A segunda vida de um jipe-robô

qua, 27/01/10
por Cássio Barbosa |
categoria Observatório

spirit_595_424O intrépido jipe de exploração de Marte Spirit finalmente se aposentou. Você deve se lembrar que algum tempo atrás eu falei que ele estava enfrentando alguns problemas. Mais precisamente há dez meses, o jipe entrou em um pequeno platô; inesperadamente a superfície fina se quebrou e as seis rodas do jipe atolaram em areia bem fina.

Durante os últimos dez meses os engenheiros da Nasa procuraram livrar o jipe desse atolamento, tentando diversas manobras. Para agravar a situação, o Spirit tem uma roda inutilizada que até deu sinais de vida durante as manobras, mas travou definitivamente. Outra roda também deixou de funcionar e, no final das contas, o jipe acabou afundando mais um pouco, sem conseguir avançar mais do que alguns centímetros. Diante dos fracassos, a Nasa desisitiu. O Spirit está definitivamente preso.

Esse período foi na verdade uma corrida contra o tempo, pois o inverno estava se aproximando e com ele a redução da luz disponível. E o inverno chegou. Não bastasse o atolamento em si, o jipe está em uma posição desfavorável para receber luz solar. Pior ainda, os painéis estão cobertos de poeira, diminuindo ainda mais a luz que pode ser convertida em energia elétrica. Essa é a maior preocupação agora, manter os instrumentos operacionais até que o inverno passe. Com a carga prevista de energia, o jipe não deve ser capaz de se comunicar com a Terra. Durante esse período, ele deve usar toda e qualquer energia para manter seus instrumentos em estado de hibernação, sem deixar que as baterias congelem.

Assim que passar o inverno, o jipe Spirit se tornará a “base Spirit”. “O Spirit não morreu, apenas iniciou uma nova fase de sua longa vida”, declarou, um tanto quanto poeticamente, Doug McCuistion, diretor do programa de exploração marciana. A ideia agora é transformar o jipe em uma base imóvel, já que ela ainda está operacional, e continuar sua exploração que já dura seis anos (em uma missão planejada para durar três meses).

E o que um jipe atolado – desculpe, uma “base fixa” – pode contribuir para a pesquisa de Marte? Acredite ou não ela deve contribuir para se estudar melhor o interior do planeta, se ele tem um núcleo liquído ou não. Como? Monitorando durante meses pequenas variações na rotação de Marte. Essas pequenas variações, como pequenos bamboleios, são indicativos do estado físico do interior do planeta.

Essa seria uma contribuição magnífica para quem durou 6 anos, percorreu 15 km e tirou mais de 133 mil fotos!

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Parou por quê? Os efeitos de uma ‘crise de fornecimento’ de gás

qui, 21/01/10
por Cássio Barbosa |
categoria Observatório

NGC-2976Galáxias, em especial as espirais, são conhecidas por formarem estrelas universo afora. As imagens mais profundas, obtidas recentemente, mostram formação de estrelas em galáxias quando o universo tinha menos de um bilhão de anos de idade. Então o que se passa com esta galáxia?

NGC 2976 é uma galáxia espiral que nem tem cara de espiral, justamente porque faltam seus braços e a formação de estrelas se dá prioritariamente nos braços espirais. Nesta foto do Hubble nem dá para dizer que a galáxia é espiral. Onde foram parar os braços? E as estrelas que deveriam estar se formando neles?

A vizinhança é suspeita. NGC 2976 faz parte de um grupo de galáxias dominado por M81 a 12 milhões de anos-luz de distância, e a história é um tanto tortuosa. A interação entre as galáxias do grupo disparou a formação de estrelas na 2976 e isso vem ocorrendo há pelo menos 500 milhões  anos. Só que essas interações também roubaram o gás da galáxia, em especial das suas partes mais externas. O que sobrou escoou rapidamente para o seu centro. Isso explica a falta de braços e a baixa formação de estrelas nas partes externas.

Atualmente, o que está acontecendo é que está acabando o gás nas partes externas e, por isso, a formação de estrelas está definhando. Além disso, essa crise de gás chegou ao centro. A quantidade de gás que foi para as regiões centrais está se esgotando à medida que mais e mais estrelas estão se formando. Segundo Benjamin Williams, da Universidade de Washington em Seattle, que liderou essa pesquisa, mais 500 milhões de anos e a festa acaba: não haverá mais formação de estrelas nessa galáxia.

O curioso neste caso é que a galáxia parece estar “encolhendo”, já que a taxa de formação de estrelas está diminuindo de fora para dentro! Teorias e simulações mostravam que este tipo de interação era possível, mas NGC 2976 é o melhor exemplo prático disso.

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O dia D da Phoenix é esta segunda-feira (18)

sex, 15/01/10
por Cássio Barbosa |
categoria Observatório

phnx_192_253Na mitologia, a fênix (em inglês, “phoenix”) é uma ave do tamanho de uma águia que simboliza a perpetuação. Conta a mitologia grega que ela vive na Arábia, em um oásis. Desperta a cada manhã com um belo canto. Durante os aproximadamente 500 anos de vida de uma fênix, ela reina sozinha, como a única da espécie. Quando chega sua hora, consome-se em chamas. Mas outra fênix renasce das cinzas.

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Diário de um robô persistente

Phoenix também é a sonda lançada pela Nasa que desde maio de 2008 está na região polar norte de Marte. Sua missão estava prevista para durar 3 meses, mas ela conseguiu trabalhar por 5 meses durante o verão marciano. Como sua inspiradora, a Phoenix marciana nasceu das “cinzas” de outros dois projetos, a Mars Polar Lander, que não chegou a Marte por causa de um erro grotesco de conversão de unidades, e a Mars Surveyor 2001 Lander, que acabou cancelada.

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Desde que chegou, a Phoenix passou pelo verão, outono, inverno e parte da primavera, mas seus equipamentos não foram projetados para suportar as baixas temperaturas, nem mesmo a carga de gelo que deve ter se formado sobre ela. Ninguém sabe ao certo suas condições atuais.

Dia 18 agora, segunda-feira, o orbitador Mars Odyssey vai tentar um contato com a Phoenix, na esperança que ela tenha sobrevivido. Os computadores à bordo da Phoenix foram programados para tentar estabelecer comunicação com a Terra de maneira periódica, assim que seus painéis solares conseguirem produzir energia suficiente para reativar os sistemas. Durante essas tentativas a Phoenix deverá usar suas duas antenas e seus dois rádios para tentar se comunicar com qualquer orbitador, mas a Odyssey terá papel de destaque. A partir do dia 18 e durante 3 dias consecutivos ela passará exatamente por sobre a Phoenix umas dez vezes por dia.

A quantidade de luz solar incidente sobre os painéis da Phoenix atualmente é a mesma de quando ela se comunicou pela última vez, em novembro de 2008, por umas 17 horas. As tentativas de comunicação vão continuar até que o Sol esteja visível durante todo o dia marciano, o que é possível, pois ela está na região polar de Marte. Após restabelecer as comunicações, os engenheiros na Terra vão fazer um check up das condições de todo o equipamento a bordo para só depois decidir se será possível conduzir algum experimento científico.

Ninguém está otimista. Na verdade, os engenheiros não esperam qualquer comunicação da Phoenix. Mas quem sabe essa fênix marciana não nos dá uma bela surpresa e renasce do gelo? Vamos aguardar!

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Bye bye cometa

qui, 07/01/10
por Cássio Barbosa |
categoria Observatório

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Ano novo, vida nova! Não para este pobre cometa. O ano nem bem começou, mas essa bola de gelo sujo nem chegou a ver o dia de Reis.

O pobre cometa tem uma história interessante. Foi descoberto em 2 de janeiro (sábado passado) pelo astrônomo amador Alan Watson, na Austrália, que inspecionava imagens da sonda Stereo, obtidas dia 30 de dezembro de 2009. O curioso é que para nós ele “durou” apenas um dia (não deu tempo nem de batizá-lo), mas ele tem pelo menos 2.000 anos de idade.

A história é a seguinte, no Século 19 um astrônomo alemão chamado Kreutz postulou que há dois mil anos um gigantesco cometa havia se fragmentado e formado uma imensa família de destroços. Ano após ano, esses fragmentos foram se dissipando, separando-se de modo que todos os dias vários deles mergulham no Sol. A maioria dos fragmentos é muito pequena para ser detectada, mas vez por outra um grande pedaço pode ser avistado.

Isso é o que pode ser visto na sequência de imagens acima, obtidas pelo SOHO – recordista de descobrimentos de cometas – em um período de 7 horas. O disco escuro é um anteparo (chamado coronógrafo) que tem por finalidade ocultar o briho do Sol. O círculo branco nesse disco representa o próprio disco solar. Atenuando o brilho do Sol, é possível observar detalhes do seu vento, que são esses “véus” partindo do centro.

De quebra, é possível observar cometas que passam perto do Sol. Alguns passam por trás do disco e “ressurgem” algum tempo depois, mas a maioria não volta mais. É o caso desse pobre cometa, identificado apenas como membro da família de Kreutz, em homenagem ao astrônomo que estudou o grupo.

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Diário de um robô persistente

qua, 06/01/10
por Cássio Barbosa |
categoria Observatório

spirit-marte-blog_595_600Faz algum tempo que eu falei do jipe-robô Spirit que estava atolado em uma cratera em Marte (a área central da foto acima mostra o ponto em que o Spirit atolou). Disse que os engenheiros do Laboratório de Propulsão a Jato (JPL) da Nasa estavam trabalhando em manobras para tentar desatolá-lo e fazer que ele continuasse rodando pela superfície de Marte, lembra? (Não lembra? Então clique aqui)

E como anda o Spirit esses dias?

Não anda. As manobras para tentar livrar as rodas da areia fina não deram certo.

wheel-rotateO Spirit tinha problemas com a roda dianteira direita, que estava inoperante desde março de 2006. Para surpresa dos engenheiros, que fizeram uma tentativa dia 19 de dezembro, ela funcionou – mas a surpresa acabou em decepção, porque ela funcionou por pouco tempo. A manobra consistia em dar toda força à frente. Inesperadamente, a roda defeituosa deu sinal de vida, girando com o resto do conjunto. Foram quatro tentativas. A roda voltou a falhar na última delas.

De toda forma, isso foi surpreendente para uma roda inoperante há mais de 3 anos. Só que a roda traseira direita não respondeu aos comandos. Um banho de água gelada. As outras quatro rodas giraram perfeitamente, o que seria suficiente para deslocar o jipe por 10 metros, em situação normal.

Só que o Spirit se mexeu somente 2 milímetros para frente. E afundou mais 4 milímetros. Esse afundamento foi decorrente do movimento da roda dianteira, que girou umas dez vezes durante o período em que funcionou.

Agora os engenheiros estão reavaliando os equipamentos embarcados. Eles descobriram que o chassi do jipe está carregado eletricamente, coisa que não deveria acontecer. Ao que parece, os motores do lado direito do jipe são responsáveis por essa carga inesperada, em especial o da roda traseira que não funciona.

Os planos são realizar mais testes para descobrir a origem da carga e, mais importante, se será possível contar com roda dianteira novamente, já que ela parou de funcionar durante a última das tentativas.

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Um pedaço de Marte na minha mão!

seg, 04/01/10
por Cássio Barbosa |
categoria Observatório

marte_595_800Logo depois do post sobre o meteorito de Marte que está aí embaixo, eu contei a novidade a um colega meu da universidade que trabalha com astrobiologia. Na verdade, astroquímica experimental. Conversa vai, conversa vem, não é que ele saca da mochila uma pequena coleção de meteoritos? Essa coleção foi obtida de uma colaboração dele para estudos.

Esse em destaque na foto é um pedacinho de Marte, um tipo de meteorito conhecido como condrito. Os condritos representam 86% dos meteoritos que atingem a Terra. Todos os dias toneladas deles adentram a atmosfera, mas poucos “sobrevivem” e chegam ao solo.

Os condritos têm esse nome por causa da presença de partículas arrendondadas compostas por silicatos. Alguns condritos são especiais porque carregam elementos químicos em quantidades diferentes das encontradas na maioria dos meteoritos recuperados, que pela semelhança com rochas terrestres indicam que se formaram junto com o Sistema Solar.

Essa quantidade “anômala” de elementos químicos, em especial gases nobres, indica que esses meteoritos se formaram perto de outra estrela, a partir de uma nuvem com uma composição química diferente da nuvem que originou o Sistema Solar. Esses meteoritos estiveram viajando pelo universo durante bilhões de anos, até serem atraídos pela gravidade da Terra e cair.

Bom, o fato é que este condrito em especial veio de Marte, arrancado por um impacto violento, e ficou viajando aí por alguns milhares/milhões de anos até cair na Terra, ser recuperado e ir parar na minha mão!

A caixinha branca em cima da mesa contém fragmentos de mais 4 meteoritos, um deles o famoso Allende, tido como o mais estudado do mundo. Esse meteorito caiu no México um pouco antes da missão Apolo XI. O mundo inteiro tinha preparado laboratórios para analisar as amostras de rochas lunares e de repente havia centenas de quilos do meteorito disponíveis para análise. Resultado: todos receberam amostras para testar a capacidade dos novos laboratórios e o Allende se tornou um dos pedaços de rocha mais estudados do mundo.

O microscópio ao fundo é de um projeto de outro colega. Ele o usa para estudar anéis de crescimento em árvores antigas. Esses anéis são criados no caule das árvores conforme elas crescem. O crescimento é determinado por uma série de variáveis, como o ciclo de chuva/seca por exemplo.

Mas o padrão de crescimento desses anéis é influenciado pelo ciclo de manchas solares também. É possível determinar os períodos de máximo e de mínimo solar a partir de pedaços de árvores. Esse campo de pesquisa chama-se interação Sol-Terra.

Mas essa é uma outra história que eu conto outro dia.

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