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  • Diálogo sobre ajuste na economia é conversa de surdos

    O ajuste fiscal não sai da boca do povo. Não se fala em outra coisa no país, mesmo que muita gente ainda não tenha entendido para que serve e que bem ele nos fará. No Congresso Nacional, onde o diálogo é uma premissa e o entendimento um compromisso, a discussão sobre o ajuste já virou conversa de surdos.

    Nesta terça-feira (31), o ministro da Fazenda Joaquim Levy vai à Comissão de Assuntos Econômicos do Senado para explicar o que é, como será feito, quem vai pagar a conta (isto já está claro para os assalariados), quanto tempo deve durar e qual o lado bom dessa história de ajuste fiscal.

    A fala de Levy  na CAE virou o hit da semana, menos pelo interesse que os parlamentares têm sobre o assunto e mais pela curiosidade mordaz de testemunhar alguma gafe no discurso do ministro. Encarregado de montar as medidas, explicar as medidas, adotar as medidas, entregar os resultados e salvar o Brasil, Levy assumiu um grau de exposição que o levou a cometer alguns deslizes de oratória.

    Ele já chamou a desoneração da folha de pagamento adotada no primeiro mandato de Dilma Rousseff de brincadeira. A mais recente foi numa palestra para estudantes da Universidade de Chicago na semana passada. Numa tradução ao pé da letra, Levy disse que a presidente Dilma tem o “desejo genuíno de acertar, às vezes não da maneira mais fácil, não da maneira mais efetiva”. O ministro protestou contra a tradução, afirmando que a frase divulgada pela “Folha de S.Paulo” estava fora de contexto.

    Com o atual ruído de comunicação entre todos os entes públicos que se debatem em Brasília, a interpretação da fala de Levy jogou mais umas gotas de gasolina na fogueira. É neste clima que ele vai ao Senado e também divulgar o resultado das contas públicas do mês de fevereiro. Apesar de os cortes nos gastos já terem começado, dificilmente virá um resultado positivo, ou seja, o governo federal não deve ter economizado no mês passado o suficiente para o pagamento dos juros da dívida.

    Descrever ou exemplificar situações complexas e altamente delicadas exige todo cuidado quando se fala na própria língua. O episódio mais recente de Levy não foi o único nem será o último vivido por autoridades brasileiras. Em 2000, o então diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central Daniel Gleizer anunciou a emissão de títulos brasileiros no exterior durante uma entrevista coletiva em Brasília.

    Naquela época, o Brasil ainda vivia à margem do mercado financeiro internacional e a missão de Gleizer era reabrir as portas para os títulos públicos do país. Ele foi perguntado se a operação era uma necessidade do Brasil para cobrir as contas externas que estavam bem negativas. Ele explicou que se tratava da volta do país ao mercado internacional. Na insistência dos jornalistas ele usou uma expressão bem comum aos americanos: “We are saving for rainy days”.

    Na tradução literal, isso quer dizer “estamos economizando para dias chuvosos (com sentido de piores)”. Mas lido como uma expressão idiomática, Gleizer quis dizer que o país estava acessando investidores estrangeiros e um dinheiro a mais no caixa nunca era demais. Não deu outra. No dia seguinte os jornais diziam: “Diretor do BC espera dias piores para o Brasil”.

    Quem sabe Levy tivesse causado menos frisson dizendo aos estudantes americanos que, apesar da crise econômica que vivemos, “the cow didn’t go to the swamp”...”at least, not until now”...

    Tradução: a vaca não foi para o brejo, pelo menos não até agora!  

     

  • Levy pede coragem – com ou sem paciência, ministro?

    O ministro Joaquim Levy está se revelando um sujeito bom de analogias para explicar, justificar ou convencer o país de que seu plano de ajuste não é apenas bom, como faz sentido. Num evento em São Paulo, falando para empresários, o ministro disse que as medidas que ele tenta adotar são “uma adaptação a uma nova situação, se houver coragem, não vai ser difícil”, disse.

    Levy fez comparações entre a gestão pública e a privada e ressaltou: “todos que têm sucesso são muito cuidadosos com a dívida”, ou seja, se o Brasil quer ter sucesso, tem que cuidar do seu endividamento. E emendou dizendo que “o mercado mudou, quem não muda tem problema”.

    O difícil é explicar que foi exatamente porque quis mudar tudo que a presidente Dilma Rousseff provocou a situação atual da economia. A “nova matriz econômica”, defendida no primeiro mandato, agora está sendo totalmente rechaçada pelo novo chefe da equipe da presidente.

    Mudar ou não mudar, com coragem ou sem coragem, não é menos importante que escolher o destino e o plano de viagem corretos. A história, o bom senso, o comportamento da sociedade, a matemática, tudo são fontes de informações imprescindíveis para tomada de decisão. Fazer só o que se deseja num país do tamanho do Brasil, desafiando o bom senso e, principalmente, a matemática, impôs um preço altíssimo a todos.

    “Se fizermos um ajuste de verdade, rápido, rapidamente estaremos em um cenário em que as pessoas poderão sentir o chão firme e trabalhar. Menos incerteza. Quanto menor a incerteza geral, mais dá para cada um tomar risco. Se a gente sabe pra onde está indo, a gente toma risco, maiores, menores, conseguimos decidir a vida”, disse Levy.

    Ele tem razão, a segurança faz a gente tomar risco e decidir a vida. Em busca do “chão firme”, Levy nos pede coragem para ser “menos difícil”. Perguntar não ofende: com ou sem paciência, ministro?

  • Levy é a estrela do governo do PT

    Quem diria que seria possível ver brilhar, num governo petista, uma estrela liberal, ortodoxa e com luz própria? Sob a ótica da primeira administração de Dilma Rousseff, Joaquim Levy chega ao Ministério da Fazenda quase como um anti-herói, ou será vilão? Afinal, pela agenda apresentada pelo economista em seu discurso de posse, o “necessário” não combina em nada com o “agradável”.
     
    Para financiar os ajustes, Levy já avisou, das formas mais eufemísticas possíveis, que vai haver aumento de impostos. Sim, porque não há milagre. Para controlar o endividamento público, o Estado vai precisar arrecadar mais. E já que a economia não cresce, a carga tributária precisa aumentar. Talvez o novo ministro comece retirando benefícios concedidos nos últimos quatro anos, como as desonerações de alguns setores ou a volta dos impostos que foram retirados de algumas cadeias de produção.
     
    O economista mais badalado do momento no Brasil já tem agenda e time preparados para transformar o quatro anos de Dilma. Não há “estrelas” na equipe que vai comandar o caixa federal, a arrecadação, os gastos e as escolhas para economia sob a gestão de Levy. Mas a maioria dos nomes escolhidos já teve experiência na máquina pública e são nomes de confiança do próprio ministro.
     
    Esta escolha demonstra que, pelo menos para trazer seu time, Joaquim Levy ganhou liberdade da presidente Dilma. Os nomes foram tão bem guardados que ninguém conseguiu acertar ou antecipar alguém, num furo de reportagem. Outra demonstração de estilo de gestão do ministro: centralização e domínio sobre seu entorno.
     
    A fala mansa de Joaquim Levy pode ser a chave de seu sucesso e manutenção de seu brilho. Foi assim que ele defendeu o fim do “patrimonialismo” do Estado brasileiro, avisando aos “campeões nacionais”, que se beneficiaram com ações do primeiro mandato de Dilma, que o dinheiro barato às custas do Tesouro Nacional vai minguar.
     
    E para selar a marca que pretende impor ao seu mandato, o novo ministro da Fazenda lembrou uma das máximas da economia que o Brasil descuidou nos últimos anos: “Apenas o trabalho pode gerar riqueza”, disse Joaquim Levy.

Autores

  • Thais Herédia

    Jornalista, especialista economia e política; é colunista da Globo News. Foi assessora de imprensa no BC e gerente de comunicação do Carrefour. Na TV Globo, foi repórter de economia do Bom Dia Brasil. Tem pós-graduação em finanças pela FIA.

Sobre a página

A jornalista Thais Herédia comenta os principais fatos econômicos do país e do mundo e explica como eles afetam a sua vida.