Natural de Brasília, no Distrito Federal, JE Kos viu sua arte nascer da observação – o que ela salienta ser uma de suas maiores fontes, em entrevista para a Casa Vogue. A artista terá seu trabalho exposto aos olhos – físicos e digitais – na edição de 2023 da BRIFW Wired Conference, que acontecerá no dia 1 de novembro, no State, espaço na Vila Leopoldina, e no dia 2 de novembro no NoWhere – uma espécie de metaverso.
Para o evento, a artista, de 26 anos, que atualmente reside no Rio de Janeiro, fará uma exposição especial de arte digital, a partir da inteligência artificial e técnicas manuais. A mostra acontecerá na Igrejinha e será aberta à visitação do público, desde o início do evento.
“Acho que a arte se tornou o meio de tornar visível as minhas definições de vida, da minha existência”, opina ela. “Busco explorar essa profundidade na experiência humana. Além de entender e compartilhar essas complexidades da minha existência [com os outros]”.
JE Kos conta que, desde criança, a fotografia foi a primeira a lhe fisgar os olhos – uma vez que sua mãe sempre carregava a câmera analógica nas mãos, por hobby. Na adolescência, quase cursou Administração e Educação Física, “o que não deu certo”, em suas palavras. “Então olhei para a Moda e pensei que fosse um lugar que eu poderia ter a liberdade que eu tanto admirava”.
Seu primeiro trabalho foi ao lado do estilista Lucas Leão. Junto ao designer, JE Kos fazia as estampas das peças e posteriormente atuou como assistente de estilo. Depois disso, chegou ao BRIFW (Brazil Immersive Fashion Week), conduzida por Olívia Merquior, idealizadora do evento. O novo passo começou em 2020, época em que o mundo enfrentava a pandemia da covid-19.
“Nesse tempo, comecei a trabalhar com fotografias mais experimentais. Foi um período desafiador. Estávamos passando pela pandemia e eu, assim como o resto do mundo, estava trancada em casa, sem saber o que fazer. Mas tinha essa necessidade de criar. Foi como minha carreira de artista começou”, diz JE Kos, que, em 2021, participou da SP-Arte e viu a oportunidade do seu trabalho florescer, a partir do contato com novos criativos e com a tecnologia.
Quais são as inspirações para o seu trabalho?
A inspiração para o meu trabalho é derivada de uma fonte completamente visual. Um mergulho no meu dia a dia. Sobre ter o costume de processar as minhas ideias, pensamentos e sentimentos através de imagem, em vez de palavras. Cada objeto, cena e fragmento que eu encontro no meu cotidiano se torna um potencial de inspiração. Esses elementos, muitas vezes, aparentemente desconexos, compõem o meu pensamento, o que eu estou sentindo. Recentemente, inclusive, iniciei um exercício criativo, que dei o nome de Visual Vortex. Começou na newsletter da BRIFW e estou levando para o meu Instagram. Tento relacionar esses fragmentos imagéticos, que eu fotografo no meu dia a dia, dando vida à palavra, transmistindo suas definições e envolvendo também um olhar mais profundo e pessoal, sabe? Minha inspiração é esse mergulho profundo na complexidade da vida. Uma busca constante pela beleza das coisas que, no dia a dia, passam despercebido.
Seu trabalho traz muitas referências a flora. Como esse tema guia o seu trabalho?
É um mergulho profundo nas complexidades da relação entre o ser humano e a natureza. Acho que, assim como na filosofia essencialista, o argumento é que os indivíduos criem seu próprio significado na vida. As plantas e as flores assumem esse papel simbólico. A minha intenção é criar um contraste nítido entre a beleza natural e a beleza artificial. As flores, a beleza delas, atravessa fronteiras de períodos de tempo, países, idiomas. Da cultura de modo geral. Sinto que as pessoas sentem essa singularidade na beleza intuitiva. Falo muito sobre mudança, a natureza em transformação. Acho que isso desafia, sabe? De uma existência predefinida. Minha abordagem artística busca desafiar as fronteiras convencionais entre o ser humano e o mundo natural.
Como a moda e a arte se conectam para você?
Acho que tanto a moda quanto a arte são meios de autoexpressão e de identidade, tanto pelo vestuário quanto na arte. Em ambos, a gente consegue expressar visões, crenças e experiências pessoais. Além da criatividade e inovação. Acho que as duas desempenham um papel crucial. A criatividade da moda envolve a criação, tanto dos novos designs e estilistas e conceitos, enquanto a arte desafia constantemente a fronteira do pensamento criativo e também da expressão visual.
Além disso, acho um ponto importante a narrativa e a comunicação que esses campos têm a partir do poder de contar uma história e transmitir uma mensagem. A moda pode contar histórias sobre culturas, épocas e indivíduos, o que está presente no meu trabalho. Já a arte pode ser uma forma poderosa de comunicação e expressão, em questões sociais, políticas e emocionais.
Qual o fio condutor para a sua exposição no BRIFW? Como foi o desenvolvimento?
A BRIFW é um espaço onde as minhas ideias e visões sobre a intercessão de novos criadores na tecnologia, cultura, arte e moda se encontram. Desafiando as convenções e buscando inovação. Minha jornada é, de certa forma, uma jornada paralela à minha própria evolução criativa. Sempre acreditei profundamente no que eu apresentava para as pessoas, trabalhando com a ideia de promover o novo, seja na forma dos novos talentos, novas perspectivas e tecnologias. Agora, tenho essa oportunidade e honra de dar um passo na minha carreira e levar minhas ideias para uma próxima fase, com minha própria exposição.
Essa exposição é um mergulho, sabe? No meu próprio pensamento e no processo criativo. Está sendo um exercício de autodescoberta e também de um compromisso do que a BRIFW também acredita.
Como a tecnologia, do seu ponto de vista, é uma aliada para a produção de arte hoje em dia?
O que eu acredito em relação à tecnologia é que ela é neutra. O que define é a maneira como a gente usa. Acho que isso vai determinar se terá um impacto positivo ou negativo, porque a tecnologia oferece oportunidade de desafios. Cabe a nós decidirmos como aplicar. Podemos usar para melhorar nossas vidas, a sociedade e o mundo, ou para fins prejudiciais. Então acho que, intrinsecamente, a tecnologia está ligada a essas escolhas humanas. A responsabilidade que a gente tem no seu uso. Trazendo para a arte, acho que, entre os pontos positivos, está o acesso universal. A arte no digital não tem fronteira – democratizou-se o acesso à arte. Então hoje consigo compartilhar meu trabalho com uma audiência global, não só aqui no meu nicho, onde eu estou. Além disso, há também a experimentação criativa. O que ela possibilita na arte interativa, digital, realidade virtual, impressão 3D. Acho que isso enriquece também o processo de formas inovadoras. A expressão artística. Fora que também é uma forma de preservação e documentação das obras de artes.
Depende também dos artistas e da sociedade. Acho que é sobre explorar o potencial criativo e minimizar os impactos negativos. A tecnologia acaba sendo um espelho, um reflexo das nossas escolhas e valores humanos. E é nossa responsabilidade usá-la de maneira que enriqueça nossa experiência artística e cultural.