S�o Paulo, ter�a-feira, 15 de fevereiro de 1994
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"Jeanne La Pucelle", de Rivette, j� nasce cl�ssico

AMIR LABAKI
ENVIADO ESPECIAL A BERLIM

"Jeanne La Pucelle" confirmou-se desde anteontem � noite como um dos filmes-evento de Berlim-94. Depois de esquadrinhar em quatro horas o trabalho da cria��o art�stica em "A Bela Intrigante", o veterano cineasta da nouvelle vague francesa Jacques Rivette dedica agora seu novo filme-maratona a devassar a persona hist�rica de Joana D'Arc (1412-1431), um dos maiores mitos nacionais de seu pa�s. S�o exatas cinco horas e trinta e seis minutos de proje��o divididas em duas partes, "As Batalhas" e "As Pris�es". Acredite-me: n�o � muito.
Uma vez sintonizado com o ritmo narrativo rivettiano, "Jeanne La Pucelle" flui com crescente interesse. Rivette assume ter realizado "um filme did�tico". Did�tico, mas n�o chato ou simplista. Pelo contr�rio, "Jeanne La Pucelle", exibido fora de competi��o dentro da se��o Panorama, reexamina cronol�gica e minunciosamente os fatos que levaram uma provinciana criada francesa do in�cio do s�culo 15 a afirmar-se como profetisa e liderar a rea��o francesa ao ent�o dom�nio brit�nico.
O sucesso de Rivette deve-se sobretudo a um achado: decidido a apresentar sua vers�o laica do mito Joana D'Arc, privilegiou em sua narra��o os epis�dios hist�ricos em que o conflito humano de bastidores, e n�o a guerra aberta, controlou o destino da hist�ria. Joana (Sandrine Bonnaire) surge como "a criada" (tradu��o de pucelle) e n�o "D'Arc", como sedimentou-se a lenda. Sua fragilidade humana � frisada enquanto sua religiosidade merece tratamento distanciado.
Rivette exibe e compreende a obsess�o cat�lica dela, mas n�o a assume.
A Joana de Rivette sofre assim um processo de desmitologiza��o similar ao do recente (e pouco valorizado) "Van Gogh", de Maurice Pialat. Para o p�blico n�o franc�s pode soar estranho algu�m dedicar nos dias de hoje quase seis horas de filme para tratar de Joana D'Arc, depois de o cinema j� ter visitado o tema in�meras vezes, da primeira vers�o de 1889 assinada por Georges Hatot aos cl�ssicos de Carl Dreyer e Otto Preminger. Mas o resgate historicizante de Rivette � tamb�m um resgate �tico, despindo Joana D'Arc de todo o simbolismo que a tornou o mito franc�s oficial da ultradireita de Le Pen.
Rivette fez um anti-�pico seco e direto. Tr�s planos b�sicos se estruturam. O mais comum � o longo plano americano, com os personagens confrontando-se para uma sutil c�mera que baila a seu encontro. O outro, muito mais raro, � o plano geral que acompanha Joana, seu ex�rcito e os inimigos nas sequ�ncias de batalha (poucas e curtas). Por fim, Rivette adapta o efeito "Reds" (1980) das testemunhas que dep�em, convocando seus personagens a comentar a progress�o da Hist�ria. "Jeanna La Pucelle" j� nasce cl�ssico.
Hoje, os principais filmes da mostra competitiva s�o "Trois Couleurs: Blanc", segundo filme da trilogia sobre os lemas da Revolu��o Francesa realizado por Krzystof Kieslowski, e "Philadelphia", drama sobre um portador do HIV demitido de sua empresa, do diretor americano Jonathan Demme.

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