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Por Rômulo Quadra — Rio de Janeiro


Uma piscina com ondas, quebrando perfeito, todo santo dia, como uma rampa de skate. O surfe em piscina parecia futurista há alguns anos, uma realidade de filme dos anos 1980. Afinal, os surfistas mais velhos piraram ao ver Rick, protagonista do filme North Shore (Surf no Havaí, no Brasil) , vencer um campeonato de ondas artificiais. Pois é, bem-vindo ao futuro: há alguns anos já há piscinas para surfe em vários lugares do mundo, inclusive um em São Paulo. E a Surf Ranch Pro, próxima etapa da elite da Liga Mundial de Surfe (WSL), neste fim de semana (27 e 28 de maio), será numa praia artificial na Califórnia. Mas como deve ser feita a preparação física de um surfista para as piscinas de ondas?

Piscina de ondas do condomínio da Grama, interior de São Paulo

Piscina de ondas do condomínio da Grama, interior de São Paulo

O treinamento de um surfista, amador ou profissional, deve sempre ser direcionado ao tipo de estímulos que a onda vai oferecer, segundo o professor de educação física Allan Menache, preparador físico do tricampeão mundial Gabriel Medina. No vídeo acima, vemos uma onda na única piscina apropriada para surfe do Brasil, em São Paulo. E abaixo, Allan dá um bom exemplo de treino para se preparar fisicamente para surfar em piscinas, ambiente fechado e mais previsível, que independe da natureza.

Allan Menache, preparador físico de Gabriel Medina, dá exemplos de um treino para preparação física para surfe em piscina

Allan Menache, preparador físico de Gabriel Medina, dá exemplos de um treino para preparação física para surfe em piscina

Por ordem, os exercícios demonstrados no vídeo acima:

  1. Prancha com toque da mão alternada no ombro oposto - 20 repetições
  2. Flexão de joelho uni e bilateral com o pé/pés - 10 repetições cada
  3. Mobilidade de quadril e tronco 90/90 - 10 repetições cada lado
  4. Avanço com rotação de tronco tocando a mão no pé oposto - 10 repetições cada lado
  5. Push press superband - 10 repetições
  6. Opção do push press com halteres - 12 a 16 repetições
  7. Remada alternada em estabilização halteres - 12 a 20 repetições
  8. Cortador baixo cima medicine ball - 10 repetições cada lado
  9. Rotação do tronco e quadril em decúbito dorsal - 16 repetições alternado
  10. Salto vertical com contra movimento - 6 repetições
  11. Deslocamento frente costas zigue-zague cones - de 30s a 1m

- A preparação para piscina vai depender também de que tipo de onda a pessoa vai surfar. Se for na piscina do Kelly Slater, no Surf Ranch, a gente tem uma onda que dura 45s e que exige muita resistência dos membros inferiores. Eu sempre preparo meus alunos e atletas para esse desafio, com muita demanda de treinamento de membros inferiores, de agilidade, de potência, de força. Então, é muito necessário estar bastante resistente, estar com uma estamina muito grande nessa região. O core, que é o complexo lombo-pélvico-quadril, ele precisa ser muito treinado também. Ele precisa, junto das pernas, ser bastante estimulado para surfar essas ondas mais longas da piscina do Ranch - explica Allan Menache.

Allan prescreveu, no vídeo acima, exercícios que estão frequentemente dentro de um programa de treino para surfar em piscinas, mas que podem e devem ser combinados de forma diferente, de acordo com a especificidade de cada surfista

- O que traz o resultado positivo é a forma como ele é aplicado, a forma como o programa de treino é conduzido, são vários detalhes que devem ser levantados - diz o treinador, que entende que cada surfista merece um treinamento personalizado.

Nessa modalidade há uma demanda menor da remada. Embora sejam necessárias braçadas para entrar na onda e para voltar ao pico (ponto onde se entra na onda), na piscina a distância é predefinida, não tem arrebentação, correnteza, que podem dificultar a passagem do surfista pela zona de impacto.

- Eu diria que as pernas e a região do core são mais exigidas na piscina, em relação à necessidade de ombros, de braçadas, da resistência de membros superiores. Porém, eu tenho alguns alunos que surfam em piscina e que relatam que têm que remar bastante, por conta do número de ondas surfadas, em sessões de 1h30. Isso é uma característica do surfe na piscina, você pega muito mais onda, então consequentemente tem que voltar remando pro pico. Mas ainda assim, a exigência da remada em piscina é menor - explica.

Surf Ranch, na Califórnia, está no calendário da WSL e acontece agora 27 e 28 de maio — Foto: WSL / Cestari

Hoje, com a proliferação das piscinas pelo mundo, há um maior leque de ondas artificiais, esquerdas e direitas dos sonhos e que possuem suas especificidades e qualidades.

- A gente vai ter que observar o tempo de cada onda. Dependendo da programação da piscina, você tem ondas mais curtas ou mais longas, ondas mais buraco ou mais cheias. Então, você precisa ter uma preparação física bem semelhante ao surfe no mar. Eu diria que a piscina que merece uma maior especificidade de treinamento é a piscina do Surf Ranch, pela duração (45s) e a exigência do alto rendimento que ela demanda do surfista. Exige muita força e resistência dos membros inferiores e o core também é fundamental - avalia Allan.

Rampas perfeitas para voos

O surfe evolui como um todo, e pranchas mais leves e com o design moderno favoreceram o surgimento das manobras aéreas. E que lugar melhor para treinar uma manobra futurista que uma onda artificial? Por conta da previsibilidade e das rampas perfeitas, as aterrissagens são treinadas incessantemente pelos surfistas mais avançados nas piscinas. Sendo assim, a preparação física deve ser direcionada também ao nível e ao arsenal de manobras de cada praticante.

Gabriel Medina voa no Surf Ranch — Foto: @WSL / Kelly Cestari

- As manobras aéreas oferecem um grande impacto, principalmente para joelhos, tornozelo, quadril e coluna. Então, a gente tem por hábito, há bastante tempo, preparar nosso atleta amador ou profissional para poder suportar esses impactos, principalmente os mais novos, que têm já no seu repertório as manobras aéreas. É criada uma rotina de treinamentos e protocolos bem definidos para fortalecimento de pés, tornozelos, joelhos, quadril, coluna e ombros, para que os surfistas possam resistir melhor aos impactos - explica Allan, que conclui sobre o ambiente das piscinas:

- Por se tratarem de ondas sempre iguais, geralmente vai ter aquela mesma rampa para poder voar e, com isso, o surfista vai poder treinar mais vezes. Isso faz com que um atleta tenha maior número de aterrissagens numa sessão de surfe, em comparação com o esporte realizado no mar. Porém, um atleta de alto rendimento consegue equiparar o número de aterrissagens no mar e na piscina, porque possui habilidade e técnica para isso - diz Allan.

A importância do core

Core é o complexo de 29 músculos da região lombo-pélvico-quadril — Foto: IStock

A chave do sucesso pro surfista é ter um core (complexo de 29 músculos da região lombo-pélvico-quadril) bem treinado, fortalecido, do centro para as extremidades. O surfista que tem a região central do corpo tonificada é o que tem maior taxa de sucesso e de acerto nas manobras como um todo, como analisa Allan.

- A gente sabe que essa região central do corpo irradia força e energia pra pernas e braços. Então, a chave do sucesso para o surfista é estar muito forte na região central do corpo. Isso garante que ele tenha maior controle e coordenação. Garante que tenha maior capacidade de resistir aos impactos na aterrisagem das manobra, de projetar e de aplicar força na base da onda (ponto mais baixo da onda) e ao lip ( a crista, ponto mais alto da onda) tanto nas manobras de batida, como nas rasgadas, nos laybacks, nos bottom turns (cavada, manobra básica) mais profundos. O surfista que tem a região central do corpo fortalecida é o que tem maior taxa de sucesso, de acerto nas manobras como um todo.

No Brasil já há uma piscina em atividade

Por aqui, já há piscina de ondas em atividade, mas por ficar dentro de um condomínio de luxo, em São Paulo, o acesso é restrito a moradores e convidados. Outros projetos estão em andamento no país e podem sair nos próximos anos.

Água doce, preço salgado

A piscina de ondas mais famosa é a do Kelly Slater, parada oficial no Tour da WSL (Liga Mundial de Surfe), que leva o nome de Surf Ranch e fica em Leemore, na Califórnia - onde vai rolar a etapa do fim de semana. Mas não se engane, a água é doce, mas o preço para surfar por lá é bem salgado, como o mar. As diárias vão de 5 mil dólares a 7 mil dólares, ou de R$ 24.255 a R$ 33.957, na cotação desta sexta-feira (26/5), e o valor não inclui passagens e hospedagem, apenas a entrada e alimentação. A tecnologia disponibiliza uma onda a cada quatro minutos, o que dá o direito a surfar 15 ondas a cada hora.

Um pouco de história

As primeiras tentativas de criar ondas artificiais, iguais ou melhores que as do mar, foram na década de 90. Inclusive, o brasileiro Fabio Gouveia, o Fabuloso, foi campeão de uma etapa do mundial da ASP (antigo nome da WSL) em uma piscina japonesa, a Ocean Dome, na cidade de Miyazaki, no ano de 1994. "The Dome", como era conhecida, apesar de ser considerada a melhor onda artificial da época,no geral era uma onda fraca, que possibilitava duas ou três manobrinhas, no máximo. Além disso, era caro demais para ligar o maquinário. Dava pra chamar de elefante branco, mas é o Japão, né? Então, era um Godzilla, dispendioso, sem muita vantagem. Ainda mais por estar perto de destinos de surfe famosos do país, com altas e de graça.

Três décadas depois, as piscinas voltaram ao cenário do surfe mundial com ondas high-tech. Mesmo não sendo acessível a todos por questões financeiras, hoje o surfe em ondas artificiais é uma realidade promissora.

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