Profissão perigo?

ter, 15/12/09
por Bruno Medina |

santaEntra ano, sai ano, em dezembro o protocolo segue sem alterações: “caixinhas” pra todos os lados, listas de presentes intermináveis, lojas abarrotadas e, na porta de cada uma delas, senhores gorduchos fazendo um troco vestidos de Papai Noel. Colocado assim, pode dar a impressão de que o bico dos vovôs barbudinhos se inclui na relação de mazelas que o Natal traz à reboque; muito pelo contrário.

Afinal, quem já foi criança sabe a importância do papel desempenhado por esses verdadeiros heróis sazonais, bastiões do espírito natalino e da magia que a data desperta entre os pequenos. Merecem nossos sinceros respeito e admiração todos aqueles que abdicam das tardes serenas de aposentadoria, passadas em frente a TV ou nas pequenas rodas de dominó, e se catapultam – de luvas, gorro e embrulhados em cetim vermelho – para o olho do furacão.

Durante pouco mais de um mês concentrarão todos os olhares, expostos em seus tronos ornados com purpurina, laços de fita e tinta dourada, à mercê de um séquito ensandecido de mães, por vezes histéricas, e por meninos e meninas, quase sempre contrariados. Não teria como precisar números exatos, mas desconfio que, na imensa maioria das vezes, são os pais, e não os filhos, que desejam sentar-se no colo do bom velhinho.

A insistência por uma foto não raro termina em choro convulsivo e certeza de vexame para todos os envolvidos, isso sem mencionar quando os, digamos, mais curiosos, impressionados com a volumosa barba branca, resolvem puxá-la para descobrir se é de verdade. Dá nervoso só de pensar. Ainda dentro do quesito ossos do ofício, aliás, cabe lembrar do montante de perguntas capciosas passível de brotar das criativas mentes infantis: por que você finge ser o Papai Noel? Como você faz para estar em todas as casas ao mesmo tempo?? Por que ano passado não ganhei o videogame que pedi???

Haja saco, literalmente.

Para contornar essas e tantas outras possíveis saias justas, a maioria dos estabelecimentos já solicita comprovação de treinamento antes de contratar os profissionais do “ho, ho, ho”. Nos cursos, cada vez mais específicos, aprendem desde a descerem de helicópteros sem ter a mão decepada por um aceno prematuro (há casos catalogados) até como tocar as crianças – meu Deus – sem dar margem a interpretações equivocadas.

Portanto, na próxima vez que encontrar um Papai Noel por aí, não deixe de prestá-lo uma saudação, um olhar de cumplicidade que seja, em reconhecimento por seu sacrifício. Pensando bem, apesar de gozar de muito menos prestígio, seu trabalho não difere muito do de uma passista de escola de samba: ambos dependem de disciplina para manter a silhueta, atuam em extensas jornadas que se limitam a apenas alguns dias por ano, precisam aturar o assédio dos inconvenientes e, ainda assim, distribuir sorrisos por onde passam. A diferença é que, o Papai Noel, ninguém gostaria de sequer imaginar em trajes de banho.

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8 comentários sobre “Profissão perigo?”

  1. Excelente texto! Quem imaginaria que o bom velhinho, símbolo deste espírito natalino que temos em dezembro, enfrentaria uma preparação com tantos detalhes?
    Um abraço e feliz natal!

  2. Kamila disse:

    A verdade é que é preciso muita paciência por parte dos Bons Velhinhos que trabalham por aí! Aguentar algumas crianças mimadas e assustadas não é brincadeira e não é qualquer um que tem tato para lidar com isso. Essa é mesmo uma profissão perigo!

  3. Tathyana disse:

    Medina,

    Nós aqui no Brasil, em dezembro, estamos no verão.
    Coitado de quem se candidata a ser Papai Noel.
    De repente, cairia bem colocar um Papai Noel abrasileirado rs
    De bermuda,e sem camisa rs

    Beijo

  4. Bruna Monteiro disse:

    Imagino a cara das crianças horrorizadas vendo a mão do Papai Noel voando para longe…..kkkkkkkkkkkkkk….ta desculpa…to rindo de nervoso.

  5. Lipa disse:

    Uma certa vez eu precisei, junto à minhas colegas de faculdade, fazer uma vivencia pra avaliar o nivel de acessibilidade de um garnde shopping da minha cidade para pessoas cadeirantes. Duas de minhas colegas fizeram o papel das pessoas deficientes e as demais foram acompanhar, fazer anotações, ver como as pessoas, vendedores, administradores do shopping iriam reagir, tratar… enfim. Era natal e eu tava acompanhando uma das minhas colegas que estava na cadeira de rodas, ela resolveu então falar com o Papai Noel. Nesse momento eu gelei, passamos por situações terriveis em lojas de roupas, de materiais eletronicos, em agencias de viagem, mas só de pensar que minha colega, que tinha fama de bater em garotos quando pequena, e possui uma postura extremamente desbocada ia falar com \"bom velhinho\" fingindo ser uma cadeirante, só conseguia vir em minha cabeça pensamentos trágicos. Ela se aproximou do Papai Noel, e disse que queria pedir um presente, eu pensei \"pronto, é agora que ela vai pedir para voltar a andar e derrepente pular da cadeira e dizer que é milagre\". O papai noel e todas suas ajudantes se mobilizaram e modificaram a estrutura do ambiente para que a cadeira pudesse passar e minha colega chegar o mais perto possivel da poltrona do papai noel. Ela chegou o mais perto possivel, e ele levantou e a olhou com o olhar mais doce que eu ja vi em uma pessoa que estava usando uma roupa extremamente quente em pleno verão barsileiro. Ele enfim disse \" qual é o seu desejo?\", eu que ja estava convencida que ia acontecer o que eu havia previsto, simplesmente fiquei esperando o pior, criando mentalmente desculpas para dirigir ao senhor assim que minha colega começasse a rir da cara dele, mas para a minha surpresa minha colega simplesmente disse \" eu queria que esse shopping fosse acessivel para todas as pessoas que possuem deficiencia\". Meu alivio foi imediato e as lágrimas que brotavam dos olhos do Papai Noel do shopping, também. A turma toda foi embora e eu coloquei na minha cabeça que a mentira foi por um bem maior, com fins academicos. Mas hoje, lendo a esse texto, eu simplesmente me senti péssima. O cara ta lá, com a roupa incomoda dele, num calor infernal, tendo que aguentar crianças gritando, chorando, fazendo perguntas capciosas, e de vez em quando, ainda ser enganado por mulheres de 20 poucos anos, que se aproveitaram da sua boa fé… Ninguém merece

  6. Raffael Chacon disse:

    Ótimo texto! O final foi hilário… Realmente aguentar o calor, as crianças, as mães e ainda estar sempre sob os olhos de várias pessoas deve ser bastante dificil. A parte boa é que as vezes tem aquelas mamães noel boazudas! kkk

  7. Tiago Medina disse:

    Nunca tinha pensado nos pré-requisitos para ser Papai Noel. Esse texto fez eu comprovar como realmente não quero ser um. E, certamente, cumprimentarei o próximo que eu ver no shopping. Não sei se ele vai ver, porque há muitas crianças choronas nesse mundo…

    abraço



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