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Por Redação do ge — Luxemburgo


A onda de resistência dos torcedores foi tão feroz na última vez que a Superliga Europeia apareceu que os seis clubes envolvidos na Premier League inglesa rapidamente desistiram, efetivamente interrompendo o projeto.

E embora a decisão do Tribunal de Justiça Europeu nesta quinta-feira contra a Uefa, entidade que governa o futebol europeu, tenha sido celebrada por aqueles que ainda procuram tornar o plano uma realidade, nomeadamente Barcelona e Real Madrid, o poder dos torcedores poderá mais uma vez ser o seu maior obstáculo.

Veja como é o formato da Superliga Europeia

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Quando a Superliga Europeia foi lançada, em abril de 2021, 12 clubes inicialmente se inscreveram e mais três deveriam formar os "15 fundadores", para os quais o rebaixamento seria impossível. Mais cinco clubes teriam a oportunidade de aderir anualmente com base no desempenho nacional.

Foi contra o espírito da meritocracia que continua a ser a crença fundamental da grande maioria dos torcedores do futebol e cuja raiva, especialmente em Inglaterra, onde o sistema de pirâmide de 92 clubes é valorizado, rapidamente se manifestou em protestos.

Atormentados pela indignação, Manchester City, Manchester United, Liverpool, Arsenal, Chelsea e Tottenham Hotspur bateram em retirada precipitada e, 48 horas após o seu lançamento, o projeto da Superliga estava em frangalhos.

Tendo em vista esse posicionamento, Bernd Reichart, CEO da A22 (empresa que organiza a Superliga), disse que a liga masculina de 64 equipes contaria com rebaixamento e promoção e seria "aberta, meritocrática e acessível" e libertaria os clubes.

Ele também falou que a Superliga Europeia, uma ameaça direta à principal Liga dos Campeões da Uefa, seria exibida gratuitamente em um serviço de streaming centrado nos torcedores.

Após protestos de torcedores, times ingleses desistem de participar da Superliga Europeia

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Mas, apesar da nova proposta ser menos exclusivista do que a de 2021, os grupos de torcedores continuam pouco impressionados e o Manchester United, talvez receoso de antagonizar a sua base de adeptos, reafirmou rapidamente o seu apoio às competições da Uefa.

- Torcedores, jogadores e clubes já deixaram claro que não querem uma competição costurada – todos nós queremos ver o gatilho puxado para a monstruosidade dos mortos-vivos que é a Liga Europeia de Zumbis - disse Kevin Miles, presidente-executivo da Associação de Torcedores da Inglaterra.

- Embora o cadáver possa continuar a contorcer-se nos tribunais europeus, nenhuma equipe inglesa irá aderir. O novo regulador independente irá impedir qualquer clube de competir em competições nacionais se aderir a uma superliga dissidente – afirmou, se referindo a um órgão regulador criado na Inglaterra para inspecionar os clubes.

O grupo de campanha Fair Game disse que a Superliga Europeia não atende aos interesses mais amplos do esporte. Reagindo às propostas da A22, um porta-voz disse:

- O diabo está nos detalhes, mas o que é essencial é que tal empreendimento nunca pode ser aprovado. Cabe agora ao novo regulador independente colocar o último prego no caixão da Superliga Europeia.

Em comunicado, a Premier League disse que rejeitou o conceito de uma Superliga Europeia

- Os torcedores são de vital importância para o jogo e têm repetidamente deixado clara a sua oposição a uma competição separatista - afirmou.

Bandeiras na sede da Uefa, em Nyon, na Suíça — Foto: Getty Images

Qual é o formato proposto pela Superliga?

O formato proposto para a competição masculina inclui 64 equipes em três ligas – Estrela, Ouro e Azul. As Ligas Estrela e Ouro terão 16 clubes cada, enquanto a Liga Azul terá 32 clubes.

As equipes jogarão em casa e fora em grupos de oito, o que significaria um mínimo de 14 partidas por ano. Haverá promoção anual e rebaixamento entre ligas, enquanto as equipes podem se classificar para a Liga Azul com base no desempenho da liga nacional.

A competição feminina, por sua vez, teria duas ligas de 16 clubes cada. No entanto, seja para o masculino ou feminino, a A22 não divulgou exatamente quais seriam os critérios para participação na Superliga, limitando-se a dizer que no "primeiro ano da competição os clubes serão selecionados em função de um índice de critérios transparentes baseados em rendimentos nas suas respectivas ligas nacionais".

“Os clubes participantes permanecem nas suas ligas nacionais, que continuam a ser a base do futebol europeu. Agora que os clubes podem determinar o seu próprio futuro a nível europeu, esperamos um maior envolvimento com um amplo conjunto de intervenientes no futebol para alcançar o objetivo de todas as grandes competições esportivas”, diz um comunicado da A22, que também propôs a transmissão gratuita de todos os jogos ao vivo em um streaming da própria Superliga.

Joan Laporta, presidente do Barcelona, e Florentino Pérez, do Real Madrid: estusiastas da Superliga — Foto: Getty Images

Especialistas analisam decisão: "Bomba"

Especialistas em direito e marketing esportivo ouvidos pelo ge opinaram sobre a decisão que, a princípio, pode ajudar na criação de uma Superliga Europeia.

- O futebol é a única grande indústria na qual decisões que movimentam bilhões ainda são tomadas por amadores, que se apresentam como não remunerados, mas que se beneficiam de diversas formas, mais do que questionáveis, do controle de processos relacionados diretamente aos clubes, torneios e direitos associados a eles. Essa decisão, tardia, é de suma importância para o desenvolvimento do futebol como negócio em todo o mundo – opinou Thiago Freitas, COO da Roc Nation Sports no Brasil.

- É uma bomba. Os efeitos desta decisão quebram a espinha vertebral do sistema piramidal do futebol mundial, pelo qual FIFA, confederações continentais e federações nacionais controlam com exclusividade o direito de organizar as competições oficiais no futebol. As palavras usadas pelo tribunal são bem claras e caracterizam a existência de um monopólio dentro do sistema do futebol, e este monopólio frente as regras da União Europeia é ilegal – disse Eduardo Carlezzo, advogado especializado em direito desportivo e sócio do Carlezzo Advogados.

- A partir de agora se abre um novo horizonte para os clubes de futebol da Europa, já que não necessitam mais da anuência da UEFA ou FIFA para criar uma competição entre eles. Também será relevante considerar a possibilidade de expansão global destas novas diretrizes para outros continentes, ainda que eles não estejam inicialmente dentro do raio de abrangência da decisão, que se aplica aos países da União Europeia. Poderíamos ter uma superliga com clubes do Brasil, México, Estados Unidos e Argentina? O tempo dirá, porém quando lembramos do caso do Bosman, ele iniciou pela União Europeia e acabou se aplicando globalmente, mediante a extinção do passe - observou Eduardo Carlezzo.

Fachada da sede da Fifa na Suíça — Foto: Reprodução

Entenda o imbróglio da Superliga

Nesta quinta, o Tribunal de Justiça da União Europeia avaliou que a Uefa e a Fifa, por organizarem o calendário de competições e aplicarem punições, estariam prejudicando a concorrência na Europa.

Em abril de 2021, 12 dos principais clubes da Europa (Real Madrid, Barcelona, Atlético, Arsenal, Chelsea, Manchester United, Liverpool, Manchester City, Tottenham, Juventus, Milan e Inter de Milão) anunciaram a criação de um novo torneio continental, por fora da estrutura da Uefa, de modelo fechado e participantes fixos.

Porém, a reação negativa do mundo do futebol foi imediata, principalmente na Inglaterra, e a maioria dos clubes integrantes abandonou a ideia da Superliga. Só restaram Real Madrid, Barcelona e Juventus — que recentemente também pulou fora do barco, a princípio.

O imbróglio foi parar na Justiça. A Uefa tentou punir os três clubes que continuavam a trabalhar pela criação da Superliga, mas isso foi anulado por ordem judicial.

A federação de futebol da Itália (FIGC) já anunciou que é totalmente contra o projeto e que vai excluir das competições domésticas todos os clubes que queiram fazer parte da Superliga.

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