Nelson Barbosa, meu colega do Ibre e ministro da Fazenda de Dilma Rousseff, escreveu na sexta-feira (14) nesta Folha sua avaliação do legado econômico do impedimento.
A coluna tem duas partes. Primeiro, a avaliação das causas da crise brasileira, a perda de 8% do PIB entre o 1º trimestre de 2014 e o 4º de 2016. Segundo, a avaliação do legado do impedimento sobre o crescimento econômico.
Na avaliação de Nelson, 40% da crise teve causas externas, uma parcela de 20% foi causada pela Operação Lava Jato e parte foi consequência das pautas-bomba, sobrando um pouco para os erros de política econômica da gestão petista.
O erro de avaliação de Nelson, a meu ver, é supor que, para os efeitos sobre o desempenho econômico, haja independência entre as causas externas —queda do preço das commodities, Lava Jato e crise política— e as escolhas de política econômica e de gestão da política tomadas ao longo do período da hegemonia petista.
O problema de atribuir responsabilidades à Lava Jato é esquecer que outro fator ocorreu na mesma época. Uma série de investimentos maturaram mal e endividaram as empresas. Ao menos parte da queda dos investimentos é fruto do superendividamento.
Em setembro de 2014, antes, portanto, do agravamento da Lava Jato e da queda dos preços das commodities, o endividamento da Petrobras, como razão da sua geração de caixa, já era de 4. Petroleiras com esse nível de endividamento não conseguem manter planos ambiciosos de investimento.
É certo que a reversão do ciclo das commodities explica parte da crise. Mas é importante lembrar que a vulnerabilidade da economia brasileira a essa reversão foi potencializada pelas escolhas de política econômica do período.
O processo de reestatização do setor petrolífero promovido pelo petismo nos expôs perigosamente, da mesma forma que a escolha dos militares, nos anos 1970, de financiar o 2º Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) com empréstimos externos a juros flutuantes nos expôs.
A decisão de reestatização do setor foi motivada por uma ideologia, comum na esquerda e entre os militares brasileiros, de que o investimento estrangeiro nos empobrece. Não há nenhuma evidência empírica desse fato.
O recuo do PIB teria sido menor, mesmo com a queda do preço das commodities, se, após a descoberta do pré-sal, medidas fossem tomadas para que nós compartilhássemos com o resto do mundo os riscos inerentes à atividade de extração do petróleo.
Com relação aos impactos das pautas-bomba e da crise política em geral sobre a economia, Nelson parece supor que elas tenham sido externas ao petismo.
Uma das pautas-bomba foi a devolução, em fevereiro de 2015, por Renan Calheiros, da medida provisória que desfazia a desoneração da folha de pagamentos. A MP era tecnicamente correta e foi apoiada pelos técnicos (vale lembrar que a Faria Lima apoiou vigorosamente a política econômica de Dilma em 2015).
De fevereiro de 2015, retornemos para 2014. A desoneração da folha de salários tinha data para terminar, 31 de dezembro de 2014. Por que motivo Guido Mantega perenizou algo que todos sabiam que tinha que terminar?
Evidentemente essa decisão foi importante para angariar apoio dos empresários para a campanha de reeleição de Dilma. Difícil desfazer em fevereiro algo realizado uns meses antes, no âmbito da negociação de uma reeleição.
A campanha eleitoral petista de 2014 foi excessiva na agressividade com os adversários, na quantidade de mentiras ao cidadão brasileiro e no vale-tudo para acelerar a economia, inclusive na base de fraudes nas contas públicas.
O problema é que, diferentemente do que pensava o PT antigo, aquele que era uma UDN de macacão, em política, a quantidade importa. Em política, meia gravidez é diferente de uma. Como nos lembrou inúmeras vezes Marina Silva, Dilma ganhou perdendo.
Nelson se pergunta sobre o que teria ocorrido se não tivesse havido o impedimento de Dilma. Tenho certeza de que, se não houvesse o ambiente político deteriorado, se não tivesse havido as pautas-bomba e se o Congresso tivesse aprovado o ajuste fiscal de 2015, estaríamos muito melhor. Nelson propôs reformas, tanto da Previdência quanto uma versão do teto de gastos, não muito diferentes do que as implantadas posteriormente.
O problema é que a política não conseguiu gerar esse resultado. Exclusivamente do ponto de vista econômico, havia espaço para estarmos muito melhor.
Mas aí me parece que a responsabilidade de quem ganha quatro eleições seguidas em um regime presidencialista com presidente forte, como é nosso caso, é bem maior do que a do grupo político que perde quatro eleições seguidas, em que pese ter votado favoravelmente às pautas-bomba.
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