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Linha Direta

Vitória de Rishi Sunak com aprovação de projeto para enviar imigrantes a Ruanda pode ser temporária

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O primeiro-ministro britânico, Rishi Sunak, conseguiu aprovar na Câmara dos Comuns, instância baixa do Parlamento, o projeto de lei que autoriza a deportação de estrangeiros em situação ilegal no Reino Unido para Ruanda. Se o projeto passar na Câmara dos Lordes (alta), refugiados e imigrantes que chegaram à Grã-Bretanha sem visto e documentos irão aguardar pelo processo de asilo político no país africano.

O primeiro-ministro britânico, Rishi Sunak, passou no teste que colocava em risco sua liderança política, após a aprovação, na Câmara dos Comuns, de seu projeto de lei para enviar imigrantes ilegais para Ruanda.
O primeiro-ministro britânico, Rishi Sunak, passou no teste que colocava em risco sua liderança política, após a aprovação, na Câmara dos Comuns, de seu projeto de lei para enviar imigrantes ilegais para Ruanda. © AP - Jessica Taylor
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Yula Rocha, correspondente da RFI em Londres

Depois de dois dias de debates no Parlamento e muito barulho da ala de extrema direita do Partido Conservador, que queria regras imigratórias ainda mais duras, Sunak saiu, por enquanto, vitorioso. O chamado "Esquema Ruanda" recebeu o aval da maioria dos parlamentares na quarta-feira (17) – 320 votos a favor e 276 contra. Os deputados deram sinal verde para que imigrantes em situação irregular sejam enviados ao país africano enquanto aguardam a resposta de seus pedidos de asilo político. 

O projeto, que vai contra pareceres da Corte Europeia de Direitos Humanos e da Suprema Corte do Reino Unido, é visto por muitos como uma manobra política do governo conservador, atualmente em campanha para a reeleição. O plano, apresentado ainda no governo de Boris Johnson, já custou aos contribuintes britânicos 240 milhões de libras ou o equivalente a um bilhão e meio de reais, montante que o Reino Unido pagou ao governo de Ruanda para receber os imigrantes deportados da Inglaterra. No entanto, até hoje ninguém foi enviado de fato para o país africano.

"Bem-vindo a Ruanda!"

Em linhas gerais, o governo britânico quer desencorajar a vinda de mais refugiados e imigrantes para o Reino Unido. Ruanda fica a 6.500 quilômetros da Inglaterra, e a decisão sobre um pedido de asilo político pode levar vários meses e até anos. A ideia é que apenas depois dessa resposta oficial, os estrangeiros seriam autorizados a imigrar; se forem rejeitados, poderão continuar em Ruanda ou migrar para outro país. 

Atualmente, os imigrantes que chegam ao Reino Unido de barco são mantidos em hotéis e até em navios de guerra desativados. Eles ficam numa espécie de limbo migratório, sem autorização para trabalhar, ou seja, sem ter uma renda, até que a papelada seja aprovada. Custa dinheiro aos cofres públicos britânicos pagar pela alimentação e acomodação dessas pessoas, o que gera um acalorado debate político em plena crise econômica enfrentada pelo país.

Desde o Brexit – a saída do Reino Unido da União Europeia –, a questão imigratória está no centro de uma pauta política polarizada em vários países da Europa (Itália, França, Hungria), assim como nos Estados Unidos, e o tema vai continuar em debate neste ano eleitoral. Com a constante travessia ilegal de barcos entre a França e a Inglaterra pelo Canal da Mancha, a campanha "Stop the boats" (Parem os barcos, em português) tornou-se a principal bandeira do primeiro-ministro Rishi Sunak.

Batalha jurídica

Os primeiros voos de deportação para Ruanda deveriam ter decolado em junho de 2022, mas os imigrantes apelaram à Corte Europeia de Direitos Humanos e conseguiram ficar no Reino Unido. A Suprema Corte britânica julgou o projeto de lei inconstitucional, por considerar que Ruanda não é um país seguro para os refugiados.

Apesar das manobras políticas do governo conservador, a Justiça britânica estima que os estrangeiros correm o risco de serem deportados para seus países de origem, de onde fugiram por vários motivos, como guerras, perseguição política, racial, religiosa ou de gênero. Em seu parecer no ano passado, a Suprema Corte chegou a lembrar que em 2021 o governo britânico criticou Ruanda por conta de assassinatos extrajudiciais, torturas e mortes em custódia, inclusive com casos em que a polícia abriu fogo contra refugiados.

O que o governo pretende fazer com a nova lei é ignorar a decisão da Suprema Corte e dizer, com o aval da maioria dos parlamentares, que Ruanda é sim um país seguro, apesar de até a ONU e a Corte Europeia de Direitos Humanos, da qual o Reino Unido é signatário, discordarem. O Reino Unido poderá estar infringindo leis internacionais.

Perigosa travessia no Canal da Mancha

O número de imigrantes indocumentados caiu no Reino Unido graças a um acordo com governo da Albânia, país de onde muitos tentavam migrar. Ainda assim, só no ano passado quase 30 mil migrantes atravessaram o Canal da Mancha em barcos que partem do litoral norte da França para a Inglaterra. Na semana passada, foram registradas 263 travessias em pleno inverno. 

Mais de 70% dos migrantes são originários de países em guerra ou sob regime ditatorial, como Síria, Afeganistão, Irã e Iraque. Sem poder voltar para trás, os refugiados se arriscam na perigosa travessia em pequenos botes infláveis. O Reino Unido tem um acordo com a França para combater a ação de criminosos que organizam essas travessias e cobram caro por isso. Mas as quadrilhas continuam em ação, e os migrantes conseguem chegar na Grã-Bretanha.

Crise imigratória e política

O projeto de lei ainda tem que ser apreciado pela Câmara dos Lordes, onde os conservadores não têm maioria. O governo não vê a hora de enviar a primeira leva de imigrantes para Ruanda, antes das eleições gerais que devem acontecer no segundo semestre no Reino Unido. A imagem de refugiados que tentaram migrar para a Inglaterra, mas acabaram na África, será politicamente explorada durante a campanha. Porém, mesmo que isso aconteça, serão poucos os deportados, quando comparados aos quase 100 mil imigrantes que aguardam uma decisão sobre seu status imigratório no Reino Unido; ou seja, o esquema não resolve o que muitos consideram uma crise imigratória.

O assunto é polêmico e alimenta a retórica nacionalista de grupos de extrema direita que estão se fortalecendo na Grã-Bretanha. Mas, segundo as pesquisas de intenção de voto, a oposição trabalhista está na frente e pode voltar ao poder, depois de 14 anos de governos conservadores.

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