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A inflação arrasa o bolso dos argentinos

Com 102,5%, Argentina está em quarto lugar no ranking dos países com maior inflação

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Sandra Choroszczucha

Cientista política e professora da Universidade de Buenos Aires

A hiperinflação que afeta a Argentina não permite que contratos, investimentos, operações de compra e venda ou empréstimos sejam sustentados com o tempo. E, sob um sistema capitalista, é uma condição sine qua non poder realizar esses tipos de operações a médio ou longo prazo. E, se isso não ocorre, as economias e os governos colapsam com frequência.

Por convenção da macroeconomia, uma nação se encontra em regime de alta inflação quando os preços alcançam ou superam três dígitos em um prazo médio de um ano, e em um processo hiperinflacionário quando os preços aumentam mais de 50% em um mês.

Quando a hiperinflação aparece em um país, segundo Steve Hanke, professor da Universidade Johns Hopkins, alguns fenômenos, que já são visíveis na Argentina, começam a se manifestar. As empresas começam a mudar os preços de bens e serviços toda semana ou mesmo todo dia. A população começa a gastar seu salário com maior rapidez possível em bens de consumo duráveis (embora não precise deles) para não perder o poder aquisitivo. E o valor dos bens e serviços é frequentemente calculado em uma moeda estrangeira estável, não na moeda local, a economia muitas vezes se mantém na moeda estrangeira e começa-se a realizar transações em moeda estrangeira.

Em 2016, o país latino-americano mais próximo da hiperinflação e que poderia passar a barreira de 50% mensal de modo sustentável, segundo o professor Hanke, era a Venezuela. Naquela época, o país já tinha uma taxa de inflação de 255% ao ano. E a sucessão de medidas desastrosas tomadas pelo regime de Nicolás Maduro resultou em uma escalada que continuou a produzir inflação de 438% em 2017, 65,374% em 2018 e 19,906% em 2019.

O impacto da pandemia

Em nível global, em 2020, os bancos centrais viram-se na obrigação de emitir grandes somas de dinheiro para financiar o aumento dos gastos públicos devido à pandemia do coronavírus, em um contexto de enorme paralisia da atividade econômica.

Em março de 2021, as economias dos países mais desenvolvidos já manifestavam processos de inflação após quase três décadas de estabilidade. Esses processos se agravaram a partir da guerra ofensiva da Rússia à Ucrânia, porque ambos os países são provedores de alimentos e energia, e a oferta desses bens foi consideravelmente restringida.

Em 2022, na América Latina, o Índice de Preços ao Consumidor (IPC) determinou uma inflação anual na Venezuela de 305%, na Argentina de 94,8%, na Colômbia de 13,1%, no Chile de 12,8%, no Uruguai de 8,1%, no México de 7,8%, no Brasil de 5,7% e na Bolívia de 3,1%. Enquanto em nações de outras latitudes, a inflação anual foi de 11,6% na Itália, 10,7% na Grã-Bretanha, 9,6% na Alemanha, 6,5% nos Estados Unidos e 5,7% na Espanha. O IPC no mesmo período em países em conflito mostra uma inflação de 55% na Síria, 35% na Etiópia ou 26% na Ucrânia.

A realidade argentina

De todos os países que conformam o globo terrestre, a Argentina, atualmente com uma inflação de 102,5%, ganhou o quarto lugar no ranking dos países com maior inflação.

Ao mesmo tempo, a inflação mensal na Argentina se mantém desde 2022 em uma tendência de alta e, segundo o IPC relatado pelo Instituto Nacional de Estatística e Censos (Indec), em janeiro de 2022 houve uma inflação de 3,9%, em fevereiro de 4,7% e a partir de então pairou entre 5% e 7% mês a mês. E, já em 2023, a taxa atingiu 6% em janeiro e 6,6% em fevereiro. E já se estima, com base nas medições de numerosas consultorias privadas, que o aumento mensal para março atingirá ou excederá 7%.

Por que esse número gera alarme na Argentina? Porque em julho de 2022, quando atingiu 7,4%, a então ministra da Economia, Silvina Batakis, que durou menos de um mês no cargo, foi obrigada a renunciar e passar o posto para Sergio Massa (um dos fundadores da Frente de Todos), que mantém laços estreitos com o establishment nacional e internacional. O objetivo era tentar deter a corrida contra o peso e evitar uma possível hiperinflação.

Atualmente, apesar de Massa e "seu capitalismo de amigos", espera-se que o índice de inflação comunicado em breve pelo Indec seja equivalente ao que no passado levou a temer uma espiral hiperinflacionária.

Em meio a este contexto, meios de comunicação internacionais, como o "Financial Times", começaram a publicar manchetes como as seguintes: "A Argentina da hiperinflação está pronta para desabrochar". Por sua vez, o BTG Pactual, o banco de investimentos brasileiro, tem como título: Instantânea Diária da Argentina - Tema do dia: Dançando no Titanic.

Esses indicadores de inflação também são, em grande medida, responsáveis pela preocupante e crescente pobreza na Argentina. Segundo o Indec, com base nas medições realizadas para o segundo semestre de 2022, 39,2% dos argentinos já são pobres.

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