• Não aceitar as pequenas faltas

    O mestre pediu aos seus discípulos que conseguissem comida. Estavam viajando, e não conseguiam se alimentar direito.

    Os discípulos voltaram no final da tarde. Cada um trazia o pouco conseguido por meio da caridade alheia: frutas já podres, pães duros, vinho azedo.

    Um dos discípulos, porém, trazia uma saca de maçãs maduras.

    “Farei sempre todo o possível para ajudar meu mestre e meus irmãos”, disse ele, dividindo as maçãs com os outros.

    “Onde você arranjou isto?”, perguntou o mestre.

    “Tive que roubá-las”, respondeu o discípulo. “Os homens só me deram alimentos velhos, mesmo sabendo que pregamos a palavra de Deus”.

    “Pois vá embora com suas maçãs, e não volte nunca mais”, disse o mestre. “Aquele que rouba por mim, terminará roubando de mim”.

  • Que sabedoria há na solidão

    O mestre Kais caminhava com seus discípulos pelo deserto, quando encontrou um ermitão que ali vivia há anos. Os discípulos começaram logo a crivá-lo de perguntas sobre o universo - mas terminaram descobrindo que o homem não possuía toda a sabedoria que parecia ter.

    Ao comentarem isto com Kais, este respondeu:

    “Não consultem nunca um homem preocupado, por melhor conselheiro que seja; não peçam ajuda ao orgulhoso, por mais inteligente que possa parecer. Pois as preocupações e a vaidade turvam o conhecimento. Sobretudo, desconfiem daquele que vive na solidão; geralmente não está ali porque renunciou a tudo, mas sim porque nunca soube viver com os outros. Qual a sabedoria que podemos esperar deste tipo de gente?”

  • A escuridão de um falso mestre

    O mestre encontrou-se com os discípulos certa noite, e pediu que acendessem uma fogueira, para que pudessem conversar.

    — O caminho espiritual é como o fogo que arde diante de nós – disse.
    — Um homem que deseja acendê-lo tem que se conformar com a fumaça desagradável, que torna a respiração difícil e arranca lágrimas do rosto.
    Assim é a reconquista da fé.
    — Entretanto, uma vez o fogo aceso, a fumaça desaparece, e as chamas iluminam tudo ao redor - nos dando calor e calma.
    — E se alguém acender o fogo para nós? – perguntou um dos discípulos.
    — E se alguém nos ajudar a evitar a fumaça?
    — Se alguém fizer isto, é um falso mestre. Que pode levar o fogo para onde tiver vontade, ou apagá-lo na hora que quiser. E como não ensinou ninguém a acendê-lo, é capaz de deixar todo mundo na escuridão.

  • Recriando o Passado

    Um homem depende do tempo e das estações, para conseguir sobreviver às coisas inevitáveis. O pastor cuida de seu rebanho, trata cada animal como se fosse o único, procura ajudar as mães com as crias, jamais se afasta muito de um lugar onde os animais possam beber. Entretanto, uma vez por outra, uma das ovelhas termina morrendo num acidente. Pode ser uma cobra, um animal selvagem, ou mesmo a queda de um precipício.

    Mas o inevitável sempre acontece.

    É preciso disciplina e paciência para ultrapassá-lo.

    E esperança. Quando ela não existe mais, não se pode gastar as energias lutando com o impossível.  Não se trata de esperança no futuro. Trata-se de recriar o próprio passado. As pessoas se dirigem a algum lugar e um dia retornam.

    Alguns não conseguem encontrar o que estavam buscando, porque tinham carregado consigo - junto das bagagens - o peso do próprio fracasso anterior.  Uma ou outra volta com um emprego no governo, ou com a alegria de ter educado melhor os seus filhos - mas nada além disso. Porque o passado as havia deixado temerosas, e não tinham confiança suficiente em si mesmas para arriscar muito.

    Outras pessoas também retornavam, mas com histórias maravilhosas.

    Tinham conquistado tudo que desejavam, porque não estavam limitadas pelas frustrações do passado.

    Se você tem um passado que não o deixa satisfeito, esqueça-o agora. Imagine uma nova história para a sua vida, e acredite nela. Concentre-se apenas nos momentos em que conseguiu o que desejava - e esta força irá lhe ajudar a conseguir o que quer.

  • Depois da morte

    O imperador mandou chamar o mestre zen Gudo à sua presença.

    “Gudo, ouvi falar que você é um homem que tudo compreende”, disse o imperador. “Eu gostaria de saber o que acontece com o homem iluminado e com o pecador, depois que ambos morrem?”

    “Como vou saber?”, respondeu Gudo.

    “Mas, afinal de contas, você não é um mestre iluminado?”

    “Sim, senhor. Mas não um mestre morto!”

  • Aproveite as oportunidades

    Na antiga Roma, um grupo de feiticeiras conhecidas como Sibilas escreveu nove livros contando o futuro de Roma. Levaram os nove livros para Tibério.

    “Quanto custa?”, perguntou o imperador de Roma.

    “Cem moedas de ouro”, responderam as Sibilas.

    Indignado, Tibério expulsou-as. As Sibilas queimaram três livros e voltaram.

    “Continuam custando cem moedas”, disseram.

    Tibério riu e não aceitou pagar por seis livros o mesmo que pagaria por nove?

    As Sibilas queimaram mais três livros e voltaram com os três restantes.

    “Continuam custando cem moedas de ouro”, disseram.

    Tibério, mordido pela curiosidade, terminou por pagar, mas só conseguiu ler parte do futuro de seu império.

    Diz o mestre: faz parte da arte de viver não barganhar com a oportunidade.

Autores

  • Paulo Coelho

    Imortal da Academia Brasileira de Letras e Mensageiro da Paz da ONU, autor do fenômeno literário “O Alquimista”, livro brasileiro mais vendido de todos os tempos.

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Imortal da Academia Brasileira de Letras e Mensageiro da Paz da ONU, autor do fenômeno literário “O Alquimista”, livro brasileiro mais vendido de todos os tempos.