Escrevi há alguns dias aqui que a Espanha era a seleção que mais dava gosto de ver jogar. Ao menos para mim, que sou um profundo admirador de quem domina o fundamento do passe no futebol. A vitória maiúscula da garotada espanhola sobre a anfitriã Alemanha, carregada nas costas em casa por sua fanática torcida, só reforça a minha percepção. Foi um baita jogo de bola. Deu Fúria, porque o time de De La Fuente tem enorme qualidade no toque, quase absoluta precisão no passe e mesmo nos momentos mais tensos de um duelo dessa natureza tem uma enorme segurança de quem confia no próprio taco. Mas podia ter dado Alemanha, que é um gigante do futebol seja lá onde for o jogo, que tem jogadores com o talento de Neuer, Kimmich (que partidaça este fez), Rudiger, Kroos, Havertz, Musiala... E que tem uma força física que poucos igualam.
Espanha 2 x 1 Alemanha | Gols | Quartas de final | UEFA Euro 2024
Não sei se a Espanha chegará ao tetra europeu. Tendo acompanhado o surgimento dessa nova geração na base e na conquista da Liga das Nações, imaginei que esse time estaria bem maduro para vencer, quem sabe, a partir da Copa do Mundo de 2026. Mas, como considero esse time (atenção: eu disse time, não valores individuais) com mais potencial (atenção: se é potencial, ainda precisa se confirmar) do que a geração que mandou no mundo da bola entre 2008 e 2012, é possível que a nova Fúria queime etapas.
Muita gente ainda teima em criticar aquela Espanha. Só faz isso ou quem acha que futebol é apenas gol e resultado ou quem não torce para a seleção espanhola. Quem gosta do jogo ou é espanhol, ter a bola em 70% é um bálsamo aos olhos. O time de Vicente del Bosque, herdeiro da proposta holandesa do Barcelona, tinha um goleiraço (Casillas), uma saída de três com firmeza e experiência (Sérgio Ramos, Piqué e Puyol), transição absolutamente diferenciada com Xabi Alonso e Xavi, e um Iniesta imarcável para atacar os espaços. Mas àquele time faltava jogo pelos lados. Porque os laterais não eram tão bons ofensivamente e não havia nomes para as pontas. A coisa acabava funcionando porque havia o pouco valorizado mas excepcional Davi Silva, que tentava estar nos dois lados ao mesmo tempo, mas como não dava pra ser onipresente, priorizava o lado mais fraco dos adversários.
O time atual ainda precisa se provar individualmente melhor do que aquele. Tem um excelente goleiro (Unai Simon), uma respeitável parelha de beques (Le Normand e Laporte), Rodri é o melhor volante do mundo, Pedri e Gavi (que não foi à Euro) são jovens, ágeis e talentosos... e agora a Espanha tem jogadores de lado sobrando: Nico Williams, Lamine Yamal e Dani Olmo. Contra a Alemanha, teve o controle do jogo até os 35 do segundo tempo, quando a divisão Panzer alemã partiu com tudo (inclusive competência). E empatou o jogo com o não menos brilhante Wirtz.
Se o jogo tivesse mais 10 minutos, talvez a Alemanha virasse - entre outras coisas porque a pressão impedia a Espanha de botar a bola no chão. Mas com mais 30 minutos de prorrogação, tudo igual, cinco minutos para os espanhóis voltarem ao normal, dava para ver que, no novo cenário, era a Espanha quem voltava ao controle e, na maravilhosa troca de passes, minava os tensos anfitriões. Não é para qualquer um colocar na roda uma Alemanha, em casa, num mata-mata, com os jogadores que a seleção tem. Mas a Espanha colocou, e teve paciência até Dani Olmo (outro que fez um jogo monstruoso) achar Merino livre na área.
As duas seleções que lutarão pela vaga na final chegam no bagaço por prorrogações, a Espanha ainda terá suspensões. A Fúria terá ainda um desfalque decisivo: Pedri lesionou o joelho e está fora da Euro (atingido deslealmente por Tony Kroos, que nem cartão levou nesse lance, que despedida feia do futebol teve o craque alemão...). Mas se Dani Olmo, que o substituiu, jogar o que jogou contra a Alemanha, o time de De La Fuente não perderá o favoritismo...
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