Candidaturas coletivas se multiplicam e chegam aos batalhões de polícia

Mesmo sem força jurídica, mais de 200 chapas compartilhadas disputam cargos eletivos neste ano

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São Paulo

O número de candidaturas coletivas inscritas para as eleições deste ano se multiplicou na comparação com o pleito de 2018. A lista agora inclui partidos à direita e grupos unidos por pautas conservadoras.

A Folha identificou 220 iniciativas do tipo entre os registros no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) ao buscar nomes de urna com os termos "coletivo", "bancada", "mandato" e variações que evidenciam esse atributo.

Candidaturas Coletivos Legislativo 2022
Candidatura do Coletivo PM-BM (Patriota), formada por policiais e bombeiros militares do Maranhão - @coletivopmbm

Nas últimas eleições gerais, apenas 12 grupos adotaram essas identificações. Estudo da Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (Raps) catalogou ao todo 28 campanhas coletivas na ocasião, incluindo aquelas não evidenciadas nos nomes de urna.

A ampla maioria das chapas segue concentrada no campo progressista. Nos pleitos municipais de 2020, legendas à esquerda popularizaram o modelo, utilizado como estratégia para aumentar a força eleitoral de grupos com menor representação política, como mulheres, negros e a comunidade LGBTQIA+.

Neste ano, PSOL, PT, Rede e PC do B respondem por mais da metade dos registros apresentados (57%).

Mas a lista de 2022 tem ao todo 28 siglas de todos os espectros. Entre elas estão PL, PP e Republicanos, legendas à direita que formam a coligação do presidente Jair Bolsonaro (PL), com uma chapa cada.

Ao menos sete grupos são liderados por policiais ou bombeiros militares que incluem em seus nomes de urna as respectivas patentes ou corporações. Uma dessas candidaturas tem como titular um filiado ao PSOL, e todas as outras são de partidos conservadores (Patriota, PP e PRTB).

É o caso do Coletivo PM-BM, que reúne 22 policiais e bombeiros nas disputas paralelas por uma vaga na Assembleia Legislativa do Maranhão e outra na Câmara dos Deputados. De acordo com o sargento Gilmar dos Anjos (Patriota), as duas chapas foram definidas em votação digital aberta aos batalhões de todo o estado.

"Criamos um estatuto e registramos em cartório. Todos têm o mesmo peso dentro das discussões, independentemente do grau de hierarquia", afirma o titular da candidatura a deputado federal.

Outro exemplo no campo conservador é o coletivo Maranhão com Bolsonaro. São oito civis que se reuniram para disputar um mandato de deputado estadual.

"Nosso objetivo é não deixar avançar ainda mais a ideia progressista, principalmente nas escolas. O grupo é aberto, e o pré-requisito é ser de direita e bolsonarista", diz o empresário Valter Cantanhede (PSC).

O Maranhão é um dos estados com mais candidaturas coletivas neste ano, atrás apenas de São Paulo. Em nível regional, o Nordeste concentra a maioria (86), superando o Sudeste (51), que liderava esse ranking nos pleitos anteriores, de acordo com o estudo da Raps.

O levantamento da Folha identificou 138 chapas coletivas para as Assembleias, 79 para a Câmara e três para o Senado, espalhadas por 23 unidades federativas de todas as regiões.

Também chama a atenção neste ano a variedade dos temas adotados. Alguns exemplos são a defesa dos animais, a maternidade, a prática de esportes, a legalização da maconha e os direitos dos motoboys, além de grupos que parecem não ter uma pauta específica.

Os dados reforçam que a maioria das candidaturas coletivas segue relacionada a movimentos sociais e se propõe a aumentar a competitividade de perfis com menos espaço e orçamento para a disputa eleitoral.

Entre os titulares, há presença de mulheres (46%) e de pessoas declaradas pretas (37%) em proporções bem superiores às observadas no total de registros apresentados ao TSE (33% e 14%, respectivamente).

"São campanhas características de segmentos marginalizados na política, como mulheres, negros, LGBTQIA+ e outras minorias, sobretudo devido à força simbólica que essas identidades agregam, e que podem ser usadas como retórica de questionamento sobre a sub-representação desses grupos", diz Cloves Oliveira, professor do departamento de Ciência Política da UFBA (Universidade Federal da Bahia).

Em 2018, foram eleitas duas candidaturas compartilhadas, para as Assembleias de São Paulo e de Pernambuco: a Bancada Ativista, encabeçada por Monica Seixas, e o coletivo Juntas, por Jô Cavalcanti. Ambas são do PSOL e concorrem à reeleição.

"Foi uma experiência exitosa, em uma Assembleia totalmente conservadora. Ninguém sabia o que era um mandato coletivo, e houve grande aceitação. Isso fez com que outros grupos se interessassem por esse formato", afirma Cavalcanti, presidente da Comissão de Direitos Humanos do Legislativo pernambucano.

As candidaturas coletivas, no entanto, são informais e não existem do ponto de vista da legislação eleitoral. Apenas o titular concorre oficialmente e pode tomar posse no cargo. Em caso de afastamento, o parlamentar será substituído pelo suplente eleito, não por outro integrante do coletivo.

"Esses mandatos são, na verdade, uma ficção jurídica. Na hora de responsabilizar o mandato ou de exercer o direito a voto [no Legislativo], só uma pessoa é a dona do exercício. É muito mais uma maneira de se colocar na propaganda. Digo que estou representando uma causa, um conjunto de pessoas, e isso por vezes seduz o eleitor", analisa o cientista político e professor do Insper Leandro Consentino.

Após a popularização do modelo em 2020, o TSE aprovou no fim do ano passado uma resolução que regulamenta o uso da identificação de coletivos nas urnas. A regra diz que o nome do titular não pode ser omitido.

"É vedado o registro contendo apenas a designação do respectivo grupo ou coletivo social", afirma o parecer do ministro Edson Fachin, aprovado com unanimidade no plenário do TSE.

A Justiça Eleitoral tem até 12 de setembro para aprovar as candidaturas deste ano. De acordo com o levantamento da Folha, ao menos 24 coletivos (11%) não contêm a clara identificação dos titulares nos nomes de urna e, portanto, estão sujeitos a ter o registro indeferido.

Entidades como a Frente Nacional de Mandatas e Mandatos Coletivos defendem a mudança da lei e a inclusão de mais titulares nas candidaturas.

"Para garantir que, na saída de uma pessoa, a proposta da coletividade continue", diz Luciana Lindenmeyer, pesquisadora da organização. "A nossa concepção é a de uma nova forma de implementar a política, horizontal, descentralizada e com pautas de fato populares."

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