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Por Valmir Storti* — Rio de Janeiro


Em parceria com o economista Bruno Imaizumi, o Espião Estatístico apresenta a probabilidade de cada resultado nas quartas de final da Copa do Catar. Como parâmetros, o economista usou dados posicionais e de finalizações feitas e sofridas de jogos de Eliminatórias, amistosos e outras competições, como Liga das Nações da Europa e outros torneios continentais. Também foram considerados o Ranking da Fifa e características técnicas dos atletas. No final do texto, apresentamos uma metodologia.

Goleiro Gonda, do Japão, vê a bola dentro das redes após gol de Perisic, da Croácia, próximo adversário do Brasil — Foto: REUTERS/Matthew Childs

Quartas de final

Destacamos também características ofensivas e defensivas das oito seleções que passaram de fase. Hoje em dia, com tecnologia e dedicação, cada movimento de todas as seleções é conhecido. As equipes mais sofisticadas podem usar isso a seu favor, apresentando padrões nas fases iniciais que levem à interpretação que elas desejam para, em algum momento, fazerem algo novo, diferente, que foi treinado para aquele momento. Só sabemos o que já fizeram em campo, e é a partir disso que apresentamos as análises abaixo.

Brasil x Croácia

uw — Foto: Espião Estatístico

  • Contra a Coreia do Sul, o Brasil teve dois tempos distintos, quando demonstrou muita maturidade: na pressão do primeiro tempo que resultou em quatro gols e no respeito do segundo, quando poupou energia e administrou muito bem o placar. A Croácia sofreu apenas dois gols e em ambos os adversários cruzaram a bola pelo alto, do lado direito (esquerda da defesa croata). Das 68 finalizações feitas pelo Brasil, 21 nasceram em jogadas aéreas, 11 em cruzamentos, cinco da direita que exigiram duas defesas difíceis contra Suíça e Camarões. Das seis finalizações a partir de cruzamentos da esquerda, um já virou gol, de Lucas Paquetá após cruzamento de Vini Jr. Mas o jogo brasileiro tem sido dominantemente rasteiro, com seis dos sete gols sendo construídos assim. A seleção tem a seu favor alguns fatores desequilibrantes: conseguiu se desgastar menos poupando jogadores, e tem mais talentos no banco de reservas capazes de manter o alto nível quando começa a bater o cansaço. Entre os classificados, o Brasil tem a seleção mais objetiva da Copa, a que troca menos passes em média para cada finalização feita, com média de 17 finalizações por partida, a maior média dos oito países ainda com chances de título.
  • A Croácia desgasta os adversários, mas também vem se desgastando com isso. Dos 20 jogadores da Copa que mais fizeram corridas em "alta velocidade", como define a Fifa, três são crotas: Brozovic, Perisic e Modric. No Brasil, quem tem mais é Raphinha, na 60ª colocação, mas a seleção brasileira descansou jogadores na terceira rodada. Dos classificados para as quartas, a Croácia é a seleção e com maior distância percorrida acumulada no jogos (disputou uma prorrogação) e que mais tem corridas em "alta velocidade". Fez mais corridas entre 7 e 15 km/h e também entre 20 e 25 km/h entre todos os classificados. O Brasil ganha com mais corridas acima de 25 km/h, mas fica atrás de Marrocos. Detalhes chamam atenção em relação à Croácia, coisas pequenas que mostram como eles estão atentos a detalhes: a equipe tem nesta Copa seis finalizações a partir de rebatidas de arremessos laterais, contra três adversários diferentes. Das 43 finalizações, fez 17 a partir de jogadas aéreas. Dos oito cruzamentos finalizados, dois resultaram em gols, um de cada lado, mas seis vezes a bola subiu da esquerda. Em toda a Copa, a Croácia vem atacando principalmente pela esquerda (50% mais do que pela direita), e contra o Japão, nas oitavas, insistiu o dobro de vezes pela esquerda (8 a 4), buscando principalmente Perisic e Kramaric.

Holanda x Argentina

— Foto: Espião Estatístico

  • Quando este jogo começar, saberemos se ele ainda tem importância para a seleção brasileira. Se tiver, uma das questões envolvidas é que a Holanda tem quatro defensores pendurados com cartão amarelo: Aké, De Ligt (dois zagueiros), Frenkie de Jong e Koopmeiners (dois volantes). Um miolo defensivo inteiro. É digno de nota porque adversários da Argentina foram os mais punidos com cartões amarelos nesta Copa (13). Um dos motivos para isso é que atacar a Argentina não é fácil. Só a Inglaterra dos clssificados teve maior percentual de posse de bola (62,5% x 61,3%). A Argentina tem muito a bola, sabe o que fazer com ela e pará-la exige combate, faltas, cartões amarelos... De nada adianta se a Argentina classificar, evidentemente. A Holanda é a segunda equipe mais combativa entre os oito classificados na soma de desarmes (16 por jogo) e faltas cometidas (14,3), com média de 51,8% de posse de bola. É uma equipe até aqui muito eficaz, com oito gols marcados, média de um a cada 4,4 tentativas, sendo que nas oitavas de final, contra os Estados Unidos, fez três gols, em média um gol a cada 3,7 tentativas, uma marca impressionante. Mas há duas questões: a Holanda finaliza pouco, em média 8,8 vezes por partida, e a Argentina não é os Estados Unidos.
  • A Argentina tem a terceira maior média de finalizações entre os oito classificados (14,3) por jogo, mas praticamente com a metade da eficiência holandesa, um gol a cada 8,1 tentativas, que na classificação contra a Austrália virou um gol a cada 7,0 tentativas. Só Brasil e França fizeram mais finalizações do que Argentina de dentro da área (44 contra 42 da Argentina). A diferença é que a Argentina arrisca menos de fora da área: 74% das finalizações argentinas foram feitas de dentro da área, de onde é mais fácil fazer o gol. Só um dos sete gols argentinos foi feito de fora da área, da frente da meia-lua. A Holanda sofreu dois gols, ambos em jogadas rasteiras, e é exatamente esse o ponto forte da Argentina: fora dois pênaltis, a Argentina fez 55 finalizações e 45 delas em jogadas rasteiras.

Inglaterra x França

Devido aos arredondamentos, a soma das probabilidades é diferente de 100% — Foto: Espião Estatístico

  • Um clássico de eficiências: dos oito classificados, a Inglaterra é a seleção mais eficaz no ataque. Fez 12 gols e construiu isso com um gol a cada 3,8 tentativas. Nas oitavas, contra Senegal, foi ainda mais precisa: três gols, um gol a cada 2,7 chances. A França tem nove gols e conseguiu isso com um gol a cada 7,2 tentativas, praticamente a metade da eficiência inglesa. Nas oitavas, eliminou a Polônia por 3 a 1 com um gol a cada 4,7 chances. Os ingleses percorreram uma distância maior que os franceses no acumulado dos quatro jogos, mas é uma vantagem de 2,8% e ainda assim é quarta maior distância acumulada dos oito classificados, assim como é apenas a quinta em corridas em alta velocidade (e a França a sétima). Será maravilhoso observar a movimentação das duas equipes. A Inglaterra em toda a Copa está com equilíbrio de finalizações pela direita e pela esquerda, mas contra Senegal houve algo interessante: concluiu muito mais da direita (5 a 2), mas fez um gol da direita e dois da esquerda (em duas finalizações). Dos 12 gols marcados, foram cinco da direita e sete da esquerda, todos de dentro da área.
  • Uma diferença gigante entre os dois times é estratéfica: a França tem um time muito objetivo, que faz uma finalização em média a cada 33,8 passes trocados. Já a Inglaterra roda muito mais a bola, com uma finalização a cada 51 passes. Na frieza dos números, para cada dois passes da França, a Inglaterra dá três em busca de uma finalização, 51% mais. Com isso, até aqui, a França é a segunda que mais finaliza (16,3 vezes por jogo), e a Inglaterra, a quinta dos oito classificados (11,3). Outra diferença é a resistência defensiva (até aqui), o que será decisivo neste confronto épico: a França sofre um gol a cada 7,5 finalizações sofridas (30 finalizações contrárias e quatro gols sofridos, um deles de pênalti, o que contamina a média, mas é do jogo). A resistência inglesa nos quatro primeiros jogos foi de um gol sofrido a cada 18 conclusões contrárias. Só sofreu dois gols (um deles de pêanalti) em 36 conclusões contrárias. Das 36 finalizações sofridas pela Inglaterra, só seis chegaram no gol (17%). A França sofreu 30 finalizações, e nove acertaram o alvo (30%).

Marrocos x Portugal

Devido aos arredondamentos, a soma das probabilidades é diferente de 100% — Foto: Espião Estatístico

  • Já queridinho da Copa, Marrocos joga com o potencial que tem: se garante defensivamente. Diferentemente dos adversários anteriores, a Espanha conseguiu finalizar pela direita, o que Bélgica, Canadá e Croácia não conseguiram fazer. Mas acabou não tendo resultado, como já não dava atacar pela esquerda, também. Marrocos só sofreu um gol (e gol contra) em 33 finalizações, maior resistência defensiva do Mundial. A medição defensiva de Marrocos precisa ser diferente: das 33 finalizações sofridas, só oito chegaram no gol (24%), exigindo no máximo duas defesas difíceis. É a segunda melhor marca: de cada quatro finalizações sofridas, só uma chega no seu gol. Só a Inglaterra tem a defesa ainda mais protegida (16,7%). Dos oito classificados, Portugal está no extremo oposto. Das 39 finalizações sofridas, 15 acertaram o gol (38%), pior marca dos oito classificados. Com cinco gols sofridos, Portugal levou um gol a cada 7,8 conclusões contrárias.
  • Portugal é uma equipe que finaliza o dobro de vezes do lado esquerdo (24) em comparação com o lado direitoo (12). E foi quando tentou atacar pela esquerda (direita da defesa do Marrocos) que os adversários tiveram maior dificuldades. A superioridade técnica ofensiva de Portugal (exibida na histórica goleada por 6 a 1 sobre a Suíça na rodada passada), colocará à prova essa resistência marroquina, embora satisfação conquistada com goleadas históricas possa causar um relaxamento. Portugal tem 12 gols marcados na Copa, dois em cobranças de pênaltis. Dos outros dez gols, foram quatro finalizações da direita e seis da desafiante esquerda, onde Marrocos tem neutralizado melhor seus adversários. O jogo de Portugal é basicamente rasteiro: só dois gols nasceram em jogadas aéreas. Das 52 finalizações, em apenas 11 bola viajou pelo alto.

Metodologia

O modelo empregado nas análises segue uma distribuição estatística chamada Poisson Bivariada, que calcula as probabilidades de eventos (no caso, os gols de cada equipe) acontecerem dentro de um certo intervalo de tempo (o jogo). Para chegar às previsões sobre as chances de cada time terminar a primeira fase da Copa em cada posição foi empregado o método de Monte Carlo, que basicamente se baseia em simulações para gerar resultados. O estudo foi desenvolvido a partir de dados de diversas fontes, como Futhead, Globo, Fifa, Footstats e Opta.

*A equipe do Espião Estatístico é formada por: Guilherme Maniaudet, Guilherme Marçal, João Guerra, Leandro Silva, Leonardo Martins, Roberto Maleson e Valmir Storti. Pesquisa de dados de velocidades: Gusthavo Macedo

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