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Por Bruna Rodrigues e Rafael Bizarelo — Rio de Janeiro


Os primeiros dias de maio de 1994 que sucederam o acidente fatal de Ayrton Senna - e os anos seguintes, até 2009 - marcaram uma longa jornada judicial pelo desfecho do caso. Mas, apesar dos esforços da justiça italiana, que chegou a indiciar seis pessoas por um possível homicídio culposo (sem intenção de matar) do brasileiro tricampeão, ninguém foi condenado. O ge relembra, abaixo, os detalhes da batalha judicial entre a Itália, o Circuito de Imola e a Williams, última equipe do piloto.

Teaser do documentário "Senna por Ayrton" - O primeiro título em 1988

Teaser do documentário "Senna por Ayrton" - O primeiro título em 1988

Ayrton Senna sofre acidente fatal em Ímola, em 1994 — Foto: Alberto Pizzoli/Sygma/Sygma via Getty Images

Logo após o acidente

Confirmado o falecimento, o corpo de Senna foi encaminhado para o Instituto Médico Legal (IML) de Bolonha na Itália, de onde só seria liberado no fim da terça-feira, 3 de maio de 1994.

A autópsia foi determinada pelos juízes Maurizio Passarini, Francesco Pintor e Pellegrino Ianacone e realizada pelo legista Mirco Romanelli, responsável pela perícia no corpo do austríaco Roland Ratzenberger - falecido também em Imola, no sábado. A causa da morte foram múltiplos traumas com falência cardíaca.

Capa de jornal italiano sugere que morte de Ayrton Senna teve responsáveis; publicação chama Imola de "circuito maldito", em 2 de maio de 1994 — Foto: Jean-Michel TURPIN/Gamma-Rapho via Getty Images

Um dia antes, na segunda-feira, a curva Tamburello no Autódromo Enzo e Dino Ferrari em Imola foi isolada pela polícia italiana - conforme detalha o jornalista Livio Oricchio em série especial para o ge. A justiça italiana começou a periciar o circuito e também a Williams do piloto, que permaneceu retida no país.

Posições iniciais da FIA e Williams

A Federação Internacional do Automobilismo (FIA) se reuniu na terça-feira, 3 de maio de 1994, pela manhã, para discutir o episódio do fim de semana; a Williams também analisou seus dados de telemetria para buscar as primeiras respostas sobre o acidente - o time, porém, teria removido os sensores do carro de Ayrton, devolvendo-os para a FIA só dois dias depois.

Muro da Curva Tamburello após reabertura do circuito de Imola, sucedendo acidente fatal de Ayrton Senna na F1 em 1994 — Foto: Melzer/ullstein bild via Getty Images

Inicialmente, a equipe não se pronunciou, limitando-se a divulgar um comunicado oficial no qual Frank Williams, seu fundador, declarou ser "impossível avaliar o tamanho e o significado da perda de Ayrton", acrescentando ainda que "todos que o conheceram sabem que perderam alguém muito especial".

Por fim, o britânico declarou que todos na equipe sempre se lembrariam do tricampeão. Na época, o diretor-técnico da Williams Patrick Head afirmou que Senna seria responsável pelo acidente porque "deveria ter tirado o pé do acelerador ao entrar na curva".

Patrick Head conversa com Ayrton Senna em 1994 — Foto: Getty Images

Vice-presidente da FIA e então presidente da Foca (Associação dos Construtores de F1), Bernie Ecclestone ainda teria avisado o irmão do piloto, Leonardo, de que Ayrton morreu na pista.

O gestor, entretanto, voltou atrás e disse ter se enganado ao ligar para o hospital em busca de confirmação. A informação é importante porque, segundo a lei italiana, a corrida teria que ser suspensa para investigações, o que não ocorreu.

Veja teaser do documentário "Senna por Ayrton"

Veja teaser do documentário "Senna por Ayrton"

Virou caso de polícia

Três anos antes do caso avançar na justiça sob gerência do promotor Maurizio Pasarini, ainda em 1995, um laudo de peritos italianos apontou a principal causa do acidente: a quebra da coluna de direção da Williams, que fez Senna passar reto na Tamburello e bater.

Frank Williams conversa com Patrick Head dentro do carro de Ayrton Senna, no GP de San Marino da F1 em 1994 — Foto: Dario Mitidieri/Getty Images

O relatório de 500 páginas detalha, ainda, que uma peça da suspensão dianteira do carro atingiu o piloto mortalmente na testa, na região do supercílio. O impacto provocou um corte e um traumatismo na parte inferior de seu crânio. A Williams discordou dos resultados, mas um ano depois, Patrick Head admitiu que houve a ruptura na peça, por fadiga - uso excessivo.

Não apenas a batida fatal de Senna entrou no inquérito, mas também o choque que tirou a vida do austríaco Roland Ratzenberger no sábado do GP de San Marino, e o acidente que feriu Rubens Barrichello na sexta-feira. Seus carros também foram apreendidos.

O austríaco Roland Ratzenberger também morreu em acidente no GP de San Marino de 1994 — Foto: Reprodução / Twitter

Um detalhe importante: Senna estava sem espaço no cockpit da Williams e, por isso, suas mãos batiam no carro quando ele virava o volante. Os engenheiros da Williams optaram por serrar a coluna de direção do veículo e alterar o ângulo da barra, que cederia na volta 7 do GP de San Marino de 1994.

A equipe britânica entrou na mira da justiça por essa razão; os administradores de Imola foram acusados pela falta de segurança do circuito, que passou por várias reformas após os acidentes.

Os julgamentos

Entre fevereiro e dezembro de 1997, 31 audiências do caso foram realizadas, em primeira instância. Os acusados poderiam pegar até sete anos de prisão por homicídio culposo. A promotoria sugeriu a pena de prisão de um ano, em suspensão, a Head e Newey.

Frank Williams durante o velório de Ayrton Senna em São Paulo — Foto: Getty Images

Porém, o juiz Antonio Costanzo optou por inocentar todos os envolvidos. O caso foi reaberto em 1999 com Head e Newey à pedido da promotoria e de Frank Williams, mas teve o mesmo desfecho na segunda instância, com base na ausência de provas; especificamente, os dados dos sensores do carro de Senna e algumas imagens da câmera de bordo do tricampeão.

Quatro anos depois, em 2003, a impugnação da apelação foi anulada logo depois da justiça italiana encontrar "erros materiais" na última análise. Com isso, Head e Newey voltaram a responder judicialmente em 2005, embora tenham sido absolvidos mais uma vez.

Adrian Newey e Patrick Head: mentes idealizadoras dos carros da Wiliams — Foto: Paul-Henri Cahier/Getty Images

Em 2007, após o Ministério Público italiano recorrer ao Supremo Tribunal de Justiça do país, Head foi responsabilizado pelo acidente fatal de Senna. O diretor-técnico, no entanto, escapou de uma condenação pela prescrição do fato, ocorrido 13 anos antes - o prazo de prescrição de homicídio culposo na itália era de sete anos e meio.

Os envolvidos, anos depois

Frank Williams seguiu no comando da equipe na F1 até 2013, quando passou o cargo para a filha Claire Williams. A família deixou de vez a posição no time em 2020, concluindo a venda para o grupo de investimentos americano Dorilton Capital. Frank morreu em 2021 aos 79 anos de idade.

Um dos últimos registros em vida de Frank Williams — Foto: Reprodução

Patrick Head, que também foi co-fundador da Williams, deixou a equipe ao fim de 2011 após 34 anos de parceria. Ele retornou como consultor técnico em 2019, mas à distância, da sede em Grove, no Reino Unido.

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