Chuvas devem piorar no RS e inundação 'extrema' pode chegar a novos locais no Sul, diz previsão

Grupo carrega homem ferido em carrinho de pedreiro em meio a enchente

Crédito, Diego Vara/Reuters

Legenda da foto, Mais de 1,4 milhão de pessoas foram afetadas pela chuva

Em meio à tragédia sem precedentes deixada pelas enchentes no início desta semana, chuvas fortes devem voltar a atingir o Rio Grande do Sul a partir de sexta (10/5), segundo a previsão de serviços meteorológicos.

De acordo com o Climatempo, áreas de instabilidade vão se formar sobre todo o Estado e "ficam ativas" até a segunda-feira, com o potencial de prejudicar os serviços de resgate, reabastecimento e restabelecimento de serviços.

A partir de sexta, "há condições para chuva frequente, ocorrência de temporais e acumulados extremos" especialmente na porção centro-norte do Estado, incluindo as regiões que já foram muito afetadas.

O serviço afirma que é preocupante a previsão de temporais (chuva forte com raios) e ventos fortes em todo o Estado.

Além disso, a região sul do Estado deve ser a que mais vai sofrer com o volume de chuvas.

A MetSul prevê que a enchente próximo às cidades de Pelotas e Rio Grande vai piorar nos próximos dias, com a água atingindo locais "em que jamais chegou".

"A quantidade de água que está descendo os cerca de 300 quilômetros entre o Guaíba e a parte Sul da Lagoa dos Patos, tecnicamente Laguna dos Patos, é colossal. Todos os rios que desaguam na Lagoa tiveram enchente recorde ou histórica."

"A quantidade de água que avança pela Lagoa dos Patos é extraordinária e jamais vista", diz a MetSul. "A água alcançará locais em Pelotas em que jamais chegou, inclusive no Centro. Grandes áreas da quarta cidade mais populosa do Estado e a maior da Metade Sul gaúcha vão ficar debaixo d'água. Em alguns locais, a inundação será de severa a extrema."

Segundo o serviço meteorológico, a situação será tão extraordinária que as lagoas Mirim e dos Patos poderão se unir pela inundação "formando uma única e grande massa d'água".

Nesta quinta (9/5), a Lagoa dos Patos já está 1 metro acima do normal.

Mortos, feridos e desalojados

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As enchentes já deixaram 107 mortos, 374 feridos, 130 desaparecidos, segundo o último boletima da Defesa Civil, na quinta (9/5), às 12h.

Mais de 1,7 milhão de pessoas foram afetadas em 431 municípios (85% dos municípios do Rio Grande do Sul). Mais de 68 mil pessoas estão em abrigos e 327 mil tiveram que deixar suas casas.

Na quarta (8/5), o retorno das chuvas paralisou temporariamente parte dos serviços de resgate e salvamento com barcos promovido por autoridades e voluntários.

A Defesa Civil alerta que as pessoas resgatadas de áreas alagadas, inundadas ou que correm o risco de sofrer deslizamentos de terra não devem voltar para suas casas, especialmente na região metropolitana de Porto Alegre.

Não há condições seguras para retorno, diz a Defesa Civil. Além da previsão de chuva e possibilidade de mais deslizamentos e enchentes, há o risco de contaminação por doenças.

O nível do Rio Guaíba abaixou pela primeira vez para baixo dos 5 metros desde o início das inundações, mas ainda está bem acima do que é considerado o máximo antes de causar inundação (3 m).

A previsão é que, mesmo sem chuvas, o rio continue acima da cota de inundação até a próxima semana e que o nível só volte ao normal no final de maio.

Segundo o governo do Estado, cinco barragens apresentam grande risco de rompimento e as autoridades já estão promovendo a retirada imediata de pessoas nas áreas de risco. São elas:

  • UHE 14 de Julho, em Cotiporã e Bento Gonçalves
  • PCH Salto Forqueta, em São José do Herval e Putinga
  • Barragem de São Miguel, em Bento Gonçalves
  • Barragem Saturnino de Brito, em São Martinho da Serra
  • Barragem do Arroio Barracão, em Bento Gonçalves

A força tarefa organizada pelo governo do Estado e pelo governo federal continua atuando na região.

O governo federal informou que já destinou R$ 1,6 bilhão ao Estado entre liberação de emendas parlamentares, recursos para auxílio social, aquisição de alimentos, garantia de energia, entre outras iniciativas.

Homem retira lama com um carrinho de pedreiro

Crédito, SEBASTIAO MOREIRA/EPA-EFE/REX/Shutterstock (

Legenda da foto, 85% dos municípios do Rio Grande do Sul foram atingidos

Serviços e infraestrutura

Autoridades federais e estaduais têm trabalhado para restabelecer os serviços e a distribuição de águas e alimentos.

  • Diversas estradas continuam com bloqueio total ou parcial. O governo criou um mapa interativo que mostra os bloqueios em tempo real. Clique aqui para acessar.
  • O aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, que sofreu com a inundação, está fechado e sem previsão de retorno, segundo a Fraport, empresa que administra o aeroporto. Pessoas que têm passagens de/para Porto Alegre são orientadas a procurar as companhias aéreas para remarcação/reembolso.
  • No Estado, há 952 escolas afetadas – danificadas, servindo de abrigo ou com dificuldade de acesso. São 331 mil estudantes impactados, em 236 municípios.
  • O retorno de operação da Central de Abastecimento do Rio Grande do Sul (Ceasa), que foi afetada pela enchente e vai operar temporariamente em Gravataí, deve garantir o abastecimento de alimentos em diversas partes do Estado, segundo o governador Eduardo Leite.
  • Apenas quatro das oito estações de tratamento de água estão em funcionamento em Porto Alegre. Estima-se que 80% da população da capital tenha sido afetada por desabastecimento de água.
  • Segundo o último boletim (na terça, 7/5) da RGE, empresa de energia que atende maior parte da região afetada, 13 municípios ainda estão totalmente desligados e oito cidades estão parcialmente desligadas por segurança. Já a CEEE Equatorial informou nesta quarta pela manhã que 198 mil clientes estavam sem energia em sua área de concessão.

Por que choveu tanto no Rio Grande do Sul?

Meteorologistas ouvidos pela reportagem da BBC News Brasil explicam que as chuvas intensas registradas no Rio Grande do Sul nos últimos dias são consequência de uma combinação de três fatores principais:

  • Presença de um cavado (corrente intensa de vento) em atuação na região proporcionando a formação de tempo bastante instável;
  • Presença do corredor de umidade vindo da Amazônia, que potencializou a intensidade de precipitação;
  • Presença de uma onda de calor na região central do país

"Essa massa de ar quente sobre a área central do país bloqueou a frente fria que está na região Sul, impedindo-a de avançar e se espalhar para outras localidades. A junção desses fatores faz com que essa instabilidade fique sobre o Estado, causando chuvas intensas e continuas", explica Dayse Moraes, meteorologista do Inmet.

Aliado a isso, o período entre o final de abril e o início de maio de 2024 ainda tem influência do fenômeno El Niño, que é responsável por aquecer as águas do oceano Pacífico, contribuindo para que áreas de instabilidade fiquem sobre o Estado.

Essa combinação de diversos fatores de uma única vez é considerada rara pelos especialistas.

As chuvas catastróficas do Sul têm relação direta com a onda de calor registrada na região Centro-Oeste e Sudeste, onde as temperaturas estão cerca de 5°C acima da média neste outono.

"Com a intensificação das mudanças climáticas globais, os eventos climáticos extremos serão mais frequentes e intercorrentes", acrescenta Rafael de Ávila Rodrigues, professor e climatologista do Instituto de Geografia da Universidade Federal de Catalão (UFCAT).