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Charles-Louis de Secondat, mais conhecido por Barão de Montesquieu ou simplesmente Montesquieu, foi um filósofo, escritor e político iluminista francês. Viveu o glorioso século XVIII, tido como período de grande crescimento intelectual europeu, sobretudo francês, em razão da ascensão do movimento iluminista.
Montesquieu foi um dos principais intelectuais iluministas a sustentar teoricamente a Revolução Francesa, que aconteceria em 1789, 34 anos após a sua morte. A principal contribuição do filósofo para a filosofia política que fundamentou a revolução e para toda a organização política posterior foi a ideia de tripartição dos poderes do Estado.
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Tópicos deste artigo
- 1 - Biografia de Montesquieu
- 2 - O que Montesquieu defendia?
- 3 - Tripartição do poder
- 4 - Principais obras de Montesquieu
- 5 - Frases de Montesquieu
Biografia de Montesquieu
Charles de Secondat nasceu no Castelo de La Brède, propriedade próxima à cidade de Bordeaux, França, no ano de 1689, numa família nobre, mas não tão tradicional. Obteve a primeira educação em casa e partiu para a educação formal colegial aos 11 anos de idade no Colégio de Juilly, instituição frequentada por filhos da elite local. Os padres que dirigiam o colégio eram da Congregação do Oratório, tendo uma orientação bastante intelectualizada e pautada pelo que o espírito iluminista considerava como um bom princípio educativo: as luzes e a razão advindas da filosofia moderna e da ciência.
Montesquieu ingressou na Faculdade de Direito da Universidade de Bordeaux. Aos 19 anos de idade, ele já estava aprendendo a prática da advocacia em uma espécie de estágio para aprendizado prático em Paris. Em 1713 ele voltou a Bordeaux para cuidar das finanças e dos negócios de sua família em virtude da morte de seu pai.
Em 1715, o pensador casou-se com Jeanne de Lartigue, tendo com a esposa três filhos. Apenas um ano após o seu casamento, Charles herdou, em razão do falecimento de sua mãe, o título que havia sido de seu pai, o Barão de Montesquieu, o que lhe rendeu também o direito sobre as terras equivalentes ao baronato e um cargo no Parlamento de Bordeaux.
Era fato que Montesquieu não precisaria mais trabalhar. Então ele passou a administrar sua fortuna e a estudar ciências da natureza, filosofia e direito. Com os escritos de seus estudos, vieram também escritos literários. Em 1721, Montesquieu concluiu a escrita das Cartas Persas. Por trás do humor satírico das Cartas Persas, encontra-se um polêmico crítico, que aparece depois, por diversas vezes, para estabelecer uma crítica política, muitas das vezes com igual tom satírico. Com as Cartas Persas, Montesquieu conseguiu o estrelato e logo passou a frequentar os círculos sociais reais e o Salão Literário da Madame Lambert.
Em 1728, após Montesquieu deixar a Câmara de Bordeuax por vontade própria e partir rumo a Paris, ele ingressou na Academia Francesa|1|. Um dos acadêmicos, o Cardeal André-Hercule de Fleury, clérigo influente política e intelectualmente na França, colocou-se duramente contra a eleição de Montesquieu para a cátedra na Academia por conta de sátiras contra a Igreja Católica postadas em Cartas Persas. No entanto, Montesquieu foi eleito e se tornou um dos imortais da instituição.
A partir de 1728, o filósofo passou a viajar pela Europa a fim de aprimorar-se intelectualmente, conhecendo novos filósofos, escritos, pensamentos e lugares. É certo que essas viagens influenciaram a visão política liberal do pensador. O pensador passou pela Áustria, pela Hungria, pela Itália e pela Inglaterra. Na Inglaterra estabeleceu-se por um tempo, até 1731, onde se tornou membro da Academia Real e entrou para a maçonaria. Ele retornou ao Castelo de La Brède e ficou recluso até 1734, escrevendo diariamente. Esse retiro intelectual deu origem a três escritos e é considerado pelos estudiosos o período de maturidade intelectual de Montesquieu.
Entre 1739 e 1746, Montesquieu esteve ocupado com a escrita e revisão de sua obra-prima, o livro Do Espírito das Leis, que foi publicado em 1748. Esse tratado tornou Montesquieu um notável filósofo e pensador da política. A recepção de uma obra que defendia o liberalismo político e ideais republicanos não ecoou bem entre grande parte da nobreza francesa e do clero. Até mesmo intelectuais e acadêmicos se colocaram contra o polêmico (e sensato) escrito.
Montesquieu escreveu Defesa do Espírito das Leis em 1750 e, em 1751, o livro foi oficialmente proibido ao ser incluído no Index Proibitorium. Toda a repercussão do livro aumentou a fama de Montesquieu, que o fez se envolver ainda mais com os círculos intelectuais e salões literários de Paris. D’Alembert, um dos editores e fundadores da Encyclopédie, encomendou a Montesquieu verbetes sobre política no grande compilado do conhecimento universal fundado junto a Denis Diderot. No entanto, Montesquieu preferiu escrever sobre o gosto e a estética.
Os últimos anos de Montesquieu ocorreram no Castelo de La Brède, plantando uvas e produzindo vinhos, sempre viajando, principalmente para Paris. Ele começou a perder a visão, até ficar completamente cego. Montesquieu faleceu aos 66 anos, em Paris, em 1755.
O que Montesquieu defendia?
Apesar de ser um homem das ciências, Montesquieu não se dedicou aos abstratos estudos racionalistas e empiristas comuns no século XVII. Seu interesse voltou-se para aquilo que o ser humano faz na coletividade: moral, costumes e política. Montesquieu e outros franceses de sua época, como Voltaire e Rousseau, dedicaram-se a fundamentar novas visões políticas, absolutamente contrárias ao absolutismo, ainda imperioso na França e em boa parte da Europa no século XVIII e já obsoleto na Inglaterra e nos Estados Unidos.
Apesar de nobre, Montesquieu era completamente contrário ao absolutismo. Ele era a favor de um Estado politicamente liberal, onde houvesse um corpo de leis que regesse a atuação daqueles que cuidam do Estado e dos cidadãos em geral. Para que não houvesse abusos, o Estado deveria ser repartido em três esferas de poder. Ele era completamente contra o poder despótico (o poder absoluto concentrado nas mãos de um tirano). Seu modelo defendia o respeito à liberdade e à vida, além dos direitos políticos dos cidadãos. Havia, para Montesquieu, três formas de governo centrais, sendo duas legítimas e uma ilegítima.
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República: as repúblicas poderiam variar de acordo com a amplitude da participação cidadã. As repúblicas democráticas são aquelas em que a cidadania e a participação política são estendidas a todos. As repúblicas aristocráticas têm uma restrição do conceito de cidadania, que fica atribuída a um pequeno grupo. De qualquer forma, é marca da república a divisão de poderes e a atribuição de um corpo de leis que regulamente a atuação de agentes públicos e de civis.
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Monarquia legítima: são regidas por um monarca (um rei), mas o poder desse rei não é irrestrito e absoluto. O monarca está submetido ao poder das leis e existe um corpo legislativo (um Parlamento) que cria as leis. Esse corpo, apesar de atuar em conjunto com o monarca, não pode ser por ele destituído, corrompido, dissolvido ou atacado, a menos que por justa causa.
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Despotismo: é a monarquia ilegítima, a monarquia absoluta. Os poderes do monarca nesse regime são irrestritos. O monarca despótico é, como disse o rei da França Luís XIV, o Estado. Ele quem faz as leis e age como se estivesse acima delas. Existiram pensadores, como o teórico político francês Jean Bodin e o filósofo inglês Thomas Hobbes, que defenderam o absolutismo como forma legítima de governo. Os iluministas em geral defendiam maior liberdade e respeito ao poder soberano do povo, o que implicaria quase que necessariamente a queda do absolutismo. Houve exceções de monarcas despóticos que tentaram aplicar os ideais iluministas na Europa, como o rei Frederico II da Prússia.
Veja também: Formas de governo – modo como um governo organiza seus poderes
Tripartição do poder
Para Montesquieu, um governo legítimo e bem estruturado deveria ter um corpo de leis, e o poder estatal deveria ser separado em três esferas. A defesa da separação dos poderes estava assentada na necessidade de um poder vigiar o outro (verificar se a Constituição é cumprida) e garantir que não haja abusos de poder. Um poder é complementar ao outro e nenhum pode se sobrepor ao outro. Para fazer uma analogia didática, a tripartição do poder é como um triângulo equilátero, onde não há um lado maior que o outro e os três pontos de ligação entre as arestas do triângulo têm tamanho igual e igual distância entre si|2|.
Os poderes do Estado e suas atribuições são os seguintes:
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Legislativo: composto por legisladores (vereadores, deputados e senadores), o Poder Legislativo é aquele que cria as leis, coloca os projetos de lei em discussão e em votação e fiscaliza a atuação dos outros poderes.
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Executivo: é aquele que governa. É representado por prefeitos, governadores, primeiro-ministro (em repúblicas parlamentares), presidente (em repúblicas presidencialistas), imperadores (em impérios) e reis (em monarquias). Esse poder deve atuar em concordância com a legislação, implementando ações que sejam liberadas pelo Poder Legislativo. Vez ou outra o Poder Executivo pode vetar a sanção de leis.
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Judiciário: é composto pelo corpo de magistrados. O Poder Judiciário deve julgar aqueles que atentam contra a lei e fiscalizar a atuação dos outros dois poderes.
Principais obras de Montesquieu
O filósofo escreveu dezenas de tratados, ensaios e artigos, que versam, em sua maioria, sobre política. No entanto, podemos destacar duas publicações como principais dentro de sua vasta obra.
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Cartas Persas: nessa obra literária epistolar, Montesquieu criou dois personagens persas, Usbek e Rica, que viajam pela Europa e chegam a Paris. Vivem aventuras e desventuras e trocam cartas com conterrâneos contando seus feitos. Cartas Persas foi escrito em tom cômico e satírico. É uma forte sátira política, social e religiosa da França dos séculos XVII e XVIII e tornou o filósofo Montesquieu conhecido na França.
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Do Espírito das Leis: o título dessa obra é um pouco maior do que essa redução. O título completo é “O Espírito das Leis: Ou das Relações que as Leis devem ter com a Constituição de cada Governo, com os Costumes, o Clima, a Religião, o Comércio etc.”. Esse livro condensa toda a teoria política de Montesquieu. Ele fala das leis e da necessidade de criação de um corpo de leis para garantir, inclusive, a liberdade. Fala também da importância do governo e do Estado, além de expor a teoria da tripartição do poder.
Acesse também: Valores morais e sua importância para a sociedade
Frases de Montesquieu
“Liberdade é o direito de fazer tudo o que as leis permitem.”
“Não há mais cruel tirania do que aquela que exerce à sombra das leis e com as
cores da justiça.”
“A liberdade, esse bem que nos permite desfrutar dos outros bens.”
“É uma infelicidade que existam tão poucos intervalos entre o tempo em que somos
demasiado novos e o tempo em que somos demasiado velhos.”
“Leis inúteis enfraquecem as leis necessárias.”
Notas
|1| A tradicional Academia Francesa é uma instituição científica, literária e linguística da França que nomeia 40 “imortais” para ocuparem suas cátedras devido à notória contribuição para o povo francês. Ela foi o modelo de inspiração para Machado de Assis, Ruy Barbosa, Joaquim Nabuco, Olavo Bilac e mais sete grandes escritores brasileiros fundarem a Academia Brasileira de Letras no final do século XIX.
|2| Lúcio Costa, o urbanista que projetou Brasília, utilizou a figura do triângulo equilátero e a inspiração iluminista para projetar a Praça dos Três Poderes em Brasília. Defensor da igualdade comunista, mas também inspirado pelos ideais de igualdade, liberdade e fraternidade iluministas, Lúcio Costa colocou em cada ponto do triângulo da Praça dos Três Poderes um dos palácios que abrigam o mais alto grau do poder que representam. Lá estão o Palácio do Planalto, sede da Presidência da República; o Supremo Tribunal Federal, onde trabalham os ministros da Suprema Corte, ou seja, os chefes do Poder Judiciário; e o Congresso Nacional, que abriga o Senado Federal e a Câmara dos Deputados Federais, ou seja, os chefes do Poder Legislativo.
Créditos das imagens
[1] Alexey Pevnev / Shutterstock
[2] The original uploader was Nero at Portuguese Wikipedia / Commons
Por Francisco Porfírio
Professor de Filosofia