O preço divulgado pela Honda para uma de suas grandes novidades deste ano no Brasil, o scooter SH 300i, foi recebido com surpresa, na verdade com forte indignação. O valor sugerido, R$ 23.590, é um número “forte”, especialmente tendo em vista que o concorrente único, o já veterano – desde 2010 em nosso mercado –, Dafra Citycom 300i sai da loja por bem menos, R$ 17.890 (ou R$ 18.490 se a versão for o Citycom S 300i, mais potente).

 

Uma passeada pelos comentários do leitores na reportagem sobre o lançamento da novidade Honda que foi publicada aqui mesmo dias atrás revela que praticamente 100% dos que se manifestaram o fizeram um tanto enfurecidos. Faz sentido pensar que entre o bem conceituado Dafra e o ainda desconhecido para o público geral Honda a diferença a pagar é um exagero, da ordem de R$ 5.100 (ou R$ 5.700 para o Citycom S). Com a quantia pedida pelo SH 300i dá para sair da revenda Dafra montado no Citycom e ainda passar na Honda e levar uma Pop 110i mas…  é isso mesmo o que conta?

 

Pelo lado da razão, é claro que sim. Os scooters de 300cc alvo deste meu blablablá se equivalem em linhas gerais e servem ao mesmo propósito: levar do ponto A ao B preferencialmente em ambiente urbano, mas sem arregar se houver um teco de rodovia a percorrer. Ambos tem rodas de 16 polegadas, boas engolidoras das irregularidades que não faltam em nossas vias, espaço generoso sob o banco e a nada indiferente proteção contra as intempéries oferecida pela dupla parabrisa-escudo, que deixam peito e pernas bem  limpinhos e sequinhos durante a maior parte do tempo. Mas um custa X, e outro X acrescido de quase 30%… Honda SH 300i
“Ah, mas é Honda, né?” Isso se ouve frequentemente e na alma desta frase está, em poucas palavras, o que fez da marca a líder mundial quando o assunto é veículo de duas rodas motorizado (tecnologia, robustez, pós-venda, valor de revenda…). Mas há também a conotação pejorativa, a irritação que dá à marca da asa uma fama de malvada, de pesar a mão excessivamente praticando uma política de preços cruel já que na cabeça de muitos existem veículos tão bons quanto os da Honda custando menos e oferecendo praticamente o mesmo.

 

Sem entrar neste delicado mérito,que certamente tem tons de um Fla-Flu motociclístico, será este o caso destes dois scooters? Um é tão melhor assim do que o outro? Ainda é cedo para dizer. Os testes comparativos ainda não foram realizados pelas revistas especializadas. Elas esmiuçarão igualdades e diferenças, vantagens e desvantagens, e haverá também o veredito do usuário que virá cm o tempo e com os quilômetros, que decretará julgamento sobre durabilidade, custo de manutenção e, na hora da vender, sobre a depreciação.

 

SH é líder na Itália
O que dá para dizer agorinha é que na Itália, maior mercado europeu para scooters, a família Honda SH formada pelo 300i e versões de 150 e 125 cc é a campeã nas vendas, líder disparada do segmento em 2015 ocupando os três primeiros lugares no ranking de vendas assim dispostos: 1º lugar para o SH 150 (8.450 unidades vendidas), 2º para o SH 125 (6.849) e, finalmente, o SH 300 em 3º (6.802).  

 

E o Citycom 300i? Sim, também é vendido por lá mas não agrada tanto, foi o 66º no ranking 2015, com 258 unidades vendidas. Importante registrar que também lá o SH 300 custa mais: o valor em euros que o consumidor italiano paga, 5.190, equivale a R$ 20.973 ao câmbio da segunda semana de março. Já pelo Citycom S 300i a pedida é de 3.860, ou seja R$ 15.600. A diferença regula com a daqui, os mesmos R$ 5 mil e alguma coisa…

 

O que define o preço?
Ao contrário do que a irritada maioria pensa, preço de produto industrializado não depende tanto do humor do chefe na hora da definição, mas sim de uma infinidade de fatores. Custo de produção certamente tem peso grande, mas incide também o posicionamento dentro de segmento que se pretende e neste quesito, a Honda brasileira não se fez de morta e nem de fingida, admitindo que, sim, quer colocar a novidade SH 300i em um patamar “premium”, capturar um público alvo para o qual dinheiro nesta magnitude, R$ 20 mil, não é um grande problema.

 

Comprova esta política “para poucos e bons” a quantidade de SH 300i que pretende vender este ano, apenas 1.000, e a distribuição fortemente orientada para suas concessionárias localizadas nos grandes centros, especialmente o sudeste do Brasil, tática que certamente está deixando muitos de seus mais de mil concessionários malucos de raiva pois não haverá SH 300i para todos. Dafra Citycom 300i S 2017

Levando em conta que a Dafra vendeu 2.250 Citycom 300i em 2015 o que a Honda alega pretender em termos de venda não parece nem sub nem superestimado. Essa leva inicial a meu ver sumirá das revendas, na sequência haverá ajustes, de quantidade e de preço, claro. E o mesmo vale para a Dafra, grande introdutora deste segmento e que merece palmas tanto pela aposta certeira quanto pela escolha de ter a taiwanesa SYM como fornecedora de seu best-seller Citycom, cuja qualidade, eficiência e solidez fizeram dele uma referência de mercado. Antes ele estava só no segmento e agora tem um rival peso-mais-do-que-pesado. Para enfrentar a chegada do scooter Honda a Dafra mexeu no motor, cavou cavalos e manteve o preço razoável. Seus clientes terão motivos para lhe serem fiéis.

 

A chegada do Honda SH 300i, portanto, pode ser interpretada mais com uma expansão do segmento do que um ataque frontal. Ainda mais com este desnível de preço. Talvez uma análise apurada determine que haja algo a mais do que o mais evidente “degrau” tecnológico que separa o SH 300i do Citycom S 300i, que não justifica toda a diferença de preço, mas ajuda a montar uma parte do quebra-cabeça: os freios ABS. Isso, sabemos, é um equipamento que não é exatamente barato.

 

Será curioso daqui um ano olhar o que aconteceu. Apesar da queda geral nas vendas de motos o segmento dos scooters parace imune ao mau momento de nossa economia. A oferta de uma novidade importante pelo dono do mercado vai alterar a cena? Em março de 2017 teremos a resposta, tanto de como andará o mercado como sobre o preção da novidade. Afetou ou não? A quem, à Dafra ou ao consumidor. Ou ambos?  

 

Antes de fechar, um causo: em 1986 a Honda decidiu importar um lote de uma supermoto. Naquela época a maior máquina disponível no Brasil era a Honda CB 450 e, para “apavorar” a clientela (e a concorrência!) trouxeram 700 unidades da CBX 750F, que foram disputadas a tapa, vendidas pelo triplo do preço sugerido. Certamente isso não irá ocorrer com o SH 300i. Os tempos são outros e também o fator de atração é diferente. Mas brasileiro, sabemos, adora novidades e por causa disso o preço – ora o preço! – às vezes conta bem pouco.

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