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GRAMPO NA ONU
As relações internacionais parecem representar o estado de
natureza hobbesiano, no qual o logro e a força, impulsionados unicamente pelo interesse próprio, prevalecem sobre leis, tratados e princípios. Sendo assim, não chegam a
surpreender as revelações, inicialmente feitas pela ex-ministra britânica Clare Short, de que o secretário-geral das Nações Unidas, Kofi Annan, e outros importantes funcionários da organização tiveram seus telefones grampeados às vésperas da
invasão do Iraque pela coalizão anglo-americana.
Travava-se, como se sabe, uma batalha diplomática. De um lado, norte-americanos e britânicos tentavam
convencer o mundo de que Saddam
Hussein representava uma ameaça
iminente. De outro, vários países, capitaneados pela França e pela Alemanha, pediam mais tempo para as inspeções. O campo mais belicista não
hesitou em utilizar-se de informações falsas para tentar provar suas teses -que depois se revelariam improcedentes- nem em empregar
métodos pouco ortodoxos para conquistar o apoio das nações indecisas
com voto no Conselho de Segurança.
Nesse contexto, grampos podem até
parecer violações menores.
Mesmo considerando isso tudo,
preocupa a forma como os principais envolvidos reagiram à notícia.
Os protestos dos grampeados foram
de uma mansidão inquietante. E foi
sintomática a atitude do premiê britânico, Tony Blair. Ele não negou que
seu país fosse o responsável pelos
grampos, mas, em vez de pedir desculpas a Annan e à comunidade internacional, sugeriu que a ex-ministra deveria ser punida pelo partido
por ter feito a revelação.
Não se espera, é claro, que a arena
das relações internacionais se torne,
do dia para a noite, um convento.
Mas um pouco mais de indignação e
apego a princípios -ainda que afetados- seriam bem-vindos. A finalidade mesma do multilateralismo é
tornar as relações entre Estados menos "naturais" e mais jurídicas.
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