“Quem gosta de floresta é índio e celebridade, o povo gosta é de dinheiro, e isso não vai faltar”. Essa frase sai da boca do vilão de “Aruanas” (que, em tupi-guarani, significa sentinelas), no quinto capítulo da série que lançamos no último mês de julho.
O personagem é um grande empresário interessado nos recursos minerais de terras indígenas e disposto a tudo para conseguir tirar desses territórios o que deseja. Mesmo que seus métodos tragam contaminação e morte.
“Aruanas”, um thriller ambiental, é uma coprodução da Maria Farinha Filmes e da Rede Globo e retrata a história de três amigas de infância que dirigem uma organização não governamental e que se veem envolvidas em uma trama para defender a floresta amazônica e os povos indígenas que vivem ali. Elas acreditam em um modelo de desenvolvimento que concilia proteção e lucro.
A série, que começamos a roteirizar em 2017, é tragicamente contemporânea, e a fala do nosso vilão poderia muito bem sair da boca de muita gente que ainda não consegue entender que a floresta tem muito mais valor em pé do que transformada em pasto ou garimpo.
Nas últimas semanas, por conta dos incêndios na região, a Amazônia passou a ocupar um lugar de destaque na imprensa mundial, e muito vem sendo debatido sobre preservação, regeneração, soberania e desenvolvimento local. Para nós, o momento pede também que pensemos em como desenhar outro futuro e em que caminhos podemos percorrer para chegar até lá.
“Aruanas”, através da ficção, tenta dar voz ao ativista e valorizar sua coragem e disposição —uma vez que esses defensores, em sua maioria, de forma anônima, seguem diariamente na luta em todo o Brasil.
As organizações não governamentais que cuidam da Amazônia precisam do nosso apoio e respeito. Os ativistas desempenham um papel fundamental na construção do futuro que queremos, e trabalham duro para salvar a floresta, que está sob o achaque de muitos.
Ser ativista sempre foi perigoso no Brasil, e tratá-los como criminosos aumenta ainda mais os riscos que correm. Tudo isso está retratado em “Aruanas”, e foi também pela vontade de dar luz a esses indivíduos que a série foi idealizada.
O entretenimento, em especial aquele feito para o grande público e veiculado por canais mainstream que impactam milhões, é uma ferramenta poderosa, capaz de acelerar transformações individuais e, consequentemente, sociais e culturais.
Acreditamos que o entretenimento pode virar o jogo e abrir espaço para novos consensos, que nos tirem da polarização burra e que nos ajudem a avançar. A ficção tem grande impacto nas nossas trajetórias reais. Ela influencia nosso comportamento enquanto consumidores e pode igualmente nos provocar enquanto cidadãos. Pode nos fazer sonhar e nos colocar no prumo em busca de soluções que deem conta dos desafios socioambientais do nosso tempo.
Precisamos refletir e repensar as estratégias. Cada um e cada uma podem contribuir de onde está. Sim, o povo gosta de dinheiro, o povo precisa de dinheiro. Mas ele não precisa vir em detrimento da floresta em pé. É exatamente isso que as protagonistas de “Aruanas” tentam provar ao nosso vilão, e uma pesquisa Datafolha divulgada em agosto mostra que a população brasileira concorda com elas. A mineração em terras indígenas é reprovada por 86% dos brasileiros. A pesquisa, contratada pelo Instituto Socioambiental , atesta que a rejeição à entrada de empresas de exploração em reservas é de, no mínimo, 80% em todas as regiões, escolaridades, idades, sexos e faixas de renda.
Que façamos o nosso papel, que é o de mostrar que existe um caminho possível que alia lucro e biodiversidade, desenvolvimento local e conservação da floresta. E que o trabalho dos ativistas seja valorizado, pois são eles os sentinelas que nos ajudam a manter os símbolos de um país que tem nome de árvore, que canta em seu hino que é gigante pela própria natureza e que escolheu o verde para marcar sua bandeira.
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