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Olimpíadas: Tenho pena dos intolerantes, diz comentarista Alline Calandrini

Jornalista que trabalhará nos Jogos de Paris vem ganhando cada vez mais espaço na Globo; ela diz que não se importa com haters e que 'sempre haverá machismo escancarado'

Mulher com cabelos aloirados e camisa azul
A jornalista e comentarista de futebol da Globo Alline Calandrini - @alline.calandrini no Instagram
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São Paulo

Quem vê a jornalista e comentarista Alline Calandrini, 36, trabalhando nos jogos de futebol da Globo talvez não saiba que, para estar ali, a ex-zagueira de times como Santos e Corinthians não tem só o conhecimento adquirido na prática com o futebol. Para estar ali, comentando as partidas, costuma gastar horas e horas de dedicação a estudos sobre os times, táticas, atletas em campo e todo o contexto que envolve a disputa.

"Eu assisto a jogos que nem vou atuar, só para ter conhecimento sobre tudo", diz ela ao F5. Porém, a profissional, com um ano e meio de casa, lamenta que muitas vezes não importa a bagagem, a experiência e o comprometimento: as críticas chegam sempre, sem dó. "Independentemente do estudo, sempre haverá machismo escancarado. Quando o narrador homem erra, passa batido. Já se é a mulher que erra, pegam muito mais no pé".

Mas nem isso nem o preconceito sofrido por falar abertamente sobre sua relação com outra mulher parecem tirar o foco e a seriedade com que a macapaense encara o trabalho. Pelo contrário. Em alguns dias, Alline fará algo que não conseguiu na época de atleta: estar nas Olimpíadas, agora como comentarista. "Que a comunicação me leve cada vez mais longe", diz, animada.

Para os espectadores, parece que você vem ganhando cada vez mais espaço na Globo. Concorda?
Me sinto realizada. Parei de jogar em 2018 e assumi comentários na modalidade de futebol feminino em outra emissora [Band], e tudo rolou muito rápido. Vivo um momento feliz profissionalmente, com chances que estão surgindo. O que me alegra é poder me comunicar com diversas bolhas, como quando participo do Encontro com a Patrícia Poeta (Globo).

O que lembra da carreira como jogadora?
Joguei desde os quatro anos, nasci para jogar. No Norte, de onde venho [ela nasceu em Macapá-AP] se falava pouco de futebol feminino. Com 16 anos, vim para São Paulo para jogar no Santos, no Juventus e no Corinthians, clube onde encerrei minha trajetória de forma precoce, aos 29 anos. Passei por duas cirurgias de joelho em sequência, fiquei dois anos parada e isso mudou minha performance dentro de campo. Nesse meio tempo, estudava jornalismo e já vislumbrava essa área.

Em questão de dias, você fará comentários nos Jogos Olímpicos de Paris. Como vai ser?
Farei aqui do Rio de Janeiro pela tecnologia avançada que a TV disponibiliza. Eu não consegui ir às Olimpíadas como atleta e me deixou com gostinho de quero mais. Mas isso não me abala, já que na Globo consigo me realizar dessa forma.

Você ainda é uma das poucas mulheres comentaristas da emissora. Se considera uma voz ativa?
Estar onde estamos já nos torna uma voz ativa. Quando mais nova, não imaginava que estaria na TV, porque não via mulheres comentando jogos. Temos que sempre falar da importância de termos mais mulheres nos cargos televisivos, e a emissora vem abrindo essas portas. São pessoas, independentemente de orientação sexual, cor, religião. O cenário, hoje, é mais diverso. (Segundo a assessoria da Globo, há 35% de presença feminina nas transmissões de futebol do canal; nas Olimpíadas essa taxa, afirma a emissora, será de 43%)

Como é sua preparação para comentar os jogos?
Fui atleta, determinada, e isso se repete na minha profissão como jornalista. Meu estudo é assistir aos jogos e isso virou minha base, minha segurança. Mas, independentemente de estudar mais ou menos, sempre haverá machismo escancarado, homens com ódio destinado às mulheres. Quando o narrador homem erra, passa batido. Já se é a mulher que erra, pegam mais no pé.

Quais as suas referências no comentarismo feminino?
Gosto muito da Juliana Cabral, da Ana Thaís Matos, Nathalia Ferrão. São mulheres competentes e nos fortalecemos umas às outras.

Te afeta quando, sobretudo na web, tentam criar uma rivalidade feminina entre comentaristas?
Não. Isso não me afeta. Não precisamos aumentar uma para diminuir a outra. São todas referências, cada uma com sua forma de analisar o jogo, assim como homens também são diferentes. Não existe rivalidade.

Você é uma mulher gay, do Norte do país. Se considera inspiração?
Tenho apoio da minha namorada [a jornalista e apresentadora Stephanie Paula] para tudo. Não é sempre que vemos uma nortista falando ou jogando na maior emissora do país. Recebo carinho e muitos feedbacks positivos. O fato de ser gay também é representatividade, claro. São muitas camadas de diversidade em mim.

Já sofreu preconceito, assédio?
Como jogadora, existe uma discriminação sobre a orientação sexual. Falam: 'Um bando de mulher macho, sapatão, coitadinhas'. Convivo desde a minha infância com isso, mas não me incomoda. Tenho pena dos intolerantes e o mais importante é o apoio da família, isso eu sempre tive. Claro que quando mais nova ficava assustada. É o ódio sempre voltado às mulheres.

Acontece no trabalho também? Como jornalista também acontece. Alguns tentam me diminuir, falam que não entendo nada, usam palavras pejorativas.

Quais seus planos profissionais?
A primeira vez que comentei um jogo de futebol masculino me deu a certeza de que estou no caminho certo. Fazer agora as Olimpíadas e uma Copa do Mundo e estar na Patrícia Poeta já são grandes realizações. Quem sabe no futuro entrar mais nesse universo do entretenimento. Que a comunicação me leve cada vez mais longe.

Vendo suas fotos da época de jogadora, é possível notar que você mudou muito a fisionomia. Ficou mais vaidosa após encerrar a carreira nos gramados?
Sempre fui muito vaidosa desde a época de atleta. Mas odiava aqueles tipos de pauta que a imprensa fazia que nos citavam como musa do Santos, a gata do Corinthians. Passei por isso. Hoje, esse tipo de reportagem não aparece mais, mas antes as mulheres eram sexualizadas e eu abomino. Quando eu jogava, estava com dez quilos a mais, tinha mais massa. Minha rotina não mudou, vou à academia todo dia, emagreci, porque não há mais necessidade de muita massa muscular.

Sofre pressão por estar na televisão?
Não, sempre gostei de me cuidar, nunca sofri pressão alguma. Mas prefiro estar bem na frente das câmeras. Mudei mais pela maturidade, pelo meu dever que reflete na estética, mas nada de pressão. Foi algo que foi ocorrendo naturalmente.

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