O Reflexo Do Estado Nutricional O REFLEXO DO ESTADO NUTRICIONAL DE PACIENTES ONCOLÓGICOS NO TRATAMENTO E RECUPERAÇÃO
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Número 1, Volume 6, jan/fev de 2024 – ISSN: 2596-3481
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nutricional especializado e exigir que em seu progressiva, anemia, anorexia, dor, náuseas, vômitos e
tratamento sejam incluídas as orientações nutricionais fadiga. Esses sintomas aumentam a morbimortalidade de
pertinentes às suas dificuldades do momento. Somente indivíduos com câncer e prejudicam sua qualidade de vida
profissionais com preparo em nutrição clínica aplicada (GARÓFOLO et al., 2004).
à oncologia poderá avaliar, diagnosticar e tratar Tendo em vista os dados epidemiológicos dos últimos anos
corretamente essas alterações, considerando as que apontam o câncer como uma grande epidemia mundial,
particularidades da doença. Neste sentido, é o objetivo deste estudo foi, analisar a relação do estado
importante que profissionais interessados no manejo nutricional de pacientes oncológicos com a sua recuperação
de pacientes com câncer estejam atentos à necessidade e sucesso no tratamento da doença por meio de uma revisão
de aquisição de conhecimentos para o sucesso no narrativa de literatura.
cotidiano de sua profissão.
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alimentar, o gasto energético, a absorção e O estado nutricional é um fator prognóstico (SILVA, 2006),
metabolismo de nutrientes (GARÓFOLO; além de ter uma significativa associação com as funções
LOPEZ; PETRILLI, 2005) as complicações orais, cognitivas, sociais, emocionais, psicológicas, qualidade de
a toxidade gastrintestinal e a nefrotoxicidade, vida e senso de bem-estar nos pacientes oncológicos
causada por drogas usadas no tratamento de (RAVASCO et al., 2004). Dessa forma, por meio da
neoplasias e infecções, são importantes na avaliação nutricional precoce, é possível estimar o risco
etiologia da desnutrição decorrente do câncer nutricional, a magnitude da desnutrição, determinar a
(GARÓFOLO, 2005). intervenção e educação nutricional adequada e,
Esses pacientes frequentemente apresentam consequentemente, melhorar ou manter o estado nutricional
desordens psicológicas como resultados das do paciente e sua qualidade de vida (HUHMANN,
incertezas sobre a doença, o diagnóstico e o CUNNINGHAM, 2005).
prognóstico. Esse estado psicológico está A avaliação do estado nutricional envolve o exame das
associado à depressão, afetando a ingestão condições físicas do indivíduo, crescimento e
alimentar (CERVI; HERMSDORFF; RIBEIRO, desenvolvimento, comportamento, níveis de nutrientes na
2005). urina, sangue ou tecidos e a qualidade e quantidade de
A perda de peso pode ser desencadeada ou nutrientes ingerida” (FAGIOLLI; NASSER, 2014).
potencializada durante a terapia antineoplásica
devido ao aumento dos efeitos colaterais 3.2.1 Avaliação Subjetiva Global Produzida pelo
gastrintestinais como aversão alimentar, náuseas e Paciente
vômitos, além de problemas fisiológicos de Este método consiste de questionário com questões
mastigação e de deglutição. Os tumores do trato fechadas, voltadas à investigação das alterações de peso,
gastrintestinal podem, ainda, causar obstrução e ingestão alimentar, sintomas gastrointestinais e capacidade
levar ao impedimento físico à ingestão adequada funcional. A primeira parte do instrumento o próprio
de nutrientes, que implica diminuição da ingestão paciente responde e a segunda parte o profissional da saúde,
alimentar (SARHILL et al., 2004). Distúrbios responsável pelo indivíduo, preenche com informações
indiretos podem causar anorexia, incluindo referentes ao diagnóstico, estresse metabólico e exame
alterações na percepção de sabor e odor e físico para realização da classificação do estado nutricional
anormalidades no sistema nervoso central que em “bem nutrido (Estágio A)”, “moderadamente (ou
controla a ingestão de alimentos e a sensação de suspeita) desnutrido (Estágio B)” e “gravemente desnutrido
saciedade precoce (RIVADENEIRA et al., 1998). (Estágio C)”. Para classificação dos indivíduos nestas
Alterações nos padrões dietéticos e nutricionais da categorias devem-se seguir as recomendações propostas por
população brasileira de todos os estratos sociais e Ottery (1996) sendo considerado Estágio A aquele
faixas-etárias vêm sendo analisadas no processo indivíduo bem nutrido, sem perda de peso, Estágio B
da transição nutricional (SARTURI et al., 2014). quando o paciente apresentou perda de peso maior ou igual
Essa transição nutricional caracteriza-se pela a 5% em aproximadamente 1 ano e Estágio C na existência
redução nas prevalências dos déficits nutricionais de sinais significativos e evidentes de perda de peso.
e aumento expressivo de sobrepeso e obesidade
(NUNES et al, 2015). 3.2.2 Avaliação Subjetiva Global
A Avaliação Subjetiva Global (ASG) é método simples, de
3.2 Avaliação nutricional baixo custo, que pode ser realizado em poucos minutos à
Não existe um indicador ideal que isoladamente beira do leito (BARBOSA; SILVA, 2002). Baseia-se na
possibilite a avaliação do estado nutricional. história clínica, dietética e exame físico. São avaliadas as
Portanto, a escolha dos indicadores utilizados é de ingestões alimentar em relação ao padrão usual do paciente,
difícil definição e depende, entre outros fatores, redução da massa corporal nos últimos seis meses, alteração
do tipo de doença estudada e da disponibilidade e na ingestão dietética, presença de sintomas gastrintestinais e
da rotina do serviço (PAPINI-BERTO et al., capacidade funcional relacionada ao estado nutricional.
2002). Todos os pacientes oncológicos devem ser Além disso, avalia a demanda metabólica de acordo com
submetidos à triagem nutricional no momento da diagnóstico e perda de gordura subcutânea e muscular e
admissão e esta prática deve ser incorporada à presença de edema resultante da desnutrição e ascite
rotina clínica para ser efetiva (HUHMANN; (MONTEJO GONZALEZ JC, 2006). Niyongabo et al.
CUNNINGHAM, 2005). (2014), dizem que é essencial a padronização deste método
A avaliação nutricional fornece uma estimativa da essencialmente clínico, criando uma versão em forma de
composição corporal que ajuda a identificar os questionário, denominado avaliação subjetiva global ou
pacientes em risco de desnutrição induzida pelo avaliação nutricional subjetiva (ANS) do estado nutricional.
câncer e estima a magnitude da depleção
nutricional em pacientes que já estão desnutridos. 3.2.3 Inquérito Mini avaliação Nutricional
Perda de peso involuntária maior que 10%, em Fornece um método simples e rápido de identificação de
seis meses, significa déficit nutricional importante pacientes idosos que apresentam risco de desnutrição ou
e é um bom método para avaliar o prognóstico que já estão desnutridos. Identifica o risco de desnutrição
clínico (RIVADENEIRA et al., 1998). antes da ocorrência de mudanças de peso ou dos níveis de
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proteína sérica. O MNA pode ser preenchido intolerância a glicose é uma das primeiras alterações
periodicamente no ambiente comunitário e metabólicas nessa patologia. No entanto, a resistência à
hospitalar, ou em locais de cuidados de longo insulina não ocorre devido à desnutrição, mas parece estar
prazo (NIYONGABO et al., 2014). relacionada à presença do tumor (DODESINI et al., 2007).
O MNA foi desenvolvido pela Nestlé e por A maioria dos tumores sólidos produz grandes quantidades
geriatras de reputação internacional, sendo uma de lactato (BLAAUW; DEUTZ; MEYENFELDT, 1997),
das poucas ferramentas de controle validadas para que é convertido em glicose pelo fígado, num processo
os idosos. Tem sido bem validada em estudos conhecido como ciclo de Cori. A gliconeogênese, à custa de
internacionais nos mais diversos ambientes5-7, e lactato, utiliza moléculas de adenosina trifosfato (ATP) que
estabelece uma correlação entre morbidade e é muito dispendiosa para o hospedeiro. Este ciclo fútil pode
mortalidade (GUIGOZ Y; VELLAS J; GARRY ser responsável, pelo menos em parte, pelo aumento do
P,1994). gasto energético (BLAAUW; DEUTZ; MEYENFELDT,
1997). Aumento de 40% na produção de glicose hepática
3.3 Alterações metabólicas em pacientes foi observado em pacientes com câncer que perderam peso
oncológicos (INUI, 2002).
A indução tumoral de caquexia e anorexia é mais A gordura constitui 90% das reservas dos indivíduos
provavelmente mediada por múltiplas citocinas saudáveis e a perda de gordura corporal é sinal do estado
produzidas pelos monócitos do hospedeiro na caquético (INUI, 2002). Uma grande proporção da perda de
tentativa de erradicar o tumor. Como o hospedeiro peso em pacientes com câncer é proveniente do tecido
não consegue erradicá-lo, a produção crônica de adiposo. Esse substrato energético é utilizado para suprir a
citocinas pelo hospedeiro e pelo tumor leva a demanda metabólica do hospedeiro, causada pela presença
alterações metabólicas prejudiciais, observadas do tumor (BLAAUW; DEUTZ; MEYENFELDT, 1997).
nos pacientes com câncer (RIVADENEIRA et al., A diminuição de tecido adiposo em pacientes oncológicos
1998). que perderam peso está relacionada ao aumento de ácidos
Estudos têm demonstrado que citocinas graxos livres e turnover de glicerol em comparação com
produzidas pelo tumor e pelo hospedeiro são aqueles que não perderam peso. Em situações normais, a
responsáveis pelas alterações metabólicas infusão de glicose suprime a lipólise, mas esse efeito não
encontradas em pacientes com câncer ocorre em pacientes com câncer (RIVADENEIRA et al.,
(WHITMAN, 2000). As citocinas estimulam a 1998). A depleção de massa magra corporal é a principal
degradação vigorosa de massa magra e causam responsável pela redução da sobrevida em pacientes com
alterações no metabolismo dos carboidratos e de câncer (TISDALE, 2000).
lipídeos, o que resulta em perda de gordura O paciente com câncer não é capaz de conservar energia, o
subcutânea e massa corporal magra. que resulta em constante catabolismo e consequente
Alterações no metabolismo de proteínas, depleção de massa magra. Esta quebra indevida da proteína
carboidratos, gorduras, minerais e vitaminas são fornece substrato para gliconeogênese, que não pode ser
comuns em pacientes com câncer e diferem dos suprimida completamente nem com infusão de glicose e
pacientes somente desnutridos, tornando a terapia nem com a nutrição parenteral total. Dessa forma, a
nutricional um desafio maior no paciente proteólise ocorre mesmo com aumento da gordura corporal
oncológico. Observa-se, em pacientes com câncer, e com ganho de peso (RIVADENEIRA et al. 1998). Todos
alteração no gasto energético basal, que pode estar esses efeitos metabólicos geram custo considerável para o
reduzida, como nos pacientes desnutridos, hospedeiro, como extensiva depleção tecidual, anorexia,
inalterada ou aumentada; ocorrendo um anemia, observadas em pacientes submetidos à injúria
descompasso com a ingestão de nutrientes, que (GRIMBLE, 2003).
está tipicamente reduzida (TISDALE, 1997). A O conhecimento atual sobre a respostas metabólicas do
elevação da taxa de metabolismo basal pode ser hospedeiro causadas pelo tumor justificam o tratamento
observada em pacientes com variados tipos de com nutrientes específicos. É fundamental que os
tumores, como carcinoma gástrico e sarcomas profissionais que atuam no tratamento do câncer conheçam
(RIVADENEIRA et al.,1998). Em estudo com as principais alterações metabólicas que ocorrem nesses
pacientes portadores de tumores sólidos, a taxa de indivíduos. Mais estudos são necessários para elucidar
metabolismo basal mostrou-se elevada mesmo aspectos relacionados à desnutrição e caquexia do câncer e
antes da perda ponderal37, sugerindo que a como prevenir e tratar esses processos em pacientes
elevação da taxa de metabolismo basal pode ser oncológicos (GRACIA et al., 2014).
causa (assim como consequência) dessa condição
(BLAAUW; DEUTZ; MEYENFELDT, 1997). 3.3.1 Caquexia
As alterações no metabolismo dos carboidratos no É uma síndrome clínica caracterizada pela presença de
câncer incluem o aumento do turnover de glicose anorexia, perda de peso involuntária, diminuição da
e a resistência à insulina, que levam à capacidade funcional, depleção progressiva de massa magra
hiperglicemia; ao contrário da glicemia normal ou e tecido adiposo (HUHMANN; CUNNINGHAM, 2005). A
hipoglicemia verificada em pacientes sem caquexia é considerada desnutrição protéico-energética
estresse, submetidos a jejum prolongado. A grave e pode acometer 50% dos pacientes oncológicos
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durante a terapia antineoplásica por causa do trauma, cirurgia e sepse ou nos pacientes oncológicos com
aumento dos efeitos colaterais gastrintestinais manutenção do peso corpóreo (BELTRÃO et al, 2014).
como aversão a certos tipos de alimentos, náuseas A identificação da expressão gênica e detecção urinária de
e vômitos, problemas fisiológicos de mastigação e “PIF” nos pacientes com tumores gastrointestinais
também de deglutição (DAL BOSCO; GENRO, relaciona-se com perda de peso. Estes dados fornecem a
2014). primeira evidência direta de que os tumores são a principal
Os tumores que vivem no trato gastrintestinal fonte de PIF nos seres humanos. O PIF age diretamente
podem ocasionar obstrução e impedir fisicamente estimulando a via ubiquitina-proteasoma nas células
a ingestão correta de nutrientes, que causará a musculares, compondo elemento chave para o catabolismo
diminuição da ingestão alimentar. Distúrbios protéico na caquexia do câncer (WAITZBERG et al, 2014).
ocorridos indiretamente podem causar anorexia,
incluindo alterações na percepção de sabor e odor 3.4 O papel do Nutricionista na oncologia
e fatores anormais no sistema nervoso central que O nutricionista tem como uma das suas responsabilidades
controla a ingestão de alimentos e a sensação de assegurar uma alimentação condizente com as necessidades
saciedade precoce (CABRAL; CORREIA, 2014). nutricionais de cada paciente, realizando orientações sobre
Assim, pacientes oncológicos com perda ponderal os alimentos a serem consumidos e monitorando sua
maior do que 10% do peso corporal possuem composição corporal. A terapia nutricional pode ser
chance de menor sobrevida que pessoas com o colocada em prática como tratamento adjuvante durante a
mesmo tipo e estádio da doença que se mantém terapia anticâncer ou, em longo prazo, através do aporte de
em situação de peso adequada. O nutrientes aqueles pacientes que não possam manter uma
hipermetabolismo e a perda de peso significativa ingestão adequada (MEURIC et al., 2014).
predispõem a menor sobrevida, enquanto o Para uma terapia nutricional realmente efetiva, o
aumento da ingestão energética foi associado ao nutricionista utiliza inúmeras estratégias como orientação
aumento da sobrevida (BAXTEE; WAITZBERG, dietética, suplementos nutricionais orais, nutrição enteral e
2014). parenteral (BOKHORST, 2015). A terapia nutricional tem
como objetivo prevenir a desnutrição, melhorar a qualidade
3.3.3 Metabolismo Protéico no Câncer de vida do paciente, reduzir o número de complicações
Uma das consequências metabólicas mais provenientes dos tratamentos e prevenir a interrupção dos
importantes no câncer é a perda de proteína tratamentos (OLIVEIRA, 2015).
corpórea, refletida pelo aumento da excreção de A avaliação deve ser realizada no início do
nitrogênio urinário e a presença de balanço acompanhamento nutricional. Por representarem um risco,
nitrogenado negativo (WAITZBERG et al, 2014). todos os pacientes, independente do estado nutricional
A redução da massa muscular durante condições atual, devem ser acompanhados (MEURIC et al., 2014). A
de estresse, como o câncer, está relacionada ao avaliação nutricional serve como um instrumento de grande
aumento da diminuição de proteína, em particular importância para a determinação terapêutica clínica e
com as proteínas miofibrilares. O aumento da dietética a ser empregada para a correção do déficit
degradação de proteínas miofibrilares leva à nutricional observado em alguns pacientes (GUIMARÃES
intensificação da liberação de aminoácidos, et al., 2012).
principalmente alanina e glutamina, que estão Com o objetivo de prevenir a perda de peso e desnutrição
presentes em grande quantidade no músculo associada à caquexia, a terapia nutricional é de relevante
esquelético. Esses aminoácidos liberados são importância, devendo ser instituída tão logo for
captados pelo fígado para iniciar ou regular a diagnosticada alteração no estado nutricional
síntese de proteínas de fase aguda e (GUIMARÃES et al., 2012). A terapia deve ser formulada
gliconeogênese (BELTRÃO et al, 2014). levando em consideração a individualidade do paciente,
A inibição da síntese de proteínas pode contribuir suas necessidades nutricionais, estado nutricional, restrições
para o aumento do catabolismo muscular. Essa dietéticas, tolerância, função gastrointestinal, estado clínico
resposta catabólica resulta em desgaste e fadiga do e efeitos colaterais atuais e esperados, em decorrência do
músculo esquelético, que pode atrapalhar o tratamento (BOKHORST, 2015).
tratamento e o prognóstico do paciente oncológico A terapia nutricional pode ser realizada utilizando três vias:
(WAITZBERG et al, 2014). Diferentes vias a via oral, enteral e a parenteral, dependendo do estado em
proteolíticas são responsáveis pelo catabolismo do que o paciente se encontra, lembrando sempre que, quando
músculo esquelético (BELTRÃO et al, 2014). possível, a via oral é a ideal (OLIVEIRA, 2007). Essa via é
Atualmente, foi isolada de esplenócitos de ratos a ideal quando os pacientes podem utilizá-la. Modificações
com adenocarcinoma uma glicoproteína que induz fisiológicas e anatômicas do trato gastrointestinal, como
o catabolismo do músculo esquelético e caquexia náuseas, alterações no paladar e disfagias podem ser
in vivo. Tal proteína, denominada fator de indução contraindicações relativas.
de proteólise (PIF), também foi isolada na urina Sempre que possível deve-se insistir na via oral,
de pacientes com caquexia do câncer, porém, não fracionando melhor as refeições, fazendo modificações na
estava presente na urina de indivíduos normais e consistência dos alimentos e variando a dieta para evitar
nem em pacientes com perda de peso devido a monotonia. A suplementação oral pode ser indicada caso
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não se consiga atingir as necessidades calóricas sejam incluídas as orientações nutricionais pertinentes às
(RIVANDENEIRA et al., 1998). suas dificuldades do momento. Somente profissionais com
preparo em nutrição clínica aplicada à oncologia poderá
3.5 Terapias nutricionais avaliar, diagnosticar e tratar corretamente essas alterações,
A Sociedade Americana de Nutrição Enteral e considerando as particularidades da doença. Por isso é
Parenteral (ASPEN) recomenda o uso da terapia fundamental que profissionais interessados no manejo de
nutricional se houver perda de peso maior que pacientes com câncer estejam atentos à necessidade de
10% (DANG; SEMENZA, 1999). Tal suporte aquisição de conhecimentos para o sucesso no cotidiano de
pode auxiliar na diminuição do tempo de sua profissão.
internação e aumento da sobrevida dos pacientes
oncológicos caquéticos (BOZZETTI et al., 2001).
A rotina da terapia nutricional deve incluir a REFERÊNCIAS
avaliação nutricional periódica, sendo está A.S.P.E.N. Board of directors. Guidelines for the use of
relacionada com a susceptibilidade a infecções, a parenteral and enteral nutrition in adult and pediatric
resposta terapêutica, o prognóstico e a patients. Journal Of Parenteral And Enteral. 2002.
identificação dos possíveis sintomas relacionados
ao tratamento (DOYLE et al., 2003). O suporte ALLUM WH, GRIFFIN SM, WATSON A, COLIN-
dietético individualizado pode melhorar o apetite JONES D. Guidelines for the management of oesophageal
e a ingestão alimentar e reduzir os efeitos and gastric cancer. Gut. 2002; 50:1-23.
colaterais da terapia (SILVA, 2006).
A suplementação oral é a modalidade preferida AMERICAN COLLEGE OF PHYSICIANS. Parenteral
em pacientes que são capazes de se alimentar por nutrition in patients receiving cancer chemotherapy. Annals
esta via (INUI, 2002), mas que requerem dietas of Internal Medicine. 1989; 10 (9): 734-736.
especiais devido às alterações do trato
gastrintestinal (RIVADENEIRA et al., 1998). Esta BAKER JP, DETSKY AS, WESSON DE, WOLMAN SL,
suplementação pode melhorar o aporte calórico e STEWART S, WHITEWELL J, LANGER
proteico (DOYLE et al., 2006). B,JEEJEEBHOY KN. Nutritional assessment: a comparison
Caso a ingestão via oral esteja diminuída ou não of clinical judgment and objective measurements. N Engl J
possa ser utilizada, a nutrição enteral ou parenteral Med 1982;306:967-72
é indicada. A nutrição enteral, assim como a
nutrição oral, requer absorção dos nutrientes pelo BARBOSA E SILVA MC. Avaliação subjetiva global. In:
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ou enteral, a nutrição parenteral é uma opção
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A terapia nutricional em pacientes oncológicos é BLAAUW ID, DEUTZ NEP, MEYENFELDT MFV.
controversa. Estudos têm demonstrado efeito Metabolic changes in cancer cachexia – first of two parts.
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Dessa forma, para indicar a terapia nutricional em BOKHORST, V. S. Nutritional support strategies for
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4 CONCLUSÃO
Neste aspecto, o paciente deve estar atento à
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necessidade de ter um atendimento nutricional
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especializado e exigir que em seu tratamento
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Número 1, Volume 6, jan/fev de 2024 – ISSN: 2596-3481
O REFLEXO DO ESTADO NUTRICIONAL DE PACIENTES ONCOLÓGICOS NO TRATAMENTO E
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