Como economia mais afetada, Brasil precisa de mais impulso do governo que outros países

Na tentativa de minimizar o erro de fazer o que não deve, o governo está aumentando a probabilidade de cometer o erro de não fazer o que deve

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Ricardo Barboza e Guilherme Tinoco

É um fato. As perspectivas para a economia brasileira estão cada vez piores. São pessoas sofrendo por falta de renda e empresas fechando por falta de crédito, sem falar, é claro, nas mortes, que, infelizmente, já somam 10 mil.

Segundo a Economist Intelligence Unit, o Brasil deve ser a economia mais afetada pela Covid-19 em uma amostra de 19 países. De fato, faz sentido que o estrago seja maior aqui.

O Brasil não tem apenas um problema de saúde afetando negativamente a economia. Temos também um presidente que resolveu acrescentar uma crise política ao cenário já turbulento. Nesse contexto, o que deveríamos esperar como reação de política econômica?

Previsão de crescimentodo PIB em 2020 (em %) Fonte: Economist Intelligence Unit
País Atual Pré-Covid-19

Diferença (p.p.)

Brasil -5,5 2,4 -7,9
Alemanha -6,8 0,9 -7,7
Itália -7,0 0,4 -7,4
Turquia -3,0 3,8 -6,8
México -5,4 1,1 -6,5
Inglaterra -5,0 1,1 -6,1
Arábia Saudita -5,0 1,0 -6,0
França -5,0 1,0 -6,0
China 1,0 5,9 -4,9
Argentina -6,7 -2,0 -4,7
EUA -2,8 1,7 -4,5
África do Sul -3,0 1,4 -4,4
Indonésia 1,0 5,1 -4,1
Coreia do Sul -1,8 2,2 -4,0
Índia 2,1 6,0 -3,9
Rússia -2,0 1,6 -3,6
Canadá -1,3 1,8 -3,1
Japão -1,5 0,4 -1,9
Austrália 0,4 2,0 -1,6

Ora, se o impacto da crise aqui é maior do que nos demais países, nossa reação de política econômica deveria ser também maior do que a média. O problema é que esse fato, que deveria ser básico, não vem ocorrendo.

Segundo o Ministério da Economia, em nota recentemente divulgada, a magnitude das medidas fiscais no Brasil estaria em linha com a média internacional. Comparações desse tipo nunca são muito precisas, mas, tomando o fato como verdade, há um problema sério relacionado à implementação dos programas.

No documento citado, quantifica-se o volume por meio de medidas anunciadas. Anúncios, contudo, nem sempre se transformam em medidas efetivas. Por exemplo, o programa de empréstimo do governo para pequenas empresas pagarem folha salarial, com orçamento de R$ 40 bilhões, tem sido um fracasso. Até agora, desembolsou somente R$ 400 milhões, ou 1% do total previsto.

Na política monetária, o país ainda tem o privilégio de ter juro positivo e, portanto, capacidade para reduzi-lo. Mas, enquanto PIB e inflação despencam, caminhamos em passos de tartaruga no barateamento do crédito para empresas, famílias e governo.

Por falar em crédito, o Brasil tem a vantagem de possuir bancos públicos com expertise e capilaridade para atuação nesses momentos. Segundo o Observatório de Política Fiscal da FGV, entretanto, a reação da política econômica via crédito público tem sido tímida. Ao contrário da crise de 2008, a atuação via bancos públicos parece hoje propositalmente esquecida pelos titulares da pasta econômica.

O resumo da ópera é que, no fim das contas, na tentativa de minimizar o erro de fazer o que não deve, o governo está aumentando a probabilidade de cometer o erro de não fazer o que deve --o que é muito mais grave neste momento.

Quando o ministro Paulo Guedes fala que os "sinais vitais da economia talvez não sejam preservados por tanto tempo", ele não está errado. Só esquece de dizer que quem possui as ferramentas para preservar tais sinais, e que não vem utilizando a contento, é seu próprio ministério.

Precisamos alertá-lo para o fato de que, assim como no caso da doença, as consequências econômicas aparecem de maneira exponencial. Cada vez mais fraco, lá vem o Brasil descendo a ladeira da morte --de pessoas e empresas.

Ricardo Barboza é professor colaborador da Coppead-UFRJ e mestre em economia pela PUC-Rio

Guilherme Tinoco é especialista em finanças públicas e mestre em economia pela USP

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