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Por Rodrigo Lois — Rio de Janeiro e Valencia, Espanha


Vinicius Junior estará de volta ao estádio Mestalla neste sábado, pouco mais de nove meses depois de ter sofrido — e enfrentado — insultos racistas de parte da torcida do Valencia. Ninguém foi responsabilizado na Justiça por aquele episódio até hoje, e isso se repetiu em outros casos de racismo contra o atacante brasileiro.

Vinicius Junior foi alvo de racismo por parte da torcida do Valencia durante jogo no Mestalla, em 2023 — Foto: Getty Images

As imagens dos xingamentos e gestos racistas rodaram o mundo. Vini Jr chegou a deixar em aberto a possibilidade de sair da Espanha. O episódio, que não foi o primeiro e nem o último, evidenciou como esse problema social é pouco debatido e confrontado no país. Colocou sob análise as medidas tomadas por autoridades para enfrentá-lo.

A realidade é que Vinicius Junior foi alvo de racismo em estádios da Espanha pelo menos 20 vezes, até hoje. Ele está no pais há quase seis anos. O episódio mais recente foi em janeiro, antes do clássico contra o Atlético de Madrid pela Copa do Rei.

O ge procurou La Liga, a Comissão da Espanha contra Violência, Racismo, Xenofobia e Intolerância no Esporte, mais a Procuradoria-Geral do país, para checar o que foi efetivamente feito nos casos relacionados a Vini Jr.

Ao menos três denúncias foram arquivadas. Vários processos ainda seguem em andamento, aguardando depoimentos ou mais investigação. Ninguém foi condenado por crime de ódio (no qual se enquadra o racismo, na lei da Espanha). Clubes chegaram a banir torcedores, que também foram multados pelas autoridades esportivas.

Vinícius Júnior é premiado pela luta contra o racismo no futebol espanhol

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Denúncias arquivadas ou longe de desfecho

La Liga realizou, desde 2021/22 até hoje, mais de 15 denúncias aos órgãos competentes sobre atos racistas contra o brasileiro. Pela atual legislação espanhola, a liga não tem poder de punir torcedores, atletas ou clubes.

A liga informou que ontem foram tomados depoimentos dos investigados no caso de insultos no estádio do Valladolid, em dezembro de 2022. Mais pessoas serão ouvidas sobre os episódios de fevereiro de 2023, no jogo do Real contra o Mallorca, e de março, na partida contra o Betis.

Foram arquivadas as denúncias dos casos nos jogos: do Real contra Osasuna, de fevereiro do ano passado; contra o Valencia, de maio, do lado de fora do Mestalla; e da partida entre Mallorca e Valencia, em que seis torcedores colocaram um cartaz perto do estádio Son Moix com legenda racista dirigida a Vinicius Junior.

Jogadores do Real Madrid usaram camisas com o nome de Vinicius Junior, em apoio — Foto: Getty images

A denúncia sobre o episódio no Camp Nou em março de 2023 não avançou. O procedimento do caso de outubro, ocorrido durante o jogo entre Real Madrid e Sevilla, depende de resolução o Ministério Público — o Sevilla já identificou o torcedor.

O MP avisou no fim de fevereiro que iniciou os procedimentos de investigação pré-julgamento do ocorrido em janeiro deste ano nos arredores do Metropolitano, antes do clássico de Madri pela Copa do Rei. Em situação semelhante está a denúncia por insultos a Vinicius Junior antes de Getafe x Real Madrid, em fevereiro.

La Liga garantiu ter investido mais em tecnologia e canais de comunicação com torcedores e clubes, para aumentar o seu papel de fiscalizadora em atos racistas nos estádios, por conta do episódio no Mestalla. A liga também lançou em 2023 uma ferramenta de denúncia.

A liga chegou a criar, em fevereiro do ano passado, uma comissão especial para tratar dos casos de racismo contra Vini Jr. Após a publicação desta reportagem, La Liga explicou que essa comissão se reúne "com frequência", para analisar todos os casos e tomar decisões. A segurança em jogos do Real Madrid fora de casa foi intensificada, assim como a estratégia legal. .

Imagem institucional de campanha da La Liga contra o racismo — Foto: La Liga

Falta de dados consolidados

A Comissão Antiviolência afirmou que reforçou as medidas de prevenção e resposta a atos violentos e discriminatórios. Além disso, estabeleceu critérios para a suspensão imediata de jogos em que isso aconteça. A Comissão diz não ter dados de denúncias relacionadas a Vinicius Junior e não elabora relatórios anuais sobre racismo (salvo informes internos).

A última nota do ente, composto por membros de diferentes instituições que fazem parte do esporte na Espanha, que menciona racismo contra Vinicius Junior é de junho do ano passado.

A Procuradoria-Geral da Espanha informou que não realiza trabalho de investigação, mas dita critérios de atuação nas matérias de intervenção do Ministério Público. Também não compila estatísticas referentes a pessoas específicas.

Cabe a procuradoria de cada província da Espanha conduzir os processos em cada caso. No referente ao boneco com a camisa de Vinicius Junior, pendurado pelo pescoço por torcedores do Atlético de Madrid em uma ponte da capital — simulando enforcamento —, o Ministério Público pediu quatro anos de prisão. Processo segue em andamento.

No dia 20 de fevereiro, o procurador da unidade de delitos de ódio e discriminação, Miguel Ángel Aguilar, se reuniu com a diretora jurídica da La Liga, María José López Lorenzo. Foram estabelecidos critérios de cooperação entre a liga e o MP para episódios de racismo.

Manifesto em Madri, em junho do ano passado, em apoio a Vinicius Junior — Foto: Getty Images

Sete meses depois do ocorrido do lado de fora do Mestalla, o Ministério Público da Espanha solicitou ao Tribunal de Instrução de Valência o arquivamento do inquérito. O motivo seria a impossibilidade de identificar os autores atos preconceituosos, segundo o MP.

Haverá mais depoimentos sobre o caso dentro do estádio na semana que vem, segundo a agência de notícias EFE. Eu seu testemunho, Vinicius não afirmou que foi toda a torcida do Valencia que proferiu insultos racistas. Isso desmontou a polêmica de que ele teria acusado todos no estádio. Três pessoas seguem sob investigação das autoridades de Justiça.

Vinícius Junior chega a tribunal em Madri para depor sobre ataques racistas recebidos no Mestalla em Valencia x Real Madrid — Foto: AFP

O assunto voltou à tona no início desta semana. O Valencia barrou a entrada da Netflix no estádio Mestalla, ao descobrir que a produtora iria gravar trechos do jogo deste sábado para um documentário sobre Vinicius Junior. O clube também negou pedidos de entrevistas.

O Valencia, por outro lado, resolveu na sexta-feira hastear uma bandeira contra qualquer forma de discriminação no estádio Mestalla.

Esse jogo será especial para Vinicius Junior, mas por outros motivos: ele completará 250 partidas com a camisa do Real Madrid. Fora isso, é um compromisso como qualquer outro. E na quarta-feira o Real tem o jogo de volta (ganhou a ida por 1 a 0) contra o RB Leipzig, pelas oitavas de final da Champions League.

Valencia alça bandeira contra discriminação, às vésperas da volta de Vini Jr ao Mestalla

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