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ELIO GASPARI
Há um cheiro de
México no ar
Houve uma violação dos
direitos de Roseana Sarney e Jorge Murad no processo
de apreensão de documentos
do escritório da firma em que
são sócios. Violação tamanha
que deve levar as pessoas a
pensarem se o tucanato não está mexicanizando o Brasil. Por
mexicanização entende-se a
formação de um bloco político
que, pela predação dos adversários, transforma-se em única
alternativa de poder.
Houve violação dos direitos
do casal Murad-Sarney porque
o material, apreendido por
conta de um processo que corre
em segredo de Justiça, foi sorrateira e seletivamente divulgado. A juíza de Palmas fez
muito bem em mandar recolher a papelada das firmas suspeitas do saque na Sudam. Fez
bem o juiz federal que autorizou a apreensão e cumpriram
seu dever os policiais que a
executaram.
Se o processo está sob sigilo,
como se explica que em questão de horas tenha começado a
vazar o acervo do escritório?
(Havia R$ 1,3 milhão -em espécie- na empresa, ervanário
que o casal Murad-Sarney dirá
de onde veio e para onde ia.)
Argumente-se que vazou porque as notícias vazam e é bom
que assim seja.
O problema é que o vazamento continuou. A cada dia
uma gota. Tudo bem, as coisas
vazam aos poucos.
Se um episódio semelhante
tivesse acontecido com a Polícia Federal americana, ou o
seu diretor suspendia os agentes que participaram da
apreensão, até a conclusão de
uma sindicância destinada a
apurar a quebra do sigilo judicial, ou o ministro da Justiça,
no dia seguinte, afastava os
agentes e o chefe do FBI.
No final de semana, o vazamento já havia inundado o
país. E só na segunda-feira o
ministro da Justiça solicitou a
sindicância.
Já se fez coisa parecida em
1995, com uma pasta cor-de-rosa onde estava a contabilidade política do falecido Banco Econômico. Começou a vazar seletivamente, mas seu
conteúdo explodiu. A pasta foi
brindada com solene esquecimento, com a ajuda da banda
pefelê do governo.
Quando o governo demora a
tomar providências (ou mesmo a mostrar curiosidade) para identificar a fonte dos vazamentos, fornece um sinal de
que gostou da novela. Mais: o
governo sabia que o inquérito
da Sudam continha carga para os ombros de Roseana Sarney. Repetindo: sabia. Pode-se
argumentar que o fato de saber tem pouca relevância, visto
que não podia parar a investigação nem apressá-la (coisa
que não há vestígio indicativo
de que tenha feito).
O tucanato está mexicanizando o Brasil pelo seguinte:
1) Quebrou a tradição republicana criando o instituto da
reeleição. Fez isso com votos de
parlamentares documentadamente comprados.
2) Com a ajuda do que dispunha de melhor no PMDB,
esterilizou a candidatura do
ex-presidente Itamar Franco.
Vale lembrar que um dos amigos do Planalto chegou a se referir a Itamar em termos que a
educação não permite transcrever. Dele disse o ex-presidente: "É um nome-símbolo da
corrupção no país". Seu nome
é Jader Barbalho. Conhecendo
sua folha de serviços prestados
à Sudam, a coligação tucano-pefelê levou-o à presidência do
Senado.
3) A banda mexicana reelegeu FFHH à custa da ruína
econômica do país, pela manutenção de um regime de populismo cambial (o dólar de
R$ 1,20) que foi abandonado
dois meses depois da eleição.
4) O vazamento deliberado,
sistemático e impune do papelório do casal Murad-Sarney
sugere o estímulo à retirada da
candidatura (de vento) da governadora do Maranhão à
Presidência da República, para benefício do senador José
Serra. Não foi Serra quem
aconselhou o casal a entrar nos
negócios que estão sendo investigados nem é ele quem tem
R$ 1,3 milhão para sair por aí
botando-os nos escritórios dos
outros. Ele pode ser destinatário do benefício, mas é desonesta a lógica que lhe atribui a
origem do malefício.
5) Esse processo de mexicanização inclui a contenção da
candidatura de Itamar Franco, o sumiço do apoio do PTB a
Ciro Gomes. Institui-se assim
um bloco de poder tão eterno
quanto eterna venha a ser a
candidatura de Luiz Inácio
Lula da Silva a derrotado de
segundo turno. Como diria
FFHH, é uma mexicanização
com uma pitada de candomblé.
É um modelo engenhoso para quem quer ficar 20 anos no
poder, como dizia o ministro
Sérgio Motta. O lastimável é
que o receituário dessas macumbas tenha entrado no
campo da violação dos direitos
individuais dos adversários
políticos (de novo: a violação
está no vazamento e na sua
impunidade, não na apreensão).
Quem olha a política brasileira pode achar que José Serra
virou uma espécie de passageiro do Expresso do Oriente. Se
amanhã ele aparecer apunhalado no seu camarote, será
uma bondade dizer que os suspeitos serão só 12. O problema
é que, pelo andar do trem, corre-se o risco de ele chegar a Istambul, descer do vagão, chamar um táxi e ir para o hotel. E
os outros 12 passageiros?
Eis aí um desfecho que Agatha Christie não imaginou.
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