TIMES

Por Luís Fellipe Borges — Uberlândia, MG


Mesclando elementos de danças e lutas típicas dos africanos escravizados no Brasil, a capoeira é reconhecida como patrimônio cultural nacional. Mas isso não significa que ela é uma prática exclusiva dos brasileiros. Pelo contrário: em Luxemburgo, pequeno país na Europa Ocidental, um mineiro tem levado a capoeira para escolas, e a luta tem conquistado crianças e adultos.

Natural de Uberlândia, Bruno Jordan integra o projeto Capoeira Team Luxemburgo, que oferece aulas de capoeira em escolas e outras instituições e beneficia cerca de 600 pessoas por ano. O trabalho é inspirado pelo pai, Mestre Pelezinho, que há mais de duas décadas ensina capoeira na Europa e na África.

Bruno Jordan Capoeira Luxemburgo — Foto: Arquivo pessoal

Ao ge, Bruno explicou que começou a praticar capoeira como forma de lidar melhor com os diagnósticos de dislexia e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH). O primeiro professor foi, justamente, o pai dele.

— Eu tinha muita dificuldade na escola e acabou que eu comecei a fazer a capoeira, mas como hobby. Só que eu vi que a capoeira trabalhava muita coisa e me ajudava muito na questão da dislexia e tudo mais.

Quando Bruno era criança, o pai aceitou um convite para morar na Europa para ensinar capoeira no exterior. Alguns anos depois, foi a vez do filho deixar o Brasil para viver em Luxemburgo. E foi do outro lado do Atlântico que a capoeira entrou novamente na vida dele.

"Eu nunca fui bom em futebol ou em outros esportes, mas na capoeira eu consegui me destacar. Eu sempre tive que escutar desde criança: "você não consegue", pela questão de dislexia. Eu tive muita dificuldade para me encontrar, para conseguir entender, e com a capoeira eu consegui isso".

O sucesso de Bruno com a capoeira se comprova nos títulos que ganhou na Europa. Por três vezes, ele foi campeão dos Jogos Benelux, competição disputada por atletas de Bélgica, Holanda e Luxemburgo. Na carreira, também conquistou o terceiro lugar em um torneio mundial da modalidade.

Bruno Jordan leva capoeira para a Europa — Foto: Redes sociais

Mas o objetivo maior de Bruno com a capoeira vai além do aspecto competitivo. Ele se especializou na área de educação de crianças e adolescentes e, atualmente, atua em escolas internacionais, voltadas para estudantes que precisam se mudar de país com frequência por conta do trabalho dos pais, incluindo filhos de membros do Parlamento Europeu.

Apesar de ser uma forma de lazer dos estudantes, as aulas funcionam como uma disciplina no currículo escolar, e o brasileiro precisa até dar notas para o desempenho dos alunos durante as atividades.

— Já teve casos de uma psicóloga me passar um aluno e falar: "eu tenho um mês para trabalhar com ele, mas eu acredito que ele vai se divertir muito mais na capoeira e vai ter os mesmos resultados". Acho que no Brasil a gente não teria essa confiança.

O brasileiro acrescenta que a prática da capoeira pode ajudar as crianças a desenvolver diversas habilidades que vão além da parte física. Não à toa, o trabalho da associação é reconhecido pelos ministérios da Educação e da Juventude de Luxemburgo.

— A capoeira exige a compreensão em conjunto, o trabalho em equipe e sozinho. Quando você joga com o seu parceiro capoeira, primeiramente você tem que estar sempre lendo ele, porque a capoeira é uma luta, mas você não tem a necessidade de dar um chute no seu parceiro sem necessidade. Então te ajuda a tomar decisões rápidas. Além disso, tudo que acontece em uma roda, então é um momento que você, querendo ou não, é o centro das atenções. Então a pessoa que é muito tímida vai se soltando devagar, até o dia que você se acostuma.

Outra visão

Bruno esclarece que, no Brasil, a capoeira foi historicamente marginalizada devido à associação com os povos escravizados, uma conexão que persiste nos dias atuais e alimenta preconceitos em relação à prática por parte de alguns grupos. No entanto, ele destaca que, na Europa, a capoeira não é vista sob a mesma ótica discriminatória.

- No Brasil, ainda sente o peso da criminalização da capoeira. Na Europa, não existe isso. Ela foi conquistando seu espaço. Hoje eu tenho alunos com quem posso debater diretamente sobre cultura brasileira, falando português. Alguns cantam músicas brasileiras, até coisas bem antigas, como pagodes antigos.

"Eu mesmo já escutei de outros brasileiros, ao eu falar que trabalho com capoeira, eles perguntam: 'mas e trabalho, você faz o que?'. Essas coisas que você consegue ver vindo do seu próprio país, dói bastante. Às vezes você encontra uma pessoa de fora que tem mais recepção para conseguir entender e escutar o que realmente é a capoeira e não ir só pelo que ele já ouviu falar"

Capoeira Team Luxemburgo oferece aulas de capoeira no país europeu — Foto: Capoeira Team Luxembourg/Redes sociais

Mesmo com a diferença na valorização da capoeira entre os dois países, Bruno Jordan fala com orgulho sobre a chance de disseminar a cultura brasileira pelo mundo.

"Eu fico muito feliz quando eu vejo onde a capoeira conseguiu chegar".

📲 Confira as notícias do esporte no ge Triângulo
📲 Siga o ge no Instagram e no Facebook

MAIS ESPORTE: veja os vídeos do ge Triângulo e da TV Integração

Veja também

Mais do ge