em 2008 e 2009), Daniel Serra (LMGTE-Pro em 2017 e 2019) e André Negrão (LMP2 em 2018 e 2019).

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