ABS para motos
O ano marcado por queda nas vendas das motos (frente ao anterior) está terminando de um jeito positivo. A boa notícia veio do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), que deu um passo importante para aumentar a segurança dos motociclistas, promulgando uma lei que determina que, a partir de 2016, as motos devem ter sistemas de auxílio à frenagem.

Como você poderá ler na notícia publicada no G1, tais dispositivos vão começar a equipar a frota nacional de forma escalonada. Até 2019, todas as motos vendidas no país terão sistemas para diminuir a distância de frenagem ou tornar esta ação mais segura.

Essas tecnologias estão progressivamente sendo incorporadas a motocicletas desde os anos 1980. A mais notória delas é o ABS (sigla para Antilock Braking System), que, como o nome indica, serve para evitar o bloqueio das rodas e a consequente perda de aderência dos pneus em frenagens mais fortes ou realizadas em pisos escorregadios (veja no vídeo abaixo).

Já o CBS, sigla para Combined Brake System, não impede o travamento, mas distribui o poder frenante para ambas as rodas, independentemente de qual seja a ação do motociclista, se no pedal (freio traseiro) ou na alavanca da direita do guidão (freio dianteiro).


Ao contrário do ABS, o CBS é mais simples e barato, não exige sensores eletrônicos e um complexo sistema de gerenciamento da frenagem. Em uma moto básica, o sobrepreço oriundo de um sistema ABS deve ficar em torno de R$ 1.500, enquanto que o CBS mal acrescentaria R$ 200 ao preço final.

Modelos mais baratos se beneficiarão
A resolução do Contran visa, obviamente, o aumento da segurança de todos os veículos de duas rodas, sejam eles de pequeno, médio ou grande porte, mas o efeito prático desta medida será muito mais sentido para quem usa modelos de entrada, as motos de até 150 cc, que compõem o maior percentual do mercado nacional.

Eleitas como ideais para o início da vida motociclística, essas pequenas motos, infelizmente, são usadas para perpetuar uma má prática, que paradoxalmente é incentivada por muitos instrutores de motoescolas. Eles disseminam a crença de que o freio principal é o traseiro, enquanto ao dianteiro caberia um papel periférico, coadjuvante, quase que decorativo.

A “lenda” de que, ao atuar de maneira preponderante na alavanca do freio dianteiro leva à perda de controle e, em grau maior, ao capotamento da motocicleta, faz uma expressiva legião de motociclistas inexperientes subutilizar o poder frenante de suas motos. A atitude tem o efeito devastador de transformar situações de baixo risco em acidentes graves.

A introdução do sistema CBS não resolve todo o problema, já que para a perfeita ação dos freios ambos comandos – pedal e alavanca – precisam ser acionados, mas ao menos irá minimizá-lo. Mesmo se o condutor insistir em jamais usar a alavanca, algum poder frenante será transmitido à roda dianteira, o que reduzirá o espaço de frenagem.

Experts desconfiados
Para quem não é íntimo de motocicletas, pode parecer estranho os comandos de freio atuarem independentemente na roda dianteira e traseira, enquanto que em outros veículos de quatro rodas ou mais o pedal do freio age em todas as rodas.  Isso acontece pela peculiar dinâmica de uma motocicleta. De fato, sob o ponto de vista da pilotagem de alto nível, ao freio traseiro caberia apenas a função de equilibrar a frenagem e ajudar o contorno de curvas. Muitos são os pilotos de competição que não usam o freio traseiro, ou o acionam apenas em curvas, para ajudar a motocicleta a “deitar” mais facilmente, fechando a trajetória.

Fora do restrito ambiente da pilotagem esportiva, o freio traseiro tem seu uso recomendado por especialistas em proporção de, no máximo, 30% da ação frenante. Como determinar esse percentual? É a experiência de cada um, os quilômetros rodados ao guidão, que indicarão qual o nível de pressão adequada em cada comando para obter a melhor frenagem. A complexidade que a motocicleta tem do ponto de vista do equilíbrio irá, com o tempo de guidão, ensinar a cada condutor que frenagens a uma mesma velocidade e em um mesmo local podem (na verdade devem) ser feitas de maneira diferente se, por exemplo, o piso estiver seco, molhado ou apenas úmido. Em linhas gerais, quanto mais escorregadio o piso, menor deve ser a força de atuação no freio dianteiro – e o contrário vale em caso de piso seco.

Complicado, não? Claro que sim, e por conta disso que alguns motociclistas experientes ou talentosos se mostram arredios quanto à incorporação desses sistemas. De certo modo eles tem razão: somente há poucos anos algumas motos superesportivas começaram a vir dotadas de sistemas ABS e, no ambiente da competição pura de altíssimo nível, os campeonatos mundiais da MotoGP e Superbike, tal sistema não é usado. Isso porque, em testes simulados, com condições ideais de piso (seco), o ABS para a moto em espaço maior do que um piloto profissional.

Assim como o sistema mais evoluído, o ABS se valeu dos progressos da eletrônica e hoje é capaz de “ler” através de seus vários sensores não apenas o óbvio dado, se a roda está prestes a travar ou não, como também entender o ângulo de inclinação da moto, se o acelerador está sendo usado e em que percentual, qual a marcha engatada, qual a atuação de cada uma das suspensões em tempo real e… Ufa, o processamento em nanosegundos se encarrega de oferecer a melhor eficiência frenante possível. Mas é óbvio que tudo isso custa muito dinheiro, e é inviável equipar motos de 125 ou 150 cc com tal aparato.

Já o CBS que será aplicado às motos populares não poderá incorporar tamanha tecnologia, e os motociclistas mais habilidosos poderão “chiar”, afirmando que ao usar o freio dianteiro sentem a atuação na traseira “atrapalhando”. O mesmo poderão dizer os arraigados defensores do freio traseiro, que buscarão método para eliminar essa, segundo eles, “perigosa” ação na dianteira.

Na prática, o resultado será que as frenagens das motos pequenas com CBS (e das grandes com ABS) obrigatório garantirão um maior nível de segurança à maioria, o que é indiscutivelmente bem-vindo para todos os motociclistas, habilidosos ou não, experts ou recém-chegados ao mundo das duas rodas. 

Fotos: Caio Kenji/G1; Max Rossi/Reuters