Aquecimento global ou era do gelo?

seg, 29/09/08
por Cássio Barbosa |
categoria Observatório

Mancha solariaNa segunda feira passada, dia 22, começou a primavera, e coincidentemente surgiu uma pequena mancha solar. Tão pequena que já no dia 24 ela tinha desaparecido, durando dois dias ou menos. Manchas solares vêm e vão e possuem um ciclo de 11 anos, alternando períodos de alta intensidade, caracterizado por um grande número delas, e períodos de baixa atividade solar, quando poucas manchas aparecem no Sol. Estamos justamente em um período de mínimo solar, com poucas manchas visíveis.

E qual a novidade nisso?

Bem, o evento em si é bem trivial, manchas vêm e vão, como eu já disse, mas essa foi especial em dois sentidos. O primeiro: ela apareceu depois de um longo período de baixíssima atividade solar, e suas características indicam que se trata uma mancha do ciclo 24. Esse ciclo iniciou-se em janeiro, marcando a saída do mínimo solar. Em outras palavras, de janeiro em diante o número de manchas só deve aumentar, até atingir o máximo entre outubro de 2011 e agosto de 2012. Ao menos em tese. A baixa atividade solar tinha posto em dúvida o momento em que o ciclo 23 tinha acabado, muita gente acreditava que ele ainda estivesse em curso, pois o número de manchas não aumentou como esperado. E isso levanta a segunda questão.

A atividade solar tem perdido força ao longo dos anos. Desde que a intensidade do vento solar começou a ser monitorada, há uns 50 anos, ela nunca esteve tão baixa. O vento solar é responsável por criar uma bolha chamada de helioesfera, que envolve e protege o Sistema Solar dos raios cósmicos de alta energia provenientes do resto do Universo. Com o vento solar menos intenso, a bolha se encolhe e fica mais fina, facilitando a passagem dos raios cósmicos. Em princípio, estamos a salvo na Terra, pois nosso campo magnético e nossa atmosfera nos protegem, mas satélites, astronautas e qualquer equipamento fora dessa proteção estará sujeito a esse bombardeio. Na prática, a vida útil de sondas espaciais será encurtada.

Além disto, existe um estudo controverso que liga a quantidade de raios cósmicos à quantidade de nuvens na Terra. Essa hipótese diz que o bombardeio de raios cósmicos na nossa atmosfera favorece a criação de nuvens. Se a helioesfera se enfraquecer, é justamente isso que vai acontecer, aumento de raios cósmicos e aumento de nuvens.

Aumentar a capa de nuvens significa bloquear a quantidade de raios solares que penetram a atmosfera. O topo das nuvens acaba refletindo a luz do Sol de volta ao espaço e, como conseqüência, a Terra esfriaria. É claro que isso não explica a atual onda de frio em plena primavera.

A hipótese é um tanto controversa, mas entre 1645 e 1715, aproximadamente, o número de manchas solares registrado foi muito pequeno, e o período ficou conhecido como “Mínimo de Mauner”. Nesse mesmo período a Europa sofreu com temperaturas muito baixas, com rios que normalmente são fluidos o ano inteiro ficando congelados durante um ano inteiro! Esse período é conhecido em geologia ou meteorologia como “Pequena Idade do Gelo”. Apesar dos registros do número de manchas da época não serem tão bons quanto atualmente, parece que o número atual de manchas é menor que o verificado no Mínimo de Mauner.

No final das contas, pode ser que o Sol nos dê uma força para impedir que as temperaturas se elevem com o aquecimento global.

A prima desconhecida de SN1987A

qui, 25/09/08
por Cássio Barbosa |
categoria Observatório

CircinusA explosão da supernova de SN1987A foi um marco na astronomia moderna. Esse foi o evento de morte de uma estrela de muita massa mais próximo de nós ocorrido na era dos telescópios modernos.  Ela explodiu na Pequena Nuvem de Magalhães, a meros 160 mil anos-luz de distância. A uma distância tão pequena (comparada, claro, com a de outras galáxias a milhões de anos-luz), a supernova SN1987A tem sido estudada praticamente mês a mês e, desse monitoramento quase contínuo, muitos pontos da teoria das fases finais de vida de estrelas de alta massa puderam ser aprimorados.

Agora, uma outra supernova com características similares foi identificada em arquivos públicos de imagens. A supernova explodiu entre 28 de fevereiro de 1995 e 15 de março de 1996 na galáxia de Circinus, a 13 milhões de anos luz. Essa foi a única supernova entre as cinco mais próximas (dos últimos 25 anos) que não foi detectada tão logo explodiu. A galáxia de Circinus é uma bastante estudada por ser uma das mais próximas e por mostrar gás ejetado em forma de anéis.

SN1996cr, como foi batizada, foi observada pela primeira vez apenas em 2001, por
Franz Bauer, dos EUA, analisando uma imagem de raios-X obtida pelo Telescópio Espacial Chandra. Na hora ele confessou que não entendeu muito bem o que tinha descoberto, e só depois de vasculhar os bancos de imagens públicos de observatórios do mundo inteiro é que ele se deu conta de estar diante de uma supernova. Essa explosão
passou despercebida porque, na faixa da luz visível, ela foi fraca e numa região da galáxia com muita poeira e gás. Como a galáxia de Circinus é bem observada, Bauer encontrou várias imagens, antes e depois da explosão, e percebeu que as similaridades com SN1987A eram imensas. Na verdade, a única diferença apreciável é a intensidade de brilho em rádio e raios-X. Comparada à SN1987A, essa prima distante é muito mais intensa. Ela aparece na imagem composta do Chandra (em azul) e do Hubble neste post como a bolota azul no canto inferior direito.

As semelhanças são principalmente no que se refere aos momentos antes da explosão. As duas supernovas mostram uma grande quantidade de material ejetado. Esse material se move com uma velocidade muito grande e forma uma onda de choque que limpa o meio onde a estrela moribunda está. No caso da supernova de Circinus, a onda foi tão violenta que quase não restou material em volta, e por isso ela brilha mais em raios-X do que a supernova na Grande Nuvem de Magalhães.

Agora veja só o que Nathan Smith achou de Eta Carina a singelos 7.500 anos luz de distância: material ejetado a altas velocidades, no caso em 1843. Em duas supernovas relativamente próximas, isso aconteceu logo antes da explosão. Isso significa que esse deve ser mesmo o sinal de que a hora final de uma estrela com muita massa é precedida por eventos violentos desse tipo. Então, como eu disse no post abaixo, é só esperar que a Eta Carina logo, logo vai virar uma bela atração nos céus.

Eta Carina, a bomba-relógio

qua, 10/09/08
por Cássio Barbosa |
categoria Observatório

Eta lindonaEta Carina, durante muito tempo considerada a estrela mais massuda de nossa galáxia, tem mostrado sinais da idade. Apesar de não ser mais “a” estrela com mais massa na Via Láctea, ela deve ser um sistema composto por duas das mais massudas, e estrelas com muita massa vivem pouco. Isso as leva a ter uma alta temperatura, um forte brilho, mas um curto intervalo de vida. E parece que a hora de Eta Carina chegou, ou está para  chegar.

Bom, se você é daqueles que acredita que o LHC vai produzir um miniburaco negro que vai tragar a Terra, não precisa se preocupar. Mas a história é a seguinte.

Em 1843, Eta Carina sofreu uma explosão tão intensa que ela pôde ser observada de dia! Eta Car (para os íntimos) é visível no hemisfério Sul e está a 7.500 anos-luz de distância. Naquela época, astrônomos no observatório da África do Sul relataram o súbito aumento de brilho. Hoje em dia ainda é possível ver os restos dessa explosão na forma de uma nebulosa chamada de Homúnculo. A foto do Homúnculo é um dos ícones produzidos pelo Telescópio Espacial Hubble. Restos de uma explosão anterior, por volta de uns 1.000 anos atrás, também podem ser vistos nessas imagens.

Um colega nosso, Nathan Smith, mostra na edição de hoje da revista científica “Nature” que novas observações que ele fez nos observatórios Gemini Sul e CTIO, ambos no Chile, revelam filamentos de gás se afastando muito rapidamente, quase cinco vezes mais
rápido do que o material do Homúnculo. Esse material teria sido ejetado de Eta Car no mesmo evento de 1843. Por essa hipótese, toda estrela muito massuda daria sinais de esgotamento de seu combustível alguns anos antes de explodir como uma supernova. Esse tipo de evento tem sido observado em outras galáxias, mas até agora não há nenhuma explicação para ele. Como uma estrela pode se tornar tão brilhante assim sem ter se tornado uma supernova?

Nessa ejeção de massa, Smith calcula que Eta Car se livrou de algo em torno do equivalente a 10 estrelas como nosso Sol de uma só tacada. Ainda sim, logo em seguida, ainda teve fôlego para ejetar todo o material que compõe o Homúnculo. De tanto perder massa assim, é possível que hoje ela tenha por volta de um terço de sua massa original.

O fato é que aparentemente uma estrela com tanta massa passa por golfadas violentas como essa até sua explosão final como supernova. De fato, uma hipernova observada em 2006 passou por um evento desses dez anos antes. Eta Carina, pelo que vemos nas imagens, passou por duas já, uma há 1.000 anos e outra em 1843. Resta saber quando será a terceira que provavelmente pode ser a última. Pode ser uma questão de décadas, ou séculos, mas no máximo em 1.000 anos Eta Carina vai explodir espetacularmente, tornando-se o objeto mais brilhante de nossa galáxia.

É esperar para ver!

A galáxia dos mil rubis

qui, 04/09/08
por Cássio Barbosa |
categoria Observatório

M83Uma jóia dos céus austrais, M83 é uma das galáxias que mais atraem a atenção de observadores, amadores ou não.

M83 é, ao que parece, uma versão da Via Láctea em pequena escala com um tamanho
2,5 vezes menor. Trata-se também de uma galáxia do tipo espiral barrada que está a 15 milhões de anos-luz de distância na constelação de Hidra. Esta galáxia foi descoberta no século 18, mas até hoje guarda alguns mistérios, justamente o que a faz ser tão observada.

Essa nova imagem, obtida pelo Observatório Europeu Austral (ou ESO, em inglês) mostra uma miríade de regiões de formação de estrelas, em especial aquelas com muita massa. Essas regiões são os tais rubis da foto, regiões onde o hidrogênio é excitado e brilha intensamente nessa coloração rosada. Não é difícil notar que essas regiões traçam muito bem a posição dos braços espirais da galáxia. Mas, até aí, nada de muito misterioso.

As surpresas vêm de outros comprimentos de onda, além da luz visível que nossos olhos normalmente enxergam. Por exemplo: em raios ultravioleta e em rádio, essa galáxia mostra que existe formação de estrelas em regiões externas, muito afastadas de onde se esperaria que isso estivesse acontecendo. Em raios-X, é possível notar que o núcleo de M83 está imerso em uma nuvem de gás aquecido a uma temperatura de 7 milhões de graus! Não satisfeito com as proezas de M83? Ela é uma das fábricas mais produtivas de
supernovas, estrelas de muita massa explodindo ao final de suas vidas. Ela é uma das duas galáxias conhecidas que teve seis explosões dessas em 100 anos. Só para comparar, a taxa de explosões de supernovas na nossa galáxia é de uma a cada cem anos! Uma delas, conhecida como SN 1957D, ficou observável por 30 anos!

É por essas e outras que astrônomos ainda continuam investido na M83. A imagem acima, por exemplo, levou em torno de 100 minutos para ser obtida, em quatro filtros
diferentes, com o uso de uma câmera especial que consegue obter imagens de campos de visada bem grandes de uma só vez. As estrelas brilhantes que vemos em primeiro plano são estrelas da nossa galáxia. Além da M83 é possível ver, ainda nessa foto, algumas outras galáxias mais distantes.



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