A economia está em recuperação, num processo inegável de retomada. O que não é consenso ainda é se este processo é consistente e, principalmente, se vai sobreviver ao ano de eleições gerais, com a manutenção de um quadro político extremamente instável. O que estará em jogo na escolha das novas lideranças é a agenda de reformas que o país ainda necessita enfrentar, além da reforma da Previdência que está no centro do debate agora.
 
“2018 será um divisor de águas. Será que nós vamos continuar com agenda de reformas para enfrentar os problemas, ou vamos sucumbir, do tipo 'já bastou', não precisamos fazer mais nada (e partimos para) as saídas fáceis como fizemos em 2014? Este é o grande dilema que vamos enfrentar. Vamos enfrentar os problemas ou vamos fazer a saída populista?”, indaga o economista Marcos Lisboa, presidente do Insper.
 
Em entrevista exclusiva ao blog, Lisboa faz um balanço do processo de retomada da atividade este ano e alerta para os riscos de o país viver um “novo 2015/16, só que piorado”, se o ajuste fiscal for deixado de lado. O economista afirma que o Brasil está colhendo frutos de um cenário externo favorável e da mudança na política econômica iniciada em 2016, mas que a “janela de oportunidade” para um crescimento duradouro não vai durar muito tempo e certamente não vai resistir a uma ruptura da agenda de reformas.


A seguir os principais trechos da entrevista.  
 
Como o senhor explica o crescimento atual da economia?
 
Nós estamos colhendo neste momento os benefícios das mudanças de política econômica ocorridas a partir do segundo semestre ano passado. O governo sinalizou o começo, eu enfatizo que é apenas o começo, de uma agenda de ajuste fiscal de longo prazo, com melhora do ambiente de negócios, reformas importantes como a trabalhista e a mudança na taxa de juros do BNDES.
 
É claro que nem tudo foi na direção correta. Houve vários equívocos também neste período como o reajuste salarial (aos servidores públicos) que foi grave. Tanto que precisou aumentar impostos este ano para pagar porque não tinha dinheiro. Foi muito ruim o processo de enfrentamento do problema dos estados. Vamos ter uma herança muito difícil para resolver esta questão dos estados, que vai requerer reformas duríssimas. Volta e meia pinga uma medida de volta ao passado, lembrando as medidas equivocadas do governo anterior, com coisas que vão na contramão do crescimento porque beneficiam alguns grupos de interesse específicos, mas são extremamente prejudiciais ao país.
 
O saldo é positivo ou negativo?
 
O saldo líquido é muito positivo. Estamos colhendo o benefício dessa agenda fiscal, das medidas na direção correta e de uma boa condução da política monetária, que voltou a ser muito bem conduzida, num salto de qualidade impressionante que o BC trouxe em relação ao que a gente vivenciou nos últimos anos.
 
A gente estava indo em direção ao muro com uma velocidade imensa no governo anterior. Na hora que começou uma agenda diferente, continuamos indo, mas numa velocidade um pouco menor e sinalizamos que vamos botar o pé no freio. Não botou ainda, mas sinalizou que vai botar. Isto levou o BC a baixar os juros em meio à queda da inflação, o que, hoje, está resultando em crescimento. Estamos colhendo aqui os impactos da política monetária iniciada um ano atrás. E ainda tem muito impacto para acontecer. A política monetária importa e ela tem impacto.
 
O cenário externo colaborou para todo este processo?
 
Há pouco mais de um ano o mundo estava saindo da crise, crescendo, mas ainda com taxas de juros nula ou negativa, e inflação muito baixa. Aos poucos o desemprego foi caindo lá fora, os Estados Unidos estão crescendo 3% ao ano, já há sinais de que a inflação vai voltar a subir, o que quer dizer que os juros vão deixar de ser nulos.
 
 
2018 vai ser mais um ano de voo de galinha para economia?
 
2018 vai ser um divisor de águas. Será que nós vamos continuar com agenda de reformas para enfrentar os problemas, começando pelo fiscal, pela previdência e as reformas necessárias para que o país equilibre suas contas públicas e volte a crescer muitos anos a frente? Ou vamos sucumbir, do tipo “já bastou”, não precisamos fazer mais reformas (e partimos para) as saídas fáceis como fizemos em 2014? Este é o grande dilema que vamos enfrentar. Vamos enfrentar os problemas ou vamos fazer a saída populista?
 
É claro que os problemas podem ser enfrentados de várias maneiras e a escolha de qual o caminho, é uma escolha da política. O que vai ser preocupante é se negar que os problemas existem. A negação dos problemas é que o grave. Existem várias saídas e ela, mas elas não são técnicas, elas são da política.
 
E isto não vai se resolver enquanto não passar o período das eleições.
 
Se a gente resolver enfrentar os problemas e escolher caminhos sustentáveis, o país tem uma oportunidade de crescimento imensa. Se a gente conseguir acertar a parte fiscal, com uma agenda para reduzir as distorções, a produtividade volta a crescer, o país volta a crescer. A gente tem um potencial de crescimento muito alto, por muitos e muitos anos.
 
Agora, se a gente resolver de novo com populismo, achando que é sempre o outro que vai pagar a conta, que não tem que fazer ajuste duro, que não tem que ter sacrifícios no curto prazo para colher os benefícios nos próximos anos, daí a gente pode repetir 2014 e a consequência será um novo 2015/16, só que mais grave.
 
E o país aguenta muito tempo?
 
Quanto mais o tempo passa, pior a situação fica. A gente tem uma janela de oportunidade. Estamos colhendo os frutos de um bom momento do cenário externo e da mudança na política econômica. Se continuar na mudança, podemos colher mais frutos ainda no futuro. Se interromper a mudança, a doença volta, só que volta agravada.