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Por Carlos Eduardo Mansur

Jornalista. No futebol, beleza é fundamental


É possível falar de alterações de posicionamento, de intervenções do treinador, e certamente cada um destes eventos terá seu papel para mudar os rumos de um jogo. No entanto, não há mudança tática tão impactante numa partida de futebol quanto um gol. E ao marcá-lo, aos 34 minutos do duelo com o Paraguai, o Brasil criou para si uma circunstância que a estreia contra a Costa Rica não proporcionara: o talento da seleção brasileira atacando espaços mais generosos. A combinação costuma ser fatal. Um jogo difícil, desconfortável, entre pequenas evoluções e alguns problemas que voltavam a se apresentar, rapidamente se resolveu.

O Brasil ainda voltou, em muitos momentos, a produzir lances em que as soluções dependiam demais da individualidade. E na noite de Las Vegas, um recital de Vinícius Júnior, típico de um favorito ao prêmio de melhor jogador do mundo na temporada, ofereceu os melhores caminhos ao Brasil. O mundo vive discutindo por que jogadores aclamados em clubes, por vezes, não têm rendimento similar em suas seleções. O caso brasileiro é emblemático: num trabalho em estágio ainda inicial como é o da comissão técnica atual, não é fácil criar os contextos de clubes, em que há o dia a dia de treinos. Mas, contra o Paraguai, Vinícius desconheceu obstáculos.

Vinicius Junior comemora gol do Brasil contra o Paraguai — Foto: Kevork Djansezian/Getty Images

Claro que houve progressos. Houve mais momentos em que o time tentou atacar em profundidade, ocupou mais a defesa rival, viu Wendell se oferecer mais como opção pela esquerda. Mas ainda em ocasiões esparsas. Até a abertura do marcador, persistiam as sensações de uma certa falta de agressividade, de aproximações e de jogadores atacando a linha defensiva paraguaia. E, sem bola, a proteção da entrada da área ficou abaixo do esperado. O que mudou, de fato, foi a postura do rival. Ao contrário da Costa Rica, o Paraguai tentou jogar. E, claro, sofreu o primeiro gol. A partir daí, o jogo destravou e a seleção teve espaços – bem aproveitados, diga-se. Até o 1 a 0, a partida não dava indícios de que terminaria em goleada.

Times que existem há pouco tempo, caso desta seleção vítima do desgoverno da CBF, precisam ser avaliadas em amostragens maiores. Do contrário, o risco é transitar com velocidade acima do recomendável entre a euforia e a depressão. O próprio Dorival Júnior, apenas em seu segundo jogo oficial no cargo, ainda lida com problemas inesperados que algumas partidas oferecem. Aconteceu algo importante na goleada sobre o Paraguai.

Há uma clara ideia de evitar que Rodrygo e Vinícius Júnior precisem retornar ao campo defensivo sempre que o Brasil perde a bola. Para equilibrar o time na hora de defender, a seleção forma duas linhas de quatro homens. Na primeira, estão os zagueiros e laterais. Na segunda, João Gomes se desloca para o lado esquerdo, por onde, em tese, cobre Vini ou Rodrygo. Pela direita, Savinho faz a recomposição e, no centro, ficam Bruno Guimarães e Paquetá, este último um jogador menos forte na proteção da área.

Eram 15 minutos quando Bobadilla recebeu com certa liberdade e Alisson precisou fazer grande defesa. Ali, Dorival interveio e moveu Paquetá para a esquerda e trouxe João Gomes para o centro, formando a dupla de volantes com Bruno Guimarães na hora de defender. O Paraguai não deixou de ameaçar e a seleção não se tornou uma rocha defensiva, mas a capacidade de recuperações de bola de João Gomes mostrou-se importante. Seu papel com bola, este sim, ainda gera debates válidos.

No entanto, tal mexida impactou a forma de atacar. Paquetá usualmente forma com Rodrygo uma dupla no centro do ataque, cabendo a ele se posicionar mais à direita. Ao passar para a esquerda, o que se moveu foi o eixo do ataque do Brasil. Porque os raros momentos de aproximações e trocas de passes aconteceram no setor esquerdo, juntando o próprio Paquetá com Rodrygo e Vinícius. Se na estreia era Vini Jr quem parecia isolado, desta vez quem se viu mais solitário foi Savinho, que ainda assim teve boa atuação.

A seleção nem sempre era agressiva, nem sempre ocupava a linha defensiva paraguaia ou chegava com tanta gente à área. Rodrygo já recebera bolas tendo um mar de defensores ao seu redor, e o mesmo ocorrera com Vinícius. Até que surgiu o lance do gol, em que os dois atacantes, mais Paquetá e Bruno Guimarães estavam próximos. O gol é resultado de uma jogada belíssima.

É um bom sinal, mas ainda um momento que precisa se repetir mais no jogo brasileiro. As dinâmicas ofensivas ainda parecem estar em desenvolvimento, e só o tempo dirá em que nível chegarão. Sem bola, o time permitiu 15 finalizações ao Paraguai, o que não é um número estimulante. Mas, ao ter espaço, produziu para fazer até mais do que os quatro gols marcados. O jogo ganhou outra cara quando o Brasil se viu em vantagem.

O futebol brasileiro desrespeitou processos desde que terminou a última Copa. Não seria justo imaginar um time pronto a esta altura. Ao menos, a goleada praticamente assegura um lugar na próxima fase. Da noite de Las Vegas, a melhor recordação será a forma como Vinícius Júnior fez todo mundo perceber que o jogo seria dele.

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