Dá pra resumir?

seg, 19/05/08
por Zeca Camargo |
categoria Todas

Estava tudo pronto, até que, mais uma vez, a imprevisível mão do acaso veio tirar este blog do curso que eu havia planejado para ele. O post de hoje – que, automaticamente está transferido para quinta – seria sobre o tema “como envelhecer com dignidade” – e, ao contrário do que os mais engraçadinhos possam insinuar, não era autobiográfico, mas sim sobre artistas (uma cantora e uma banda) que apareceram com seus discos de estréia em 1983 e acabam de lançar dois novos e excelentes álbuns, mostrando que, numa carreira de 25 anos, é possível perdoar fases ruins, desde que – aqui e ali – eles ofereçam trabalhos geniais como esses mais recentes. Matou a charada? Se não quer arriscar agora um palpite sobre quais são esses artistas, volte daqui a três dias, porque hoje vou ceder, como já adiantei acima, aos caprichos do acaso e comentar um comentário enviado sobre o último post.

Quem fez a “provocação” – creio eu, sem a menor pretensão de ter um post totalmente dedicado a ela – assina como Lorena, e todo o conteúdo da sua mensagem está no título do post de hoje. Isso mesmo: ao convite à reflexão sobre o livro de Zuenir Ventura – na verdade, o próprio texto uma provocação aberta a uma geração que tem interesse zero pelo passado em geral, e menos ainda pela comemoração dos 40 anos de uma verdadeira revolução cultural – tudo que ela foi capaz de expressar era isso… “dá pra resumir?”.

Claro que dá, Lorena, e eu vou fazer exatamente isso antes de concluir o texto de hoje. Mas antes, queria aproveitar esse gancho que você proporcionou para abrir um pouco mais a discussão – algo que certamente não vai te interessar, Lorena, mas que, conhecendo quem passa sempre por aqui, pode provocar muitos outros debates interessantes.

Ao puxar essa conversa, sei que estou transgredindo um dos meus princípios dessa atividade de blogueiro, que é justamente não perder tempo com comentários que não valem a pena… Como você, leitor deste espaço já há algum tempo sabe, minha proposta é sempre um debate, digamos, saudável – pegar um assunto com potencial instigante, jogar para cima e esperar a sua opinião, que, na grande maioria das vezes, acrescenta algo à discussão. Nas semanas recentes, tive um enorme prazer de ver isso se desenvolver a partir de assuntos tão diversos como a nossa cultura da celebridade ou a pobreza de rotular artistas apenas por sua opção sexual. Posso ainda buscar exemplos mais antigos, como quando falamos da ausência da identidade negra nas artes plásticas no Brasil, ou sobre nossa capacidade infinita de comprar livros que nunca conseguimos ler, ou ainda, sobre livros que debatiam a existência de Deus, a reação da platéia ao assistir “Tropa de elite”, a natureza dos fãs. Na verdade, uma das coisas que mais me surpreendem nesses quase dois anos de blog é a capacidade de as pessoas sempre darem uma opinião interessante – ainda que não necessariamente concordando com o que eu escrevi – sobre qualquer assunto proposto. Da simples definição do que é um bom trailer ao convite para sugerir músicas para uma festa, há uma vontade – sempre bem-vinda – de participar. E se um blog não existe para isso, então não sei para o que é.

Mas aí vem a Lorena, e com uma simples pergunta me faz pensar sobre o que significa essa nossa troca aqui. Mais de uma vez, e especialmente em “datas festivas”, fiz um questionamento sobre o que significa essa nossa… relação, o que me leva a escrever, e o que leva você a me escrever. Em sempre tirei conclusões otimistas: vale mesmo a pena todo o esforço (o meu, o seu, o nosso), porque o resultado final é sempre – para usar uma expressão ligeiramente pretensiosa – iluminador. Dá para resumir? Ainda não, espere um pouco.

Num primeiro momento, me lembrei daquela figura na sala de aula– você certamente sabe localizar alguém na sua escola que era assim –, que fazia sempre um comentário engraçadinho sobre tudo o que o professor, ou a professora, falava. Era até engraçado, especialmente se você também não estava a fim de prestar atenção na aula. E, usando essa imagem, registrei o comentário da Lorena como mero ruído.

Até que percebi que a situação é totalmente diferente – especialmente porque isto aqui não é uma sala de aula. Claro que isso aqui não é uma sala de aula, mas onde eu quero chegar é que ninguém tem a obrigação de “freqüentar” isso aqui. Lê quem quer – algo tão óbvio que me sinto até meio constrangido de ter que evocar… E, seguindo o raciocínio, comenta quem quer – e o que quer, assim como eu também escrevo o que eu quero.

Mas o que me incomoda no “pedido” da Lorena é a tentativa disfarçada de tentar enquadrar um formato que simplesmente não tem formato nenhum – o do blog. Não era mais uma das reclamações (já sublimadas) sobre o tamanho do texto do post. Escondida na inocência da pergunta está a preguiça perene de uma geração que não quer pensar – e por “geração” não estou definindo ninguém por faixa etária, mas sim por atitude diante de um texto.

Novamente, isso seria engraçado no colégio, quando o grande barato (que, na época, a gente nem conseguia elaborar) era ser inconseqüente. Mas aqui, num espaço livre como esse, num diálogo aberto como o nosso, em tempos esclarecidos como esses, onde a internet é uma ferramenta tão transparente de relacionamento, qual o sentido de, diante de um texto que – ironicamente – comentava a resistência de muitos a assuntos um pouco mais elaborados, fazer uma gracinha como essa?

Estou com preguiça, é verdade. Preguiça de lembrar que nem todo mundo que passa por aqui quer participar desse debate. Preguiça de reconhecer que sempre a gente tem que enfrentar esse tipo de atitude negativa quando expõe as opiniões. Preguiça de tentar convencer pessoas como a Lorena de que ela pode aproveitar seu tempo melhor do que pensando em maneiras de como sabotar um convite para o diálogo.

Ao mesmo tempo, me sinto um pouco arrependido de talvez ter mordido uma isca menor, quando a maior parte dos comentários (sobre este, e tantos outros posts) tem a ver justamente com essa conversa saudável que eu me esforço em estabelecer. Será que a Lorena merecia toda essa reflexão? Talvez ela mesma não – afinal, mal a conheço, e tudo que penso dela é derivado das três palavras que ela me enviou –, mas seu comentário certamente contribuiu para a evolução deste blog – ainda que, talvez, não da maneira como sua autora pretendia.

Enfim, na quinta-feira então, retomamos o curso. Temos que falar de tanta coisa: os artistas que “esbocei” no início do texto (já descobriu quem são?), um novo (velho?) Indiana Jones, uma nova novela das oito (das nove?) que promete, o novo livro do sempre sensacional Hanif Kureishi, o número sobre dinheiro da revista “Colors”, “Sex and the City” etc etc etc. Tudo, garanto, com quantas palavras eu achar necessário para exprimir o que eu quero dizer e para inspirar você a escrever aqui.

Mas antes de terminar, porém, num enorme exercício de comedimento, vou atender ao apelo de Lorena usando menos palavras ainda do que as que ela selecionou para formular sua pergunta: “Dá pra resumir?”. Claro que dá: “Leia mais!”.

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181 Comentários para “Dá pra resumir?”

Páginas: [10] 9 8 7 6 5 4 3 2 1 »

  1. 181
    ANDRE BAIA:

    ZECA

    MEU NOME É ANDRÉ E SOU ADMIRADOR DO SEU TRABALHO,
    E GOSTARIA DE PEDIR UM POST COMPLETO SOBRE A MINHA CIDADE BELÉM DO PARÁ, E SABER QUAL A SUA OPINIÃO SOBRE A DIVISÃO DO TERRITÓRIO PARAENSE. GRANDE ABRAÇO.

  2. 180
    Ricardo Geromel:

    Obrigado Zeca! Este post me faz pensar que você parece ser muito fiel a você mesmo. Como fellow blogger sei como isso não é fácil.

    Resposta do Zeca – fala Ricardo! Boa – essa é, de fato, a fidelidade mais complicada… Um abraço!

  3. 179
    Thabata:

    Gosto do seu blog, apesar de não acompanhar sempre. Mas escreva sempre e não poupe os seus leitores de ter o prazer de ler os assuntos mais variados que você oferece!!!
    Parabéns!

  4. 178
    violeta vargas:

    Oi Zeca. Sei q já houve muitos comentários. Mas eu me sinto na “obrigação” de comentar tbém…rs…rs…Adorei a sua resposta para tal que anda com preguiça mental como muitos que andam por ai. A pergunta que ñ quer calar: Pq ela se dá ao “trabalho” de freqüentar esse blog? Já que nem aprecia leituras culturais e “saudáveis” como as do seu blog?
    Quanto a mim, chego da facul, pensando em dar só uma olhadinha e quem disse que consigo, dar só uma “ollhadinha” tenho que ler tudo até as “entrelinhas”…rs…
    ah! mesmo sendo professora de port/inglês, cometi um terrível erro de ortografia. Nem vou dizer qual, tão grande que nem posso dizer que foi um “lapso”. É isso que dá, quando resolvemos escrever, depois de ter lido quase 100 redações, dos alunos do fundamental e médio. Ao final, tbém esquecemos de como se escreve determinadas palavras.

    Qt à alusão que vc faz, a cantora é Madonna, eu penso.
    Um abração
    violeta

  5. 177
    Dani Pessoa:

    É a primeira vez que visito os blogs da glob.com e resolvi ler o seu. ADOREI!
    A graça do blog é justamente essa liberdade em poder escrever quando, como e do jeito que lhe convier exatamente como vc faz.
    A frase que me fez pensar foi a parte em que vc diz: “Lê quem quer.”

    Eu vivo me perguntando o que certas pessoas pensam quando resolvem fazer comentários ‘sem noção’. Gosto das críticas, quando possuem algum fundo positivo; dos elogios ou das reclamações, mas com intuito em contribuir.

    A resposta pra essa “dúvida cruel” (tá, foi uma piadinha kkk) me parece bastante simples:
    Eles não querem ler. Desejam ser lidos!

    A vontade em serem apreciados supera o talento da escrita e os fazem pagar qualquer preço pela pequena (ou não) atenção que tomam dos demais, quando estes respondem.
    No fundo desejariam ter capacidade e disposição para escreverem dúzias de livros. Hehehehe.

    Em homenagem, deixo este comentário gigante.
    E viva a liberdade de expressão, mesmo que nada seja expresso.
    E um chega aos silenciadores de palavras!

    beijos, Zeca e muito sucesso pra ti!

  6. 176
    daniel:

    Ola Zeca… adorei seus argumentos… e tb estou desapontado com a geraçao O à esquerda;;;

  7. 175
    LUCIA:

    Oi Zeca, da uma resumida na Lorena e pula para o próximo belo assunto.MADONNA?Quero meus bisnetos assistindo “ELA” ao vivo como eu,espetaculo.Beijões

  8. 174
    Wunsch:

    mto grande, parei de ler qdo li a palavra everybody

  9. 173
    Pedro Giachetta:

    [b] “Posso fazer uma pergunta” ? Já fazendo, quais os livros que tem mais saida no mercado hoje em dia?
    eu estou fazendo um livro de poemas e queria fazer um de opiniões ou talvez um estilo trama de filme.
    Qual você indica para melhor aceitação no mercado?
    Bjos!
    Me responda no email ou pelo orkut em depoimento!

  10. 172
    Pedro Giachetta:

    Zequinha!
    (Você não me conhece eu sei), mas gosto de ser gentil “risos”, A Algum tempo atrás eu tinha realmente preguiça também como a nova geração de ler, mas como a faculdade exige e como passei a amar de paixão, ler artigos de opinião e noticiarios de TV (fantastico o melhor claro…estou puxando o saco mesmo porque é de ótima qualidade ainda mais com o Zequinha).
    Adorei seu texto “Da pra resumir?” O Senhor nobre Zeca Camargo esta com toda razão, a nova geração esta muito preguiçosa mesmo.
    Conheci seu blog esses dias e frequentarei sempre!
    Beijos!

  11. 171
    Su:

    Estive no Café Literário na Bienal do livro aqui em BH! Não conhecia seu blog, mas tive imensa curiosidade depois do “causo” contado. Bom… resumindo mais ainda “perfeito”!

  12. 170
    magda:

    Zeca como sempre você escreveu esse texto muito bem, pois o blog um maneira de interação com o público e lê quem tiver vontade não é mesmo? seus textos me fazem refletir, coisa essa que no mundo de hoje é muito raro ver um jovem da minha idade fazer.
    “Leia mais” foi ótimo……..exelentes argumentos para o comentário da Lorena.
    Beijão até mais

  13. 169
    Júlio:

    O Post é muito bom.
    Refletir sobre a preguiça em aprofundar, principalmente em tempos de tanta superficialidade, é muito pertinente. Mas acredito que deveria ser menos pessoal.
    Não conhecemos a Lorena ou suas intenções ao tecer o comentário. Ela poderia estar se referindo ao prolixo, por exemplo, como foi citado acima. O que mereceria outra reflexão.
    Acredito que o debate seja para alimentar e fazer crescer, não para se chegar a uma conclusão.
    Questionar é mais interessante do que ter a resposta.

  14. 168
    José Victor:

    Zeca…
    o que eu mais gostei desse seu post foi o fato de que geralmente as pessoas cultas não perdem tempo em rebater críticas mediocres e outras partem logo para baixaria!
    vc é demais cara!
    deu uma lição de moral com uma classe que poucas pessoas tem!
    “Leia mais!” foi demais!

  15. 167
    Raphael:

    Oi zeca, tudo bem? adoro sua coluna…. sempre passo para dar uma lida… comecei a escrever um BLOG tbm se puder passar la .. seria bem legal!! abracos

    https://relatosparadoxais.blogspot.com/

  16. 166
    Fernando:

    Zeca

    Não consigo acompanhar todos os comentários da sua página; mal tenho tempo para ler todas as postagens. Me incomoda, um pouco, a linguagem meio “teen” que acontece às vezes nos seus textos, mas é do jogo. Tem de escrever para um público de A-ha a U2… Ou seria de A-ha (aqueles fãs teens de quando apresentava o drops MTV) aos novatos ativistas “emmos”?

    Bem, não vem ao caso. Mas com certeza sua dedicação a este blog pode levar muita gente, como eu fui motivado quando tinha meus 15/16 anos a ler e conhecer coisas de pop a heavy metal. Eu gosto muito de ler seus textos e dou-lhe os parabéns também por apresentar um Fantástico cada vez mais fantástico.

    Quanto ao tamanho dos seus textos, são até pequenos em relação ao que tem a dizer. Naqueles seus 15 segundos para falar de você, só faltou um beat para conseguir falar mais rápido que o falecido deputado Enéias…

    Outra coisa, por que faz tão pouco uso do “ponto-e-vírgula”?

    Só para terminar, aquela sua entrevista no “Sempre um papo” (TV Câmara) foi maravilhosa. Quando vai sair um livro seu de ensaios?

  17. 165
    Thiago:

    Lê quem quer, escreve quem quer, responde quem quer.. e acho também que “se interessa pelo assunto quem quer e se sente interessado”. Se a tal Lorena não se sentiu interessada por um assunto como este, não da para julga-la. Agora, realmente também é no minimo indelicado comentar o assunto infantilmente como ela fez.
    Enfim, acho que tem outros Posts do Blog bem mais interessantes que este ultimo, e acho que aceitar o comentario e ainda dedicar um post inteiro para uma pessoa que faz um comentario bobo como este, no fim, atingiu o objetivo dela. Tem muita gente que escreve muita coisa boa nos comentarios e ainda não teve um post exclusivo sobre seu ponto de vista.

  18. 164
    Heitor Diniz:

    O império da mediocridade avança sobre a raça humana! É triste e desesperador pensar como um batalhão de gente hoje em dia se exime justamente… de pensar! Qualquer mínimo exercício de reflexão torna-se tarefa hercúlea, que no mais das vezes, resulta em “ah, deixa pra lá…!”. Ou então na emblemática “dá pra resumir?”. O pensamento, a reflexão e o exercício da abstração, cara Lorena, caro Álvaro e amigos, são a base que nos diferencia dos animais irracionais. Não sei fazer juízo de valor se estamos mais ou menos evoluídos que os tais bichos. Mas sei que esse é um elemento que nos livra do nível da bestialidade. Abrir mão disso, por preguiça, negligência, ignorância ou coisa que o valha, é deixar o caminho livre para que tenhamos novos casos Richtoffens, Nardonis, ou outros “João Hélio”. Devemos nos agarrar, como um náufrago à sua bóia, a todo e qualquer lampejo de problematização da vida e das coisas da vida. Aqui em Belo Horizonte, ontem à noite, tivemos o prazer de ver Zeca Camargo e Rubem Alves na Bienal do Livro. Oportunidade ímpar de parar por um instante as tarefas do cotidiano… e de pensar. Pensar, refletir e dialogar sobre as coisas da vida, sobre o caráter múltiplo e multifacetado da existência humana. Eu, como muitos outros, esperamos horas por uma sessão extra, que Zeca e Rubem generosamente nos ofereceram, diante da grande procura. Grata espera que nos permitiu uma hora de boa conversa com essas grandes figuras. Tempo de pensar! Talvez Lorenas e Álvaros passassem por ali, com ar de enfado, e dissessem: “Blargh! Papo-cabeça…!”.

  19. 163
    marcelo:

    Poxa Zeca, isso deve ser questão antiga, a mina só pediu pra resumir. nem achei tão grave. anyway…

  20. 162
    Maikol:

    Zeca, não sei se você vai ler meu comentário, mas eu sempre passo por aqui e não comento por falta de tempo, afinal prefiro gastar o tempo para ler o post!!!
    Achei demais sua resposta á essa alienação das Lorenas que temos atualmente. Também tenho um blog que sofre em audiência devido á essa falta de coragem e vontade de conhecer algo novo, de se aprofundar. Essa má vontade alheia, me gerou má vontade, e meu blog tá quase parado.
    Como gostei muito do post, da resposta, peço licença pra usar (já usando) seu post, e o comentário da Lorena, para ilustrar um post do meu blog, ok??? Qualquer problema eu tiro do ar na hora…….abraços!!!

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