Um garoto de 9 anos foi ferido com um tiro no rosto, supostamente disparado por um adolescente de 12 anos, quando ambos brincavam no segundo piso de um sobrado, por volta das 16h40 desta terça-feira (16), no bairro Iguatemi (zona leste da capital paulista). A criança ferida foi encaminhada ao hospital Ermelino Matarazzo, também na zona leste. A Secretaria Municipal da Saúde afirmou, nesta quarta-feira (17), que o estado de saúde do garoto é estável.
O revólver calibre 38, usado para ferir acidentalmente o menino, estava guardado juntamente com uma escopeta calibre 12. Ambas as armas não contam com registro, segundo a polícia. O responsável por elas não havia sido localizado até a publicação desta reportagem.
O menino de 12 anos relatou à Polícia Civil, acompanhado da mãe, ter encontrado a chave que dá acesso ao segundo piso do sobrado, onde ele mora com os pais e um irmão de 9 anos. O local era mantido trancado, pois a família paga o aluguel somente do primeiro andar do imóvel. O andar superior, disse a mãe do menino, era usado eventualmente para que ela estendesse roupas lavadas.
Quando encontrou a chave, em um armário onde são mantidos produtos de limpeza, o garoto acessou o segundo andar, acompanhado do irmão e do outro garoto de 9 anos, que brincavam na casa. Não havia adultos na residência no momento do incidente.
Ao chegar no segundo piso, segundo registrado pela Polícia Civil, os menores encontraram um revólver calibre 38 e uma escopeta, calibre 12, guardados sob um móvel.
O menino de 12 anos pegou o revólver, que estava com munição, e a arma disparou uma vez, atingindo a criança de 9 anos na bochecha. O projétil ficou alojado próximo ao ouvido esquerdo da vítima, que permanecia internada até a publicação desta reportagem.
Após o menino ser ferido, os outros garotos chamaram a mãe, que trabalhava como caixa no momento do incidente. Enquanto isso, o garoto ferido foi socorrido. Os pais dele, que moram perto do local onde o filho foi baleado, o acompanharam até o hospital.
As armas foram recolhidas e entregues à Polícia Militar, assim que agentes da corporação foram atender à ocorrência. Além das armas, também foram apreendidas nove munições, calibres 12 e 29, além de munições calibre 38.
O armamento não tem registro e, segundo a polícia, pertence aos proprietários do imóvel, que se mudaram para o litoral paulista há cerca de um ano. Um telefone, que seria da esposa do suspeoto dono das armas, consta no boletim de ocorrência do caso. A reportagem tentou entrar em contato a partir deste número, mas sem sucesso.
O caso foi registrado como lesão corporal culposa (sem intenção) e posse ilegal de arma de fogo, de uso permitido, no 53º DP (Parque do Carmo).
Segundo a SSP (Secretaria da Segurança Públca), gestão João Doria (PSDB), as polícias Civil e Militar apreenderam na capital paulista, no ano passado, 2722 armas de fogo, representando 7,4 casos diários. Durante o mesmo período, ocorreram 931 prisões por porte ilegal de arma.
No mesmo período do ano anterior, foram apreendidas 2730 armas e presas 1.141 pessoas portando ilegalmente armamentos, uma queda de 0,2 e 18,4%, respectivamente, em relação ao mesmo período de 2020.
Decreto pode contribuir para eventuais tragédias, diz especialista
Para a gerente de projetos do Instituto Sou da Paz, Natália Pollachi, casos semelhantes ao ocorrido na com o menino de 9 anos podem, eventualmente, se repetir em decorrência da flexibilização para a compra de armas prevista em decreto do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) na última sexta-feira (12).
“Uma questão importante é que, antes do decreto, para a compra de uma arma adicional, a pessoa precisava justificar. Os novos decretos, porém, acabam com isso. Atiradores esportivos, por exemplo, podem agora manter em casa até 60 armas, um verdadeiro arsenal, isso é absurdo”, destacou.
A facilitação para a compra de armamentos, além do aumento de armas a serem eventualmente guardadas em casa, podem facilitar o acesso de crianças e adolescentes aos arsenais particulares, da mesma forma que de ladrões. “Isso pode levar a tragédias, ainda mais que os decretos também derrubaram a obrigatoriedade para a guarda [dos arsenais] em cofres”, acrescentou a especialista.
A gerente afirmou ainda que somente com pressão popular será possível reverter a flexibilização, determinada pelo governo federal, para adquirir armas, o que já mobiliza entidades.
“Com o decreto [de Bolsonaro] houve a invasão de competência [feito pelo Executivo] do Congresso, para alterar leis. O decreto foi publicado na noite da sexta de carnaval, quase escondido. Isso repercutiu muito mais do que o governo esperaria. Isso é flagrantemente ilegal, contra evidências científicas, mais uma vez.”
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