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FUTEBOL
Crime e castigo
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
Certa vez perguntaram a
Ernest Hemingway o que poderia atrapalhar a carreira de um
escritor. "Dinheiro, bebida, mulheres", respondeu ele. "E também falta de dinheiro, falta de bebida e falta de mulheres."
Penso que mais ou menos a
mesma coisa pode valer para a
carreira dos jogadores de futebol.
Digo "mais ou menos" porque há
os jogadores que não gostam de
bebida e também, suponho, os
que não gostam de mulheres. De
dinheiro todos gostam.
Tudo é uma questão de medida.
Cada um deve ter liberdade de fazer o que quiser, desde que não
prejudique os outros.
Estou lembrando essas obviedades porque o grave acidente provocado pelo atacante Guilherme,
do Corinthians, desencadeou discursos e comentários que merecem algum ordenamento.
De um lado, surgiram as reações moralistas de praxe, identificando o álcool e as mulheres como o mal em si -demônios a serem exorcizados pela religião e
pelo bom-mocismo.
No extremo oposto, falou-se
muito do "drama que o jogador
vem sofrendo", como se Guilherme fosse vítima de uma conjuração do acaso.
Objetivamente, entretanto, o jogador cometeu um crime. Por
causa de seu comportamento imprudente (para dizer o mínimo),
duas pessoas perderam a vida.
A "culpa" não foi da bebida, e
muito menos das mulheres. O
problema foi misturar uma dessas coisas (a bebida) com uma
terceira: a condução de um carro
numa rodovia. Por tê-las misturado conscientemente, o cidadão
Guilherme é responsável pelo que
aconteceu e deve ser punido por
isso, de acordo com o que diz a lei,
como qualquer cidadão.
Ao jogador de futebol, em suma, não cabe nem menos nem
mais que a qualquer outro sujeito. Não merece nem o preconceito, nem o paternalismo.
Nem tudo é tão simples, porém.
Quando se trata de um astro de
um time de massa, como é Guilherme, seu caso ganha uma platéia de dimensões quase insuportáveis.
É como se o julgamento do atleta não se desse no espaço limitado
de um tribunal, mas a céu aberto,
diante de milhares de pessoas, a
cada vez que entra em campo
com seu time.
Mais do que o veredicto do tribunal e o veredicto das arquibancadas, contudo, o julgamento que
deve importar a Guilherme é o
que ele está fazendo ou fará de si
mesmo. É nesse lugar interno,
obscuro e indevassável que vigora
a moral. O resto é moralismo.
Já que falamos de punição, um
dos efeitos mais salutares da renovação política trazida pelas
eleições foi o de varrer do Legislativo alguns velhos caciques que
sempre se promoveram às custas
do futebol.
O caso de Eurico Miranda foi o
mais emblemático, não só por tudo o que ele representa mas também por sua reação aos fatos. Segundo ele, a culpa por sua derrota
foi "da mídia". Ainda bem que às
vezes alguém, ainda que sem querer, reconhece o lado positivo dos
meios de comunicação.
Fiquei com vontade de agradecer ao (ainda) deputado pela parte que me toca.
Mas nunca é demais lembrar
que essa vitória democrática não
terá validade se os atuais derrotados voltarem nas próximas eleições, ou se as mesmas práticas
ressurgirem na pele de novos caciques.
Sinais dos tempos
Três dos jogos de hoje -Palmeiras x Juventude, Figueirense x São Paulo e São Caetano x Vasco- são sintomáticos da atual situação do futebol brasileiro. Em outros
tempos, os grandes Palmeiras, São Paulo e Vasco seriam
considerados francos favoritos. Hoje ocorre quase o contrário. O caso mais dramático
é o do Palmeiras, que está em
penúltimo e pega o líder Juventude, depois de ter tomado quatro gols.
Toque de classe
Daqui para a frente, todos os
jogos são decisivos em alguma medida, seja para a classificação ou o rebaixamento.
Mas a partida que mais promete nesta rodada, em termos de futebol bonito, é Cruzeiro x Santos, amanhã. Um
dos atrativos do confronto
será o duelo entre Alex e Diego, dois dos mais refinados e
habilidosos meias-atacantes
em atividade hoje no país.
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